Conselho Nacional dos Direitos Humanos elege novo presidente

Darci Frigo, representante da Plataforma Brasileira de Direitos Humanos, Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais (Plataforma Dhesca Brasil) é o novo presidente do Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH). Frigo é advogado e coordenador da organização de direitos humanos Terra de Direitos. Ele foi eleito na manhã desta quinta-feira (2) na 24ª reunião ordinária do Conselho, em Brasília.

“O Conselho vai se debruçar sobre graves questões que estão postas, que foram apresentadas no Congresso Nacional como reformas e que vão retirar direitos de trabalhadores, sejam trabalhistas ou previdenciários. Isso preocupa hoje o conjunto da população brasileira, vai ser motivo de grandes mobilizações sociais e o Conselho não pode se ausentar desse debate”, declara Frigo.

O novo presidente do CNDH enfatizou ainda que o Conselho atua, ou pelas demandas que recebe, ou pelas projeções que as comissões permanentes fazem sobre determinados temas. “As comissões, que já são de blocos temáticos, deverão se preocupar com temas transversais como temas de gênero, de raça, o tema de empresas e violações dos direitos humanos e outras questões que estão colocadas no âmbito da conjuntura, como a violência nos presídios, que é um sintoma da grave situação que o país vive hoje.”

No encontro, que contou com a presença da secretária Flávia Piovesan e de representantes da sociedade civil e do poder público que compõem o colegiado, também foi eleita a vice-presidente do CNDH, Fabiana Severo.

Fabiana Galera Severo é defensora pública federal do 3º Ofício de Migrações e Refúgio da Defensoria Pública da União (DPU), em São Paulo. Atualmente exerce a função de Defensora Regional de Direitos Humanos de Direitos Humanos e representa a Defensoria Pública da União no Conselho Nacional dos Direitos Humanos. Mestranda pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), com pesquisa sobre o trabalho escravo contemporâneo, representa ainda a DPU na Comissão Estadual para Erradicação do Trabalho Escravo, de São Paulo.

A pauta da reunião contemplou também a aprovação do Relatório sobre o Sistema Sócio Educativo de Pernambuco, com o resultado da Missão Emergencial que aconteceu nos dias 24 e 25 de novembro de 2016, e do Relatório sobre a População atingida pela implementação da UHE Belo Monte e pelo projeto de instalação da mineradora Belo Sun, resultado da Missão que ocorreu entre os dias 9 e 12 de outubro de 2016 na região de Altamira, sudoeste do Pará.

Nova composição da Mesa Diretora para o mandato 2016-2018

Presidente: Darci Frigo – Plataforma Dhesca Brasil

Vice-presidente: Fabiana Severo – Defensoria Pública da União

Deborah Duprat – Ministério Público Federal

Flávia Piovesan – Secretaria Especial de Direitos Humanos

Leonardo Pinho – Unisol Brasil

Sandra Carvalho – Justiça Global

Fonte: Ascom CNDH

Modelo agrícola alternativo corre o risco de ser controlado pelas multinacionais

A produção agrícola alternativa, que não utiliza agrotóxicos, nos próximos anos possivelmente também será controlada por um grupo de menos de cinco multinacionais que hoje dominam o mercado mundial de agrotóxicos e sementes transgênicas. Segundo Victor Pelaez Alvarez, empresas como Monsanto, DuPont, Syngenta, Dow e Bayer já estão investindo em herbicidas produzidos à base de insumos biológicos, e quando os órgãos reguladores passarem a barrar a venda de agrotóxicos, o atual “modelo agrícola vai simplesmente substituir os agrotóxicos por produtos de base biológica; é por isso que as empresas já se preparam para essa transição e, obviamente, vão continuar atuando nessa lógica de grande escala”, adverte o engenheiro. “O que hoje é um modelo alternativo de pequenos agricultores que usam ativos biológicos”, frisa, “em pouco tempo, será controlado pelas grandes empresas. Esse é o risco que está colocado”.

