Lideranças indígenas alertam comunidade europeia sobre situação no Brasil

Lideranças indígenas da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – Apib e entidades de apoio levaram ao conhecimento da comunidade europeia alertas sobre a situação crítica das comunidades indígenas para ser considerada no processo de avaliação do Brasil na Revisão Periódica Universal – RPU.

As leituras foram apresentadas em um documento com 12 recomendações, no qual destacam a paralisia do processo de demarcação de terras indígenas, o retrocesso de direitos que avança no Congresso Nacional, o enfraquecimento dos órgãos indigenistas como a Fundação Nacional do Índio – Funai, a Secretaria Especial da Saúde Indígena – SESAI, além dos assassinatos e criminalização de lideranças de povos nacionais.

O documento reforça as recomendações da relatoria da ONU, elaborada após visita da relatora Victoria Tauli-Corpuz em março passado. Em seu relatório, ela alertou sobre “retrocessos extremamente preocupantes na proteção dos direitos dos povos indígenas” nos últimos oito anos no Brasil, uma tendência que, segundo ela, continuará a se agravar “caso não sejam tomadas medidas decisivas por parte do governo para revertê-la”, disse à época. De lá para cá, passado quase um ano de sua visita, o resultado é que a escalada sistemática de ataques aos direitos indígenas por parte dos três poderes – Executivo, Legislativo e Judiciário.

Realizado em Brasília, na manhã desta terça-feira (21/02), na sede da Delegação da União Européia em Brasília, o encontro reuniu as lideranças indígenas e indigenistas junto a representantes de 12 países que compõem a União Européia, entre eles, Áustria, Países Baixos, Bélgica, Noruega, Finlândia, Suíça, Polônia, Dinamarca, Alemanha, Reino Unido, Suécia. Além da sede da Delegação da UE no Brasil, as lideranças indígenas estiveram reunidas também com representantes de outras embaixadas, entre elas, Austrália, Equador, El Salvador, México e Uruguai.

Relatório

O relatório apresentado à União Européia e também a outras embaixadas durante a terça (21/02) e quarta-feira (22/02) foi elaborado de forma colaborativa com a participação de 16 organizações indígenas e 10 organizações indigenistas pela defesa dos direitos humanos durante uma oficina realizada pela APIB, pela Rede de Cooperação Amazônica – RCA e pela Plataforma de Direitos Humanos – Dhesca Brasil.

 

Acesse o relatório da íntegra aqui

Fonte: Plataforma Dhesca

 

 

Populações do campo precisam lidar com os perigos dos projetos de mineração

O conceito de soberania alimentar foi profundamente desenvolvido pelos movimentos que compõem a Via Campesina, composta por dezenas de organizações em todo mundo e que articula as lutas, saberes e modo de produção camponeses, as populações tradicionais e os conflitos no campo. Diferente do termo “segurança alimentar”, que está mais ligado à disponibilidade e acesso aos alimentos, a soberania alimentar é entendida como um direito e bem essencial dos povos. Soberania é alimentação suficiente, com variedade, livre de venenos e que garanta uma nutrição equilibrada. Está inserida numa proposta maior de projeto de nação. Implica, necessariamente, em uma soberania territorial e uma soberania hídrica, para citar dois eixos fundamentais. E são estes dois eixos que se confrontam diretamente com os grandes projetos mineradores.

A conquista da soberania territorial passa pela resolução de um dos mais graves problemas estruturais brasileiros: a concentração de terra. Com o aprofundamento da exploração mineral no Brasil nos últimos 15 anos, os camponeses de inúmeras regiões passaram a lidar de forma intensa com um conflito adicional, a perda de terra para as empresas mineradoras. Temos situações diversas, como em Conceição do Mato Dentro (MG), onde comunidades inteiras foram dissolvidas, moradores remanejados pela empresa multinacional Anglo American para outros lugares, muitos nas áreas urbanas dos municípios da região. São populações que viveram por gerações do trabalho na terra, com produção suficiente para viver com dignidade, estocar uma quantia e vender na feira da cidade. Que tipo de soberania alimentar vivem essas pessoas quando são expulsas para as cidades? O deslocamento compulsório vivido por comunidades rurais de Conceição do Mato Dentro não se trata de um caso isolado, mas sim do padrão estabelecido do modelo mineral brasileiro. Mineração é desenvolvimento; “roça” é puro atraso.

Outras ameaças

A soberania alimentar dos camponeses e camponesas não é ameaçada pela mineração somente na disputa pela terra. Um empreendimento de mineração, independente da escala ou do mineral extraído, coloca as águas de determinada região em situação de vulnerabilidade. Quando se trata das grandes minerações industriais do ferro e bauxita, o consumo de água é ainda maior. Mas para além do consumo, que já é um risco para o desenvolvimento da agricultura, há um padrão constante de contaminação dos cursos d’água associado à instalação dos projetos minerários. Na região de Caetité (BA) existe a única mina em atividade de urânio do país, a estatal Indústrias Nucleares do Brasil (INB). Ela admitiu em laudos próprios que havia poços de água no município vizinho de Lagoa Real com concentração de urânio acima do nível permitido pela Organização Mundial de Saúde. A região onde está sendo explorado o mineral radioativo é de semiárido, com longos períodos de seca. A água, escassa, é essencial para a vida dos moradores das áreas rurais.

