Quadrinhos mostram o controle das grandes empresas sobre o nosso alimento, das sementes ao prato

Uma parceria entre a FIAN Internacional e os irmãos artistas Zago Brothers desenvolveu os quadrinhos A Captura Corporativa de Sistemas Alimentares.

A publicação ganhou versão em português por iniciativa da FIAN Brasil – Organização pelo Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas e do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), no intuito de fortalecer o debate sobre o tema no nosso país. 

Originalmente produzido em inglês para série da ESCR-Net, o material detalha como as grandes empresas do agronegócio, de finanças, de tecnologia e de alimentos usam seus recursos para ditar a lógica de produção e oferta de comida e produtos alimentícios. Também ilustra, de forma artística e intuitiva, os impactos negativos na saúde das pessoas e do planeta.

Os sistemas alimentares, que representam tudo aquilo que tem relação com a produção, distribuição, oferta e consumo de alimentos, estão cada vez mais sob o controle de um pequeno número de empresas poderosas. O controle corporativo sobre o que comemos e cultivamos prejudica o direito humano à alimentação e à nutrição adequadas (Dhana), causando fome, obesidade e impactos ambientais que colaboram para as mudanças climáticas. A transformação radical desses sistemas é mais urgente do que nunca.

A Captura Corporativa de Sistemas de Alimentos foi lançado durante o evento de estreia do documentário Big Food: O Poder das Indústrias de Ultraprocessados, que também denuncia a influência das grandes corporações na saúde pública.

“Se antes eram os países mais ricos que dominavam os sistemas alimentares, hoje são as grandes corporações que exercem esse domínio, o que tem gerado graves violações de direitos, em todo o mundo”, destaca a secretária-geral da FIAN Brasil, Valéria Burity.

Para Janine Coutinho, coordenadora do Programa de Alimentação Saudável e Sustentável do Idec, a iniciativa é uma importante ação para comunicar de maneira didática as complexas relações entre empresas, governos e nossa alimentação. “Precisamos promover de maneira urgente uma transição para sistemas alimentares focados nos direitos humanos, e não nos interesses das empresas de aumentarem seus lucros. Só assim poderemos combater as crises globais de fome, obesidade e mudanças climáticas”, defende ela.

Acesse a íntegra da história em quadrinhos A Captura Corporativa de Sistemas Alimentares.

A Captura Corporativa de Sistemas Alimentares

História em quadrinhos (HQ) originalmente produzida em parceria entre a FIAN Internacional e os irmãos artistas Zago Brothers. Ganhou versão em português por iniciativa da FIAN Brasil e do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec).

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A HQ detalha como as grandes empresas do agronegócio, de finanças, de tecnologia e de alimentos usam seus recursos para ditar a lógica de produção e oferta de comida e produtos alimentícios. Também ilustra, de forma artística e intuitiva, os impactos negativos na saúde das pessoas e do planeta. Saiba mais.

Podcast aborda o direito à alimentação com base jurídica e formato lúdico

A FIAN Brasil e O Direito Achado na Rua acabam de lançar o podcast O Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas: enunciados jurídicos. Em dez episódios, o programa destrincha o livro lançado pelas duas organizações em abril. Está disponível nas plataformas Spotify, Anchor e YouTube.

Participam da primeira gravação três dos organizadores/as do livro: Valéria Burity, José Geraldo de Sousa Junior e Antonio Escrivão Filho (a quarta é Roberta Amanajás Monteiro), além do autor do prefácio, Carlos Marés. As entrevistas apresentam brevemente os temas, interlocutores/as e entrevistados/as dos nove episódios seguintes, apontando também reflexões que serão desenvolvidas ao longo da série.

“O podcast reúne de uma forma lúdica, artística e didática o debate sobre os grandes temas que impactam a relação entre o direito à alimentação e o sistema de justiça no Brasil e no ambiente internacional”, descreve Escrivão Filho. “Tem como ponto de partir as falas de especialistas de diversos campos, como a militância em movimentos sociais, a advocacia popular, o ativismo em direitos humanos e a academia.”