De acordo com Alvarez, além de atuarem no ramo de agrotóxico e deprodução de sementes transgênicas, essas empresas também estão atuando na área de agricultura de precisão, desenvolvendo tecnologias para “monitorar tanto o clima quanto o solo e desenvolver novas moléculas, adaptadas a mudanças climáticas específicas”.

Na entrevista a seguir, concedida à IHU On-Line por telefone, Alvarez também comenta a recente fusão entre a Bayer e a Monsanto. Ele afirma que o negócio faz parte de um processo que vem se acentuando desde os anos 1990, em que empresas maiores adquirem as menores, criando um oligopólio tanto no mercado de agrotóxicos quanto no de sementes transgênicas. Hoje, “a partir dessas movimentações”, as quatro maiores empresas que detêm 49% do mercado mundial de agrotóxicos passarão a controlar “74% do mercado”. Empresas como Monsanto, DuPont, Syngenta, Dow e Bayer, que controlam “46% do mercado de sementes, com essas fusões passarão a controlar 50% desse mercado, o que gera uma concentração tanto no mercado de agrotóxicos quanto no de sementes”, informa.

Victor Manoel Pelaez Alvarez é graduado em Engenharia de Alimentos, mestre em Política Científica e Tecnológica pela Universidade Estadual de Campinas e doutor em Ciências Econômicas pela Université de Montpellier I. Além de professor na Universidade Federal do Paraná, é membro do Conselho Editorial do International Journal of Biotechnology e da Revista Brasileira de Inovação.

Confira a entrevista.

IHU On-Line – Qual é o significado da fusão entre a Bayer e a Monsanto para as empresas e como essa fusão tende a reconfigurar o mercado mundial de sementes e agrotóxicos?

Victor Pelaez Alvarez – Esse processo de concentração de capitais já tem acontecido nos últimos anos, ou seja, aconteceu no final dos anos 90 e início dos anos 2000 e agora acontece novamente. No passado foram feitas aquisições por parte da Arysta, e a partir daí a DuPont e a Dow Chemical, que são respectivamente a quinta e sexta maiores empresas desse ramo de atividade, iniciaram uma fusão, e a Syngenta foi adquirida pela ChemChina. Se analisarmos os indicadores que os órgãos de defesa da concorrência fazem, vamos verificar que, antes dessas novas fusões, as quatro maiores empresas controlavam 49% do mercado mundial. O que deverá acontecer é que, a partir dessas movimentações, elas controlem 74% do mercado mundial. Então, há um crescimento significativo.

Além disso, as cinco maiores empresas de agrotóxicos – Monsanto, DuPont, Syngenta, Dow e Bayer -, que controlam 46% do mercado mundial de sementes, com essas fusões passarão a controlar 50% desse mercado, o que gera uma concentração tanto no mercado de agrotóxicos quanto no de sementes. Essas empresas atuam nesses dois campos porque eles são ativos complementares. A Monsanto foi a pioneira no ramo de sementes, ingressou no mercado porque desenvolveu uma semente resistente ao seu próprio herbicida, que é o glifosato, e a partir daí a empresa fez uma série de aquisições que a tornaram a líder no mercado de sementes. As demais empresas seguiram a mesma lógica de criar sementes resistentes.

Para você ter uma ideia, essas empresas adquiriram, desde 1996, quando foi lançada a semente transgênica nos EUA, até 2006, 133 empresas de sementes, 45 empresas de agrotóxicos e hoje elas estão num outro segmento de mercado, que são os biointensivos, ou seja, os agrotóxicos de base biológica e não de base química. Esses produtos estão sendo desenvolvidos para complementar o portfólio das empresas, dado que os custos de agrotóxicos químicos são muito elevados, principalmente em função do aumento das restrições dos órgãos reguladores nos países desenvolvidos. Isso faz com que os custos e os riscos de desenvolvimento sejam cada vez maiores, mas os mercados dos países desenvolvidos demandam cada vez mais produtos sem agrotóxicos ou com resíduos menores.