E o que dizer do maior crime e desastre socioambiental da história do Brasil, o rompimento da barragem do Fundão de propriedade da Samarco/Vale/BHP? A lama devastou vidas, casas, animais, nascentes, riachos e o Rio Doce, um dos maiores do país. Toda uma bacia hidrográfica foi comprometida, talvez de modo irreversível. Como pensar em soberania alimentar para os milhares de camponeses e pescadores que passaram a não ter mais os meios de sua sobrevivência e alimentação garantidos?

Modelo de desenvolvimento

A mineração é inevitável e precisa estar acima de qualquer outra atividade produtiva que possa ser realizada no território? A produção agrícola camponesa, que garante diversidade e qualidade de alimentos na mesa do povo não é desenvolvimento? O atual modelo de mineração brasileiro se caracteriza, em grande medida, pela reduzida capacidade de estabelecer elos com dinâmicas econômicas tradicionais, em particular no contexto de projetos minerários predominantemente voltados para a exportação. A forte tendência à concentração das atividades econômicas em torno apenas de um setor, como ocorre em muitas regiões, gera processos de monotonização econômica e até mesmo de uma minério-dependência, em que as demandas gerais do local passam a ser pautadas por um único setor. A mineração é vista como “redenção” e “progresso”. Esse processo, associado à apropriação intensiva da natureza, gera uma inviabilização de outras atividades econômicas, como a agricultura.

Terra e água sob o controle dos camponeses são elementos básicos para se pensar em soberania alimentar. A defesa do território virou uma questão de sobrevivência para camponeses, pescadores e populações tradicionais em muitas partes do Brasil. Para além de toda a histórica e desigual estrutura fundiária brasileira, as populações do campo precisam lidar em muitas partes com os novos perigos colocados pelos projetos mineradores.

Maria Julia Zanon é antropóloga e da coordenação nacional do Movimento pela Soberania Popular na Mineração

Fonte: Brasil de Fato

Novo presidente da Funai diz que ‘é preciso ensinar índios a pescar’

Gestor nomeado pelo governo Temer, indica que entidade, criada para preservar a civilização indígena, deverá ter atuação nula na mediação de conflitos com o agronegócio


O novo presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), Antonio Fernandes Toninho Costa, que assumiu o cargo em janeiro deste ano, provocou sua primeira polêmica frente ao cargo ao declarar, ao jornal Valor, que é preciso que as aldeias “sejam auto sustentáveis” e é preciso “ensinar os índios a pescar”.

Ainda na entrevista, Toninho Costa disse que o momento da “Funai assistencialista” não cabe mais. A afirmação não foi bem aceita pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi). “Talvez ele pudesse inverter as palavras, deixar os indígenas ensinarem a Funai a pescar. Ele é que está chegando agora, então seria bom ensinar (a ele) o rumo, abrir o espaço para um diálogo com os povos indígenas que são aqueles que sabem para onde querem ir”, afirmou o secretário-geral do Cimi, Gilberto Vieir, em entrevista à TVT.

O secretário-geral do Cimi disse que a indicação de Toninho Costa, no primeiro momento, agradou os movimentos sociais que atuam junto aos povos indígenas e lembrou que o novo presidente da Funai viveu muitos anos em áreas de demarcação, trabalhando diretamente com os indígenas e possui comprovada formação acadêmica na área.

Entretanto, Gilberto lembra que a Funai terá dificuldade mais para atuar nas questões de saúde, educação e nos conflitos de terra em áreas críticas, como no Mato Grosso do Sul, pois a fundação atua com poucos colaboradores e um orçamento cada vez mais enxuto, por causa da política de cortes na área social promovidas pelo governo Temer. “Ele pega a Funai em um momento extremamente conturbado, na parte financeira, nas próprias iniciativas que o governo Temer tem feito, com uma portaria limita a demarcação de terra. É esse o contexto do presidente da Funai, que tem o orçamento reduzido”, explica.

O Cimi também chamou a atenção para a presença de Michel Temer, na sexta feira passada (17), no ato de posse do novo presidente da Frente Parlamentar Agropecuária (FPA), agora sob o comando do deputado federal Nilson Leitão (PSDB-MT).

A aproximação de Temer com a bancada ruralista é sinal de que cada vez mais as demandas do agronegócio terão prioridade, em detrimento dos direitos dos povos indígenas e das comunidades tradicionais. “Ele (Temer) declara que quando olha para o futuro, ele olha os ruralistas, ou seja, então se você trabalha para os ruralistas, você vira as costas para os povos indígenas.”

Fonte: RBA

Número de pobres no Brasil terá aumento de no mínimo 2,5 milhões em 2017, aponta Banco Mundial

Até o final de 2017, o Brasil deverá testemunhar um aumento de 2,5 milhões até 3,6 milhões no número de pessoas vivendo na miséria. Resultado da prolongada crise econômica, a estimativa foi divulgada neste mês pelo Banco Mundial, que sugeriu um aumento do orçamento do Bolsa Família para atender os “novos pobres”. Em média, esses brasileiros têm menos de 40 anos, moram nas zonas urbanas, concluíram pelo menos o Ensino Médio e estavam empregados em 2015, sobretudo no setor de serviços.


Até o final de 2017, o Brasil deverá testemunhar um aumento de 2,5 milhões até 3,6 milhões no número de pessoas vivendo na miséria. Resultado da prolongada crise econômica, a estimativa foi divulgada neste mês pelo Banco Mundial.

O organismo financeiro traça um perfil desses “novos pobres” — em média, brasileiros com menos de 40 anos, moradores de zonas urbanas, que concluíram pelo menos o Ensino Médio e estavam empregados em 2015, sobretudo no setor de serviços.

