Racismo é um dos fatores de insegurança alimentar da comunidade de Brejo dos Crioulos, aponta Diagnóstico

“A gente tem muita dificuldade na educação, os jovens terminam o Ensino Médio e depois não tem mais o que fazer, a gente queria estudar, fazer cursos, mas não tem condição. Tem jovens na comunidade que não conseguem ligar um computador e por que isso acontece? Porque eles não têm acesso e precisam conquistar isso também”.

O depoimento é da jovem Joana Dark Rodrigues, 20 anos, da comunidade de Brejo dos Crioulos, que falou sobre as dificuldades de acesso à saúde, educação dos jovens quilombolas durante o debate de lançamento da publicação Diagnóstico de violações de direitos e situação de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional em Brejo dos Crioulos, realizada no dia 9 de junho, em Brasília.

Brejo dos Crioulos é um caso emblemático da luta das comunidades quilombolas no país. O Estado brasileiro reconheceu a comunidade como quilombola em 2003 e o Decreto de desapropriação das terras da comunidade foi emitido em 2011. A comunidade iniciou, por conta própria, o processo de retomada em meados de 2004. “Os fazendeiros se uniram, nós éramos minoria, mas também fomos engrossando com os companheiros. Nós conseguimos o território, mas queremos produzir a alimentação, não temos postos de saúde, não temos estrada boa, e aí como vamos fazer?”, questionou José Carlos de Oliveira, mais conhecido como Véio, 56 anos, da comunidade de Brejo dos Crioulos, onde vivem cerca de 400 famílias.

A elaboração do Diagnóstico iniciou em janeiro deste ano e é fruto de uma análise antropológica que baseia uma avaliação das principais violações de direitos humanos sofridas pela comunidade. Entre as principais observações da publicação para a situação de insegurança alimentar da comunidade destacam-se a seca, falta de empregos, não conclusão da desintrusão da terra, pouco ou nenhum impacto de políticas públicas para prover Direitos Humanos, cortes no Programa Bolsa Família, entre outros fatores.

A Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) da comunidade, foi observada a partir de três situações: segurança, insegurança leve e insegurança grave. “A segurança alimentar foi observada em uma minoria das famílias as quais têm algum tipo de renda vindo da aposentadoria, Programa Bolsa Família ou do trabalho remunerado. A insegurança alimentar leve e moderada referem-se àquelas famílias as quais têm a preocupação com a falta iminente de alimentos, situação da maioria das famílias da comunidade devido ao conjunto dos fatores apresentados pelo relatório – seca, falta de políticas públicas, entre outros. Por fim, a insegurança alimentar grave está relacionada com a falta de alimentos em quantidade e qualidade, o que atinge uma parcela considerável da comunidade”, apontou o assessor de Direitos Humanos da FIAN Brasil, Lucas Prates.

Conquista da terra não garante acesso a políticas públicas

A conquista da terra não garante políticas públicas, essa é uma das principais conclusões do diagnóstico. “O diagnóstico geral da FIAN Brasil é o de que as famílias quilombolas de Brejo dos Crioulos são levadas a viver em preocupante situação de violações dos seus direitos humanos. Diante da omissão histórica do Estado brasileiro, ou de ações diretas que impactam o direito destes quilombolas, o desafio é fazer com que seus direitos sejam respeitados, protegidos, promovidos e providos”, ressaltou a assessora de direitos humanos da FIAN Brasil, Luana Natielle.

Joana Dark fala das dificuldades dos jovens quilombolas

Entre as violações sistêmicas de Direitos Humanos, que acabam violando o Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas destacam-se o racismo institucional, a invisibilização do trabalho das mulheres e a falta de água, que é um dos fatores determinantes. “Estamos sem água há 5 meses, a água chega por caminhão pipa, no dia que o caminhão não vem, a gente fica sem água”, contou Joana Dark.

“Já ouvi muita gente dizendo que não precisa demarcar terra para quilombola porque quilombola não produz nada. Nossa comunidade não produz não por nossa culpa”, afirmou Véio.

A região do Norte de Minas Gerais é uma das mais violentas do estado, afirma Ana Paula Alencar Silva, membro da Comissão Pastoral da Terra de MG. “Estamos em uma região muito violenta, o Véio já sofreu tentativas de homicídios e o Estado obriga a comunidade a conviver com os criminosos porque não terminou a desintrusão do território. A região do Norte de minas é caracterizada por grandes projetos, como mineração, monocultura e o povo tradicional quilombola, geraizeiro, camponeses, em geral, são vistos como empecilho e como atraso para o desenvolvimento”.

Racismo

“A questão racial continua sendo determinante para a construção de políticas públicas. Existe uma sistemática discriminação racial contra os quilombolas, seja no processo de formulação das políticas, seja na execução destas A demarcação, incompleta, das terras, conjuntada com a ausência quase que total de políticas específicas para estas comunidades negras rurais, resulta em quadro alarmante de insegurança alimentar na comunidade.”, destacou Luana Natielle.

Para a pesquisadora Ana Maria Segall-Corrêa existe uma condição histórica que fará com que a situação da população negra seja sempre desfavorável. “O racismo na sociedade brasileira mantém essas condições desfavoráveis, mantém a vulnerabilidade, mesmo quando as pessoas negras atingem renda mais alta e a situação dos quilombos no Brasil retratam este cenário de exclusão e iniquidades história que impactam diretamente na questão da segurança alimentar e nutricional”.

