Regulamentação da publicidade infantil continua a espera da lei

A demora reflete o poder que as indústrias de brinquedos e de alimentos têm para barrar qualquer iniciativa visando proteger a infância.


Um projeto de lei que regula a propaganda dirigida às crianças completou neste final de ano 15 anos na fila de espera para ser votado na Câmara dos Deputados.

A demora reflete o poder que as indústrias de brinquedos e de alimentos, as agências de publicidade e os veículos de comunicação têm para barrar qualquer iniciativa visando proteger a infância desse tipo de propaganda.

Além dos intrincados trâmites legislativos.

Tornou-se conhecido o caso do menino, na periferia de São Paulo, que ao ser detido pelo segurança de um supermercado tomando um danoninho, disse estar apenas querendo saber que gosto tinha esse produto tão anunciado na televisão.

Situações dramáticas como essa são os aspectos mais visíveis de um cotidiano marcado pelo martelar constante de apelos indiscriminados ao consumo infantil.

Eles estão, todos os dias e todas as horas, nos anúncios impressos, nos comerciais de rádio e TV, em banners na internet, nas embalagens de alimentos e brinquedos, na disposição de produtos nos pontos de venda entre tantas outras formas de sedução para o consumo.

Do lado oposto ao dos defensores da propaganda dirigida às crianças está o Instituto Alana que há dez anos mantém o projeto Criança e Consumo, voltado à defesa do público infantil.

O Instituto lançou o Caderno Legislativo: Publicidade Infantil, uma minuciosa análise do funcionamento do processo legislativo apresentada de forma didática junto com um apanhado atualizado do debate em torno da regulação da publicidade infantil no Brasil e no mundo.

Um dos aspectos centrais desse debate é o da vulnerabilidade das crianças diante dos apelos ao consumo. “A publicidade tem maior possibilidade de induzir ao erro as crianças até os 12 anos, quando não possuem todas as ferramentas necessárias para compreender o real”, diz um parecer do Conselho Federal de Psicologia,

Muitas delas, principalmente as mais novas, não conseguem diferenciar o entretenimento da propaganda.

Disso se vale a publicidade ao misturar nas embalagens de alimentos e brinquedos ídolos e heróis infantis, combinando produtos desses dois tipos na mesma mercadoria oferecida às crianças, realizando a chamada “venda casada”.

Os mais velhos, já entrando na adolescência, são atingidos por outras estratégias publicitárias.

Pesquisa da Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) realizada em 23 países, entre eles o Brasil, com 5 mil jovens de 12 anos, mostra a importância dos heróis televisivos e pop stars na imaginação infanto-juvenil.

Muitos deles transformam-se em garotos-propaganda, usando para vender mercadorias a aura conquistada em programas de entretenimento.

Além de estabelecer o consumo como ideal de vida, há outras conseqüências negativas produzidas por essa propaganda.

Duas delas são facilmente perceptíveis: a erotização precoce e a obesidade infantil.

A primeira é resultado da “entrada precoce e artificial no mundo adulto, desrespeitando assim a peculiar fase do desenvolvimento infantil”, diz a publicação do Instituto Alana.

“Conheço meninas de 4 ou 5 anos que só querem comer alface ou rejeitam certos modelos de roupa. Tudo para não parecerem gordas ou distantes das imagens propagadas pela TV e copiadas pelas amiguinhas”, diz a professora Jane Felipe da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, citada na publicação.

Por outro lado cresce a obesidade.

Segundo o Caderno Legislativo “observa-se um cenário assustador de epidemia de obesidade entre as crianças, chegando ao índice alarmante de 30% com sobrepeso e 15% obesas. As causas apontadas vão desde o aumento do consumo de produtos ricos em açucares simples e gorduras à intensa presença de televisão e computador nas residências”.

Embora a promulgação de uma lei que ponha fim a essa situação continue sendo protelada pelo Parlamento brasileiro, parte da sociedade já se deu conta dos malefícios impostos aos seus jovens pela comunicação mercadológica. São várias as entidades da sociedade civil engajadas nesse processo.