Para mitigar os impactos da recessão sobre a população, o Banco Mundial recomenda a expansão do Bolsa Família, que deverá ter seu orçamento ampliado para 30,7 bilhões de reais em 2017, caso o governo queira cobrir os “novos pobres” com a proteção social.

Isso evitaria que a miséria atingisse valores acima do patamar de 2015, quando a tendência decrescente da pobreza foi revertida após uma década de queda ininterrupta. Em 2014, a pobreza e a pobreza extrema no Brasil eram estimadas em 7,4% e 2,8%, respectivamente. No ano seguinte, os valores registraram um salto para 8,7% e 3,4%.

O incremento no Bolsa Família sugerido pelo Banco Mundial representa um acréscimo de cerca de 900 milhões de reais na verba prevista para o programa pela lei orçamentária de 2017.

O aumento na pobreza para este ano foi calculado com base em variações distintas de índices macroeconômicos. No cenário mais otimista, o Banco Mundial estima uma retomada do crescimento econômico, com um modesto saldo positivo — de 0,5% — para o Produto Interno Bruto (PIB). O desemprego continuaria em ascensão, chegando aos 11,8%, valor 0,6% mais alto do que a taxa de desocupação no ano passado.

Na previsão mais pessimista, o Brasil continuará em recessão, com o PIB registrando contração de 1%. O desemprego alcançaria os 13,3%.

Foto: USP/Marcos Santos
Trabalho formal é principal fonte de renda entre os 40% mais pobres da população brasileira. Foto: USP/Marcos Santos

Nas melhores circunstâncias, o número de pessoas moderadamente pobres atingirá os 19,8 milhões (9,8% da população), incluindo os que viverão na miséria extrema — cerca de 8,5 milhões de indivíduos (4,2%) em 2017. A linha de pobreza utilizada para os cálculos foi estipulada como 140 reais per capita por mês.

No pior cenário, a pobreza chega a 10,3% — 20,8 milhões de brasileiros — e a pobreza extrema alcançará os 4,6% — 9,3 milhões. Em 2016, a miséria extrema havia sido calculada em 3,4%.

Caso os investimentos no Bolsa Família sejam realizados, a proteção social poderia frear o crescimento da miséria extrema, que alcançaria 3,5% e 3,6% nas simulações mais otimista e mais pessimista, respectivamente. Os valores ficariam bem próximos aos verificados em 2015.

Desemprego, pobreza e redistribuição de renda

O Banco Mundial lembra que mais de 28,6 milhões de brasileiros saíram da pobreza entre 2004 e 2014. O número representa quase metade da redução da miséria na América Latina e Caribe verificada no mesmo período. Os avanços foram possíveis pelo crescimento econômico, que gerou novas oportunidades de emprego, sobretudo no setor de serviços, e também por programas como o Bolsa Família.

Segundo o organismo financeiro, o Brasil se assemelha a outros países de renda média, onde os rendimentos do trabalho representam a maior fatia da renda para os 40% mais pobres da população. Para a maior parte desse segmento, a prosperidade depende do trabalho formal. Isso significa que o aumento do desemprego por conta da recessão põe em risco as conquistas do país no combate à miséria.

Em 2015, a recessão provocou o fechamento de 1,6 milhão de postos formais, causando um aumento no nível de desemprego, que saltou de 4,3% em dezembro de 2014 para 11,8% em outubro de 2016. O Banco Mundial aponta ainda que os salários reais também vêm sofrendo contração, com queda de 4,2% em 2015. Neste ano, o PIB registrou uma contração de 5,8%.

Para a fatia da população vivendo em pobreza extrema, porém, foram os programas de transferência de renda que reduziram o nível de miséria. Cinquenta e oito por cento da queda na pobreza extrema no Brasil registrada entre 2004 e 2014 está associada a mudanças nos rendimentos de fontes que não incluíam o trabalho, como o Bolsa Família.

Quem são os ‘novos pobres’?

Mapeando o perfil dos chefes das famílias de “novos pobres”, o Banco Mundial aponta que esses brasileiros não eram miseráveis em 2015. Eles têm nível de qualificação — 38,2% concluíram pelo menos o Ensino Médio — muito próximo ao da camada de não pobres, dos quais 41,3% têm, no mínimo, escolaridade média. Os “novos pobres” tinham trabalho dois anos atrás, mas entraram para as estatísticas dos desempregados.

O nível da formação revelado pelo Banco Mundial distancia os dois segmentos dos considerados estruturalmente pobres, brasileiros que já eram pobres em 2015 e continuarão vivendo na miséria. Entre esses, apenas 17,5% terminou o Ensino Médio e 63,7% vivem no campo. Quase 90% dos “novos pobres” vivem em zonas urbanas.

Dos que chegarão à linha da pobreza em 2017, 33,5% são brancos, em comparação aos 24,2% dos brancos descritos como vítimas estruturais da desigualdade.

Outra informação calculada pelo organismo financeiro é a faixa etária dos chefes das famílias dos “novos pobres”. Eles têm em média 37,9 anos, enquanto, entre os estruturalmente pobres, a média sobre para 41 anos. No grupo de não pobres, a idade chega a 50,4.

De acordo com o organismo financeiro, a profundidade e duração da atual crise econômica no Brasil podem ser vistos como uma oportunidade para que o governo amplie o papel do Bolsa Família — que passaria de um eficaz programa de redistribuição de renda para uma verdadeira rede de proteção, flexível o suficiente para expandir a cobertura aos domicílios dos “novos pobres”.