Apresentação do Diagnóstico foi realizada no dia 9 de junho

Incidência

Uma agenda de incidência política foi realizada no dia 8 de junho junto aos órgãos federais para tratar sobre a situação da comunidade de Brejo dos Crioulos. Os representantes da comunidade Joana Dark e José Carlos participaram de reuniões com a 6ª Câmara de Coordenação e Revisão (responsável por Povos e Comunidades Tradicionais) do MPF, com o Conselho Nacional de Direitos Humanos, Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial – principal responsável pelo Programa Brasil Quilombola), com o INCRA, com a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial/SEPPIR e com a Defensoria Pública da União . A agenda foi acompanhada pelos assessores da FIAN Brasil Luana Natielle e Lucas Prates, pelo presidente do CAA, Elizeu Oliveira e pela representante da CPT, Ana Paula Silva.

Parcerias

O diagnóstico de Brejo dos Crioulos é uma parceria entre o CAA – Centro de Agricultura Alternativa do Norte de Minas e CPT – Comissão Pastoral da Terrra e apoio financeiro de Pão Para o Mundo (PPM) e Misereor.

FIAN Brasil

A FIAN Brasil é uma seção da FIAN Internacional, organização de direitos humanos que trabalha há 30 anos pela realização do Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas (DHANA). No país desde 2000, a FIAN Brasil realiza o acompanhamento e monitoramento de casos de violações de direitos humanos, bem como ações de incidência, advocacy e articulação na área de direitos humanos e direitos correlatos, com ênfase no DHANA.

Foto: Léo Lima

FIAN Brasil apresenta publicações sobre violações de direitos humanos nesta sexta em Brasília

A FIAN Brasil apresenta nesta sexta-feira, 9 de junho, duas publicações sobre o direito humano à alimentação e à nutrição adequadas (DHANA), em Brasília. A primeira publicação será lançada às 9 horas e apresenta um diagnóstico de violações de direitos na comunidade quilombola Brejo dos Crioulos (MG). No período da tarde, às 14 horas, acontece o lançamento da segunda publicação “Da democratização ao golpe: avanços e retrocessos na garantia do DHANA no Brasil”.

As duas publicações estão relacionadas aos trabalhos e pesquisas realizadas pela FIAN Brasil no âmbito do cumprimento de sua missão institucional em defesa dos Direitos Humanos. A luta pelo reconhecimento como comunidade quilombola e pelo direito ao território em Brejo dos Crioulos, localizada no Norte de Minas Gerais, é um dos casos acompanhados pela FIAN há mais de 10 anos.

A elaboração do Diagnóstico iniciou em janeiro deste ano e é fruto de uma análise antropológica que baseia uma avaliação das principais violações de direitos humanos sofridas pela comunidade. “Ao  tratar sobre o DHANA também abarcamos uma ampla gama de direitos correlatos, como acesso à educação, saúde e cultura, e com base nisso fazemos uma série de recomendações ao Estado brasileiro sobre o que deve ser feito para alterar essa realidade”, aponta o assessor de direitos humanos da Fian Brasil, Lucas Prates.

Durante o lançamento do Diagnóstico de Brejo dos Crioulos haverá um debate sobre a segurança alimentar e nutricional dos povos quilombolas no Brasil, com a participação de José Carlos/Véio (Brejo dos Crioulos), Joana Rodrigues (Brejo dos Crioulos), Ana Segall (FIOCRUZ), Luana Natielle (FIAN Brasil) e Lucas Prates (FIAN Brasil).

Democracia e golpe

Crédito foto: Fábio Nascimento/MNI

No período da tarde, a partir das 14 horas, será lançado o informe “Da democratização ao golpe: avanços e retrocessos na garantia do direito humano à alimentação e à nutrição adequadas no Brasil”. A publicação analisa a situação do DHANA no Brasil desde 1988 até o período atual, com foco nos principais retrocessos vividos após o golpe de estado de 2016. Para tanto são analisados criticamente os retrocessos nas áreas de proteção social e combate à fome, de produção e consumo de alimentos sustentáveis, bem como o aumento da violência institucional e da criminalização das lutas sociais. Saiba mais sobre a publicação no link.

“Este informe é uma leitura a partir da ótica do Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas, da Soberania e da Segurança Alimentar e Nutricional (SAN). Não temos a pretensão de apontar todos os iminentes retrocessos, mas sim, aqueles que nos pareciam, no momento de produção do documento, como mais graves e estruturais, considerando as obrigações que o Estado brasileiro assumiu quando adotou tratados internacionais de direitos humanos”, ressalta a secretária geral da FIAN Brasil Valéria Burity.

Durante o lançamento, haverá uma mesa de debate com a participação de Jorge Gimenez (FIAN Brasil), Valéria Burity (FIAN Brasil), Deborah Duprat (PFDC/MPF), Iridiani Seibert (MMC), Pedro Rossi (UNICAMP) e Antônio Teixeira (IPEA).

Parcerias

O diagnóstico de Brejo dos Crioulos é uma parceria entre o CAA – Centro de Agricultura Alternativa do Norte de Minas e CPT – Comissão Pastoral da Terrra. Já o informe sobre o DHANA é uma iniciativa da FIAN Brasil, com apoio do Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (FBSSAN) e do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (IBASE). Ambas as publicações contam com o apoio financeiro de Pão Para o Mundo (PPM) e Misereor.  Após o lançamento, as publicações estarão disponíveis para download no site da FIAN Brasil.