A proteção da criança e do adolescente diante da publicidade infantil já está garantida pela Constituição Federal, pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, pelo Código de Defesa do Consumidor e por uma resolução de 2014 do Conanda (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente).  

Falta, no entanto, uma lei específica capaz de esclarecer melhor o debate e garantir a eficácia no seu cumprimento.

É o que se espera do Congresso Nacional.

Por Laurindo Leal Filho.

Fonte: Carta Maior

CEPAL: autonomia das mulheres é imprescindível para a igualdade de gênero

A autonomia socioeconômica das mulheres é um requisito necessário e imprescindível para alcançar uma verdadeira igualdade de gênero na América Latina e no Caribe, alertou a diretora da divisão de assuntos de gênero da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL), María Nieves Rico. Ela lembrou que ao menos 12 mulheres são vítimas de feminicídio por dia na região.


A autonomia das mulheres é um requisito necessário e imprescindível para alcançar uma verdadeira igualdade de gênero na região latino-americana e caribenha, afirmou nesta terça-feira (10) a diretora da divisão de assuntos de gênero da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL), María Nieves Rico, no quarto capítulo de “Horizontes CEPAL”, novo programa multimídia desse organismo das Nações Unidas.

Em entrevista, a oficial da ONU abordou o processo de construção da agenda regional de gênero durante as últimas quatro décadas sob o enfoque de direitos humanos, e identificou os principais objetivos relacionados à autonomia das mulheres em três dimensões-chave: física, econômica e na tomada de decisões.

Dados oficiais dos países indicaram que ao menos 12 mulheres são assassinadas em média a cada dia na região só pelo fato de serem mulheres, alertou Rico no programa.

“A América Latina e o Caribe é a região do mundo com maiores avanços em legislação sobre violência contra as mulheres”, mas a vontade política expressada nessas leis não é suficiente para erradicar esse flagelo que se sustenta em padrões culturais patriarcais entranhados nas sociedades latino-americanas e caribenhas, explicou.

A Estratégia de Montevidéu, aprovada durante a XIII Conferência Regional sobre a Mulher de América Latina e Caribe realizada no fim de outubro no Uruguai, identificou essas práticas como um dos nós estruturais da desigualdade de gênero na região, disse a oficial da ONU.

A Estratégia de Montevidéu foi adotada para a implementação da agenda regional de gênero nos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) e na Agenda 2030.
Durante a entrevista, María Nieves Rico compartilhou alguns dos principais indicadores incluídos no documento “Autonomia das Mulheres e Igualdade na Agenda do Desenvolvimento Sustentável”, apresentado na reunião no Uruguai.

Ela lembrou, por exemplo, que uma em cada três mulheres na região não tem renda própria e que mais da metade (55%) não tem renda própria ou recebe menos que o salário-mínimo mensal de seu país. Entre as que têm renda, 23,6% têm renda pessoal abaixo da linha da pobreza.

A especialista afirmou também que a América Latina e o Caribe foi a primeira região do mundo a ter leis de cotas para aumentar a participação das mulheres nos cargos de representação popular. No entanto, em nenhum nível da tomada de decisões nos poderes do Estado as mulheres superam atualmente 25% (prefeituras e ministérios) ou 30% (parlamentos e tribunais de Justiça) do total, disse.

“A igualdade de gênero não é apenas igualdade de oportunidades, mas também de resultados”, concluiu Rico.

 

Fonte: ONU Brasil

Discurso de encerramento do mandato de Maria Emília L. Pacheco no Consea

Discurso de encerramento do mandato – Maria Emília L. Pacheco

Encerramos, hoje, nosso mandato da gestão 2012-2016, nesse importante Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, onde cheguei em 2004, conselheira representante do Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional, e em 2012, fui honrada com a indicação para assumir a presidência que busquei exercer de forma colegiada.

