CNDH elege organizações da sociedade civil para próximo biênio

O Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH) realizou nesta quinta-feira (10) o Encontro Nacional que elegeu organizações da sociedade civil para o biênio 2016-2018.

Ao todo, 34 organizações foram habilitadas a participar do processo eleitoral, sendo que 32 votaram. Foram escolhidas 9 organizações titulares e 9 suplentes.

O conselheiro Darci Frigo, representante da Plataforma de Direitos Humanos – Dhesca Brasil no CNDH, faz um balanço positivo do mandato que está se encerrando. “Apesar das grandes dificuldades institucionais, de transição no âmbito da Secretaria e do Ministério de Direitos Humanos  e também na conjuntura política com o advento do golpe, o Conselho conseguiu ter posturas bastante firmes na defesa, promoção e garantia dos direitos humanos no país, sem se confundir com uma grande ONG, com o parlamento e o Governo, tendo seu espaço próprio, buscando garantir sua autonomia”, destaca.

Ainda segundo Frigo, “o processo conseguiu reunir um conjunto de organizações representativas das redes e movimentos sociais que cada vez mais colocam os direitos humanos em suas pautas e eleger um conjunto de organizações que são representativas de diferentes segmentos que pode continuar uma atuação firme para que o Conselho de fato seja o grande guardião dos direitos humanos no país”.

A Plataforma Dhesca reúne mais de 40 organizações de direitos humanos de todo o país e foi reeleita para mais um mandato. “O saldo da eleição foi positivo, a Plataforma recebeu um apoio bastante significativo e como rede vai continuar procurando tanto fortalecer a atuação da sociedade civil no Conselho, criar espaços como a plenária nacional, onde de forma plural a gente possa reunir o conjunto das organizações de direitos humanos do país”, conclui Frigo.

Organizações filiadas à Plataforma Dhesca também foram eleitas ou reeleitas para o próximo mandato: Conselho Indigenista Missionário – CIMI, Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social, Justiça Global e Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua – MNMMR. O Conselho Federal de Psicologia integra a rede por meio de sua Comissão de Direitos Humanos.

Conheça todas as organizações da sociedade civil que irão compor o CNDH no mandato 2016-2018:

Titulares

1. Conselho Indigenista Missionário – CIMI
2. Plataforma de Direitos Humanos – Dhesca Brasil
3. Central Única dos Trabalhadores – CUT
4. Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social
5. Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais – ABGLT
6. Justiça Global
7. Central de Cooperativas e Empreendimentos Solidários do Brasil – UNISOL Brasil
8. Conselho Federal de Psicologia – CFP
9. Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua – MNMMR

Suplentes

1. União Brasileira de Mulheres – UBM
2. Movimento Nacional de Direitos Humanos – MNDH
3. Central de Trabalhadores do Brasil – CTB
4. Movimento Nacional da População de Rua – MNPR
5. Coletivo Nacional de Juventude Negra – Enegrecer
6. Associação Nacional dos Atingidos por Barragens – ANAB
7. Rede Nacional Feminista de Saúde, Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos
8. Associação Direitos Humanos em Rede – Conectas Direitos Humanos
9. Associação Nacional dos Centros de Defesa da Criança e do Adolescente – ANCED

Fonte: Plataforma Dhesca

ONU aponta preocupação com situação de indígenas no Brasil

Instituições, entidades e diversas lideranças estiveram reunidas numa audiência pública nesta quinta-feira (10) na sede da Procuradoria-Geral da República (PGR), em Brasília (DF), para debater a situação dos povos indígenas no Brasil.

Os debates adotaram como ponto de partida um relatório produzido este ano pela Organização das Nações Unidas (ONU) sobre o tema. O documento foi elaborado após uma missão da relatora especial sobre os direitos dos povos indígenas da ONU, Victoria Tauli-Corpuz, que esteve no país de 7 a 17 de março.

O representante da ONU que participou da audiência, Davide Zaru, explicou que a proposta do trabalho é qualificar a luta pelos direitos dos indígenas e identificar áreas de preocupação, com o objetivo de engajar as autoridades brasileiras em relação à temática.

A demarcação de terras, a violência e o racismo institucional figuram entre as principais preocupações que vêm sendo apontadas pelo órgão e pelos demais atores da rede de proteção às comunidades tradicionais.

“A prioridade é a necessidade de assegurar medidas de urgência relativas à violência e à discriminação das comunidades. É preciso fazer referência também à falta de confiança que os povos indígenas têm no Estado e na polícia. A nossa relatora retrata, inclusive, movimentos de policiais federais em episódios de agressão e afirma que essas pessoas precisam dar conta do que fizeram”, destacou Zaru.

Os debatedores salientaram ainda que a violência tem um caráter multifacetado. Segundo dados oficiais do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), em 2015 foram notificados 725 casos de violência contra o patrimônio, 182 ocorrências de violência contra a pessoa idosa e 137 casos de violência por omissão do poder público, entre outras ocorrências.

Demarcações

Uma das principais recomendações feitas pela ONU ao Estado brasileiro após a produção do relatório diz respeito à continuidade das demarcações de terras. “Há falhas no processo, e o desafio nessa área vem de vários fatores, como a sensibilidade política do tema e a baixa capacidade de atender as demandas. É preciso dar continuidade às demarcações no Brasil”, defendeu Zaru.

Segundo dados divulgados há poucos dias pela Advocacia-Geral da União (AGU), cerca de 200 terras estão em alguma das fases do processo de demarcação, mas há 475 territórios ainda sem apreciação por parte da Fundação Nacional do Índio (Funai).

“E há também casos de reivindicações fundiárias que precisam apenas de decisão final, mas as portarias não são assinadas pelo Ministério da Justiça por decisão política. (..) O Estado brasileiro ainda precisa tomar iniciativas muito mais efetivas no sentido de garantir todos os direitos indígenas”, avalia Buzato.

Participação

A ONU apontou ainda grande preocupação com a falta de consulta aos povos indígenas em relação às decisões públicas que dizem respeito aos direitos das comunidades. “É o caso da PEC [Proposta de Emenda Constitucional] 215, por exemplo. Essa proposta vai minar de uma forma geral os direitos garantidos na Constituição Federal, além dos processos de demarcação”, projetou o representante da ONU.

De interesse da bancada ruralista, a PEC 215 transfere do Poder Executivo para o Legislativo a competência sobre as demarcações. Na avaliação das comunidades e das entidades que atuam na causa, a medida tende a deixar as populações tradicionais ainda mais vulneráveis ao jogo político.

Líderes indígenas que compareceram à audiência relataram preocupação com o fato de não estarem sendo ouvidos pelo poder público. “Isso é um desrespeito à Convenção 169, da OIT [Organização Internacional do Trabalho], que nos garante o direito de veto em relação a projetos que tratam dos nossos interesses”, afirmou Dinamam Tuxá, da comunidade homônima, localizada na Bahia.

Suicídio

Ele ressaltou ainda que a violência constante contra a cultura indígena é diretamente responsável pelos casos de suicídio, que no ano passado somaram 87 registros em todo o país, segundo relatório do Cimi.

“É algo que ocorre principalmente entre a juventude, o que é ainda mais grave. Os jovens muitas vezes saem das suas terras e vão para as cidades em busca de outros mecanismos de sobrevivência, mas lá não são reconhecidos como cidadãos. Como consequência, voltam pra comunidade, mas já com uma cultura urbanizada, e não são aceitos. Isso gera uma confusão mental que provoca o suicídio”, explica Dinamam Tuxá.

MPF

Na ocasião, o procurador da República Luciano Maia conversou com o Brasil de Fato e disse que o relatório da ONU tende a qualificar a atuação dos diversos atores do poder público e das entidades e lideranças da rede de proteção aos indígenas.

“Vamos elevar o nosso nível de conhecimento e de consciência sobre esses direitos e a violação deles. Como consequência, é algo que vai gerar mais unidade na defesa dos índios em relação às políticas públicas. O relatório servirá de estímulo ao diálogo interno entre os vários segmentos”, projetou.

Legislativo

Os debatedores mencionaram também a ressonância que a violência contra os indígenas tem no Poder Legislativo. “Há um preconceito enorme com a nossa cultura, causando danos irreparáveis às populações, e isso muitas vezes vem das pessoas que deveriam promover os nossos direitos, como os membros do Congresso Nacional. Muitos dos jagunços e fazendeiros que atacam as comunidades bancam os congressistas”, afirma Tuxá.