Elas também estão atuando no ramo de agricultura de precisão, que funciona a partir do uso massivo de dados, o Big Data, que serve para monitorar tanto o clima quanto o solo e desenvolver novas moléculas, adaptadas a mudanças climáticas específicas, ou seja, trata-se de uma área de fronteira. Essa diversificação de serviços faz com que as empresas tenham um portfólio de produtos que envolvam papéis tecnológicos, e isso cria uma rede muito grande. Para se ter uma ideia, nessas três áreas em que elas atuam, as seis maiores empresas adquiriram cerca de 200 empresas e fizeram cerca de 470 acordos com outras empresas. Esses acordos comerciais de transferência de tecnologia, ou de comercialização de uma empresa por outra, fazem com que haja uma rede intrincada de atuação em diferentes mercados que envolve desde o uso diferenciado de biopesticidas, agrotóxicos, sementes, desenvolvimento de tecnologia, e esse efeito de rede faz com que elas de fato controlem toda a produção de insumos para agricultura.

IHU On-Line – Por que o senhor afirma que essa fusão poderá ter implicações no sentido de agravar a insegurança alimentar no Brasil? Quais os impactos dessa fusão para os agricultores e consumidores?

Victor Pelaez Alvarez – Porque os custos de produção são cada vez maiores na medida em que essas empresas controlam os mercados de forma concentrada. Vou mencionar o exemplo publicado na revista da Embrapa, que trata justamente da elevação dos preços dos insumos e das commodities. É possível verificar que enquanto o valor da produção de soja é 100, 150%, o valor da semente aumentou o dobro disso, e no caso do algodão a situação é ainda mais dramática, porque o preço da semente aumentou quatro vezes mais que o valor da produção. Isso faz com que o custo de produção só possa ser sustentado por subsídios agrícolas e, portanto, essas empresas acabam sendo subsidiadas com dinheiro público. Esse é o modelo de produção agrícola instalado com a Revolução Verde, e que viabiliza a produção em grande escala para que o custo unitário seja menor. Então, obviamente que, em grande escala, o preço cai de modo significativo. Mas esse modelo agrícola foi implantado no contexto da Guerra Fria, onde estava em disputa uma ideologia de esquerda x direita, onde a direita colocou, a partir dos EUA, o capitalismo numa perspectiva de que poderia resolver a fome no mundo produzindo alimentos a baixo custo.

Mas falta uma variável nessa equação: a distribuição de renda. Se não há renda para adquirir os alimentos, por mais que o preço deles seja baixo, isso não será o suficiente para resolver o problema da fome. Esta questão que está em jogo: não basta reduzir custo de produção; é importante distribuir renda, mas esse modelo é concentrador de renda na medida em que poucos agricultores têm condições de produzir. É por isso que os agricultores acabam utilizando crédito agrícola para viabilizar esse modelo. Então, quanto mais há essa concentração, mais os custos se elevam; e o custo das sementes se elevou muito, porque os mercados são concentrados e as empresas fixam preços, desenvolvem tecnologias cada vez mais caras, e isso gera um impacto na renda do agricultor. Assim, para não onerar o consumidor final, volta-se à questão dos subsídios.

IHU On-Line – Hoje, como é possível romper com essa proposta da Revolução Verde?

 

Victor Pelaez Alvarez – A questão é repensar o modelo de produção. Quando esse modelo foi instituído, a rota alternativa, que seria hoje a chamada agroecologia, com o uso de insumos biológicos e não químicos, foi inibida. Ou seja, houve uma trajetória tecnológica baseada no uso intensivo de agrotóxicos porque, ao fazer sementes melhoradas, com determinadas características, elas perdiam resistência a algumas pragas, mas esse pacto tecnológico foi adotado com um custo elevado. Hoje, se resgata a ideia do insumo biológico como algo que tem um menor risco ambiental e um menor custo. Tudo isso está colocado e de fato há que se repensar sempre os modelos de monocultivo em grande escala, e esse é o desafio em termos de políticas públicas.