São abordadas questões como: o que o direito a se alimentar e se nutrir adequadamente tem a ver com as retomadas indígenas, a educação quilombola, a agroecologia e a luta sem-terra; como é tratado na nossa Constituição e nos pactos internacionais dos quais o Brasil faz parte; e como tem sido aplicado na prática.

“Os enunciados expressam a forma como movimentos sociais compreendem o direito e como as normas podem ser aplicadas para a garantia efetiva do direito humano à alimentação e à nutrição adequadas”, comenta Burity. “É forma de incidirmos sobre o Judiciário e agirmos pela democratização do acesso à justiça.”

O podcast tem roteiro, direção e montagem de Marco Escrivão, com locução de João Victor Coura e Priscila Schmidt. Coura também assina a trilha original, o desenho de som e mixagem, e divide as gravações com Alexandre Scarpelli. O programa é produzido por Kaburé Filmes e Estúdio Pongá.

Conceituação e teses jurídicas

Resultado de intensa agenda de discussão, o livro de 196 páginas é uma obra coletiva voltada para a proteção e efetivação desse direito individual e social, conhecido pela sigla Dhana, indispensável à dignidade humana e à própria vida.

A publicação divide-se em duas partes. A primeira apresenta os principais conceitos envolvidos e os contextualiza no Brasil e no mundo, com abordagens sobre o Dhana e o sistema de justiça, ao passo que a segunda traz os enunciados, teses jurídicas utilizadas na defesa e promoção desse direito. Cada um corresponde a um capítulo e aborda um assunto específico.

Livro jurídico liga os pontos entre lutas sociais, sustentabilidade, o direito à alimentação e o sistema de justiça

O que o direito a se alimentar e se nutrir adequadamente tem a ver com as retomadas indígenas, a educação quilombola, a agroecologia e a luta sem-terra? Como é tratado na nossa Constituição e nos pactos internacionais dos quais o Brasil faz parte, como tem sido aplicado na prática e como isso poderia ser diferente?

Esses são alguns dos pontos abordados no livro O Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas: Enunciados Jurídicos, iniciativa da FIAN Brasil e de O Direito Achado na Rua.

Com prefácio de Carlos Marés e artigo de Boaventura de Sousa Santos sobre o sistema judicial, a publicação de 196 páginas é uma obra coletiva voltada para a proteção e efetivação desse direito individual e social, conhecido pela sigla Dhana, indispensável à dignidade humana e à própria vida. A coletânea é organizada por Valéria Torres Amaral Burity, Antonio Escrivão Filho, Roberta Amanajás Monteiro e José Geraldo de Sousa Junior.

“Temos um conjunto de normas que dispõe sobre o Dhana no Brasil, o que nos falta é que as pessoas que aplicam o direito se posicionem de maneira efetiva pela sua realização”, diz Burity. “Este trabalho traz a visão de movimentos e de pessoas que pesquisam e advogam neste campo sobre como o direito à alimentação pode ser garantido. É, portanto, um instrumento para potencializar lutas sociais.” 

“Queremos que o livro chegue aos advogados/as, procuradores/as, defensores/as, juízes/as, juristas, professores/as e estudantes do nosso campo de conhecimento”, diz Escrivão Filho. 

A FIAN pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) para se manifestar em arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF) para que o governo federal adote medidas emergenciais de combate à insegurança alimentar.

Rigor e linguagem simples

O Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas divide-se em duas partes. A primeira apresenta os principais conceitos envolvidos e os contextualiza no Brasil e no mundo, com abordagens sobre o Dhana e o sistema de justiça, ao passo que a segunda traz os enunciados, teses jurídicas utilizadas na defesa  e promoção desse direito. Cada um corresponde a um capítulo e aborda um assunto específico. 