No âmbito do Congresso, os deputados federais Patrus Ananias (PT-MG) e Erika Kokay (PT-DF) mencionaram a preocupação com a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Funai e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). O colegiado foi instalado pela segunda vez esta semana na Câmara Federal, como resultado de articulações da bancada ruralista.

“Essa CPI tem como objetivo impedir a demarcação de novas terras e ainda retroceder em relação a essa questão, colocando as reservas indígenas no mercado de terras. (…) Além disso, é pra impedir a discussão e a implementação da reforma agrária no Brasil, para dificultar a efetivação do princípio da função social da terra, que os indígenas tão bem compreendem e praticam”, criticou Patrus.

Governo

Durante a audiência, por diversas vezes os grupos indígenas fizeram severas críticas e manifestações contrárias ao atual governo, sobretudo nas questões relativas ao reconhecimento de territórios. Entre outras coisas, as lideranças se queixaram que a Funai não tem recebido as lideranças para tratar da respectiva pauta.

“Estão matando nossas famílias e, amanhã ou depois, podemos ser expulsos do nosso território”, gritou do auditório um manifestante, embalado por gritos de apoio dos demais grupos étnicos presentes.

Na ocasião, o presidente interino da Funai, Agostinho de Nascimento Neto, disse que tem conversado “com cerca de 40, 50 pessoas” e que há um esforço institucional no sentido de articular as demandas indígenas.

Por Cristiane Sampaio/ Brasil de Fato

Crédito foto: Antonio Augusto/Secom/PGR

Campanha Mais Direitos, Mais Democracia

A campanha nacional “Mais Direitos, Mais Democracia” é uma iniciativa construída coletivamente por redes, entidades e movimentos sociais que tem como objetivo fazer uma disputa de valores no campo dos direitos humanos e da garantia e ampliação da democracia no Brasil. Ela nasce da necessidade de se promover o enfrentamento da perda de direitos historicamente conquistados, que vem sendo bancada por uma parte significativa dos políticos brasileiros ligados à chamada bancada conservadora.

A crise econômica que se abateu sobre o país, somada à desestabilização política, à eleição de um Congresso conservador e ao recente processo de impeachment aberto contra a presidenta da República Dilma Rousseff, contribui para o agravamento dos retrocessos. Além disso, a própria democracia como um princípio norteador do Estado brasileiro vem sendo posta à prova, com ações que priorizam a moral privada em detrimento da ética pública e que escancaram, no cotidiano, o fascismo, o machismo e o racismo presentes na sociedade.

A partir desta perspectiva, buscando uma ampla articulação entre parceiros nacionais, regionais e locais, que atuam em diferentes esferas de promoção e defesa de direitos, a campanha pretende sensibilizar a sociedade sobre o que são direitos
humanos e sua conexão direta com a democracia. Pretende, ainda, afirmar a identidade e a autonomia de grupos oprimidos e marginalizados, bem como promover a mobilização e a formação destes grupos para uma atuação de convergência que vise o alargamento da democracia.

Todos os direitos para todas as pessoas!

Saiba mais no link.

RPU: Situação dos Direitos Humanos no Brasil será avaliada pela ONU

Em 2017, o Brasil será submetido pela terceira vez à Revisão Periódica Universal (RPU) do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas. Este é um mecanismo pelo qual os Estados-membros da ONU são avaliados por seus pares quanto à situação de proteção aos direitos humanos no país.

O processo de avaliação da RPU toma por base três tipos de documentações distintas. O primeiro é o relatório produzido pelo país em avaliação, no qual o Estado aponta a situação dos direitos humanos no contexto atual, sobretudo desde a última rodada de avaliação a qual foi submetido. O segundo é a documentação produzida pelos órgãos e mecanismos especiais das Nações Unidas sobre a situação dos direitos humanos naquele Estado. O terceiro rol de documentos consiste em compilações preparadas pelas Nações Unidas a partir dos relatórios-sombra enviados pela sociedade civil sobre o Estado em avaliação.

É, portanto, de grande importância a contribuição de organizações, coletivos, redes e movimentos da sociedade civil no processo de Revisão Periódica Universal ao qual o Brasil irá se submeter. O trabalho e as análises feitas por essas entidades são fundamentais para a efetiva caracterização do contexto de violações de direitos humanos que ocorre no Brasil, sendo fundamentais para embasar as recomendações que os demais Estados-Membros farão ao Brasil, com o objetivo de aumentar o grau de proteção existente no país.

Com o propósito de incidir no próximo período de Revisão Periódica Universal, a Justiça Global enviou, durante o mês de outubro, cinco relatórios-sombra ao Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas. Os documentos foram escritos em parceria com diversas organizações e redes, e abordam a crítica situação de violação de direitos humanos hoje no país, em quatro temas distintos: Justiça Juvenil, Sistema Prisional, Direitos Indígenas e Defensores de Direitos Humanos. Os relatórios também trazem recomendações ao Estado Brasileiro, como forma de embasar a atuação dos Estados-Membros da ONU que estarão encarregados de formular as suas próprias recomendações ao Brasil. Para acessar todas as recomendações e documentos clique AQUI.

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A seguir, as recomendações enviadas sobre o tema de Direitos Indígenas, e acesse os documentos na íntegra:

Recomendações enviadas pelo Conselho Indigenista Missionário – CIMI, FIAN Brasil, JUSTIÇA GLOBAL e Associação dos Juízes pela Democracia.

Acesse o documento na íntegra

1. O Estado Brasileiro deve pôr fim à morosidade administrativa dos processos de demarcação das terras indígenas, fator que impede a realização dos demais direitos humanos de tais povos e é o fator principal na relação do aumento da criminalização e violência contra os povos indígenas de todo o país.

2. O Estado Brasileiro deve focar na efetiva investigação e punição dos culpados pelos violentos ataques a que têm sido submetidos os povos indígenas no país, bem como na proteção direta aos indígenas, quando se mostrem necessários.

3. As invasões de Terras Indígenas já demarcadas, bem como a retirada de bens comuns de tais territórios (a exemplo de madeira e minerais) demonstram a omissão do Estado Brasileiro, que deve oferecer proteção direta, imediata e real aos povos indígenas e às terras indígenas, sempre que se apresentar risco e tendo em vista a natureza destas invasões.

4. Assegurar aos povos indígenas o direito de participarem de todos os processos judiciais em curso e futuros, que possam impactar seus direitos, particularmente o concernente ao direito à terra, ao território e recursos tradicionais.

5. Assegurar que órgão próprio do Estado/Judiciário (CNJ) estabeleça metas de atuação para todo o Brasil, priorizando os processos que tratam dos povos indígenas, especialmente os referentes às demarcações de terras, tendo em vista, o evidente retardo na prestação jurisdicional.

6. Assegurar que todos os operadores do Sistema de Justiça, especialmente os magistrados, sejam capacitados a atuar na temática de direitos humanos dos povos indígenas, levando-se em conta a normativa internacional e regional, realizando capacitação permanente, através da Escola do Poder Judiciário, campanhas do CNJ, e outras vias e, especialmente, para que a aplicação do direito seja compatível com o regramento de proteção aos povos indígenas.

7. Recomendar que sejam realizadas campanhas, no mínimo anuais, de informação e esclarecimento à população do país, sobre os povos indígenas, com a participação deles, como contra cultura ao clima de ódio que se instaura e para combater o racismo estrutural e estruturante do Estado Brasileiro.

Recomendações enviadas pelas articulações Associação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB, RCA – Rede de Cooperação Amazônica e Plataforma de Direitos Humanos – DHesca Brasil.

Acesse o documento na íntegra


Aceitação de normas internacionais

1. Ratificar a Convenção de Minamata e incluir o levantamento de dados específicos sobre os efeitos adversos do mercúrio para a saúde indígena e o meio ambiente das terras indígenas.

2. Manter diálogos com países fronteiriços para evitar a contaminação por mercúrio nos rios da bacia amazônica.

Cooperação com outros mecanismos internacionais e instituições

3. Implementar as recomendações da Relatora Especial da ONU sobre os direitos dos povos indígenas e estabelecer mecanismos de monitoramento com a participação dos povos indígenas e da sociedade civil.