FIAN Brasil

A FIAN Brasil é uma seção da FIAN Internacional, organização de direitos humanos que trabalha há 30 anos pela realização do Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas (DHANA). No país desde 2000, a FIAN Brasil realiza o acompanhamento e monitoramento de casos de violações de direitos humanos, bem como ações de incidência, advocacy e articulação na área de direitos humanos e direitos correlatos, com ênfase no DHANA.

Serviço

Lançamentos publicações FIAN Brasil

9 de junho de 2017 (sexta-feira)

9 horas: Diagnóstico de violações de direitos e situação de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional em Brejo dos Crioulos

14 horas: Da democratização ao golpe: avanços e retrocessos na garantia do DHANA no Brasil

Local: Instituto Bíblico de Brasília – SGAN 601, Módulo F, Asa Norte (antiga sede da Cáritas)

 

 

Ascom FIAN Brasil

Foto destaque: Léo Lima

Produção de comida saudável, direito à terra e à água como alimento: temas do novo Consea

A Produção agroalimentar, agricultura familiar e camponesa e suas repercussões ambientais, sociais, territoriais e no padrão alimentar foram temas escolhidos como prioridades centrais para os próximos dois anos para o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea). A orientação foi dada pelos novos conselheiros, que assumiram o cargo para o biênio 2017-2019 durante a primeira reunião plenária, realizada nesta quinta-feira (18). Os temas deverão ser confirmados e aprofundados na próxima reunião do grupo, prevista para daqui a um mês.

O direito à terra, ao território, direitos dos povos indígenas, da população negra e de povos e comunidades tradicionais também foi citada pela maior parte dos conselheiros, além da erradicação da fome, da pobreza e desigualdade social no Brasil. A escolha dos temas foi feita após a apresentação dos relatórios do cinco grupos de trabalho integrados pelos conselheiros, que se reuniram durante dois dias em Brasília.

Como estratégia para alcançar os objetivos traçados, os conselheiros afirmaram que é importante o Consea buscar se aproximar de outras iniciativas do Legislativo e do Judiciário, a promoção de reuniões com outros conselhos da sociedade civil e o apoio à participação social para elaboração dos planos de segurança alimentar e nutricional nos estados e municípios, por meio de seminários.

A água como alimento

Outro tema de grande destaque foi a água como alimento e recurso produtivo, além da abordagem dos fatores limitantes do acesso universal a esse bem. Os novos conselheiros destacaram ainda a atenção à saúde, à nutrição e ao consumo alimentar adequado e saudável.

Devido ao grande interesse na questão da água como alimento, a nova presidenta do Consea, Elisabetta Recine, solicitou que à Secretária-geral do órgão que avalie a possibilidade de levantar informações para que este seja o tema da próxima plenária. Lembrou que haverá, neste ano, o Encontro sobre Água e o Fórum Mundial da Água.
Elisabetta ponderou que seria interessante para o Consea realizar um evento sobre o tema da água como alimento durante o fórum. A sugestão deverá ser analisado em agosto, após a próxima plenária da água, quando serão consolidadas as propostas de organização interna do Consea.

O presidente do Consea da Paraíba, José de Arimatéia Rodrigues França, alertou que há atualmente um grave problema de água em vários estados. Informou que o Consea-PB está organizando uma atividade sobre o projeto de integração do Rio são Francisco e os impactos em matas ciliares, bem como sobre a redução das políticas de cisternas de placa. Por isso, reforçou a importância do tema.

Estratégias

Os novos conselheiros definiram também, nesta quinta-feira, quais devem ser as principais estratégias de trabalho do Consea no próximo biênio 2017-2019, a partir de três grandes temas: direito à agua, terra e território; relação e cooperação internacional; e a defesa e fortalecimento do caráter estatal e público.

Para viabilizar essa atuação, acrescentaram, é preciso considerar a diversidade da natureza dos temas, dos sujeitos (diferentes gerações, mulheres, população negra, povos e comunidades internacionais) e suas dimensões (rural e urbana), além de buscar formas de articulação entre eles. É importante garantir a criação de um espaço e uma estratégia que permita a discussão permanente das questões de gênero, de modo a permear a discussão em todas essas instâncias.

O Consea deve atuar na difusão do direito humano à alimentação adequada; na divulgação da missão da entidade (que é mais conhecida fora do Brasil do que internamente); ampliar sua relação com o Legislativo e Judiciário; promover a integração das comissões internas permanentes; identificar avanços, gargalos e ameaças à implantação das políticas de segurança alimentar e nutricional.

Os conselheiros consideram importante a promoção de reuniões entre conselhos da sociedade civil e o apoio à participação social para elaboração dos planos estaduais e municipais de segurança alimentar e nutricional, por meio de seminários.

Fonte: Ascom Consea

Consea: FIAN Brasil toma posse e membros elegem uma nova Presidenta para gestão 2017-2019

O presidente da FIAN Brasil Marcelo Brito tomou posse na manhã desta quinta-feira, 18 de maio, como membro titular do Consea – Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional para o período 2017-2019. A programação de posse dos novos conselheiros, representantes da sociedade civil e do governo, iniciou na terça-feira, 16, em Brasília, durante a 1ª Reunião Plenária Ordinária do órgão.