IHU On-Line – Quais são os impactos causados pelo uso dessas duas tecnologias?

Victor Pelaez Alvarez – O primeiro impacto é a perda de biodiversidade biológica. O uso da transgenia é uma iniciativa da Revolução Verde, de monocultivos produzidos em grande escala para reduzir os custos unitários de produção. O segundo impacto é que as sementes resistentes a herbicidas foram desenvolvidas justamente para se usar mais herbicidas, fazendo com que o uso continuado desses produtos gerasse uma resistência às plantas indesejadas, as chamadas ervas daninhas, e fazendo com que se usasse uma combinação de herbicidas altamente tóxicos, como o caso do 2,4D, que já estava no fim do seu ciclo de vida. Há um retrocesso tecnológico acontecendo nessa perspectiva, onde cada vez mais se utilizam e se combinam esses herbicidas.

O problema é justamente que o processo de avaliação de agrotóxicosavalia a toxicidade dos herbicidas com cada ingrediente ativo em separado, e não pela combinação deles, embora se saiba que esse uso combinado gera um efeito sinérgico, que tem um impacto ainda desconhecido tanto no ser humano quanto no meio ambiente. Os órgãos reguladores dos países desenvolvidos começaram a se preocupar com essa combinação de herbicidas, mas o Brasil ainda está longe de tratar essa questão.

No dia em que houver esse controle de forma sistemática, esse modelo agrícola vai simplesmente substituir os agrotóxicos por produtos de base biológica e é por isso que as empresas já se preparam para essa transição e, obviamente, vão continuar atuando nessa lógica de grande escala. O que hoje é um modelo alternativo de pequenos agricultores que usam ativos biológicos, em pouco tempo será controlado pelas grandes empresas. Esse é o risco que está colocado.

IHU On-Line – Então as empresas já estão investindo num modelo alternativo, mas esse não mudará a lógica da produção agrícola?

Victor Pelaez Alvarez – Exato. Trata-se de um oligopólio, em que poucas empresas controlam e concentram o mercado cada vez mais. O papel dos órgãos de concorrência é importante, mas mesmo aí há certas limitações, porque a capacidade que as empresas têm de exercer um poder de mercado vai além da questão de preço. As outras empresas ficam com pouca alternativa e pouco espaço de mercado para atuar. Mesmo que as grandes não imponham preços maiores, as pequenas ficam impossibilitadas de atuar em mercados que são extremamente marginais.

IHU On-Line – Como se dá a dinâmica do comércio internacional de agrotóxicos e qual é a participação do Brasil nesse comércio?

Victor Pelaez Alvarez – O Brasil, a partir de 2008, passou a ser o segundo líder no mercado mundial de agrotóxicos e o primeiro exportador mundial de agrotóxicos. Hoje, Brasil e EUA correspondem a quase metade do consumo mundial de agrotóxicos e são os primeiros exportadores de alimentos. O que faz o Brasil ser um grande importador de agrotóxicos é o fato de produzir as principais commodities agrícolas que mais usam agrotóxicos, como a soja, o milho, o algodão e o café. Então, o Brasil é destinatário desse modelo de produção em que, ao mesmo tempo, importa esses insumos da China e é o maior exportador de alimentos para a China. O comércio mundial de agrotóxicos é, portanto, um comércio intraempresas, porque são essas maiores empresas que têm subsidiárias em várias partes do mundo. Nesse contexto, França e Alemanha, portanto, são as maiores importadoras e exportadoras de agrotóxicos.

IHU On-Line – O que seria uma alternativa para romper com esse mercado?