Acesse a avaliação do Banco Mundial na íntegra clicando aqui.

Fonte: ONU Brasil

Brasil é 10º país que mais mata jovens no mundo; em 2014, foram mais de 25 mil vítimas de homicídio

Dados são do ‘Mapa da Violência’, lançado nesta semana (15) na Câmara dos Deputados, em cerimônia que contou com a participação do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA). Relatório aborda letalidade das armas de fogo no Brasil e ranqueia país em uma lista de cem nações. Documento alerta para a vulnerabilidade da população negra brasileira: atualmente, morrem 2,6 vezes mais afrodescendentes do que brancos por homicídios cometidos com armas de fogo.


No Brasil, 25.255 jovens de 15 a 29 anos foram mortos por armas de fogo em 2014, um aumento de quase 700% em relação aos dados de 1980, quando o número de vítimas nessa faixa etária era de cerca de 3,1 mil. Com isso, o Brasil ocupa a 10ª posição em número de homicídios de jovens num ranking que analisou cem países.

As informações são do “Mapa da Violência 2016”, lançado na quarta-feira (15) em Brasília, na Câmara dos Deputados. O documento alerta também para a vulnerabilidade da população negra à violência. Atualmente, morrem por arma de fogo 2,6 vezes mais afrodescendentes do que brancos.

O representante do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA), Jaime Nadal, participou da mesa de apresentação do documento e afirmou que é preciso mudar a forma como a juventude é vista no Brasil. “Apesar de serem apontados como os principais responsáveis pelas alarmantes estatísticas no Brasil, adolescentes são mais vítimas do que autores de atos violentos”, disse.

O dirigente da agência da ONU no Brasil lembrou que a violência afeta principalmente os jovens negros e pobres, assim como as mulheres afrodescendentes.

Sem distinção por faixa etária, o “Mapa da Violência” aponta que, de 2003 a 2014, os homicídios por arma de fogo registraram queda de 27,1% entre a população branca — passando de 14,5 mortes por 100 mil habitantes para 10,6. No mesmo período, o índice aumentou entre os negros. Em 2003, foram 24,9 mortes por 100 mil afrodescendentes. Onze anos mais tarde, a taxa subiu para 27,4 — um aumento de 9,9%.

Em números absolutos, o “Mapa da Violência” identifica um crescimento de 46% no número de negros vítimas de homicídio por arma de fogo — de 20.291, em 2003, para 29.813, em 2014. Em 2003, morriam 71,7% mais negros do que brancos por esse tipo de crime. A proporção chegou a 158,9% em 2014. Ou seja, morrem por arma de fogo 2,6 vezes mais negros do que brancos no Brasil.

“O UNFPA e outras agências da ONU no Brasil têm atuado em várias frentes, apoiando ações afirmativas que buscam promover a participação de pessoas jovens e diminuir as desigualdades étnico-raciais”, acrescentou Nadal.

Tendo como tema central a letalidade das armas de fogo no país, o “Mapa da Violência” recupera registros desde 1980 e revela que aproximadamente 1 milhão de pessoas já foram vítimas de disparos. De 1980 para 2014, o número de homicídios por armas de fogo subiu de 6.104 para 42.291 por ano — um crescimento de 592,8%. Do total de assassinatos, cerca de 25 mil vitimaram jovens.

No Brasil, o número de armas de fogo não registradas é maior que o de registradas — 8,5 milhões contra 6,8 milhões. O relatório aponta que 3,8 milhões estão em mãos criminosas.

Entre as unidades federativas, Alagoas é o estado com a maior taxa de homicídios por armas de fogo: 56,1 vítimas por 100 mil habitantes em 2014. Ceará e Sergipe vêm em seguida. Os estados com os menores índices são Santa Catarina (7,5) e São Paulo (8,2). A média brasileira em 2014 foi de 21,2 vítimas por 100 mil habitantes.

Da esquerda para direita, Assis Filho, secretário nacional de Juventude, Juvenal Araújo, assessor especial da SEPPIR, e Jaime Nadal, representante do UNFPA, Foto: UNFPA/Jorge Salhani
Da esquerda para direita, Assis Filho, secretário nacional de Juventude, Juvenal Araújo, assessor especial da SEPPIR, e Jaime Nadal, representante do UNFPA, Foto: UNFPA/Jorge Salhani

Com dados verificados até 2012, o Brasil ocupa, a nível internacional, a 10ª posição em um ranking de cem países. Quem encabeça a lista é Honduras, com taxa de 66,6 homicídios por 100 mil habitantes, seguido por El Salvador (45,5). A nação sul-americana com a maior taxa de homicídios por arma de fogo é a Venezuela (39).

Sobre os dados, o assessor especial da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Social (SEPPIR), Juvenal Araújo, comentou que é inadmissível que, a cada três jovens assassinados no Brasil, dois sejam negros. Araújo disse que faltam políticas efetivas para acabar com o genocídio da população jovem brasileira.

Parceira no lançamento do “Mapa”, a Secretaria Nacional de Juventude (SNJ) foi representada pelo secretário Assis Filho. “A violência tem cor, faixa etária e moradia”, disse o chefe do organismo, referindo-se aos números da violência contra a população negra, jovem e periférica.

Assis Filho informou ainda que a SNJ e seus parceiros estão trabalhando no relançamento do Plano Juventude Viva, projeto que visa reduzir a vulnerabilidade de jovens negros a situações de violência física e simbólica.