Para dar maior alcance e mais efetividade ao conteúdo, as autoras e autores – advogadas e advogados que atuam junto aos movimentos sociais no tema – buscaram uma linguagem simples e direta, longe do dito “juridiquês”, sem descuidar do rigor técnico da defesa.

A compilação baseia-se numa intensa agenda de discussão a partir das experiências e concepções de movimentos, entidades de direitos humanos e advocacia popular, juristas e intelectuais.

Participam, como autoras e autores: Valéria Torres Amaral Burity, Roberta Amanajás Monteiro, Antonio Escrivão Filho, José Geraldo de Sousa Junior, Carlos Marés, Boaventura de Sousa Santos, Raquel Z. Yrigoyen-Fajardo, Renata Carolina Corrêa Vieira, Olivier De Schutter, Felipe Bley Folly, Luiz Eloy Terena, Gladstone Leonel Júnior, Rafael Modesto, Naiara Andreoli Bittencourt, Eduarda Aparecida Domingues, Givânia Silva, Vercilene Francisco Dias, Camila Cecilina Martins, Joice Silva Bonfim, Carlos Eduardo Lemos Chaves, Larissa Ambrosano Packer, Leticia Santos Souza, Diego Vedovatto, Edgar Menezes Mota, Euzamara de Carvalho e Victória Lourenço de C. e Gonçalves.Confira o debate de lançamento, em 30 de abril, e leia artigo do co-organizador José Geraldo de Sousa Junior sobre o livro.

Foto: Humberto Góes

Cozinhando Agendas Políticas – Guia Feminista Sobre o Direito à Alimentação e à Nutrição das Mulheres Rurais

Cozinhando Agendas Políticas – Guia Feminista Sobre o Direito à Alimentação e à Nutrição das Mulheres Rurais oferece a essas mulheres – pertencentes ou não a organizações locais ou nacionais – orientações práticas para a construção coletiva de estratégias e ações transformadoras com ênfase nesse direito fundamental, conhecido pela sigla Dhana, com base nas recentes normas internacionais de direitos humanos.

Ao tomar a experiência de vida e os conhecimentos das participantes (denominadas “cozinheiras”) como ponto de partida, as atividades permitem a adaptação por diferentes grupos para tratar de suas necessidades e prioridades em resposta a sua própria realidade.

É a versão em português de uma publicação coordenada pela FIAN Internacional que resultou do trabalho coletivo entre Via Campesina, FIAN México, FIAN Colômbia, FIAN Honduras, Comitê Latino-Americano e Caribenho para a Defesa dos Direitos da Mulher, Clínica de Direitos Humanos da Faculdade de Direito da Universidade de Miami, Universidade Nacional Autônoma do México, Coordenadora Nacional de Mulheres Indígenas (Conami), Cooperativas de Produtoras da Esperança da Grande Costa de Guerrero, Centro de Capacitação em Ecologia e Saúde de Chiapas e Rede Global pelo Direito à Alimentação e à Nutrição. A tradução e a adaptação contaram com apoio da Agência Suíça para o Desenvolvimento e a Cooperação (SDC), Pão Para o Mundo (PPM) e Misereor.

Saiba mais aqui.

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Relatório de Monitoramento do Direito à Alimentação e à Nutrição Durante a Covid-19 – junho/2020

Informe sobre os impactos da pandemia do novo coronavírus na segurança alimentar das populações de todos os continentes. Acesse aqui, em PDF.

Originalmente publicado em inglês com o título Monitoring Report on the Right to Food and Nutrition during covid-19 – june 2020, foi traduzido pela FIAN Brasil com apoio de Flavio Valente.