Victor Pelaez Alvarez – As alternativas são variadas e aqui é possível incluir desde leis que consigam reduzir essa concentração de capitais, até leis que incentivem capitais de menor porte, com alternativas tecnológicas. Alguns argumentam que não é possível alimentar a população com produto orgânico por uma questão de escala, mas quando começou aRevolução Verde, ela também não era viável. Então, tudo depende de uma trajetória tecnológica e de uma continuidade de investimentos e de assistência técnica. Isso significa que precisamos de políticas de curto, médio e longo prazo para incentivar alternativas tecnológicas e isso está ligado não só à segurança alimentar, mas a uma questão de soberania.

No Brasil, nós temos uma grande empresa de referência na área de pesquisa, que é a Embrapa. O importante é como vai se utilizar esse saber para garantir a soberania nacional nesse processo, porque o fato de hoje o Brasil ser o segundo maior exportador de alimentos também tem a ver com a experiência da Embrapa.

Fonte: Brasil de Fato 

Degradação do meio ambiente na região do Matopiba preocupa especialistas

“Os Impactos do Plano de Desenvolvimento Agropecuário Matopiba na Segurança Alimentar e Nutricional das Populações Locais e a Política de SAN” foi tema da mesa de debates realizada pelo Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) nesta terça-feira (13) no auditório do anexo I, do Palácio do Planalto. O projeto traça um planejamento territorial estratégico de desenvolvimento para a região formada por partes dos estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia.

Em portaria publicada no Diário Oficial da União de 13 de novembro de 2015, foram selecionados 337 municípios: 139 são do Tocantins, 135 do Maranhão, 33 do Piauí e 30 da Bahia. De acordo com o Ministério da Agricultura, a região compreende 324 mil estabelecimentos agrícolas e cultiva grãos — soja, milho e arroz —, algodão e frutas, além de desenvolver a atividade pecuária. Na safra 2013/2014, o Matopiba produziu 8,7 milhões de toneladas de soja.

O chefe geral da Embrapa Pesca e Aquicultura de Palmas (TO), Carlos Magno, defendeu o projeto como uma forma de trazer grande desenvolvimento para a região e disse não concordar que o Matopiba causará impactos negativos. “Nós somos protagonistas em agricultura tropical. As pessoas estão vindo aprender conosco”, disse.

A posição da Embrapa foi refutada pelo conselheiro Carlos Eduardo Leite. Para ele, “muitas vezes o foco é econômico e a valorização das culturas locais é colocada em segundo plano”. “São essas populações que mantêm as culturas alimentares e a diversificação da alimentação no Brasil”, completou.

O procurador da República Gustavo Kenner Alcântara lembrou que tanto a Convenção n° 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) quanto a Constituição Federal garantem o direito a consulta prévia informada sobre mudanças que venham a afetar seu território. “Não basta saber que o agronegócio traz lucro porque talvez isso seja de menor importância para a comunidade que vai ser diretamente afetada. O lucro não necessariamente traz benefício pra ela que vai arcar com aquele prejuízo. Não há dúvidas de que o agronegócio traz problemas graves”, afirmou.

A região do Matopiba compreende 28 terras indígenas, 39 territórios quilombolas e 41 unidades de conservação ambiental. Os representantes das entidades civis presentes no debate demonstraram preocupação com o desmatamento, a contaminação causada pelos agrotóxicos, a concentração de riquezas e a dizimação da cultura local.

Fonte: Ascom/Consea

Contaminação por agrotóxicos tem afetado comunidades indígenas, diz antropóloga

O uso de agrotóxicos tem contaminado o solo e a água usada por comunidades indígenas em todo o país, segundo a antropóloga Lúcia Helena Rangel. A pesquisadora representou o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) na audiência pública, realizada hoje (29), que discutiu os perigos dos defensivos, organizada pela Defensoria Pública de São Paulo e A Defensoria Pública na União.

“Nós temos um registro constante de contaminação por agrotóxico em diversas áreas indígenas. Em alguns lugares do Brasil o problema é agudo”, ressaltou Lúcia Helena ao citar como exemplo o caso de três comunidades guarani-kaiowá no Mato Grosso do Sul. A situação dos grupos residentes nos municípios de Amambai, Aral Moreira e Paranhos foi denunciada no relatório O Direito Humano à Alimentação Adequada e à Nutrição do Povo Guarani e Kaiowá. O documento foi elaborado pelo Cimi em parceria com a Rede de Ação e Informação pelo Direito a se Alimentar.