Grupo Assessor sobre Juventude

O UNFPA coordena, em conjunto com a Secretaria Nacional de Juventude, o Grupo Assessor Interagencial sobre Juventude da ONU no Brasil. Formado por 10 agências das Nações Unidas e pelo Conselho Nacional de Juventude, o organismo é responsável por promover diálogos entre a sociedade civil, governos e a Organização internacional.

Conheça o ‘Mapa da Violência’

O “Mapa da Violência 2016” tem autoria do sociólogo Julio Jacobo Waiselfisz, coordenador da área de Estudos sobre a Violência da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (FLACSO). A primeira edição do “Mapa” foi publicada em 1998 e, a cada ano, foca em um tema diferente, como homicídio de mulheres ou violência contra adolescentes.

As informações completas podem ser encontradas na versão online do relatório. Acesse o documento clicando aqui.

Fonte: ONU Brasil

Governo Temer acelera registros e põe novos agrotóxicos nas lavouras e na mesa

Paralelamente ao apoio dado ao chamado “pacote do veneno”, que avança em regime de prioridade na Câmara, o governo de Michel Temer (PMDB) investe em novas ações que praticamente revogam a atual legislação sobre agrotóxicos, colocando assim a saúde da população em risco.

No último dia 3, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) anunciou a criação, ainda este ano, do Sistema Integrado de Agrotóxicos. Conforme a pasta, não se trata apenas de simplificar procedimentos para o registro de agrotóxicos. “São ações coordenadas para que seja agilizada a oferta de novos agroquímicos, atendendo, assim, as prioridades do agricultor”, disse o secretário de Defesa Agropecuária do Mapa, Luis Rangel, conforme nota divulgada no site da pasta.

Ainda segundo o comunicado, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), vinculada ao Ministério da Saúde, e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), do Ministério do Meio Ambiente, participam desse esforço para reduzir a burocracia e acelerar a aprovação de novos produtos.

O ministério chefiado por Blairo Maggi, mais conhecido como “rei da soja”, informa ainda que vai cruzar “os dados desses três órgãos para organizar a fila de pedidos de registro e acelerar a aprovação de novos produtos”.

Genéricos

No ano passado, o número de novas liberações foi recorde, com a aprovação de 277 novos produtos, a maior parte deles genéricos – “porque o ministério quer velocidade e segurança para a utilização de insumos mais adequados ao agronegócio”, conforme o secretário de Defesa Agropecuária Luis Rangel, que tem se reunido com fabricantes de agrotóxicos e outros agroquímicos, representantes dos produtores de soja e algodão, além de parlamentares, para definir as prioridades de novos insumos agropecuários e “garantir a oferta de produtos seguros, não contrabandeados e mais baratos aos produtores”.

A medida do governo para ampliar o estímulo ao mercado brasileiro de venenos, que já é o maior do mundo, é repudiada por especialistas em saúde e meio ambiente. Segundo fontes ouvidas pela reportagem, a iniciativa tende a afrouxar ainda mais as regras de um setor carente de rigor nos procedimentos de liberação, comercialização e fiscalização.

Professora do Departamento de Nutrição da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Suzi Barletto Cavalli entende que acelerar o processo de liberação de novos venenos significa colocar mais veneno nas lavouras e na mesa da população brasileira. “Se continuarmos assim, vamos liberar mais agrotóxicos e com menos avaliações de sua toxicidade especialmente para a saúde humana, animal e o meio ambiente”, afirma.

De acordo com ela, a flexibilização das regras, que vem ganhando força no país com várias iniciativas, agrava ainda mais a situação marcada pela utilização desmedida de agrotóxicos, geralmente sem controle e sem fiscalização na produção, que compromete a segurança e a qualidade dos alimentos consumidos.

“Temos análises que demonstram a presença de agrotóxicos proibidos no país em muitos alimentos, de outros até que nem foram liberados. Sem contar amostras que revelam desrespeito aos períodos de carência entre aplicação e consumo. Trata-se de um conjunto de relações que faz com que a ‘comida’ esteja insegura sob o ponto de vista biológico e químico”, ressalta.

Estudos

Recentemente, a Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e pela Vida anunciou que novos estudos têm associado a exposição a agrotóxicos com o surgimento do Mal de Parkinson. A doença degenerativa do sistema nervoso central, crônica e progressiva, ocorre pela queda da produção de dopamina, neurotransmissor envolvido no fluxo de informação entre os neurônios. Esta redução, segundo estudos, tem entre suas causas aspectos genéticos e ambientais – entre eles os agrotóxicos.

A professora da UFSC destaca que a relação entre o consumo de alimentos com a incidência de doenças crônicas, em especial o câncer, é comprovada em diversos estudos científicos.

“Para complicar, os casos agudos ou crônicos de doenças desencadeadas por agrotóxicos são subnotificados. Não temos controle, por exemplo, do custo dos tratamentos de doenças correlacionadas ao consumo e utilização dos agrotóxicos ao sistema de saúde. Esse descontrole escondem a real magnitude do problema. Precisamos associar custos financeiros utilizados nos tratamentos de saúde com as doenças crônicas, para que esse problema também seja visto sob o ponto de vista de política econômica”, diz.

Ela destaca ainda que estudos da Anvisa já vinham encontrando muito mais veneno em amostras de alimentos do que o permitido. O que pode ser ainda mais grave porque o desenho da avaliação da agência exclui alguns tipos de agrotóxicos, como o glifosato, que é o mais utilizado.