Nos últimos anos, tivemos a melhoria dos indicadores sociais, com a redução da extrema pobreza; a diminuição significativa da insegurança alimentar moderada e grave, da mortalidade infantil e da desnutrição.

A saída do Brasil do Mapa Mundial da Fome da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO-ONU), mostrou o acerto da adoção de estratégias intersetoriais concretizadas em iniciativas políticas como a valorização do salário mínimo, a garantia de emprego, a execução de programas de transferência de renda, como Bolsa Família, e a inovação de programas estruturantes a exemplo do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), o Programa de Alimentação Escolar ( PNAE), o Programa um milhão de cisternas (P1MC) e Uma terra e duas águas (P1+2), e a aprovação da Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica, que hoje sofrem fortes ameaças.

Mas no exercício crítico permanente de monitoramento e controle social que caracteriza esse Conselho, problematizamos a situação de insegurança alimentar grave que permanece entre os povos indígenas, segmentos da população negra, comunidades quilombolas. Debatemos sobre os problemas políticos e econômicos que impactam a soberania e segurança alimentar e nutricional, enfatizando que os trabalhadores e pobres não podem arcar com o ônus da crise. Defendemos reiteradamente as políticas redistributivas. Fizemos aflorar diferentes percepções e debates sobre temas controversos de forma democrática, como o impactos dos agrotóxicos e transgênicos, a premência da democratização do acesso à terra e direitos territoriais, e explicitamos alertas sobre os riscos de retrocessos e desconstrução de direitos que já se manifestavam nos governos anteriores nesse período.

Mas hoje, no contexto de ruptura democrática, com indignação constatamos que estamos mais longe da realização do Direito Humano à Alimentação Adequada, inscrito em nossa Constituição, desde 2009, fruto de significativa mobilização social, com ativa participação do Consea em interlocução com a Frente Parlamentar de Segurança Alimentar e Nutricional.

Tudo indica que estamos no caminho de volta do país ao Mapa da Fome, setenta anos depois do libelo expresso no livro “Geografia da Fome” de nosso patrono Josué de Castro, sobretudo diante da possibilidade de aprovação, nos próximos dias, no Congresso Nacional, da Proposta de Emenda Constitucional do teto dos gastos públicos (PEC 55) sobre a qual endereçamos, ontem um manifesto ao Senado Federal.

Esse cidadão do mundo, a quem novamente presto a minha homenagem, pelo seu compromisso com a justiça social, pelo seu legado histórico, ensinou-nos que não há exílio das idéias. Em meio às adversidades precisamos resistir.

Celebramos os passos dados até agora na construção do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan) como estrutura responsável pela formulação, implementação e gestão participativa da política de Segurança Alimentar e Nutricional em todos os níveis.

Mas como avançar nesse caminho quando se extingue o Ministério do Desenvolvimento Agrário e secretarias voltadas para os Direitos Humanos, Igualdade Racial e Políticas para as Mulheres, numa manifestação de descompromisso dos atuais governantes com os Sujeitos de Direitos, sobretudo nesse contexto de crescimento de onda conservadora nas manifestações de preconceitos, racismo e intolerância. Há muitos desafios também nos estados e municípios. Temos acompanhado com preocupação iniciativas de judicialização de Conseas. O momento atual requer estratégias claras de resistência no plano estadual e municipal. Diante dos grandes desafios, é importante também a construção da interface entre o Sisan e o Sistema Único de Assistencia Social (Suas) e Sistema Único de Saúde (Sus).

Quis a história que as minhas últimas atividades públicas como representante do Consea simbolizassem vários campos de ação do conselho e um chamamento sobre o quadro de ameaças, retrocessos e incertezas que vivemos.

A comitiva liderada pelo Consea, em visita à região dos povos indígenas das etnias Guarani e Kaiowá, no Cone Sul do Mato Grosso do Sul, constatou um quadro de violência com mortes por assassinato, preconceitos, violação de direitos humanos, em especial o Direito Humano à Alimentação Adequada.