“O Consea se constitui como um espaço de exigibilidade, de monitoramento e de garantia de direitos. Levando em consideração essa conjuntura de golpe e momento antidemocrático do Brasil, consideramos que ocupar este espaço é muito importante e estratégico para que esses retrocessos não avancem”, destacou Marcelo Brito.

A FIAN Brasil é uma das organizações da sociedade civil que integra o Conselho. “Na quarta (17/05) fizemos uma reunião entre as organizações da sociedade civil e mais uma vez foi reforçado nós que estamos neste espaço não compactuamos com o momento político do país e não reconhecemos esse governo”, ressalta Brito.

Segundo Marcelo Brito, na reunião foi apontado que o que se percebe é um crescimento da pobreza no Brasil e o decrescimento de programas de combate à pobreza. Entre as prioridades apontadas para a gestão, estão a questão da terra, agua, território, fortalecimento do SISAN, entre outros.

Presidenta
Depois da posse, os novos integrantes do Consea escolheram a nutricionista, professora e pesquisadora Elisabetta Recine para presidir o órgão no período 2017-2019. A indicação agora será submetida ao presidente Michel Temer, a quem compete a nomeação oficial. A presidência do Consea, de acordo com a Lei 11.346/06, deve ser exercida por representante da sociedade civil. Caso seja confirmada a escolha, Elisabetta será a segunda mulher a ocupar a presidência do Consea, sucedendo no cargo a antropóloga Maria Emília Pacheco. O Conselho foi criado em 1993, desativado em 1995 e recriado em 2003. Em ordem cronológica, os outros presidentes do Consea foram Dom Mauro Morelli, Luiz Marinho, Chico Menezes e Renato S. Maluf.

Consea
Nestes próximos dois anos, 24 novas organizações passam a fazer parte do Consea Nacional, outras 56 organizações que já participavam do conselho permanecem com suas vagas. O conselho será composto por um total de 60 representantes, sendo 40 representantes titulares da sociedade civil (2/3) e 20 representantes titulares do governo (1/3), além dos suplentes. O decreto de nomeação de representantes da sociedade civil foi publicado no Diário Oficial da União em 17 de abril.

Ascom Fian Brasil, com informações do Consea

Demarcar terra é imprescindível para resolver problemas indígenas

“A demarcação das terras indígenas é condição primária para a realização do Direito Humano à Alimentação Adequada dos povos indígenas Guarani e Kaiowá e para o acesso a todas as políticas públicas previstas no Plano Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Plansan)”. O diagnóstico consta do relatório de visita, realizada entre os dias 28 de agosto e 2 de setembro de 2016, às comunidades indígenas (acampamentos e reservas) das etnias Guarani e Kaiowá do Cone Sul do estado de Mato Grosso do Sul.

Os Guarani e Kaiowá lutam há décadas pela regularização fundiária de seus territórios de ocupação tradicional. A comitiva que visitou a região, liderada pelo Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), abordou o acesso dos Guarani e Kaiowá aos alimentos, os impactos de programas sociais, qualidade, quantidade e regularidade das cestas básicas, o acesso à água, documentação e questões relacionadas à demarcação das terras.

A situação de insegurança alimentar e nutricional dos povos Guarani e Kaiowá, diz o relatório, tem relação direta com o descumprimento dos direitos territoriais garantidos às comunidades indígenas pela Constituição Federal do Brasil. “Foi possível constatar em todas as comunidades visitadas a ocorrência de fome e desnutrição, a precariedade do acesso à saúde, à água e à educação e a ausência de documentação civil”.

A comitiva verificou um quadro de violência com mortes por assassinato, manifestações de preconceitos e violação de direitos humanos. “A realidade vivida pelos povos Guarani e Kaiowá pode ser denominada como uma tragédia humanitária e denota explicitamente a negação sistemática de direitos humanos em função da omissão do Poder Público”, destaca o documento.

O relatório evidencia a necessidade da adoção de ações estruturantes para as comunidades, tanto em reservas indígenas como em áreas de retomada, que garantam a produção de alimentos para o autoconsumo e a comercialização do excedente, respeitando suas tradições agrícolas e sua cultura alimentar.

O Consea tem discutido e se manifestado sobre a situação de insegurança alimentar e nutricional e das recorrentes violações de direitos dos povos indígenas no Brasil. O Conselho encaminhou várias Exposições de Motivos e Recomendações aos órgãos do Poder Público sobre demandas indígenas, em especial os direitos dos povos Guarani e Kaiowá.

Clique aqui para acessar o relatório

Fonte: Consea

FIAN Brasil apresenta versão preliminar de estudo sobre o DHANA no Brasil

A FIAN Brasil prepara estudo sobre a realização do Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas (DHANA) no Brasil que visa registrar avanços estratégicos  desde a promulgação da Constituição de 1988, bem como lacunas e retrocessos e o agravamento destes retrocesso e involuções em um contexto de ruptura democrática evidenciando violações de direitos de responsabilidade dos poderes Executivo, Judiciário e Legislativo que impactam a realização deste direito no Brasil.