4. Elaborar um Plano Nacional de Ação para a implementação e monitoramento dos compromissos relativos ao resultado da Conferência Mundial sobre Direitos Indígenas em diálogo com os povos indígenas, Fundação Nacional do Índio, Conselho Nacional de Direitos Humanos e com o Conselho Nacional de Política Indigenista.

Cooperação inter-estatal e assistência para o desenvolvimento

5. Compartilhar boas práticas e dialogar com países vizinhos para a implementação de ações e políticas de proteção de ações transfronteiriças de promoção e defesa dos direitos indígenas com especial atenção para a situação de povos indígenas isolados e de recente contato.

6. Garantir a participação indígena, por meio de suas organizações representativas, nos espaços bilaterais de negociação do Brasil com os países de fronteira.

Estrutura Constitucional e Legislativa

7. Garantir a manutenção e o fortalecimento dos direitos constitucionais indígenas respeitando os padrões internacionais de proteção dos direitos humanos.

8. Não revogar atos e normativas de reconhecimento de direitos territoriais indígenas.

9. Garantir que eventual regulamentação dos processos de consulta não restrinja o exercício do direito, nem seja contrária aos princípios de pluralidade e autonomia dos povos indígenas, quilombolas e tradicionais.

10. Garantir que a discussão sobre a regulamentação ou normatização do direito de consulta aos povos indígenas seja dialogada e devidamente consultada, priorizando a orientação à administração para gerar melhores condições para a efetiva implementação do direito, e de modo a respeitar a autonomia dos povos indígenas e quilombolas, inclusive quanto a seus protocolos de consulta quando for o caso.

Instituições e políticas públicas

11. Incluir a temática indígena nos relatórios de direitos humanos em diálogo com o Conselho Nacional de Política Indigenista e o Conselho Nacional de Direitos Humanos.

12. Incentivar e e fortalecer a atuação do Conselho Nacional de Política Indigenista e do Conselho Nacional de Direitos Humanos, garantindo a participação de representantes indígenas para monitorar, avaliar e aprimorar políticas que garantam o cumprimento das obrigações de direitos humanos e observando as especificidades dos povos indígenas.

13. Priorizar o fortalecimento das ações e do órgão indigenista federal (FUNAI) e do Ministério Público Federal (MPF) para a promoção e defesa dos direitos humanos dos povos indígenas com especial atenção para os direitos territoriais e para a autonomia dos povos indígenas e sua colaboração no monitoramento nacional e internacional de direitos humanos.

14. Garantir condições institucionais e adotar medidas urgentes e programas específicos contínuos para a proteção aos defensores de direitos humanos indígenas, com especial atenção para a situação dos defensores de direitos humanos em estados que não integraram ao Programa Federal de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos.

15. Avançar para a superação de posturas tutelares e coloniais do Estado com relação aos povos indígenas por meio da implementação de planos nacionais e ações que visem a proteção de direitos e a a adequação de política sociais, econômicas e ambientais de modo a fazer respeitar as línguas, culturas e modos de vidas diferenciados dos povos indígenas.

16. Estabelecer mecanismos e cooperações para produzir regularmente dados, estatísticas e análises específicas sobre as realidades e os contextos de vulnerabilidade dos povos indígenas nas diferentes regiões do país.

17. Ampliar o conhecimento das diferentes instituições de governo sobre direitos indígenas e adotar medidas que reconheçam e garantam os direitos indígenas no contexto de grandes empreendimentos e exploração de recursos naturais.

18. Implementar as recomendações do Conselho Nacional de Direitos Humanos, particularmente relacionadas à situação de violação de direitos humanos no caso da UHE Belo Monte/PA, da Barragem de Saramago em Mariana/MG e dos povos indígenas da região sul do Brasil/RS, SC e PR.

Educação em Direitos Humanos

19. Oferecer treinamentos sistemáticos a juízes, promotores e defensores sobre direitos indígenas, inclusive sobre direitos territoriais, direito à convivência familiar e comunitária e sobre a implementação do direito de participação, consulta, autonomia e desenvolvimento.

20. Implementar campanhas de educação e conscientização contra o racismo e a discriminação e sobre os direitos dos povos indígenas e adotar legislações específicas de proteção desses direitos alinhadas com as proteções internacionais de direitos humanos.

21. Promover ações de aproximação e aprofundamento do conhecimento de Ministros e Juízes sobre os direitos específicos dos povos indígenas e as proteções de direitos humanos considerando os contextos locais e regionais.

22. Garantir orientações nacionais sobre direitos indígenas para a educação em direitos humanos nas escolas e repartições públicas buscando participação e cooperação com organizações e povos indígenas.

Não-discriminação

23. Atender às recomendações da OIT para dar continuidade aos esforços de garantir plena igualdade de oportunidade e tratamento para mulheres, afro-descendentes e pessoas indígenas, bem como combater e punir a discriminação.

24. Combater a desigualdade no acesso de pessoas indígenas a empregos e condições de trabalhos, especialmente com relação à contratação de professores e outros profissionais indígenas nas diferentes áreas, de acordo com a realidade local.

25. Criar programas específicos para incentivar empresas e órgãos públicos a contratar mulheres, afrodescendentes e indígenas.

26. Garantir políticas públicas e o atendimento de qualidade aos povos indígenas no acesso a todos os seus direitos econômicos, sociais e culturais, independentemente da situação de regularização fundiária de seus territórios.

Discriminação Racial

27. Implementar sanções administrativas, políticas, civis e criminais a parlamentares ou figuras públicas que cometam atos de discriminação e racismo contra indígenas.

28. Adotar medidas contínuas para prevenir e punir discursos e ações racistas por parte de autoridades públicas contra povos indígenas, com especial atenção para as regiões Sul, Centro-Oeste e Nordeste do país.

29. Investigar e punir sistematicamente os casos de racismos e de violências fundada em racismo praticados contra pessoas e comunidades indígenas.

30. Atuar junto a autoridades estaduais e municipais para o enfrentamento do racismo e da discriminação contra povos indígenas em localidades que já apresentaram casos emblemáticos de racismo.

Direito à vida, execuções, desaparecimentos forçados, tortura e tratamentos cruéis e degradantes

31. Adotar medidas integradas entre governos estaduais e federal para garantir maior responsabilização para prevenir mortes e homicídios com especial atenção para a situação no campo e dos povos indígenas.

32. Adotar medidas urgentes e efetivas em nível federal e estadual para conter a ação de grupos armados ou milícias que atacam comunidades indígenas, com especial atenção para a situação no Mato Grosso do Sul, Paraná e Bahia.

33. Adotar medidas para prevenir e combater a tortura nos níveis estadual e federal e adotar medidas de reparação e retração pelas comprovadas violências e torturas cometidas pelo Estado contra pessoas e povos indígenas.

34. Investigar e punir casos de mortes de lideranças indígenas em contexto de disputa territorial.
Adotar medidas específicas para combater a impunidade em casos de agressão e morte de pessoas indígenas.

Justiça e impunidade

35. Criar mecanismos para recebimento de denúncias e condução de investigações imparciais de casos de prisões arbitrárias, atos de racismo e mortes de indígenas resultando na efetiva responsabilização de agentes públicos envolvidos.

36. Dar seguimento e consequências aos processos de busca da verdade e da justiça de transição envolvendo violações de direitos cometidas contra pessoas e povos indígenas e adotar medidas para prevenir, reparar e compensar violações de direitos humanos cometidas contra pessoas e povos indígenas, implementando as recomendações da Comissão Nacional da Verdade.

37. Adotar medidas para reparar e compensar violações de direitos humanos contra os povos indígenas Guarani, Cinta Larga, Waimiri-Atroari,Tapayuna, Yanomami, Xetá, Panará, Parakanã, Xavante de Marãiwatsédé, Araweté e Arara, tal como identificadas pela Comissão Nacional da Verdade.

38. Adotar medidas urgentes para prevenir, punir e reparar ataques violentos e ou racistas contra comunidades indígenas, com especial atenção para os estados da Bahia, Mato Grosso do Sul, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.

39. Responsabilizar administrativa, civil e criminalmente os agentes de Estado que deliberadamente ou sem justificativa retraem os procedimentos de demarcação de terras indígenas.

Violações de direitos humanos por agentes de Estado

40. Apurar a responsabilidade administrativa, civil e criminal de agentes públicos envolvidos em ações e omissões que violam direitos humanos dos povos indígenas, inclusive colocando comunidades indígenas em situação de vulnerabilidade extrema.