Uma verdadeira tragédia humana! Assim podemos sintetizar a dura e dramática realidade de vulnerabilidade social, e de insegurança alimentar e nutricional grave desses povos.

Vare’á continuam gritando, como eu disse no meu discurso de posse em 2012, para falar da ausência do broto da semente; para falar da fome. Continuam vivendo a realidade de negação de seus Tekoha como lugar de pertencimento onde buscam a subsistência, produzem sua cultura, e cultivam a solidariedade e a generosidade. O lugar onde realizam o seu “modo de ser”.

A expansão do agronegócio, com um alto nível de degradação ambiental com contaminação por agrotóxicos do solo e dos mananciais, e o verdadeiro confinamento a que estão submetidos esses povos, estão a exigir dos poderes públicos, com respaldo de manifestação de apoio de órgãos internacionais, enfrentar a raiz dos problemas com o arquivamento da PEC 215 e resposta com demarcação e titulação de terra, a garantia do Direito Humano à Alimentação e acesso às políticas públicas, em conformidade com as cláusulas de nossa Constituição cidadã.

Como resposta emergencial de caráter de ajuda humanitária firmou-se um acordo para distribuição imediata de cesta de alimentos nas áreas de retomada, rompendo-se com o silencio e o descaso do poder público com os gritos da fome. Ao Consea cabe, em diálogo com a Comissão Especial de Violação do DHAA, continuar interpelando o Executivo, Legislativo e Judiciário. E ainda, acompanhar o trabalho do Comitê Técnico de Povos e Comunidades Tradicionais na Câmara Interministerial de Segurança Alimentar e Nutricional (Caisan) que, em interação com a mesma instancia no plano estadual, continuará monitorando as violações de direitos desses povos.

Estive no IX EnconAsa, no Semiárido, onde a “vida pulsa e o povo resiste” no ecoar das vozes das organizações da agricultura familiar, das mulheres, dos jovens, dos povos e comunidades tradicionais “construindo e transformando o semiárido”, articulados pela Articulação do Semiárido (ASA). Estratégias e práticas inovadoras, deram origem a um novo paradigma de convivência com o semiárido plasmado em programas e projetos públicos inspirados nas iniciativas das organizações sociais de armazenamento da água de chuva (P1Mc e P1+2), casas de semente, gestão coletiva de fundos e produção de alimentos agroecológicos saudáveis.

Mas lá também ouvi as vozes de protesto contra as ameaças de corte de orçamento, de volta às velhas práticas da industria da seca. Ouvi um apelo que cabe ao Consea encaminhar, uma vez que temos monitorado os Termos de Parceria entre governo e sociedade: que o governo honre os compromissos liberando os recursos firmados em contratos pré-estabelecidos e complete a universalização do acesso à água para consumo humano.

Não posso deixar de registrar o significado político do 2º Encontro Nacional de Pesquisa em SAN que consolidou a criação da Rede Brasileira de Pesquisa em SAN, cuja semente foi lançada neste Conselho. Nesses tempos sombrios e de incertezas representa um precioso espaço para reflexão crítica sobre dilemas, contradições e desafios como o conflito de interesses público-privado no processo de construção da Política e do Sisan no país.

Este é um momento também de agradecimentos.

Expresso meus agradecimentos aos conselheiros e às conselheiras, suas organizações, redes e fóruns, pelos ensinamentos fruto da interlocução sobre as várias dimensões da soberania e san, que requer de nós da sociedade civil uma postura militante da interdisciplinaridade. Peço-lhes licença para sublinhar, sobretudo meus agradecimentos aos (as) profissionais da nutrição e saúde, que me proporcionaram novos aprendizados para a construção de uma visão mais holística de san.

Agradeço também aos presidentes dos conseas estaduais pela atuação significativa na construção do Sisan, chamando-nos para as reflexões sobre as diferentes realidades no país.