O conteúdo da publicação vai abranger os retrocessos na capacidade do estado de prover proteção social e combater a fome; retrocessos na capacidade do estado de  promover a produção e o consumo de alimentos de forma sustentável e nutricionalmente adequada e em relação à exigibilidade de direitos, violência e criminalização de movimentos sociais. “Esse estudo é um instrumento de iniciativa da FIAN Brasil, mas com o apoio e a participação de outras organizações e coletivos que servirá como denúncia e também como estratégia de incidência para evitar que se instalem mais retrocessos no Brasil, como por exemplo a proposta de reforma na previdência social que vai significar um grande retrocesso na realização do direito humano à alimentação e nutrição adequadas, atingindo sobretudo as mulheres, de uma forma geral, mas também trabalhadoras e trabalhadores rurais”, aponta a secretária geral da FIAN Brasil, Valéria Burity.

A versão preliminar do estudo, que está em fase de elaboração, foi apresentada durante o Seminário Desafios e perspectivas de enfrentamento dos retrocessos: pela garantia da soberania alimentar e do direito humano à alimentação adequada, realizado no dia 9 de fevereiro, durante reunião ampliada do FBSSAN – Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional, no Rio de Janeiro. O lançamento da publicação está previsto para meados de junho de 2017 e tem apoio da Pão Para o Mundo (PPM) e Misereor.

Seminário

O Seminário Desafios e perspectivas de enfrentamento dos retrocessos: pela garantia da soberania alimentar e do direito humano à alimentação adequada (DHAA) foi realizado durante a reunião ampliada do Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (FBSSAN) nos dias 9 e 10 de fevereiro, no  Rio de Janeiro.

A reunião contou com a parceria do Centro de Referência em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (CERESAN) e da FIAN Brasil, e teve como objetivo de  promover o debate sobre os desafios e perspectivas da conjuntura política atual em virtude das ameaças nacionais e internacionais às recentes conquistas brasileiras no campo das políticas de enfrentamento da fome e de promoção da Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (SSAN) e do Direito Humano à Alimentação Adequada (DHAA).

 

Por Flávia Quirino, da Assessoria de Comunicação da FIAN Brasil, com informações do FBSSAN.

Geografia da Fome, uma trajetória em busca do direito humano à alimentação e nutrição

A história das políticas públicas destinadas à alimentação e à nutrição a famílias de baixa renda começa no Brasil, com o trabalho deste, que é um dos mais importantes pensadores, sobre a questão da fome: Josué de Castro. Médico, escritor, embaixador junto à sede das Nações Unidas em Genebra (1962), político, sociólogo, Diretor da FAO – Organismo das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (1945), em duas gestões na década de 50. Na sua obra, dois livros fundamentais ao estudo científico sobre o tema, “Geografia da Fome”, que analisa as condições específicas do Brasil em relação à fome e a desnutrição, e “Geopolítica da Fome”, onde estende sua análise ao âmbito internacional. Josué de Castro profetizava: “denunciei a fome como flagelo fabricado pelos homens contra outros homens”, no que queria deixar claro sua visão sobre a fome como fenômeno político e econômico, produzido pela mão do homem, em contraponto a um problema  alimentar ou natural.

Seus estudos com um grupo de médicos na década de 40, foram imprescindíveis para a compreensão dos diversos tipos de fome, nos indicando a complementaridade entre  terra/ambiente, homens/culturas  e nutrição. Nasce aí, o ¨Geografia da Fome¨.

Através dos inquéritos alimentares, que ¨nutrem¨ a obra, o autor caracterizou cinco áreas alimentares no país, em 1945, cada uma delas com recursos e características próprias tanto de clima, quanto de solo, cultura, etnias, desenvolvimento econômico, social, as diferenças regionais, entre um norte, nordeste, sul, que estavam assim distribuídas: 1) Área da Amazônia; 2) Área da Mata do Nordeste – todo o seu extenso litoral: 3) Área do Sertão do Nordeste; 4) Área do Centro-Oeste; 5) Área do Extremo Sul. Das cinco áreas que formam o quadro alimentar brasileiro, três, através desses estudos, caracterizavam-se como áreas de fome: a da Amazônia, a da Mata do Nordeste, e a do Sertão Nordestino. As populações que ali viviam, na sua grande maioria, exibiam e/ou exibem, permanentemente ou ciclicamente as marcas inconfundíveis da fome coletiva, numa categoria de calamidade coletiva. Nessas regiões, ao lado das deficiências proteicas, ocorriam deficiências em sais minerais, fazendo uma correlação entre a riqueza mineral do solo, e a vida, tanto animal quanto vegetal.

Josué de Castro apontou no livro sua preocupação com as decisões políticas para a busca de solução para problema de tamanha e extensa grandeza:

“(…) o drama atual do Brasil, que é promover o seu desenvolvimento, com suas escassas disponibilidades, em ritmo acelerado e sem sacrificar as aspirações de melhoria social de seu povo, constitui a pedra de toque da acuidade política dos nossos dirigentes.”(CASTRO, 1963, p. 39).

Ao longo dos processos históricos brasileiros, vamos encontrar políticas públicas reprodutoras da pobreza, programas fragmentados na tentativa de superação da miséria, sempre com a supremacia dos interesses econômicos sobre os direitos sociais. Em décadas, vimos a concentração do poder econômico, a desresponsabilização do Estado, como indutor do fosso entre a população pobre, as desigualdades sociais, a fome e as elites que concentraram poder e riqueza.