“Faltam análises das águas e de alimentos industrializados, como legumes e frutas em conserva frutas, produtos de origem animal, como carnes, leite, ovos e subprodutos. Nesse contexto creio que o quadro é muito pior do que as avaliações realizados pela Anvisa”.

Outra advertência é para o fato de que o agrotóxico fica impregnado no alimento, sendo impossível eliminar resíduos ao lavar os alimentos com ingredientes supostamente “salvadores’, como iodo, ácido acético (vinagre), cloreto de sódio e bicarbonato de sódio, entre outros, recomendados de maneira equivocada.

“Cada um possui funções específicas, mas não reduzem nem eliminam os agrotóxicos dos alimentos. Penso que deveríamos ter uma nova estrutura para o sistema político/técnico dos órgãos que regulam a produção, industrialização e comercialização de alimentos no país, como o Mapa, o Ibama e a Anvisa, permeando aspectos de instrumentalização e fiscalização de forma integrada e efetiva.”

Destacando a necessidade de reavaliação do atual modelo hegemônico de produção agrícola, que prioriza a monocultura com utilização de venenos em detrimento da produção orgânica de alimentos, a professora defende mais responsabilidade na agricultura. “A produção e consumo de alimentos orgânicos, de base agroecológica, são uma necessidade pois o alimento é saúde. Livres dos venenos e seus malefícios, os orgânicos ainda fornecem maior e melhor aporte nutricional, com mais vitaminas, minerais, antioxidantes que previnem doenças cardíacas, diabetes e vários tipos de câncer”.

Diante do avanço do PL do Veneno, e de medidas que estimulam novas liberações, a exemplo do sistema integrado a ser implementado por Temer, Suzi avalia que as perspectivas para a alimentação saudável e sustentável são as mais preocupantes.

“Além da questão dos agrotóxicos, temos ainda os produtos geneticamente modificados, onde não temos segurança para o consumo humano, e para os quais devemos aplicar o princípio de precaução até porque recebem quantidades maiores de veneno. Em especial aos alimentos industrializados, que utilizam largamente ingredientes derivados de sementes transgênicas. No caso da soja, 94% do que é utilizado é geneticamente modificado. E no do milho, 85%”, explica.

A preocupação não se limita a alimentos de origem vegetal, mas também subprodutos de origem animal, como carnes, leites, de rebanhos alimentados com rações produzidas com grãos geneticamente modificados (OGM) para receberem quantidades maiores de venenos.

“Temos ainda leveduras que são utilizadas nos produtos industrializados como queijos, pães, bolachas, vinhos, cervejas e outros. Encontra-se no senado federal a proposta da desregulamentação da rotulagem dos produtos transgênicos, se for aprovada, não teremos o direito de saber o que estamos consumindo”, destaca.

Por isso ela defende urgência em mudanças no sistema alimentar, no qual alimentação saudável seja sinônimo de alimentação sustentável nas suas dimensões nutricional, ambiental, cultural e política.

“Pacote do veneno”

O pacote é composto pelo Projeto de Lei 6299/2002, de autoria do atual ministro da Agricultura Blairo Maggi, quando senador, altera as atuais regras para pesquisa, experimentação, produção, embalagem e rotulagem, transporte, armazenamento, comercialização, propaganda, utilização, importação, exportação, destino final dos resíduos e embalagens, registro, classificação, controle, inspeção e a fiscalização de venenos, seus componentes e afins.

À proposta de Blairo estão apensados 17 outros projetos de lei – que compõem o “pacote do veneno”. Sua aprovação coloca em risco a atual legislação de agrotóxicos (Lei 7.802/89), afrouxando ainda mais a legislação e estimulando a liberação, a produção, a venda e uso dessas substâncias que têm no Brasil seu maior mercado consumidor – daí passar a ser chamado de “pacote do veneno”.

Um dos projetos inserido no pacote é o PL n.º 3200/2015, de autoria do deputado federal Luis Antonio Franciscatto Covatti (PP-RS), repudiado inclusive por promotores da 4ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal por criar uma Comissão Técnica Nacional de Fitossanitários (CTNFito), no âmbito do Mapa, a qual ficará responsável pela apresentação de “pareceres técnicos conclusivos aos pedidos de avaliação de novos produtos defensivos fitossanitários, de controle ambiental, seus produtos técnicos e afins e indicará os 23 membros efetivos e suplentes, deixando de fora representantes dos consumidores e da Anvisa”. Um ataque, segundo eles, aos princípios da precaução e da vedação ao retrocesso.

Por Cida de Oliveira, da RBA

Fonte: Sul 21

FIAN Brasil apresenta versão preliminar de estudo sobre o DHANA no Brasil

A FIAN Brasil prepara estudo sobre a realização do Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas (DHANA) no Brasil que visa registrar avanços estratégicos  desde a promulgação da Constituição de 1988, bem como lacunas e retrocessos e o agravamento destes retrocesso e involuções em um contexto de ruptura democrática evidenciando violações de direitos de responsabilidade dos poderes Executivo, Judiciário e Legislativo que impactam a realização deste direito no Brasil.

O conteúdo da publicação vai abranger os retrocessos na capacidade do estado de prover proteção social e combater a fome; retrocessos na capacidade do estado de  promover a produção e o consumo de alimentos de forma sustentável e nutricionalmente adequada e em relação à exigibilidade de direitos, violência e criminalização de movimentos sociais. “Esse estudo é um instrumento de iniciativa da FIAN Brasil, mas com o apoio e a participação de outras organizações e coletivos que servirá como denúncia e também como estratégia de incidência para evitar que se instalem mais retrocessos no Brasil, como por exemplo a proposta de reforma na previdência social que vai significar um grande retrocesso na realização do direito humano à alimentação e nutrição adequadas, atingindo sobretudo as mulheres, de uma forma geral, mas também trabalhadoras e trabalhadores rurais”, aponta a secretária geral da FIAN Brasil, Valéria Burity.