Comunidade quilombola de Lagedo (MG). Foto: Delmo Roncarati Vilela/UFMG

MPF cobra apoio federal a povos e comunidades tradicionais durante pandemia

O governo federal deve adotar, nos próximos dias, medidas para garantir a assistência e promoção de serviços essenciais aos povos indígenas e povos e comunidades tradicionais do Brasil no contexto da pandemia da Covid-19. O Ministério Público Federal (MPF) oficializou recomendação nesse sentido, com prazo de dez dias, na última quarta-feira (6).

Na recomendação, a Câmara de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais (6ª Câmara – 6CCR) cobra a disponibilização de recursos financeiros, humanos e materiais, além da adoção de medidas e políticas públicas que zelem pela saúde e estabilidade socioeconômica desses povos. O descumprimento sujeitaria os órgãos federais a medidas administrativas e judiciais.

“Esses povos e comunidades enfrentam intensa pressão desde a colonização. O cenário de violações de direitos ao longo de toda nossa história, por conta tanto de ações como de omissões, vem se agravando muito no governo Bolsonaro, com falas que afrontam a dignidade e até a existência desses povos”, ressalta a secretária-geral da FIAN Brasil, Valéria Burity. “Com isso combinado aos modos de vida comunitários e às particularidades imunológicas dessas populações, a Covid-19 pode causar muitas mortes e sofrimento se o poder público não mudar seu patamar de atenção ao problema com toda urgência.” 

A 6CCR afirma que, em razão da histórica ineficiência do poder público, as comunidades “possuem precárias estruturas de água, energia elétrica, saneamento básico e outros serviços públicos essenciais”.

Além dos ministérios da Cidadania, dos Direitos Humanos e da Agricultura, o documento foi enviado à Caixa Econômica Federal, à Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), à Fundação Cultural Palmares, ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e ao Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).

Na avaliação do MPF, o atual cenário exige ações emergenciais coordenadas e integradas dos órgãos e entes públicos, “sobretudo na prevenção da disseminação da doença, mas também na garantia do pleno atendimento e na tomada de medidas preventivas de contaminação”. Por isso, a 6CCR recomenda o apoio dos órgãos no desenvolvimento de metodologias que garantam o acesso à educação, o fortalecimento das unidades de saúde dentro dos territórios, além da adoção de estratégias diferenciadas para que as comunidades tenham acesso ao cadastramento e utilização do auxílio emergencial do governo.

O MPF pede, ainda, o controle sanitário das pessoas que ingressem nos territórios étnicos; ampliação da política de distribuição de cestas básicas; andamento aos processos de reconhecimento, identificação, delimitação e titulação dos territórios; distribuição de kits de higiene; e ampla propaganda de conscientização dos riscos de contaminação da doença, entre outras medidas.

Leia a recomendação e confira recomendações endereçadas a governos estaduais e prefeituras para assistência a regiões, terras indígenas e comunidades específicas.

Articulação

A articulação com a 6ª Câmara de Coordenação e Revisão (6ª CCR)  do Ministério Público Federal foi uma iniciativa da Rede de Povos e Comunidades Tradicionais do Brasil apoiada pela FIAN Brasil. “Representantes dos PCTs puderam apresentar suas demandas, e o MPF comprometeu-se a enviar recomendações aos órgãos responsáveis e a acompanhar os desdobramentos”, relata o assessor de Direitos Humanos Paulo Asafe, que participou das tratativas junto com Valéria Burity.

A FIAN também se reuniu, em 28 de abril, com o Conselho Nacional de Povos e Comunidades Tradicionais (CNPCT) e organizações parceiras (Rede Cerrado, Terra de Direitos e Instituto Sociedade, População e Natureza – ISPN) a fim de elaborar estratégias para melhorar a comunicação dos PCTs. “A prioridade imediata é o enfrentamento da Covid-19, mas a iniciativa não se restringe a ela. As lideranças enfatizam a importância de aumentar o fluxo de informações dentro e fora dos territórios durante e depois da pandemia”, explica Asafe.