Condições das prisões

41. Identificar a situação da população carcerária indígena no país e adotar medidas que garantam condições adequadas de detenção; o devido processo legal; e a defesa de pessoas e comunidades indígenas, inclusive com a garantia de representantes indígenas em júris criminais.

42. Monitorar a situação de criminalização e encarceramento de lideranças indígenas no contexto de luta por direitos territoriais.

43. Aplicar penas alternativas a réus indígenas e regimes especiais de cumprimento de pena nos termos da lei e de modo a considerar a organização social, os usos e os costumes dos povos indígenas.

Proibição da escravidão e tráfico de pessoas

44. Estabelecer a cooperação nacional entre atores relevantes, bem como a cooperação internacional, a fim de combater tanto o tráfico interno e internacional quanto a exploração sexual de mulheres e crianças com especial atenção para a situação de pessoas indígenas e na faixa de fronteira.

45. Investigar, punir e adotar campanhas para prevenir casos e situações de escravidão praticada contra pessoas indígenas.

46. Criar órgãos ou mecanismos específicos nos órgãos já existentes para a fiscalização, prevenção e combate à exploração do trabalho, turismo sexual e tráfico de pessoas indígenas, especialmente em zonas rurais e regiões de fronteira.

Administração da Justiça e acesso à justiça

47. Facilitar o acesso à justiça dos povos indígenas na defesa de seus direitos individuais e coletivos adotando medidas específicas para o atendimento em áreas rurais inclusive garantindo o uso das línguas indígenas.

48. Assegurar a atuação de Defensores Públicos Federais na defesa de pessoas e comunidades indígenas e particularmente para a garantia do devido processo legal em casos criminais envolvendo pessoas indígenas.

49. Garantir a disponibilidade de defensores públicos federais a fim de reforçar as garantias do devido processo legal para povos indígenas em processos envolvendo direitos territoriais e outros direitos humanos.

50. Avaliar a situação e adotar medidas para garantir o acesso à Justiça aos povos indígenas promovendo ações de conscientização de operadores de direito sobre as especificidades dos povos indígenas.

51. Democratizar o poder judiciário garantindo o acesso dos povos indígenas às carreiras jurídicas por meio de ações afirmativas.

52. Revogar a Portaria nº. 303 e subsequentes da AGU e retomar os processos de demarcação de terras indígenas com a devida defesa dos direitos indígenas pelas Procuradorias Federais Especializadas da Funai.

53. Adotar medidas para impedir a criminalização e encarceramento de lideranças indígenas.

54. Revisar a legislação que ampara o uso de recursos como a suspensão de liminar e antecipação de tutela comprometendo a aplicação do direito de consulta dos povos indígenas nas decisões administrativas que os afetam.

55. Reconhecer, reparar e indenizar as violações de direitos humanos dos povos indígenas decorrentes da ação, atraso ou omissão do Estado, inclusive do sistema de justiça, relacionados à proteção de direitos territoriais indígenas.

56. Reconhecer sistemas de justiça e de resolução de conflitos próprios dos povos indígenas quando existentes.

Liberdade de opinião e expressão. Liberdade de associação, crença e religião

57. Destinar recursos para e implementar ações de prevenção de práticas de racismo e discriminação racial contra povos indígenas.

58. Estabelecer procedimentos oportunos e proporcionais para garantir o direito de resposta e a liberdade de opinião e expressão dos povos indígenas junto aos meios de comunicação.

59. Garantir direito de uso das línguas indígenas em espaços públicos ou privados, como forma de liberdade de expressão dos povos indígenas.

60. Além de ampliar as ações de registro e documentação de línguas indígenas, desenvolver mecanismos e ações para fortalecer e proteger as línguas indígenas contra o risco de perda ou extinção.

61. Respeitar e proteger o uso da língua indígena nas escolas indígenas.

62. Garantir o acesso dos povos indígenas aos recursos naturais necessários às suas práticas espirituais, religiosas e culturais.

63. Demarcar e proteger as terras indígenas e lugares sagrados necessários a suas práticas espirituais, religiosas e culturais.

Direitos relacionados à identidade, nacionalidade e documentação civil

64. Dar continuidade às ações e políticas para garantir o direito de documentação básica de pessoas indígenas, garantindo-se o uso de nomes indígenas de acordo com seus costumes e tradições.

65. Garantir o direito de registro de nascimento de crianças indígenas que nascem em terras indígenas e o registro tardio de nascimento de adultos indígenas.

Direito de participação na vida pública e direito de voto

66. Adotar políticas de ação afirmativa para ampliar a representação indígena, inclusive de mulheres indígenas, nos poderes executivo, legislativo e judiciário em todos os níveis da federação.

67. Garantir a participação efetiva de representantes dos povos indígenas nos espaços colegiados de consulta e deliberação do poder executivo em todos os níveis de governo.

Direitos econômicos, sociais e culturais

68. Demonstrar avanços no programa de reforma agrária e aos processos de demarcação de terras indígenas em todo o país e com especial atenção às regiões centro-sul e nordeste do país.

69. Evitar sobreposições de assentamentos de reforma agrária e demarcação de terras indígenas de forma a prevenir conflitos no campo.

70. Coordenar os processos de reconhecimento de direitos territoriais e demarcação de terras indígenas, quilombolas e de comunidades tradicionais de modo a evitar conflitos no campo.

71. Garantir os direitos econômicos sociais e culturais dos povos indígenas por meio da implementação de políticas públicas de proteção territorial, e de respeito e fortalecimento socio-cultural e ambiental nas terras indígenas.

Direito a um padrão de vida adequado

72. Aplicar indicadores social e culturalmente adequados para aprimorar políticas de redução da pobreza voltadas a povos indígenas, garantindo o acesso dos povos às terras indígenas e protegendo-os de intimidações, ameaças, mortes e despejos.

73. Garantir a adequação cultural de programas sociais, como o Bolsa família, contemplando a participação dos povos indígenas na sua formulação, execução e avaliação.

74. Reconhecer e valorizar modos de vidas indígenas na concepção de programas de inclusão social.

75. Continuar os esforços para demarcar as terras indígenas e eliminar as vulnerabilidades de povos indígenas em situação de extrema pobreza.

Direito à alimentação e moradia adequados

76. Adotar medidas urgentes para a garantia da segurança alimentar dos povos indígenas com particular atenção para os casos de insegurança alimentar causados pela falta de demarcação de terras indígenas.

77. Adotar medidas urgentes para a garantia da segurança alimentar dos povos indígenas em terras demarcadas mas sem condições adequadas de sustentação física e cultural.

78. Adotar medidas urgentes para a garantia da segurança alimentar dos povos indígenas afetados e pela expansão de monoculturas no entorno de terras indígenas, inclusive com envenenamento se águas, solos e ar.
79. Reduzir os índices de mortalidade e desnutrição infantil indígena e a disparidade entre os índices da população indígena e não-indígena.

80. Garantir o direito à moradia culturalmente adequada para a população indígena que mora nas áreas urbanas e garantir que os programas de habitação popular urbana contemplem as especificidades dos povos indígenas.

81. Garantir condições de moradia adequada a povos indígenas com especial atenção à situação de vulnerabilidade de comunidades indígenas em acampamentos aguardando a demarcação de terras indígenas.

82. Acelerar os processos de demarcação de terras indígenas de comunidades que se encontram em situação de vulnerabilidade devido à falta de acesso ao direito de moradia adequada.

Direito à saúde

83. Garantir efetivamente serviços de saúde gratuitos, de qualidade, específicos e diferenciados para povos indígenas por meio do Sub-sistema de Saúde Indígena, fortalecendo a Secretaria Especial de Saúde.

84. Indígena e o Sistema Único de Saúde para o atendimento de média e alta complexidade de pessoas indígenas e ampliar a cobertura de vacinas na população indígena.

85. Reduzir mortalidade infantil e materna promovendo medidas de assistência médica pré-natal e no momento do parto que sejam social e culturalmente adequadas às mulheres indígenas, sem a imposição da realização de cirurgias cesarianas.

86. Demonstrar avanços no sentido de reconhecer, valorizar e incorporar as práticas e conhecimentos tradicionais dos povos indígenas nos processos de atendimento médico e de saúde e avançar na implementação de saneamento básico em terras indígenas considerando as especificidades culturais dos povos.