Este célebre registro nos ensina que ao abordarmos a questão da fome, num país como o Brasil, de dimensões continentais, rico em suas fontes naturais, minerais, hídricas, seus ecossistemas, sua biodiversidade, condições climáticas, fronteiras agrícolas, sua diversidade étnica e cultural; é abordar a questão da terra, da agricultura, das opções de desenvolvimento, dos povos e comunidades tradicionais, é reconhecer que a fome, mesmo em diferentes períodos históricos e de desenvolvimento do país, é produzida, reproduzida e mantida por um contexto político, econômico e social.

Josué de Castro deixa seu legado, a materialidade de sua obra e testemunho de vida, proporcionando ao Brasil a base para um sistema de lei que hoje vigora no país. A institucionalização da Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) vem ocorrendo gradualmente com um impulso maior a partir da promulgação da Lei nº 11.346, de 15 de setembro de 2006, que instituiu a Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional (LOSAN) e criou o Sistema Nacional de Segurança Alimentar Nutricional (SISAN), com vistas a assegurar o direito humano à alimentação adequada no país.

Essa política pressupõe a articulação e a integração de ações no âmbito do acesso aos alimentos com qualidade e quantidade suficientes, pela extensão e biodiversidade brasileira, desde a produção até o consumo, passando pela educação alimentar e nutricional a toda a população. Por sua vez, ela deve favorecer a articulação de ações setoriais de forma sustentável, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, envolvendo tanto as políticas econômicas e financeiras, quanto políticas sociais como a  saúde, educação, assistência social.

O Brasil deu um passo significativo no que se refere ao arcabouço legal, através da promulgação da Emenda Constitucional nº 64, que inclui a alimentação entre os direitos sociais, no Art. 6º da Constituição Federal, em 2010. Esse direito constitucional confere especialmente no que se refere à política de segurança alimentar e nutricional, sob o enfoque da realização de direito e da proteção social, mais garantias de sua efetivação e operacionalidade.

A legislação brasileira de SAN, expressa enquanto dever do poder público respeitar, proteger, promover, prover, informar, monitorar, fiscalizar e avaliar a realização do direito humano à alimentação adequada, bem como garantir mecanismos para sua exigibilidade.

No entanto o caráter positivo da política de SAN, em relação aos seus destinatários, não é automático, não se dá por decreto, pela norma, o que sugere um contínuo desafio no enfrentamento das forças hegemônicas e do poder estrutural do capital. Nesta política pública destacam-se os componentes regionais diferenciados de pobreza com demandas de populações específicas: mulheres, crianças, idosos, populações negras, quilombolas, indígenas.

Rafirmemos Josué de Castro, a contemporaneidade de sua obra, entendendo a oferta adequada de alimentos; num Brasil continental, como a estabilidade da oferta e dos mercados, segurança no acesso aos alimentos ofertados, redistribuição dos recursos materiais, da renda e a redução da pobreza, sem os quais não haverá segurança alimentar para as populações em qualquer parte do mundo.


Referências

ROCHA, B. M.  Política de Segurança Alimentar Nutricional e sua inserção ao Sistema Único de Assistência social. 1ª. Ed. Jundiaí: PACO Editorial, 2012. v. 120. 164 p .

CASTRO, Ana Maria. Últimos escritos de Josué de Castro. São Paulo: Vozes, 1984.

CASTRO, Josué de; CASTRO Ana Maria de (orgs.). Fome: um tema proibido. 4. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003.

______. Decreto-Lei nº 11.346, de 15 de setembro de 2006. Cria o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional SISAN com vistas em assegurar o direito humano à alimentação e nutrição.


 

Brizabel Rocha é bacharel em Economia Doméstica pela Universidade Federal de Pelotas. Mestre pelo curso de Serviço Social em Políticas Públicas de SANS/PUCRS.. Assessora de Gestão Social de Política Territorial/UFRGS/PGDR/RS.

Publicado, originalmente, no Observatório Brasileiro de Hábitos Alimentares – OBHA

Tese “Organizações Sociais e Políticas Públicas: inserção da Fetraf-Sul nas políticas públicas de segurança alimentar e nutricional”

Disponibilizamos a Tese de Doutorado de Irio Luiz Conti, submetida e aprovada ao Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Rural da Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, defendida em 28 de junho de 2016.

O objetivo geral da Tese foi compreender as mudanças ocorridas no interior de organizações sociais da agricultura familiar, como a Fetraf-Sul, em virtude de sua participação na formulação e implantação de políticas públicas de segurança alimentar e nutricional (SAN). A investigação se caracterizou por ser um estudo de caso e privilegiou a abordagem qualitativa, auxiliada pela quantitativa. Optou-se por duas unidades de análise, sendo uma em Brasília, Distrito Federal, e outra no município de Constantina, no Rio Grande do Sul. A tese de fundo desta pesquisa é que a definição das formas de organização e ação e das estratégias dos movimentos e organizações sociais é, em parte, estruturada em função da forma como se configuram as relações com os atores e instituições político-administrativas. Essas formas se explicam, parcialmente, por sua inserção relacional na qual as relações com o Estado são centrais. Neste sentido, a mudança de relações baseadas, centralmente, no confronto para relações baseadas, centralmente, na cooperação conflituosa oportunizou e, por vezes, demandou transformações importantes na organização e na atuação da Fetraf-Sul.