Foto: Comunidade quilombola de Lagedo (MG). Crédito: Delmo Roncarati Vilela/UFMG

Foto: Andressa Zumpano

Relatório da CPT mostra ofensiva ainda mais intensa contra indígenas e relação de conflitos com terra e água, destaca FIAN

A Comissão Pastoral da Terra (CPT) lançou, na última sexta-feira (17), o relatório Conflitos no Campo Brasil 2019.

A 34ª edição mostra que a violência no campo aumentou em relação a 2018. O número de assassinatos cresceu 14% (de 28 para 32). As tentativas de assassinato passaram de 28 para 30 (crescimento de 7%) e as ameaças de morte subiram de 165 para 201 (mais 22%).

“A publicação registra o número mais elevado de conflitos no campo dos últimos cinco anos e como se agrava a ofensiva contra os direitos dos povos indígenas no Brasil”, alerta a secretária-geral da FIAN Brasil, Valéria Burity. “Todos esses dados nos deixam ainda mais alertas, porque são gravíssimos.”

As sete lideranças indígenas assassinadas em conflitos no campo representam o número mais elevado dos últimos 11 anos, de acordo com o Centro de Documentação Dom Tomás Balduino, da CPT. Outros dois indígenas foram mortos em 2019.

Valéria lembra a estreita relação de parte desses conflitos com sistemas alimentares e a disputa por água e terra que esses sistemas geram. Oitenta e quatro por cento dos assassinatos registrados ocorreram na região amazônica. Os conflitos pela água registraram um salto de 77% em relação aos 276 do ano passado – número que representavam o recorde até então.

“Além disso, vivemos graves retrocessos de garantia de direitos no Brasil, o que inclui o direito à alimentação, e a FIAN vem denunciado como violência e criminalização são instrumentos de contenção das lutas sociais”, acrescenta a representante da entidade.

A publicação abrange os primeiros 12 meses do governo de Jair Bolsonaro (sem partido), período em que ocorreu também o crime socioambiental da Vale em Brumadinho (MG).

A CPT destaca como grandes empresas têm provocado graves violações de direitos humanos. “Apesar disso, crimes como os que ocorreram em Mariana e Brumadinho nos mostram como estas empresas restam impunes”, critica Valéria Burity.

Conflitos no Campo Brasil 2019 relaciona, ainda, a violência constatada com ações e omissões que se deram no primeiro ano do governo Bolsonaro, a exemplo da transferência para o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) da responsabilidade pelo processo de demarcação de terras indígenas, que antes era da Fundação Nacional do Índio (Funai).

O relatório capta o contraste entre as ocupações/retomadas e acampamentos, em quantidade reduzida, e as ações de protesto e reivindicação, que totalizaram 1.301, soma recorde para uma década de série histórica. Para a Pastoral, isso traduz não o arrefecimento da luta das comunidades e movimentos sociais do campo, e sim uma tentativa de manter a resistência diante de um cenário fortemente adverso, “marcado pela total paralisação da política de Reforma Agrária e, mais grave, pela classificação institucional – de forma destacada nas palavras do presidente da República – dos  movimentos sociais do campo como ‘criminosos’, ‘terroristas’ e ‘inimigos do Estado’”.

Foto (extraída da capa da publicação): Andressa Zumpano

Crianças Wichí em Las Lomitas, Salta

Corte interamericana responsabiliza Argentina por descumprimento de direitos de indígenas

“A Argentina é responsável internacionalmente pela violação dos direitos à propriedade comunitária indígena, à identidade cultural, ao meio ambiente saudável, ao alimento e à água”, decidiu a Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH) em caso que trata da situação de cinco povos originários na província de Salta, na fronteira com o Paraguai e a Bolívia. A decisão ordenou diversas medidas de reparação e restituição.