87. Desenvolver um programa específico para atendimento à saúde de mulheres indígenas considerando suas especificidades culturais.

88. Fortalecer a Secretaria Especial de Saúde Indígena e adotar medidas para garantir a participação indígena autônoma no mecanismo de controle social das políticas de saúde indígena sem interferências política partidária.

89. Garantir o acesso à saúde de indígenas nas cidades e em seus territórios, independente da situação fundiária em que se encontre.

90. Adotar programas de formação de indígenas em ciências da saúde para atuar dentro de seus territórios.

Direito à educação

91. Respeitar os modos de vidas e os projetos político-pedagógicos dos povos indígenas.

92. Garantir o cumprimento da legislação nacional de educação escolar indígena por meio da implementação efetiva dos territórios etnoeducacionais; monitoramento e controle social dos recursos aplicados na educação escolar indígena; e contratação de professores indígenas por meio de concursos diferenciados.

93. Adotar medidas administrativas e legislativas para garantir direitos trabalhistas e isonomia salarial para professores indígenas.

94. Demonstrar avanços na oferta de matrículas no ensino médio bilíngue e intercultural nas escolas das aldeias indígenas.

95. Demonstrar avanços nos programas e projetos de elaboração e publicação de materiais didáticos bilíngues, valorizando as línguas, culturas e conhecimentos tradicionais dos povos indígenas.

96. Adotar medidas urgentes para oferecer e adequar estruturas físicas para o funcionamento das escolas nas aldeias indígenas.

Discriminação e violência contra mulheres

97. Adotar medidas legais e práticas para eliminar a violência e discriminação contra mulheres indígenas, particularmente em contexto de luta por direitos territoriais, bem como de empreendimentos e grandes obras que impactam os territórios.

98. Adotar mecanismo específico para receber denúncias e adotar providências céleres para prevenir, apurar e reverter casos de discriminação racial e violência praticada contra povos indígenas.

99. Assegurar políticas de acesso dos povos indígenas, especialmente das mulheres indígenas, a serviços de saúde, educação, emprego, moradia e assistência social.

Direitos das Crianças

100. Garantir nas políticas públicas e planos nacionais as especificidades relacionadas à de jovens e crianças indígenas de modo a não reforçar estereótipos e preconceitos contra os povos indígenas, mas efetivamente proteger seus direitos, observando-se o respeito às formas de organização social dos povos indígenas.

101. Impedir a retirada de crianças indígenas do convívio familiar e comunitário fundadas em discriminação racial, étnica e socioeconômica.

Direitos dos Povos Indígenas

102. Estabelecer procedimentos necessários para a administração pública de modo a garantir a implementação e o monitoramento do direito dos povos indígenas serem consultados nos termos da Convenção 169 da OIT.

103. Garantir a proteção e promoção dos direitos indígenas, especialmente com relação a suas terras, territórios tradicionais e recursos naturais; e direito de serem consultados.

104. Consultar os povos indígenas e quilombolas sobre quaisquer medidas que visem regulamentar o direito de consulta garantindo o reconhecimento dos protocolos de consultas de povos indígenas sem impor restrições ao direito de consulta e consentimento previstos na Convenção 169 da OIT.

105. Garantir a adequada consulta e a plena participar!ao dos povos indígenas em todas as medidas legislativas e administrativas que os afetem, particularmente para prevenir retrocessos na defesa e promoção dos direitos humanos dos povos indígenas.

106. Respeitar e garantir, inclusive com previsão de alocação orçamentária, processos indígenas de elaboração autônoma de protocolos de participação, consulta e consentimento conforme as formas de organização social dos povos indígenas e das comunidades tradicionais.

107. Assegurar a participação efetiva e qualificada dos povos e organizações indígenas na formulação, implementação e avaliação de políticas ou medidas mitigatórias ou compensatórias relacionadas a empreendimentos que impactam seus territórios.

108. Atualizar os limites das terras indígenas delimitadas antes de 1988 e que não atendem às prescrições constitucionais, submetendo-as a novos procedimentos demarcatórios.

109. Garantir que os povos indígenas possam defender sem discriminação seus direitos territoriais e de consulta relacionados a obras e projetos de desenvolvimento que afetem seus territórios, recursos naturais e formas de organização social.

110. Concluir os processos de demarcação pendentes, em especial aqueles relacionados aos Guaranii, Kaiowá, Terena, Kaingang , Pataxó e Tupinambá, como forma de solucionar graves conflitos que assolam esses povos.

111. Dar mais atenção, em todos os níveis da administração, à promoção dos direitos dos povos indígenas e evitar retrocessos, especialmente garantindo a demarcação de terras indígenas nas regiões Sul, Sudeste, Centro-Oeste e Nordeste.

Defensores de Direitos Humanos

112. Avaliar e fortalecer o Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos com especial atenção para o atendimento de defensores de direitos humanos indígenas.

113. Aprimorar a proteção de defensores de direitos humanos indígenas, especialmente lideranças indígenas que lutam por direitos de suas comunidades e investigar as causas do aumento do número de casos de ameaças, violências e mortes de lideranças indígenas nos últimos 04 anos.

114. Adotar medidas em nível federal que sejam protetivas e eficazes para as comunidades em situação de conflito e para as lideranças indígenas ameaçadas.

115. Tomar medidas necessárias e específicas para garantir a integridade física de lideranças indígenas especialmente no contexto de defesa de seus direitos coletivos.

Meio Ambiente

116. Proteger as terras e territórios indígenas contra o desmatamento e a degradação ambiental e reconhecer a contínua proteção dos povos indígenas ao meio ambiente.

117. Garantir dotação orçamentária para implementação da Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental enquanto política de Estado.

118. Respeitar o direitos dos povos indígenas de dizer não sobre medidas administrativas e legislativas que os afetem.

119. Garantir que os processos de implementação do direito à consulta a povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais acerca de obras e projetos de desenvolvimento que os afetem diretamente seja considerado em todas as etapas de tomada de decisão pública desde o planejamento, o licenciamento, a execução e o monitoramento das obras.

120. Reconhecer, reparar, compensar e indenizar casos de violações de direitos socioambientais decorrentes da não-realização, do atraso ou de outros vícios relacionados à implementação de processos de consultas efetivamente livres, prévias e informadas.

121. Adotar medidas de maneira consultada para efetivamente proteger as terras indígenas e as áreas sagradas contra a exploração de recursos naturais e degradação ambiental.

122. Proteger as terras indígenas dos efeitos negativos das mudanças climáticas, reconhecer e fortalecer os conhecimentos indígenas sobre seu meio ambiente e para o combate ao aquecimento global.

123. Respeitar os direitos e os interesses dos povos indígenas protegidos constitucional e internacionalmente e consultá-los em temas relacionados a suas terras, autonomia, línguas, meio ambiente e projetos de desenvolvimento.

124. Fortalecer as legislações nacionais sobre meio ambiente considerando os direitos humanos dos povos indígenas com especial atenção para o direito ao ambiente saudável, direito à saúde e à consulta livre, prévia e informada.

125. Avançar no reconhecimento e na proteção de terras indígenas como áreas ambientalmente protegidas e significativas para a preservação da sociobiodiversidade e do desenvolvimento sustentável.

126. Promover estudos e levantamentos sobre as formas que os povos indígenas estão se adaptando às mudanças climáticas e apoiar suas iniciativas.

Direito ao Desenvolvimento, Direitos Humanos e Empresas

127. Implementar as recomendações do Grupo de Trabalho de Empresas e Direitos Humanos com relação à proteção de direitos territoriais, ambientais e de consulta e autonomia dos povos indígenas.

128. Monitorar o impacto e adotar medidas para reverter ou compensar danos ambientais e situações de violações de direitos humanos dos povos indígenas por particulares, empresas e empreendimentos.

129. Garantir a participação e o reconhecimento da contribuição dos povos indígenas na construção de uma nova matriz e perspectiva de desenvolvimento econômico, social, político e cultural do país.

130. Respeitar a autonomia dos povos indígenas na definição de seus planos de desenvolvimento de acordo com seus modos de vida e visões de mundo.