Os principais resultados da investigação são organizados em cinco conclusões. A primeira é que a análise da inserção da Fetraf-Sul nas políticas públicas levou ao resultado teórico explicitado na conformação de um novo padrão de relações entre o Estado e os movimentos e organizações sociais, sobretudo, expresso na cooperação por formulação de políticas públicas e na sua execução qualificada por parte das organizações sociais. A segunda realça que a Fetraf-Sul aproveitou as oportunidades políticas que se abriram nos vários espaços para construir políticas públicas, com base em relações de cooperação com o Estado, que se tornaram efetivas e contribuíram para melhorar a vida dos agricultores familiares. A terceira é que o sindicalismo rural e a segurança alimentar e nutricional se constituíram com trajetórias e relações estanques entre si e com o Estado. Este, em boa medida, segue adotando políticas públicas setorializadas no espaço rural e submete as organizações sociais à mesma lógica na sua execução. A quarta é que, apesar de diversas iniciativas de políticas públicas incrementadas pela Fetraf-Sul e suas organizações filiadas, especialmente pelas mulheres agricultoras familiares, a SAN não se constituiu em prioridade política em sua agenda, nem recebeu atenção acentuada por parte de suas estruturas sindicais.

Ademais, a partir de 2012 a cooperação nas políticas de SAN enfraqueceu nas duas esferas de governo e se tornou mais conflituosa, sobretudo devido às mudanças na operacionalização do PAA em âmbito federal e de governo em Constantina. A quinta evidencia que ocorreram mudanças na profissionalização de dirigentes e da equipe técnica, na passagem de processos de formação para projetos de capacitação, na moderação do discurso da Fetraf, na ampliação de suas estruturas organizativas e na criação de organizações específicas para responder às novas exigências decorrentes de sua inserção na formulação e execução de políticas públicas.

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Fian Brasil inicia diagnóstico sobre situação alimentar em território quilombola e geraizeiro de MG

As violações de direitos e a situação de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (SSAN) e do Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequada (DHANA) no Território Quilombola de Brejo dos Crioulos e no Território Geraizeiro de Vale das Cancelas, ambos localizados na região Norte de Minas Gerais, são foco de dois diagnósticos em elaboração pela Fian Brasil.

“A elaboração destes diagnósticos tem como objetivo analisar de maneira qualitativa a situação do Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas (DHANA) nos dois territórios. Devido ao enfoque da Fian, ao tratar do DHANA também abarcamos uma ampla gama de direitos correlatos, como acesso à educação, saúde e cultura, e com base nisso pretendemos fazer uma série de recomendações ao Estado brasileiro sobre o que deve ser feito para alterar essas realidades”, aponta o assessor de direitos humanos da Fian Brasil, Lucas Prates.

A visita em Brejo dos Crioulos para elaboração do diagnóstico foi realizada entre os dias 10 e 13 de janeiro e contou com a participação de cerca de 30 lideranças das comunidades que compõem o território, homens e mulheres. Já no Território Geraizeiro de Vale das Cancelas a visita foi realizada entre os dias 13 a 16 de janeiro, com a participação de cerca de 40 lideranças, entre homens e mulheres.

O processo de coleta de dados foi realizado por meio de entrevistas com lideranças, entrevistas domiciliares e grupos focais, e abordaram três grandes eixos: soberania alimentar, gênero e processo social da alimentação, na perspectiva da indivisibilidade dos direitos humanos.

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Grupo focal com mulheres de Brejo dos Crioulos assessorado por Edina Lapa do CAA

Em cada território foi abordada a questão da dimensão territorial e do acesso ao território e o acesso às políticas públicas de fomento à produção alimentar que impactam, diretamente, no acesso à alimentação. Responsável pela elaboração dos diagnósticos, o antropólogo Dr. Júlio César Borges, observa que mesmo com o acesso a cerca de 85% do território garantido, as comunidades de Brejo dos Crioulos sofreram nos últimos 5 anos com uma grave seca na região, que atrapalhou a produção de alimentos. “Aliada à seca, constatamos a presença de uma alimentação comprada, com pouca produção própria – o que não supre as necessidades das famílias. Desta forma restou evidente a atual importância de aposentadorias e do Programa Bolsa Família para a aquisição de alimentos”.

Mesmo com a dificuldade da produção de alimentos no território quilombola, o antropólogo aponta que comparando os dois territórios, a situação de Vale das Cancelas é mais preocupante pois além de “não terem o território garantido, [os/as geraizeiros/as] sofrem com ameaças de empresas de eucalipto, que desde a década de 70 estão acabando com a água e jogando muito agrotóxico na região, e ainda enfrentam problemas com empresas mineradoras e de usinas hidrelétricas”, destaca Júlio César Borges.

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Júlio Borges durante entrevista domiciliar em Vale das Cancelas

As visitas nos territórios contaram com o apoio do CAA – Centro de Agricultura Alternativa do Norte de Minas  e MAB – Movimento dos Atingidos por Barragens. Os diagnósticos serão apresentados ainda no primeiro semestre de 2017 e são elaborados com o apoio da Misereor, Pão Para o Mundo e HEKS-EPER.

Brejo dos Crioulos

O Território Quilombola de Brejo dos Crioulos localiza-se na região norte de Minas Gerais, entre os municípios de São João da Ponte, Varzelândia e Verdelândia, e possui cerca de 17.300 hectares. O território divide-se em oito comunidades, reunindo em torno de 500 famílias.