Segundo a Corte, é a primeira vez em que se analisam esses direitos num caso contencioso a partir do artigo 26 da Convenção Americana. Leia o comunicado de imprensa da Corte IDH:

San José, Costa Rica, 2 de abril de 2020 – Na decisão do caso “Comunidades indígenas membros da Associação Lhaka Honhat (nossa terra) versus Argentina” notificada hoje, a Corte Interamericana de Direitos Humanos  [Corte IDH] considerou o Estado da Argentina internacionalmente responsável pela violação dos direitos a propriedade comunitária, identidade cultural, ambiente saudável, comida e água adequadas para as comunidades indígenas.

Pela primeira vez em um caso contencioso, a Corte analisou os direitos a um meio ambiente saudável, alimentação adequada, água e identidade cultural de forma autônoma a partir do artigo 26 da Convenção Americana, ordenando medidas específicas de reparação da restituição desses direitos, inclusive ações de acesso a água e alimentos, recuperação de recursos florestais e recuperação da cultura indígena. O caso está relacionado ao pedido de reconhecimento da propriedade de suas terras pelas comunidades indígenas pertencentes aos povos Wichí (Mataco), Iyjwaja (Chorote), Komlek (Toba), Niwackle (Chulupí) e Tapy’y (Tapiete) na província de Salta (na fronteira com o Paraguai e a Bolívia).

Essas terras também foram ocupadas por outros moradores e uma ponte internacional foi construída sem consulta prévia do Estado. A presença indígena tem sido consistentemente encontrada na área, pelo menos desde 1629. Em seu julgamento, a Corte determinou que o Estado violava o direito à propriedade da comunidade, não fornecendo segurança jurídica e permitindo que fosse mantida a presença de colonos “crioulos”, não indígenas, no território. Isso apesar de a reivindicação de propriedade indígena ter mais de 28 anos. Concluiu também que a Argentina não possui regulamentos adequados para garantir suficientemente o direito de propriedade da comunidade.

O tribunal observou que não foram seguidos mecanismos adequados para consultar as comunidades indígenas em uma ponte internacional construída em seu território. Resolveu também que as autoridades judiciais não seguiram um período de tempo razoável no processamento de um caso judicial no qual foi decidido anular regras relativas a concessões fracionárias de terras.

A Corte também determinou que o Estado violava os direitos à identidade cultural, a um ambiente saudável, a alimentos e água adequados, devido à falta de eficácia das medidas estatais para interromper as atividades que lhes eram prejudiciais. Em seu julgamento, o tribunal entendeu que a exploração ilegal de madeira, bem como outras atividades realizadas no território pela população crioula, especificamente pecuária e cercamentos com arame, afetaram os ativos ambientais, impactando as comunidades indígenas em sua maneira tradicional de se alimentar e seu acesso à água. Isso alterou o modo de vida indígena, prejudicando sua identidade cultural. A Corte ordenou que o Estado adotasse várias medidas de reparação. Acesse, em espanhol, o comunicado de imprensa, com links para o resumo oficial e o texto completo da sentença.

“É desumano o que estão fazendo com a gente” diz Elizeu Guarani e Kaiowá sobre a suspensão do envio de cestas básicas para áreas de retomada no MS

Com a suspensão da entrega de cestas alimentares de responsabilidade do Estado brasileiro, se agravou desde o final de 2019, a situação de violação do direito humano à alimentação e à nutrição adequadas a comunidades Guarani e Kaiowá, no Mato Grosso do Sul.

As cestas têm distribuição realizada pela Companhia Nacional de Abastecimento (CONAB) e entrega pela Fundação Nacional do Índio (FUNAI). Por meio de despacho, a Funai suspendeu o envio de técnicos da Funai em Terras Indígenas não homologadas e “não regularizadas”.

No intuito que tal situação fosse resolvida, a Fian Brasil, Fian Internacional e Conselho Indigenista Missionário (CIMI) enviaram denúncias aos órgãos dos sistemas internacionais de proteção de direitos humanos sobre a suspensão.