Fonte: Plataforma Dhesca

Edição de outubro da revista Policy in Focus trata sobre segurança alimentar e nutricional

Os desafios envolvidos na realização do desenvolvimento Direito à Alimentação e  à Nutrição Adequadas (DHANA) e soberania e segurança alimentar e nutricional nos países da África e no Brasil, compreendem diferentes elementos, mas também compartilham várias semelhanças. Embora haja evidência de uma redução significativa da fome e desnutrição em todo o mundo, observa-se que esta fenômeno não ocorreu no mesmo ritmo em determinados países da África e em algumas regiões do Brasil. Ao mesmo tempo, houve um rápido aumento das taxas sobrepeso, obesidade e doenças relacionadas, como diabetes, doenças cardíacas, vários tipos de câncer, etc.

Esta é a síntese do 13º volume da revista Policy in Focus de outubro de 2016, publicada pelo PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento. Nesta edição, a publicação apresenta vários artigos, entre eles “The realisation of the human right to adequate food and nutrition and the principle of prohibition of social regression as an argument for social struggles” de autoria da secretária geral da FIAN Brasil, Valéria Burity, que trata da realização do direito humano à alimentação e à nutrição adequadas e o princípio da proibição da regressão social como argumento para as lutas sociais.

Policy in Focus é a publicação mais importante do IPC-IG. A revista tem o objetivo de sintetizar os debates e discussões em políticas públicas, educar e aumentar a conscientização sobre temas específicos de desenvolvimento. A cada edição, uma ampla gama de perspectivas e opiniões sobre um assunto específico é reunida em uma coleção de artigos escritos por especialistas. Os temas abrangem assuntos diversos como a crescente classe média no mundo em desenvolvimento, as Mulheres Protagonistas e Juventude e Emprego nos países BRICS.

A revista está disponível para download (em inglês) AQUI.

A extinção do CONSEA aumenta as ameaças contra a alimentação adequada e saudável da população brasileira. Foto: EBC

Agência da ONU lança espaço virtual para troca de informações sobre alimentação e nutrição

A Organização Pan-Americana da Saúde/Organização Mundial da Saúde (OPAS/OMS) lançou um espaço virtual para a troca de informações e experiências sobre alimentação e nutrição.

A Organização Pan-Americana da Saúde/Organização Mundial da Saúde (OPAS/OMS) lançou no sábado (29) em Porto Alegre um espaço virtual (clique aqui) para a troca de informações e experiências sobre alimentação e nutrição.

Resultado de uma parceria entre OPAS/OMS, Ministério da Saúde e o Observatório de Políticas de Segurança Alimentar e Nutrição (da Universidade de Brasília), o portfólio da Rede de Alimentação e Nutrição do Sistema Único de Saúde (RedeNutri) foi apresentado durante o 24º Congresso Brasileiro de Nutrição (CONBRAN). O material faz parte da Biblioteca Virtual de Saúde, operada pelo Centro Latino Americano de Informação em Ciências da Saúde (BIREME).

Atualmente, a RedeNutri tem mais de 35 mil usuários, entre nutricionistas, estudantes, pesquisadores, professores, gestores e diversos outros profissionais do setor público e privado, além de organizações não governamentais.

A variedade de participantes tem qualificado debates e proposições da rede. Professores podem utilizar o espaço para indicar cursos online, exibir vídeos, analisar casos didáticos, enquanto os alunos têm acesso a diversas publicações recentes e gratuitas. Os gestores e outros profissionais também podem utilizar os recursos da RedeNutri para formação, atualização e educação permanente.

De acordo com a consultora de nutrição da OPAS/OMS no Brasil, Alice Medeiros, a participação é aberta, sendo necessário apenas um cadastro online. “Todos os participantes podem contribuir com a rede, compartilhando suas ideias por meio de textos, notícias, vídeos, relatos de experiências, fóruns, entre outras atividades. Uma equipe de moderação busca garantir que o debate seja sempre respeitoso, democrático e ético”, explicou Alice.

Acesse abaixo as publicações apresentadas pela OPAS/OMS durante o 24º Congresso Brasileiro de Nutrição:

Portofólio da RedeNutri
Perspectivas e desafios no cuidado às pessoas com obesidade no SUS: resultados do Laboratório de Inovação no manejo da obesidade nas Redes de Atenção à Saúde
Modelo de Perfil Nutricional da Organização Pan-Americana da Saúde
Plano de Ação para Prevenção da Obesidade em Crianças e Adolescentes

Fonte: Nações Unidas

Nota da FIAN Brasil sobre recente decisão judicial que proíbe a entrada de alimentos em escola ocupada do DF

A FIAN Brasil manifesta por meio desta nota seu repúdio à decisão de 30 de Outubro de 2016 do Poder Judiciário do Distrito Federal e Territórios, referente ao Processo nº 2016.01.3.011286-6, que determina a desocupação do Centro de Ensino Asa Branca de Taguatinga. Na citada decisão o magistrado Alex Costa de Oliveira autoriza o uso dos mais diversos meios para a desocupação, incluindo o impedimento da entrada de alimentos na escola, bem como o corte dos fornecimentos de água, energia elétrica e gás, e “o uso de instrumentos sonoros contínuos, direcionados ao local da ocupação, para impedir o período de sono”.

Em nossa visão a decisão atenta diretamente contra diversos direitos humanos consolidados na legislação nacional e internacional, dentre eles o Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas (DHANA). Isto se dá pela explícita autorização para o impedimento, com o uso de força policial, da entrada de alimentos na citada ocupação, bem como pelo corte de serviços essenciais que garantem direitos humanos correlatos, como a água.

A FIAN Brasil lembra que o Direito Humano à Alimentação é previsto na Declaração Universal dos Direitos Humanos, no Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais e em diversos outros instrumentos legais internacionais em vigor e ratificados pelo Brasil – todos eles com força de norma constitucional, conforme determinação expressa do art. 5º, § 3º de nossa Constituição Federal. Tal direito humano, assim como todos os demais, é inalienável a todos os seres humanos, não podendo ser limitado devido a quaisquer razões, incluindo as políticas. Neste sentido e para além da legislação internacional, o art. 6º caput da Constituição Federal, bem como a Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional (Lei nº 11.346/2006) e outros instrumentos normativos internos também garantem como responsabilidade do Estado Brasileiro o respeito, a proteção, a promoção e a provisão do Direito Humano à Alimentação de todos/as os/as cidadãos/ãs.

Sendo assim, a FIAN Brasil entende que a citada decisão não só criminaliza os/as estudantes em suas lutas sociais, como também atenta contra o Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas de tais estudantes, impedindo diretamente processos de exigibilidade de direitos humanos.

Brasília, 01 de Novembro de 2016.

Plataforma Dhesca debate conjuntura e estratégias da rede e elege nova coordenação

Representantes de organizações filiadas à Plataforma de Direitos Humanos – Dhesca Brasil e de entidades parceiras se reuniram em Brasília nos dias 27 e 28 de outubro para a 6ª Assembleia Geral Ordinária da rede. Foram dois dias de ricos debates sobre a conjuntura nacional e de deliberações sobre as estratégias para os próximos dois anos. Entre os participantes também esteve a Relatora de Direitos Humanos e Povos Indígenas da Plataforma Dhesca, Erika Yamada.

A mesa de abertura apresentou um panorama da conjuntura nacional e os desafios para a defesa dos direitos humanos no país. Na avaliação de Leandro Scalabrin, coordenador da Plataforma Dhesca e representante do Movimento dos Atingidos Por Barragens – MAB, vivenciamos o final de um ciclo que tinha uma política de conciliação de classe, e que o novo cenário apresenta um quadro em que as correntezas contrárias têm atuado de forma mais intensa. “Atualmente o Brasil vive um estado de exceção, uma ditadura constitucional. Neste cenário qual o ideário aglutinador? Nenhum direito a menos!”, concluiu Leandro.

A Subprocuradora-geral da República e Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, Dr.ª Deborah Duprat, destacou a atuação da Procuradoria na defesa dos direitos constitucionais e dos direitos humanos. Dentre as ameaças aos direitos destacou o fato em que um conjunto de produtores rurais chegou a fazer um leilão com o objetivo de arrecadar recursos para contratação de milícia armada para atacar indígenas, e que isso tem sido replicado nacionalmente. Por outro lado, fez menção à recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que rejeitou o enquadramento de movimentos sociais na lei de organização criminosa, ressalvando que os movimentos não podem ser criminalizados. “O momento é de atuar em rede. Temos que perceber as dinâmicas de atuação em uma luta comum, reconhecendo as nossas diferenças. Este é um momento de judicializar a disputa e questionar a perda de direitos”, avaliou.

O presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, Padre João Carlos Siqueira, falou sobre o cenário de retrocessos na Câmara. Segundo ele, projetos que tramitavam há anos agora ganham força e estão sendo retomados, numa estratégia que significa retirar direitos e deixar morrer por inanição políticas de direitos humanos. “Nunca iremos avançar sem ir além do executivo e legislativo. É preciso enfrentar o debate junto com o judiciário e também setores do Ministério Público que têm atuado a serviço da retirada de direitos”, afirmou Pe. João.

Márcio Barreto, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST, destacou a criminalização contra movimentos sociais e defensores de direitos humanos. “O processo de criminalização não vem apenas das forças repressivas. Nunca houve na história uma composição congresso tão conservador. Este ofensiva tem sido homologada pelo judiciário, inclusive por ministros que foram nomeados com apoio dos movimentos sociais”, afirmou. Para Márcio, o desafio é a luta por mais direitos e mais democracia, lutar nas ruas, apoiar os movimentos estudantis.

Desafios da Rede

As reflexões  feitas a partir do diálogo realizado na mesa de abertura permearam os debates durante todo o evento. A conjuntura política nacional exige da Plataforma Dhesca Brasil e de suas filiadas ações que respondam ao quadro de graves violações de direitos humanos no país, combinadas com o fortalecimento do campo das organizações que atuam na defesa dos direitos humanos, na luta por mais direitos e mais democracia.

Neste contexto, o papel das Relatorias em Direitos Humanos – criadas em 2002 com o desafio de diagnosticar, relatar e recomendar soluções para violações apontadas pela sociedade civil – segue sendo fundamental. Para o próximo período a assembleia propôs as seguintes agendas prioritárias: genocídio da juventude negra, temáticas ligadas ao Direito à Cidade, criminalização dos movimentos sociais, acesso à justiça, privação de liberdade e os temas que já vinham sendo abordados no último ano pelas Relatorias – Povos Indígenas e Laicidade do Estado, com recortes transversais de gênero e raça e modelo de desenvolvimento.

Além de manter o formato de Relatorias temáticas com mandato definido, como já acontece desde que foram criadas, o projeto poderá contar com um Grupo de Relatoras/es que atuem em demandas emergenciais – como no caso recente das ocupações de escolas, onde tem acontecido flagrantes de violações de direitos. Isto possibilitará maior velocidade de resposta à conjuntura e ao contexto, dando às Relatorias mais flexibilidade a agilidade. A metodologia de trabalho das próximas Relatorias será debatida num seminário de avaliação e planejamento.

Outro ponto importante discutido foi a necessidade de busca por mais adesões da Campanha Mais Direitos Mais Democracia. Criada a partir de um amplo debate realizado pela Plataforma Dhesca e Articulação para o Monitoramento dos Direitos Humanos no Brasil e respectivos movimentos e organizações filiadas e parceiras, a campanha tem como objetivo fazer uma disputa de valores no campo dos direitos humanos e da garantia e ampliação da democracia no Brasil. Ela é fruto da necessidade de se combater a perda de direitos conquistados, que vem sendo promovida pela soma das parcelas de políticos ligados à chamada bancada conservadora e fundamentalista.

Adesão de novas organizações e eleição da nova Coordenação

Além de discutir as estratégias e ações políticas para os próximos anos, a assembleia elegeu a nova Coordenação Colegiada para um mandato de dois anos. As organizações eleitas foram: Ação Educativa, Cfemea – Centro Feminista de Estudos e Assessoria, Geledés – Instituto da Mulher Negra, Intervozes Coletivo Brasil de Comunicação, Justiça Global, Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST, Movimento Nacional de Direitos Humanos – MNDH, Sociedade Maranhense de Direitos Humanos e Terra de Direitos.

Foram aprovadas, ainda, a adesão de duas novas entidades à rede: o Instituto de Desenvolvimento e Direitos Humanos – IDDH e o Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social. Além destas, duas outras organizações manifestaram seu interesse em integrar a Plataforma e encaminharão as solicitações de adesão, o Centro de Defesa da Criança e do Adolescente – Cedeca Ceará e a Via Campesina.

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Fonte: Plataforma Dhesca

Corte no Orçamento da Funai está em choque com princípio da vedação ao retrocesso social

Documento recentemente lançado pela Fian Brasil – O Direito Humano à Alimentação Adequada e Nutrição do Povo Guarani e Kaiowá – traz dados alarmantes sobre a situação de insegurança alimentar e nutricional deste povo. Em três comunidades pesquisadas o índice de insegurança alimentar era de 100% contra a média de 26,6% da população brasileira. O estudo atribuiu as precárias condições de vida que enfrentam os Guarani e Kaiowá, dentre outros fatores, à falta de respeito à sua cultura, à falta de demarcação de seus territórios, à violência a que estão submetidos e à falta ou inadequação de políticas públicas específicas para estes povos. Situações graves de violações de direitos como essas podem se agravar não só para os Guarani e Kaiowá, mas para todos os povos indígenas do Brasil.

Michel Temer apresentou ao Congresso Nacional a menor proposta de orçamento para a Fundação Nacional do Índio (FUNAI) dos últimos 10 anos, com o teto de 110 milhões de reais para despesas discricionárias da instituição. Há 09 anos havia sido aprovado um valor de 120,4 milhões de reais. Como destacou o Secretário Executivo do CIMI, se levarmos em consideração a inflação acumulada do período, estamos falando de 60,88% de perda orçamentária. Em 2013 o orçamento aprovado foi de R$ 194 milhões.

Se mesmo com investimento em programas sociais e com maior orçamento para ações que mantém estreita conexão com direito humano à alimentação e Nutrição adequada os povos indígenas estavam sofrendo graves violações de todos os seus direitos, a proposta de corte no orçamento, sem que haja qualquer justificativa devidamente fundamentada para essa redução no Orçamento da FUNAI, já é em si um grave retrocesso que viola direitos humanos e representa o absoluto desrespeito aos compromissos internacionais e nacionais assumidos pelo Estado Brasileiro.

A propósito, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), por outros motivos, já afirmou que, de acordo com o Protocolo de San Salvador, ratificado pelo Brasil em 1996, é proibido ao Estado qualquer retrocesso de direitos econômicos, sociais e culturais (direitos como terra, educação, saúde, alimentação e nutrição, entre outros). A CIDH sugeriu que cortes em programas sociais anunciados pelo governo interino poderiam configurar infração ao referido Protocolo.

Isso porque, em relação aos direitos humanos, os Estado devem obedecer ao Princípio da Vedação do Retrocesso Social, que remonta à década de 1970, quando se discutiu na Alemanha, em razão de crise econômica, restrições a “benefícios” sociais (Continentino, 2015) . O Princípio foi conceituado como cláusula de “proibição de ‘contra-revolução social’ ou da ‘evolução reaccionária’. Com isto quer dizer-se que os direitos sociais e econômicos (…), uma vez obtido um determinado grau de realização, passam a constituir, simultaneamente, uma garantia institucional e um direito subjectivo” (Canotilho, 2006) . [1]

Alguns tribunais vem flexibilizando a adoção deste princípio, fenômeno chamado de “jurisprudência da crise”, isto é, passaram a admitir que crises econômicas justificam a involução de direitos. Mas ainda se reconhece que, mesmo em períodos de contingências, este princípio está atrelado à democracia econômica e social e impõe limites aos legisladores e demais agentes públicos (Continentino, 2015).

Nesse sentindo, um dos instrumentos que expõe de maneira mais elucidativa o princípio de vedação de retrocesso social é o Comentário Geral (CG) nº 3 do Comitê de Direitos Econômicos e Sociais da ONU, documento que descreve as obrigações que os estados assumem quando ratificam o Pacto de Direitos Econômicos Sociais e Culturais (PIDESC), 164 países, em todo mundo,ratificaram ou aderiram a este tratado, o que inclui o Brasil.