Vale das Cancelas

O Território Tradicional Geraizeiro de Vale das Cancelas abrange um total de 73 localidades dos municípios de Grão Mogol, Padre Carvalho e Josenópolis, onde vivem mais de 1.400 famílias geraizeiras.

FIAN

A FIAN Brasil é uma seção da FIAN Internacional, organização de direitos humanos que trabalha há 30 anos pela realização do Direito Humano à Alimentação e Nutrição Adequadas. No Brasil, a FIAN acompanha e monitora casos de violações deste direito, incidindo sobre o poder público e realizando ações de formação e informação.

Flávia Quirino/Assessoria de Comunicação FIAN Brasil

 

Seminário pelo Direito à Alimentação propõe articulação institucional para barrar retrocessos nas políticas de combate à fome

O segundo dia do Seminário Nacional sobre o Direito Humano à Alimentação, promovido pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM) em parceria com a Frente Parlamentar de Segurança Alimentar e Nutricional, apontou que a articulação institucional, por meio de frentes parlamentares e atuação dos conselhos de segurança alimentar, são uma frente de resistência significativa aos retrocessos nas políticas públicas de combate à fome e acesso à alimentação.

O evento, realizado entre os dias 30 de novembro e 1º de dezembro, no Plenário 9 do Anexo II da Câmara dos Deputados, reuniu movimentos sociais, organizações que atuam no tema da segurança alimentar, representantes dos conselhos estaduais e do Consea – Conselho Nacional de Segurança Alimentar, parlamentares e acadêmicos.

Ana Cláudia Lima e Silva, representante do Movimento Camponês Popular, apontou que o camponês é tratado como criminoso historicamente, e que a violência contra o povo do campo apresenta novas formas, como a proibição do PAA (Programa de Aquisição de Alimentos) pelo Tribunal de Contas da União, que praticamente inviabiliza a produção de alimentos pela agricultura familiar visando a comercialização, uma vez que ao exigir o domínio de toda cadeia produtiva, impede aos pequenos agricultores o fornecimento de alimentos, pois a escala menor de produção leva à especialização em determinado produto.

“Temos uma série de formas em que a violência chega no campo e camponeses não conseguem fornecer alimentação saudável. Diante de toda essa problemática gostaríamos de reafirmar a produção familiar, para garantir a diversidade local, o acesso aos mercados locais, fornecendo alimentação saudável na cidade e no campo. Fortalecer a produção de produtos agroecológicos e que aperfeiçoem os marcos da agroindústria. Perpetua-se a concentração fundiária, a reforma agrária vive retrocessos, e sem terra não há produção de alimentos”, defendeu.

A extinção de mecanismos de participação social na definição de políticas públicas e a criminalização os movimentos que constroem estes processos são decisões políticas que mostram as dificuldades em qualquer avanço no debate sobre acesso à alimentação saudável e livre de agrotóxicos, aponta Gil Marcos Carvalho, presidente da Comissão dos Presidentes dos Conseas Estaduais. Gil denunciou que os conselhos estaduais estão sofrendo severas pressões do Estado visando sua desarticulação, desde investigações policiais, acusações indevidas e ameaças do Poder Judiciário. Nos estados do Amapá e Espírito Santo, por exemplo, os Conseas são “triturados” pelo poder político e econômico, apontou.

Nesse contexto de ausência de diálogo, sobretudo no plano federal, a articulação institucional torna-se fundamental. É o exemplo do Mato Grosso, citado por Aída Dinucci, presidenta do Consea mato-grossense. A Frente Parlamentar do estado buscou fortalecer projetos que atendessem aos anseios representados pela sociedade civil por meio do Consea.

O deputado Padre João (PT-MG), que preside a CDHM e a Frente Parlamentar pela Segurança Alimentar e Nutricional da Câmara dos Deputados, reforçou a necessidade dessa articulação. “ Precisamos provocar os legislativos estaduais e municipais a se comprometerem com essa questão. Há promotores muito comprometidos com a causa, e se em cada município tivermos um vereador sensibilizado ao tema da alimentação saudável, avançaremos muito. É importante identificar parceiros na sociedade civil, nos demais conselhos e organizações inter-relacionadas”.

Billy Boss / Câmara dos Deputados
Billy Boss / Câmara dos Deputados

Para Denildo Rodrigues, coordenador nacional da Confederação Nacional Quilombola, as conquistas estão muito distantes para seu povo. “São mais de 5 mil comunidades quilombolas no Brasil, desse total, não há nem 200 com titulação de propriedade. Dessas 200 o título ainda não foi homologado. Isso causa conflito e segurança alimentar em nossos territórios. Mesmo que tenhamos o documento de posse, se os fazendeiros não foram indenizados eles permanecem no território, e promovem ameaças às lideranças quilombolas. O acesso às políticas públicas é restrito. Aquelas universais chegam, mas as específicas para a comunidade, com o recorte quilombola, a dificuldade é muito grande. Isso está muito vinculado ao racismo que temos nos órgãos institucionais. Isso causa insegurança alimentar nos territórios quilombolas, pois vivemos da terra e não sabemos se nela vamos permanecer”, salientou.

Fruto das discussões nos dois dias do Seminário, as 29 entidades presentes construíram uma carta pela formação de frentes parlamentares de segurança alimentar e nutricional, lida e aprovada por todos os presentes no plenário.

 

Fonte: CDHM/Câmara dos Deputados