A versão preliminar do estudo, que está em fase de elaboração, foi apresentada durante o Seminário Desafios e perspectivas de enfrentamento dos retrocessos: pela garantia da soberania alimentar e do direito humano à alimentação adequada, realizado no dia 9 de fevereiro, durante reunião ampliada do FBSSAN – Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional, no Rio de Janeiro. O lançamento da publicação está previsto para meados de junho de 2017 e tem apoio da Pão Para o Mundo (PPM) e Misereor.

Seminário

O Seminário Desafios e perspectivas de enfrentamento dos retrocessos: pela garantia da soberania alimentar e do direito humano à alimentação adequada (DHAA) foi realizado durante a reunião ampliada do Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (FBSSAN) nos dias 9 e 10 de fevereiro, no  Rio de Janeiro.

A reunião contou com a parceria do Centro de Referência em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (CERESAN) e da FIAN Brasil, e teve como objetivo de  promover o debate sobre os desafios e perspectivas da conjuntura política atual em virtude das ameaças nacionais e internacionais às recentes conquistas brasileiras no campo das políticas de enfrentamento da fome e de promoção da Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (SSAN) e do Direito Humano à Alimentação Adequada (DHAA).

 

Por Flávia Quirino, da Assessoria de Comunicação da FIAN Brasil, com informações do FBSSAN.

Relatório “Nas Ruas, nas Leis, nos Tribunais – violações ao direito de protesto no Brasil 2015-2016”

A organização ARTIGO 19 lançou relatório “Nas Ruas, nas Leis, nos Tribunais – violações ao direito de protesto no Brasil 2015-2016”, que faz uma análise detalhada sobre o processo de criminalização do direito de protesto que tem ocorrido no país nas três esferas de poder: Executivo, Legislativo e Judiciário. Além disso, o relatório também chama atenção para a crescente criminalização do direito de protesto na esfera simbólica.

Todo o conteúdo do trabalho ainda pode ser visto em um site interativo (2016brasil.protestos.org), que, além de todo o conteúdo escrito, também traz vídeos com entrevistas com ativistas e especialistas no assunto.

Acesse o Relatório.

Artigo 19 | Relatório analisa processo recente de criminalização de protestos no Brasil

A organização ARTIGO 19 lançou na quinta-feira (9) o relatório “Nas Ruas, nas Leis, nos Tribunais – violações ao direito de protesto no Brasil 2015-2016”, que faz uma análise detalhada sobre o processo de criminalização do direito de protesto que tem ocorrido no país nas três esferas de poder: Executivo, Legislativo e Judiciário. Além disso, o relatório também chama atenção para a crescente criminalização do direito de protesto na esfera simbólica.

Todo o conteúdo do trabalho ainda pode ser visto em um site interativo (2016brasil.protestos.org), que, além de todo o conteúdo escrito, também traz vídeos com entrevistas com ativistas e especialistas no assunto.

Baixe o estudo

A publicação cita técnicas recém-criadas pela polícia para reprimir manifestações, novas tipificações penais usadas na detenção de ativistas, decisões judiciais negativas contra manifestantes, além da proposição e, em alguns casos, a aprovação, de projetos de lei restritivos ao direito de protesto.

Outra tendência preocupante verificada no período foi a exigência por parte da Polícia Militar (PM) para que organizadores apresentassem o trajeto a ser seguido por manifestantes, sob pena de serem impedidos de marchar pelas ruas. A conduta foi registrada em diversos protestos ocorridos em São Paulo.

Casos emblemáticos de manifestações que foram alvo do uso desproporcional da força policial também são mencionados no relatório. Entre eles, estão as manifestações contra o impeachment de Dilma Rousseff e contra a PEC 241, e as ocupações de escolas por estudantes secundaristas.

As ocupações estudantis, inclusive, motivaram o Governo do Estado de São Paulo e a PM a adotar um procedimento formalmente inédito no país: a realização da reintegração de posse de prédios ocupados sem mandados judiciais.

Ainda de acordo com o relatório, de todos os protestos registrados entre agosto de 2015 e dezembro de 2016 no Brasil, ao menos 1244 manifestantes foram detidos, enquanto que, só no Estado de São Paulo, pelo menos 69 manifestações foram alvo do uso de bombas pela polícia. Já no âmbito legislativo, foram contabilizados ao menos 22 projetos de lei que restringem de forma direta ou indireta o direito de protesto.
Cenário de violações preocupante

Para Paula Martins, diretora-executiva da ARTIGO 19, o recrudescimento da postura do Estado brasileiro perante as manifestações de rua têm se mostrado bastante preocupante à luz dos direitos de protesto e à liberdade de expressão.