Meus agradecimentos aos povos indígenas, povos tradicionais de matriz africana e povos de terreiro, movimento negro, organizações de mulheres, movimentos sociais do campo e da cidade pelo diálogo de saberes e por trazerem com veemência a relação entre o DHAA, e o caráter estrutural das formas de dominação que produzem desigualdades.

Aos gestores e gestoras públicos que praticam os valores republicanos e que zelam pelas suas funções, com inestimáveis contribuições para a soberania e san, os meus sinceros agradecimentos.

Dirijo-me aqui também aos valorosos e às valorosas integrantes da secretaria do Consea, incansáveis na sua dedicação e compromisso de apoiar o Consea no cumprimento de sua missão. O meu muitíssimo, obrigada.

Aos jovens estagiários e às estagiárias que aqui estão e que por aqui passaram meu reconhecimento e a certeza que continuarão militantes pela causa da soberania e san.

Agradeço as organizações observadoras que, com sua presença constante engrandecem o sentido deste conselho.

Quero agradecer também à FASE- Solidariedade e Educação, onde trabalho, ao Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional, que representei nesses anos, e à Articulação Nacional de Agroecologia, pelo seu apoio para o exercício dessa nobre missão.

Temos um legado histórico construído coletivamente a ser preservado e renovado com a mobilização social na 5ª Conferencia Nacional de SAN, que inovou em sua metodologia e produziu o manifesto sobre Comida de Verdade, que acena para a importância da dimensão cultural dos sistemas alimentares.

Tivemos conquistas e devemos nos manter com firmeza na defesa da Constituição no que concerne aos direitos, em especial do Direito Humano à Alimentação Adequada (DHAA) e na defesa da implementação do Plano Nacional de SAN.

Importante manter a iniciativa política de interação entre os conselhos como Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável (Condraf), Comissão Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (CNAPO), Conselhos de Saúde e Assistencia Social, que além de permitir articular posições na conjuntura tem o desafio de influenciar no Plano Plurianual (PPA).

Minha expectativa é que o Consea continue ecoando as vozes do campo, da floresta, das águas e das cidades, expressão de nossa sociobiodiversidade e de uma sociedade pluriétnica; que continue a enfrentar as injustiças combatendo o racismo e o machismo.

Encerro a minha missão no Consea, porém sem abdicar do compromisso cidadão com a firme determinação de continuar atuando em outros espaços em defesa da “comida de verdade no campo e na cidade, por direitos e soberania alimentar”.

Obrigada!

Brasília, 30 de novembro de 2016

Posicionamento sobre o decreto que ameaça demarcações de terras indígenas

Na última segunda-feira, dia 12 de dezembro, foi divulgada pela imprensa a minuta da “Proposta de regulamentação da demarcação de terras indígenas”, elaborada pelo Governo Federal, que pretende inviabilizar as demarcações e abrir as terras indígenas para exploração de recursos naturais sem consulta aos indígenas. A medida ganhou o apelido de Decreto do Etnocídio.

O governo não dialogou com o Conselho Nacional de Política Indigenista (CNPI) e não realizou consulta prévia aos povos indígenas para elaborar a minuta, atendendo apenas aos interesses dos ruralistas. O texto contraria a legislação vigente e princípios internacionais de direitos humanos, e impossibilita a resolução dos conflitos atuais, pelos motivos expostos na “NOTA DE REPÚDIO À PROPOSTA DO GOVERNO TEMER PARA RETIRAR DIREITOS DOS POVOS INDÍGENAS SOBRE SUAS TERRAS” (leia abaixo na íntegra ou aqui).

A Relatoria de Direitos Humanos e Povos Indígenas, da Plataforma de Direitos Humanos – Dhesca Brasil, entende que as consequências deste decreto não serão outras senão alimentar os conflitos no campo e o caos fundiário, desvirtuar a Constituição e abrir as terras indígenas para outros interesses e colocar mais pressão sobre os povos e as comunidades que vivem da terra.