Este CG afirma que o artigo 2.1 do PIDESC contém um mandato de progressividade para a plena realização de direitos nele inscritos, a qual apresenta uma dimensão positiva e outra negativa. A positiva impõe a obrigação de adotar medidas de respeito, proteção, promoção e provimento dos direitos previstos no Pacto. A negativa impõe aos Estados a obrigação de se abster de adotar medidas que impliquem retrocesso aos progressos alcançados em relação a esses direitos (Defensoria Del Pueblo de Colômbia, 2009) . [2]

De outro lado, o parágrafo 9 do CG nº 3 determina que os Estados devem demonstrar que estão fazendo uso do máximo dos recursos disponíveis de que disponham para garantir direitos humanos e, ainda, que eventuais retrocessos devem ser plenamente justificados no contexto da totalidade dos direitos previstos no pacto. Portanto, havendo alguma circunstância concreta que exija a involução do processo de implementação de direitos, é imperativo demonstrar que a medida atende ao princípio da proporcionalidade, isto é, é necessária, é a mais efetiva e é a menos prejudicial para os titulares de direito (Continentino, 2015).

Nesse sentido, o Princípio de Vedação ao Retrocesso, assim como a abordagem de direitos humanos, são importantes argumentos políticos para enfrentar os grandes retrocessos que estão sendo impostos ao Povo Brasileiro e, nesse momento com a redução do orçamento da FUNAI, mais uma vez aos povos indígenas.

Historicamente as lutas sociais têm provocado o reconhecimento de direitos nos instrumentos legais da superestrutura da nossa sociedade, isto é em diversas normas nacionais e internacionais de proteção de direitos humanos e promoção de políticas públicas, esse reconhecimento pode e deve retroalimentar essas mesmas lutas, em um ciclo contra hegemônico de construção e exigibilidade de direitos.

Valéria Burity é mestre em Ciências Jurídicas pela Universidade Federal da Paraíba (2005). Advogada. Secretária Geral da Fian Brasil.


[1] Canotilho, Gomes (1998). Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Almedina

[2] Defensoria Del Pueblo de Colômbia (2006). El Derecho a la Alimentación en La Constitución, La Jurisprudencia y los Instrumentos Internacionales. Serie Desc. Bogotá, D. C

 

Publicado, originalmente, no site Justificando.

Retrocesso e criminalização: diagnósticos de ameaças aos direitos dos povos indígenas

Com o avanço de forças conservadoras e o governo de Temer, situações graves de violações de direitos podem se agravar

 
Cortes no orçamento da Fundação Nacional do Índio (Funai), mudanças em seu corpo administrativo, reinstalação da CPI do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) e da Funai, utilização da Tese do Marco Temporal e Tradicional, avanço de proposições legislativas como a PEC 215, e muita violência. Este é o resumo do que representam nos últimos meses os retrocessos imputados aos povos indígenas pelo Estado Brasileiro.

O relatório especial das Nações Unidas sobre os direitos dos povos indígenas do Brasil, apresentado no último dia 20 de setembro em Genebra, na Suíça, enfatizou que o país não avançou e, inclusive, está piorando na proteção dos Direitos Indígenas. Além de tornar evidentes as violências e violações de direitos cometidas contra os povos originários, o Relatório da ONU também faz diversas recomendações para o Estado Brasileiro e expressa preocupação com relação às políticas implantadas desde maio de 2016.

Outro documento, lançado em agosto deste ano pela FIAN Brasil, “O Direito Humano à Alimentação Adequada e Nutrição do Povo Guarani e Kaiowá: um enfoque holístico” traz dados alarmantes sobre a situação de insegurança alimentar e nutricional deste povo. Em três comunidades pesquisadas o índice de insegurança alimentar era de 100% – em comparação, a média deste índice entre a população brasileira não-indígena é de 26,6%.

O estudo atribui esta gravíssima situação às precárias condições de vida que enfrentam os Guarani e Kaiowá, em que predominam a lentidão da demarcação de seus territórios tradicionais, a ausência de respeito à sua cultura, a violência física a que estão submetidos por ataques paramilitares e a ausência ou inadequação de políticas públicas específicas para estes povos. Com o avanço de forças conservadoras pelo país e com o governo de Michel Temer, situações graves de violações de direitos como essas podem se agravar não só para os Guarani e Kaiowá, mas para todos os povos indígenas do Brasil.

A demarcação de terras tem sido o pano de fundo de diversos conflitos que afetam os povos indígenas. Neste contexto, a luta histórica pela demarcação dos territórios tradicionais esbarra nas lutas políticas institucionais, bem como nas jurídicas. Dois grandes exemplos disto são a reinstalação da CPI do Incra e da Funai, no último dia 17 de outubro pela bancada ruralista, e o uso cada vez mais frequente da Tese Jurídica do Marco Temporal e Tradicional pelo Poder Judiciário.

A CPI do Incra/Funai tem sido utilizada para criminalizar entidades sociais que apoiam a luta pela demarcação das terras indígenas e quilombolas. É importante enfatizar que a citada CPI não atendeu a mandamentos constitucionais básicos como, por exemplo, a criação para apurar um “fato certo”, como mostra o requerimento de sua instalação.

A Tese do Marco Temporal e Tradicional, por sua vez, é uma criação jurídica que ocorreu no âmbito do julgamento do caso Raposa Serra do Sol no Supremo Tribunal Federal, em 2009. Em resumo, trata-se de impor a data da promulgação da Constituição Federal (5 de Outubro de 1988) como marco temporal para se reconhecer uma terra indígena: caso os indígenas não estivessem na área demandada àquela época, eles não teriam direito a ela. A exceção a tal regra se daria caso os povos originários estivessem pleiteando àquela época a posse da terra no Poder Judiciário, ou ainda se, àquela época, estivessem sofrendo violência física direta contra a ocupação. Esta teoria não abarca, portanto, milhares de casos em que os povos indígenas já haviam sido expulsos e não haviam ajuizado ações na justiça por quaisquer razões. Nos últimos anos o Poder Judiciário vem barrando a demarcação de terras indígenas com base nesta teoria, a exemplo das Terras Indígenas Limão Verde, Panambi-Lagoa Rica e Guyraroka, todas no estado do Mato Grosso do Sul.

Em paralelo a tais entraves, o presidente Michel Temer apresentou ao Congresso Nacional a menor proposta de orçamento para a Funai dos últimos 10 anos, com o teto de R$ 110 milhões para despesas discricionárias da instituição. Há nove anos havia sido aprovado um valor de R$ 120,4. Como destacou o Secretário Executivo do Cimi, Cleber Buzatto, se levarmos em consideração a inflação acumulada do período, estamos falando de 60,88% de perda orçamentária. Em 2013 o orçamento aprovado foi de R$ 194 milhões.

O que se via no Brasil até o início deste ano é que, mesmo com investimentos em programas sociais e com maior orçamento para ações que mantêm estreita conexão com os direitos humanos, tal como o direito à alimentação e à nutrição adequada, os povos indígenas estavam sofrendo graves violações de todos os seus direitos. Sendo assim, a atual proposta de corte no orçamento da FUNAI, sem que haja qualquer justificativa devidamente fundamentada, já é em si um grave retrocesso que viola direitos humanos e representa o absoluto desrespeito aos compromissos internacionais e nacionais assumidos pelo Estado brasileiro.

No Direito Internacional, por exemplo, o Princípio da Vedação do Retrocesso Social proíbe que se retroaja em matéria de direitos econômicos, sociais e culturais sem que haja graves razões que justifiquem tal retrocesso. Esta tem sido a interpretação da Corte Interamericana de Direitos Humanos em diversos casos já analisados. Em sentido semelhante, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos indicourecentemente que cortes anunciados pelo governo de Temer em programas sociais podem configurar infração ao Protocolo de San Salvador.

Ressalta-se assim, portanto, a importância de uma abordagem de direitos humanos nas lutas sociais, inclusive indígenas. Historicamente, tais lutas têm provocado o reconhecimento de direitos em instrumentos legais. Contudo, esse reconhecimento pode e deve retroalimentar essas mesmas lutas, em um ciclo contra hegemônico de construção e exigibilidade de direitos humanos que permitam a todos e todas uma vida digna em sociedades mais justas e igualitárias.

Flávia Quirino é jornalista

Lucas Prates é assessor de Direitos Humanos da FIAN Brasil

Valéria Burity é advogada e Secretária Geral da FIAN Brasil

Publicado, originalmente, no Brasil de Fato.

Crédito foto:  Marcelo Camargo/ Agência Brasil