“Os pedaços de terras que estas comunidades ocupam dentro de seus territórios tradicionais estão dominados por monoculturas das fazendas, cujo cultivo demanda o uso excessivo de agrotóxicos e de outros produtos que representam grave risco à sua saúde”, enfatiza o relatório lançado no último dia 16.

A antropóloga destacou, no entanto, que a situação das comunidades indígenas, inclusive em relação à contaminação por agrotóxicos, tem que ser entendida em um contexto de violações de direitos. “[As violências] vão desde a posse da terra, o direito ao território, até as questões mais suaves, que são o direito a uma religião, a rituais”, ressaltou.

O problema da contaminação por agrotóxicos se soma, de acordo com Lúcia Helena, à difusão de sementes transgênicas. “Aqui mesmo no estado de São Paulo, no Vale do Ribeira, as comunidade guarani reclamam disso. Porque passam os trens carregando milho e caem sementes. Assim como o milho transgênico dos Estados Unidos solapa a diversidade do milho mexicano”, exemplificou sobre o fenômeno em que as plantas modificadas geneticamente tendem a substituir as nativas quando são dispersada fora das áreas de cultivo.

Riscos

A professora da Universidade Federal de Santa Catarina, Sônia Corina Hess, apresentou dados que mostram os riscos dos principais agrotóxicos usados no Brasil. O herbicida glifosato, por exemplo, pode apresentar, segundo a especialista, efeitos tóxicos mesmo em pequenas concentrações.

De acordo com Sônia, experimentos feitos com ratos que beberam água contaminada por glifosato em uma quantidade muito menor do que a permitida pela legislação brasileira demonstrou diversos efeitos nocivos. “Todos desenvolveram tumores, tanto do sexo masculino quanto do sexo feminino, e alterações metabólicas muito intensas”, ressaltou.

Sobre o 2,4-D, outro herbicida usado na agricultura brasileira, Sônia lembrou que o produto foi desenvolvido a partir do Agente Laranja, desfolhante usado na Guerra do Vietnam. O defensivo ficou famoso por ser altamente cancerígeno e causar mal formação em fetos. Segundo a especialista, caso o produto não seja purificado adequadamente, o 2,4-D pode apresentar as mesmas substâncias tóxicas presentes no Agente Laranja.

Fonte: Daniel Mello – Repórter da Agência Brasil

Missão liderada pelo Consea visita Guaranis Kaiowás no Mato Grosso do Sul

Missão liderada pelo Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) iniciou nesta segunda-feira (29/08) uma visita de cinco dias às comunidades indígenas da etnia Guarani Kaiowá no Cone Sul do estado do Mato Grosso do Sul.

A missão segue até a sexta-feira (02/09) e tem como objetivos observar a realidade vivida pelos indígenas e ouvi-los sobre possíveis violações de direitos humanos, em especial sobre a segurança alimentar e nutricional e as questões relacionadas à terra.

Fazem parte da comitiva a presidenta do Consea, Maria Emília Pacheco, o conselheiro indígena Dourado Tapeba, as conselheiras Daniela Frozi e Mariza Rios (FIAN Brasil), a assessora técnica Mirlane Klimach, o representante do Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário (MDS), Milton Marques do Nascimento, e as indigenistas Viviane Matias e
Priscila Ribeiro, da Fundação Nacional do Índio (Funai).

O grupo foi recebido em Dourados (MS) pelo conselheiro Silvio Ortiz e Silvio Paulo, ambos indígenas, e pela presidenta do Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional do Mato Grosso do Sul (Consea-MS), Vânia Almeida, que vão acompanhar a missão nas visitas às comunidades.