Não obstante a gravidade desta iniciativa, a minuta faz referência a um estudo produzido pela Relatora Erika Yamada, fazendo parecer que ela estaria dando suporte a essa esdrúxula, inconstitucional e desnecessária proposta de alteração do procedimento de demarcações de terras indígenas. Somos terminantemente contra essa medida que fere os direitos indígenas!

A justificativa do decreto deliberadamente omite a informação de que o estudo  citado foi feito para a Procuradoria da Funai no ano de 2006. Ou seja, antes da existência da Portaria MJ 2498/11, que regulou a já então existente participação dos entes federados nos processos de demarcação de terras indígenas, que também é mencionada no estudo.

Além disso, a minuta faz referência a algumas jurisprudências do Supremo Tribunal Federal (STF), mas omite a existência de (em ainda maior número) decisões favoráveis aos processos de demarcação de terras indígenas naquela corte. Deliberadamente, também desvirtuam o uso da Declaração da ONU sobre os Direitos dos Povos indígenas para forçar a ideia de se legitimar reduções e fracionamentos de terras indígenas. Esbulhos e posses irregulares de não indígenas passariam a ser aceitas, caso tal minuta fosse adiante. Haveria ainda uma suposta oferta de pagamento de compensação ou reparação ao índio ignorando a explicita vedação constitucional de remoção de povos indígenas de suas terras.

É bom que fique claro: o sentido da Declaração da ONU de nenhuma maneira é legitimar esbulhos e posses irregulares de não indígenas, e muito menos respaldar ações do Estado violadoras de direitos dos povos indígenas”, afirma a Relatora Erika Yamada, que também é Perita do Mecanismo de Direitos dos Povos Indígenas do Conselho de Direitos Humanos da ONU.

Diante da tentativa de se violar direitos constitucionais por decreto presidencial, e da incapacidade do Estado para encarar de fato as questões mais urgentes que precisam ser resolvidas em torno da disputa pela terra no Brasil, como os massacres e etnocídio praticados contra povos e comunidades das florestas e do campo, a Plataforma Dhesca reitera o posicionamento conjunto da sociedade civil que se opõe à proposta do Governo que busca enterrar as políticas de demarcação de terras indígenas, de regularização fundiária, de reforma agrária e ordenamento territorial do país.

Confira a nota repúdio ao decreto assinada por organizações da sociedade civil:

NOTA DE REPÚDIO À PROPOSTA DO GOVERNO TEMER PARA RETIRAR DIREITOS DOS POVOS INDÍGENAS SOBRE SUAS TERRAS

As organizações abaixo assinadas, em apoio aos povos indígenas do Brasil, manifestam repúdio à minuta de “Proposta de regulamentação da demarcação de terras indígenas” que, somada a outras medidas de retrocessos de direitos constitucionais em diversas áreas sociais, estão sendo impostas pelo atual governo à sociedade brasileira à revelia da lei, de maneira atropelada, autoritária e ilegítima.

Sem qualquer diálogo com o Conselho Nacional de Política Indigenista – CNPI, nem consulta prévia aos povos indígenas, a minuta de decreto, que veio à público pela imprensa no dia 12.12.2016, contraria a legislação vigente e a jurisprudência e impossibilita a resolução dos conflitos atuais, pelos motivos que seguem:

  1. Desrespeita a Constituição Federal Brasileira de 1988 ao ignorar o direito originário que os povos indígenas detêm sobre suas terras e recursos naturais, ou seja, direito que antecede à constituição do Estado brasileiro, além de tratar direitos fundamentais como objeto de negociação, desconfigurando a noção de usufruto exclusivo e o caráter imprescritível do direito indígena sobre suas terras.
  2. Desrespeita o direito à consulta livre, prévia e informada, garantida pela Convenção 169/OIT ao preparar um Decreto de extremo impacto sobre os povos indígenas, não apenas sem consultá-los, no apagar das luzes de um ano difícil como o de 2016, numa clara manifestação de má-fé.
  3. Atenta contra direitos constituídos dos povos indígenas, ao reabrir para revisão atos demarcatórios já consolidados, promovendo conflitos em áreas já pacificadas, ao submeter todas as terras indígenas ainda não registradas em cartório ou SPU a novo período de contestação por quaisquer “interessados”.
  4. Viola os princípios de razoabilidade e eficiência da administração pública ao submeter todos os processos de demarcação em curso à estaca zero, independente da fase em que se encontrem, para cumprir novas regras sobre o processo demarcatório, criadas para dar espaço a decisões políticas sem respaldo té.
  5. Distorce os termos da Declaração da ONU sobre o direito à reparação em casos de inconstitucional remoção dos povos indígenas de suas terras tradicionais, ao abrir a possibilidade de substituição da efetivação do direito à terra por indenização em dinheiro e ao legitimar e oficializar crimes de esbulho territorial cometidos no passado recente contra as populações indígenas.
  6. Institui tratamento ainda mais desigual aos povos indígenas perante a Justiça, ao introduzir como regra geral todas as condicionantes definidas especificamente para o julgamento da PET 3388, e aplicar “manifestações individuais de Ministros do STF” para restringir direitos, como se fossem súmulas vinculantes.
  7. Normatiza a inconstitucional aplicação da tese do Marco Temporal para legitimar situações de esbulhos de terras indígenas, posses ilegítimas, irregulares e ilegais e, consequentemente, outras violações de direitos humanos dos povos indígenas.
  8. Transforma a Funai em órgão assistencialista, ao retirar seu papel de órgão de defesa dos direitos indígenas, colocando-a no papel de instância de legitimação de violações de direitos territoriais ou, quando muito, que contabilizaria danos materiais a serem indenizados.
  9. Atende aos interesses de setores que pressionam pela aniquilação da existência dos povos indígenas enquanto povos autônomos e culturalmente diferenciados, ao criar instâncias revisoras no Ministério da Justiça e Cidadania que tendem a reforçar o poder de barganha política sobre os direitos indígenas ultrapassando suas competências legais.
  10. Contraria recomendações ao Brasil da Relatora da ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas, bem como recente Resolução do Parlamento Europeu sobre o tema, agravando violações de todos os direitos humanos dos povos indígenas já indicadas nestes documentos.

Pelos motivos expostos, entendemos que a minuta de Decreto revela o propósito do atual governo, no sentido de enterrar as políticas de demarcação de terras indígenas, de regularização fundiária, de reforma agrária e ordenamento territorial do país.

Sem legitimidade ou justificativa para criar novos procedimentos de demarcação, a proposta minutada não oferece soluções para os conflitos existentes, cria novos entraves e aprofunda as violações e violências contra os povos indígenas no país. Parece querer voltar no tempo das inaceitáveis políticas de confinamento territorial e de assimilação cultural, que podem levar ao extermínio sociocultural ou etnocídio dos povos indígenas.

Enfim, trata-se de gravíssima situação de retrocessos no campo dos direitos humanos e dos direitos constitucionais, onde o Estado democrático de Direito é mais uma vez colocado à prova.

Esperamos que a referida proposta seja definitivamente arquivada e que sejam tomadas iniciativas a fim de que se cumpram os direitos fundamentais dos povos indígenas às suas terras tradicionais conforme determina a nossa Carta Magna, demais legislação em vigor e os princípios internacionais de direitos humanos.