Embora as cestas de alimentos sejam distribuídas pela Conab, é necessário que indigenistas acompanhem a entrega por várias questões, entre elas por conhecimento das áreas. “Além da entrega de cestas de alimentos, o impedimento de deslocamento de servidores da Funai às Terras Indígenas não homologadas e regularizadas impede a realização de outras atividades fundamentais do órgão, como a verificação da situação das áreas de retomada, atuações de monitoramento territorial, acolhimento de denúncias e acompanhamento de processos acerca de violações de direitos de crianças e mulheres dentre outras atividades de assistência e acompanhamento dos povos indígenas”, aponta trecho do documento elaborado pelas organizações.

“Desde o processo eleitoral o presidente Jair Bolsonaro tem tido uma fala muito dura contra movimentos sociais e povos indígenas e durante seu mandato esse discurso ganha uma perspectiva de ação. O último ato do Governo Bolsonaro de considerar indígenas, que estão lutando pelo seu território e que ocupam seus territórios tradicionais, como invasores e a partir daí impedir que serviços públicos acessem essa população é muito grave, pois reforça o quadro de violação de direitos que afeta os povos indígenas, especialmente alguns destes povos, como é o caso dos Guarani e Kaiowá”, destaca a secretária geral da Fian Brasil, Valéria Burity.

Sobre a demarcação de Terras Indígenas, Burity argumenta que desde a promulgação da Constituição da República, estas deveriam ter sido demarcadas em um prazo de cinco anos. Ou seja, “estamos então com um atraso de mais de 27 anos no dever do Estado de garantir os territórios indígenas”. No caso específico de Mato Grosso do Sul, em 2007 o Ministério Público Federal firmou um Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta com a Fundação Nacional do Índio (Funai) para que em um prazo de dois anos os povos Guarani e Kaiowá tivessem garantido seus territórios. “Nem a Constituição foi respeitada, nem o TAC foi respeitado e essa omissão do Estado brasileiro viola direitos e põe em risco a vida dos povos indígenas”.

Além da Constituição Federal, a medida de suspensão de cestas básicas do Governo Federal viola também tratados internacionais da qual o Brasil é signatário, entre os quais o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos Sociais e Culturais (Pidesc), Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (Pidcp), Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho.

Insegurança alimentar

A situação de (in)segurança alimentar e nutricional dos povos Guarani e Kaiowá é acompanhada pela Fian Brasil e Internacional desde 2005 quando chegaram as primeiras denúncias sobre mortes de crianças indígenas por desnutrição. Em 2016, a Fian Brasil publicou pesquisa socioeconômica e nutricional em três comunidades emblemáticas dos Guarani e Kaiowá- Guaiviry, Ypo’i e Kurusu Ambá. Os resultados demonstraram o gravíssimo quadro de violação ao direito humano à alimentação e à nutrição adequadas.

Nas três comunidades, 100% dos domicílios onde residiam crianças e jovens que ainda dependiam da família para sua alimentação encontravam-se em algum grau de insegurança alimentar e nutricional, no momento da pesquisa.

Acesse a publicação completa AQUI!

“É um absurdo o que o Governo vem fazendo com a gente, ao invés de resolver o problema, principalmente de regularização do nosso território, estão com essa ameaça de despejo, cortando cestas básicas, assistência social, cortando tudo. É desumano o que estão fazendo com a gente, porque precisamos nos alimentar, precisamos e dependemos da terra, precisamos nos alimentar para sobreviver”, destaca Elizeu Guarani e Kaiowá, membro da Aty Guasu – Grande Assembleia Guarani e Kaiowá.

Entrega de cestas

No dia 17 de fevereiro a Funai, junto com a Conab voltaram a distribuir as cestas básicas. De acordo com o site institucional da Fundação, foram entregues 217 cestas para 170 famílias nos seguintes municípios Rio Brilhante, Maracaju, Jardim, Guia Lopes da Laguna e na área rural de Douradina.

Foto destaque: Acervo Funai