Na última quinta-feira (15), a FIAN Brasil encaminhou petição ao Ministério Público Federal (MPF) e à Defensoria Pública da União (DPU) em que solicita providências urgentes quanto ao cumprimento das obrigações do Estado brasileiro para com o povo indígena Yanomami, que enfrenta o aumento da desnutrição e da fome na maior reserva indígena brasileira, situada na Floresta Amazônica. São aproximadamente 30 mil indígenas e 300 comunidades na região.
A petição, assinada pela secretária-geral da FIAN Brasil, Valéria Burity, e pelos assessores de direitos humanos Adelar Cupsinski e Nayara Côrtes, alerta que informações da Hutukara Associação Yanomami e do Conselho Distrital de Saúde Indígena (Condisi) do Distrito Sanitário Especial Yanomami e Ye’kuana (Dsei-Y), e que estão no noticiário, evidenciam “um quadro inaceitável de intenso sofrimento destas comunidades”, em situação de desnutrição (e de outras doenças desenvolvidas/agravadas a partir dela), mortalidade infantil, contaminação dos alimentos e das pessoas por metais pesados em razão da mineração, e total falta de proteção ao território e as formas de sobrevivência e de alimentação tradicional. O documento também registra a inadequação dos serviços públicos de atendimento aos povos indígenas.
A partir de ampla fundamentação jurídica, base e marcos legais, e de um arcabouço normativo nacional e internacional relacionado à promoção e proteção do Dhana – Constituição Federal de 1988, Declaração Universal dos Direitos Humanos, Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), Lei 11.346/2006, Comentário Geral 12/1999, Diretrizes Voluntárias 2004, dentre outros mecanismos –, e da observação dos aspectos que fundamentam a realização do direito à alimentação (disponibilidade, acessibilidade, adequação e sustentabilidade), a FIAN Brasil apresenta apontamentos sobre em quais aspectos o Dhana da comunidade Yanomami tem sido violado.
O documento também faz uma abordagem sobre a relação entre o acesso ao território ancestral e a realização do direito à alimentação dessas populações indígenas, “pois é através da terra, considerada sagrada, que estes povos garantem sua subsistência. Considerando a interdependência e indivisibilidade dos direitos humanos, o grave estado de insegurança alimentar e nutricional enfrentado por estas comunidades Yanomami pode estar associado à falta de proteção real ao seu território tradicional”.
Reivindicações
A petição pede ao MPF e à DPU o retorno sobre três pontos. No primeiro deles, solicita informações sobre possíveis ações já adotadas no enfrentamento da situação descrita, incluindo aspectos relacionados à garantia da proteção ao território e ao direito à alimentação.
Solicita a adoção de medidas e exigências junto ao Poder Executivo, capazes de efetivar a “apuração e a superação do quadro de violações de direitos como garantia de proteção ao território, às formas tradicionais de acesso aos alimentos e ações emergenciais para enfrentamento da desnutrição do Povo Yanomami”, levando em conta os ritos e a alimentação tradicional local.
Por fim, o documento exige das autoridades competentes a realização de uma agenda de estudos profissionais das diferentes áreas atuantes no tema (nutrição, antropologia, saúde, entre outras), “sobre os fatores multicausais da situação de fome e outras formas de má nutrição do povo Yanomami com propostas de soluções de curto, médio e longo prazo”. A petição recomenda que estes estudos abordem uma metodologia que atenda a diversidade da situação de saúde e de insegurança alimentar e nutricional dos Yanomami.
Outras manifestações
Durante a II Plenária da Área de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional e do Direito Humano à Alimentação, também na quinta (15), a coordenadora do Observatório de Políticas de Segurança Alimentar e Nutrição da Universidade de Brasília (Opsan/UnB) e ex-presidente do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), Elisabetta Recine, apresentou um alerta sobre a situação “absurdamente desesperadora e terrível que o povo Yanomami está vivendo”, ao falar sobre o enfrentamento ao racismo institucional e seus efeitos na vida de povos indígenas, populações negras e demais povos e comunidades tradicionais no campo da soberania e segurança alimentar.
“A questão do enfrentamento de todo o nível de violência contra o povo Yanomami é absolutamente urgente. Dentre todas as urgências ligadas aos povos originários, talvez o povo Yanomami seja o povo que precise neste momento de uma atenção principal e prioritária”, disse Recine.
Relatório anual do Cimi, publicado em agosto deste ano, retrata agravamento das violências contra os povos indígenas no Brasil, com ataques a direitos e desmonte dos órgãos de fiscalização e assistência.
Sobre nós
A FIAN Brasil é a seção brasileira da FIAN Internacional, organização não governamental de direitos humanos que trabalha há 30 anos pela realização do direito humano à alimentação e à nutrição adequadas (Dhana). No Brasil, acompanha, desde 2000, situações de violações ao Dhana que afetam povos indígenas e outras comunidades tradicionais, além de outros grupos em situação de vulnerabilidade.
FIAN Brasil
Foto: Carsten ten Brink. Disponível em flickr.com