Está prevista também a participação de representantes do Ministério Público Federal (MPF), da Funai Regional e da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) que atuam no estado. Além das visitas de campo, serão realizadas audiências específicas com Procuradores da República e com juízes federais que atuam na região.

O foco da missão é analisar a relação entre direitos territoriais e direito à alimentação adequada, observando aspectos em três dimensões: identidade, manifestações de insegurança alimentar e direitos territoriais.

Como tem sido o acesso dos indígenas a alimentos? Quais são os impactos de programas sociais? Como estão a qualidade, a quantidade e a regularidade da entrega de cestas de alimentos? Como os indígenas têm acesso à água? Estes são alguns dos pontos a serem observados pela delegação.

Concluída a viagem, os observadores vão elaborar um relatório que será encaminhado aos diversos órgãos públicos competentes, nos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, em âmbito federal, estadual e municipal.

Fonte: Ascom/Consea

Colabore

Dados Bancários :

Rede de Informação e Ação pelo Direito a se Alimentar – FIAN Brasil
C/C: 19.932-X
Ag. 3689-7
Banco do Brasil

Articulações

A atuação articulada com os movimentos e organizações sociais e organismos de responsabilidade é uma prerrogativa fundamental para a Seção Brasil, que possui caráter de REDE e busca fortalecer parcerias estratégicas com a sociedade civil e espaços institucionais, visando mobilizar ações conjuntas de forma a incidir direta ou indiretamente na promoção do acesso, efetivação e proposição de políticas públicas e na exigibilidade do DHANA.

Incidência

A atuação no âmbito da incidência visa acompanhar situações de violações ligadas ao DHANA, a partir de um processo de seguimento e sistematização de casos de violação do DHANA através da formulação de denúncias e da realização de ações de pressão junto aos órgãos competentes. Este processo parte da articulação com os sujeitos sociais locais com vistas à prevenção, garantia e efetividade do DHANA.

Brejo dos Crioulos

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O Território Quilombola de Brejo dos Crioulos localiza-se na região norte de Minas Gerais, entre os municípios de São João da Ponte, Varzelândia e Verdelândia, e possui cerca de 17.300 hectares. O território divide-se em oito comunidades, reunindo em torno de 500 famílias.

A principal luta de Brejo dos Crioulos é pela titularização do seu território. Após muitos anos demandando o Estado Brasileiro, as comunidades que integram o território conseguiram que o decreto de desapropriação fosse publicado em 2011. Atualmente o processo de titulação está na fase de desintrusão, em que são retirados os ocupantes não-quilombolas que se encontram na área. Tal processo tem ocorrido lentamente, de modo que resta cerca de 15% da área para desintrusão. Não obstante tal demora, a luta de Brejo dos Crioulos se tornou referência para os territórios quilombolas na região – muitos dos quais ainda sofrendo graves violações de direitos humanos.

A FIAN Brasil atua desde 2007 com o território quilombola de Brejo dos Crioulos. Avalia-se que o trabalho da FIAN Brasil possibilitou o empoderamento das comunidades que formam o território, que hoje ocupam a maior parte da área e produzem seus próprios alimentos, consolidando uma conquista real. A FIAN também tem atuado na incidência política em prol de Brejo dos Crioulos, com participações de liderança do território em audiências da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, por exemplo.

Primeira visita da FIAN Brasil em Brejo dos Crioulos. Arquivo FIAN Brasil
Primeira visita da FIAN Brasil em Brejo dos Crioulos. Arquivo FIAN Brasil

Atualmente, para além da luta pelo território, o outro grande fator de violação dos direitos humanos de Brejo dos Crioulos é a ausência ou ineficiência de políticas públicas voltadas ao território, em especial as de produção agrícola, saúde e educação. Neste sentido, a FIAN Brasil tem atuado com o intuito de exigir do Estado Brasileiro a realização de políticas públicas que plenamente efetivem os direitos humanos correlatos a tais políticas, em especial o Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas (DHANA).