“O ímpeto criminalizante que antes era muito visível no Executivo, por meio dos episódios de repressão policial em manifestações, acabou nos últimos anos também avançando no Legislativo e Judiciário. Esse processo tem causado grande preocupação em toda a sociedade civil por significar a supressão de direitos civis previstos na Constituição e ratificados pelo Brasil em convenções internacionais”, afirma

Ela acrescenta: “Uma medida a curto prazo que poderia ser tomada para remediar a situação é a criação de um protocolo que regulamentasse o uso da força policial em protestos, que hoje inexiste ou é mantido em sigilo. Além disso, também caberia aos governantes e ao Judiciário apurar os abusos e ilegalidades cometidos nas manifestações e elaborar políticas que visem a garantia desse direito fundamental. No entanto, o que vemos hoje muitas vezes é o contrário, com a alta cúpula do governo elogiando ações violentas da polícia e juízes expedindo decisões restritivas ao direito de protesto, fatos esses que acabam servindo como estímulo para que o ciclo de violações se perpetue.”

Lei Antiterrorismo e Olimpíadas

Um dos principais marcos da criminalização do direito de protesto no Brasil foi a Lei Antiterrorismo, aprovada no final de 2015. A lei é discutida no relatório sobretudo por trazer brechas que a permitem ser aplicada contra manifestantes. Sua aprovação se deu no contexto da realização das Olimpíadas no Brasil, evento que também ficou marcado por diversas violações ao direito de protesto.

O relatório lembra que, tanto no Rio de Janeiro quanto em São Paulo, manifestações contra os impactos sociais dos Jogos foram alvo de forte repressão policial. Critica ainda a aprovação da Lei Geral das Olimpíadas, que, entre outros pontos, proibia o uso de bandeiras para outros fins que não o de “manifestação festiva e amigável”, e rememora que, durante a realização do evento, diversos espectadores chegaram a ser expulsos dos locais de competição por se manifestarem politicamente, em flagrante violação ao direito de protesto e da liberdade de expressão.

Casos emblemáticos e episódios positivos

Alguns dos casos emblemáticos de pessoas que foram vítimas da criminalização do direito de protesto no Brasil também aparecem no relatório. Entre os casos, está o de Rafael Braga, que ficou preso por mais de dois anos após ser detido portando um frasco de desinfetante em região próxima a uma manifestação que ocorria em junho de 2013, no Rio de Janeiro. Após progredir para o regime semiaberto, em dezembro de 2015, Rafael foi novamente preso e colocado por 10 dias na solitária por ter aparecido em uma foto ao lado de uma mensagem de protesto.

Outro caso citado é o do fotógrafo Sérgio Silva, que perdeu o olho esquerdo após ser vítima de um disparo de bala de borracha que o atingiu no rosto, enquanto cobria uma manifestação em São Paulo, em junho de 2013. Sérgio entrou com uma ação pedindo reparações do Governo do Estado, mas viu seu pedido ser negado pela Justiça em agosto de 2016 sob o argumento de que ele próprio era responsável pelo ferimento, em episódio bastante ilustrativo da postura dos tribunais brasileiros de legitimação das violações em protestos.

Apesar deste amplo cenário de violações ao direito de protesto, houve o registro de alguns episódios pontuais positivos que são mencionados no relatório. Entre eles, estão decisões judiciais que suspenderam reintegrações de posse de prédios ocupados, a concessão de pagamento de indenizações a manifestantes feridos, e ainda a Ação Civil Pública aceita pela Justiça de São Paulo que, por alguns dias, restringiu a PM do Estado de empregar armamento menos letal em manifestações até que um protocolo do uso da força policial fosse criado.

Fonte: Artigo 19

Brasil de Fato | Novo presidente do Conselho Nacional de Direitos Humanos é de Curitiba

A autonomia com relação ao governo Temer (PMDB) é um dos principais desafios apontados pelo novo presidente

O advogado Darci Frigo foi eleito presidente do Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH), papel que deverá exercer até o final de 2018. Frigo é coordenador da Terra de Direitos, organização fundada em Curitiba há 15 anos. No Conselho, o advogado representa a Plataforma Dhesca Brasil, articulação composta por 40 entidades da sociedade civil – entre as quais a Terra de Direitos.

O CNDH é um organismo de Estado, que deve ser independente do Executivo, com composição paritária entre representantes da sociedade civil e do governo (11 de cada). A autonomia com relação ao governo Temer (PMDB) é um dos principais desafios apontados por Frigo para essa nova gestão do conselho.

Segundo o advogado, a maioria dos conselheiros interpreta o processo de condução de Temer à presidência com um golpe, que abre caminho para violações de direitos em vários setores. “O retrocesso na democracia faz com que a possibilidade de garantir direitos tenha se reduzido”, diz Frigo.

O advogado elenca o “descontrole total” no campo da segurança pública como um dos efeitos do enfraquecimento da democracia, referindo-se à crise nos presídios e à situação do crescimento súbito da violência no Espírito Santo.

Outra preocupação do novo presidente do CNDH é com os efeitos da aplicação da Proposta de Emenda à Constituição 55, aprovados pelo Congresso no final de 2016, que congela os gastos públicos por 20 anos. “O congelamento vai reduzir o atendimento às polícias sociais, aumentar o desemprego e gerar uma violação massiva de direitos humanos”, conclui.

Queda de braço

Ainda durante o governo interino de Temer, o novo arranjo institucional vinculou o Conselho ao Ministério da Justiça. Em agosto de 2016, o então ministro da pasta, Alexandre de Moraes, baixou uma portaria em que impedia qualquer gasto sem autorização do gabinete do ministerial, exceto para ações de segurança pública.

As entidades integrantes do CNDH pressionaram e conseguiram a manutenção das verbas necessárias para reuniões nacionais e para a realização de atividades e pesquisas das comissões temáticas.

* Por Ednubia Ghisi, do Brasil de Fato