Conjuntamente e em apoio a Mobilizacao Nacional Indigena/APIB, https://mobilizacaonacionalindigena.wordpress.com/, assinam:

Alternativas para Pequena Agricultura no Estado do Tocantins – APA-TO
Amazônia Real Jornalismo Independente
Articulação de Mulheres Brasileiras -AMB
Articulação dos Empregados Rurais do Estado de Minas Gerais/ADERE-MG
Articulação para o Monitoramento dos Direitos Humanos no Brasil
Articulação para o Monitoramento dos Direitos Humanos no Brasil
Associação Brasileira de Antropologia
Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais/ABONG
Associação de Advogados de Trabalhadores Rurais – AATR
Associação de Defesa do Meio Ambiente de Araucária – PR/AMAR
Associação de Preservação do Meio Ambiente e da Vida/Apremavi
Associação de Proteção ao Meio Ambiente de Cianorte – PR/APROMAC
Associação de Saúde Ambiental – PR/TOXISPHERA
Associação dos Agentes Agroflorestais Indígenas do Acre – AMAAIC
Associação Floresta Protegida
Associação Juízes para a Democracia – AJD
Associação Mulheres pela Paz
Associação Nacional de Direitos Humanos – Pesquisa e Pós-Graduação – ANDHEP
Associação Nacional dos Centros de Defesa da Criança e do Adolescente/ANCED
Blog Combate Racismo Ambiental
Central Única dos Trabalhadores – CUT Brasil
Centro de Assessoria Multiprofissional/CAMP
Centro de Cultura Linguagens e Tecnologias Aplicadas da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia – CECULT/UFRB
Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva – CEDEFES
Centro de Documentación en Derechos Humanos “Segundo Montes Mozo S.J.” (CSMM)/ Quito, Ecuador
Centro de Estudos Bíblicos/CEBI
Centro de Pesquisa e Extensão em Direito Socioambiental – CEPEDIS/ PUC PR
Centro de Pesquisa em Etnologia Indígena – CPEI/Unicamp
Centro de Trabalho Indigenista – CTI
Coordenadoria Ecumênica de Serviço – CESE
Coletivo de Mulheres Transamazônica e Xingu
Coletivo ENTITLE (Rede Europeia de Ecologia Política)
Coletivo Purus
Coletivo Terra Vermelha
Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos
Comissão Guarani Yvyrupa – CGY
Comissão Pró-Índio de São Paulo – CPI-SP
Comissão Pró-Índio do Acre
Comité Permanente por la Defensa de los Derechos Humanos (CDH) / Guayaquil, Ecuador
Conectas Direitos Humanos
Conselho Indigenista Missionário/CIMI
Conselho Nacional das Populações Tradicionais/CNS
Conselho Pastoral dos Pescadores /CPP
Coordenação Estadual das Comunidades Quilombolas do Tocantins – COEQTO
Cooperativa Kayapó de Produtos da Floresta – CooBaY
Cosmopolíticas – Núcleo de Antropologia/Universidade Federal Fluminense
Departamento de Antropologia da Universidade Federal do Paraná
Divisão de Educação Indígena/SEED – RR – Boa Vista – Roraima
Dom da Terra AfroLGBT
ELO Ligação e Organização
FASE
Federação das Organizações e Comunidades Indígenas do Médio Purus /FOCIMP
Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro – FOIRN
FIAN Brasil
Fórum Paranaense de Religiões de Matrizes Africanas – FPRMA
Greenpeace Brasil
Grupo Carta de Belém
Grupo de Estudos em Temáticas Ambientais – GESTA-UFMG
Grupo de Estudos em Temáticas Ambientais – GESTA-UFMG
Grupo de Estudos sobre a Diversidade da Agricultura Familiar – UFPA
Grupo de Estudos: Desenvolvimento, Modernidade e Meio Ambiente da Universidade Federal do Maranhão (GEDMMA/UFMA)
Grupo de Pesquisa em Antropologia Jurídica do Centro de Ciências Jurídicas da Universidade Federal de Santa Catarina/GPAJU/UFSC
Grupo de Pesquisa Sociedade, Ambiente e Ação Pública – UFPA
Grupo de Trabalho sobre Ecologia Política do Conselho Latino Americano de Ciências Sociais – CLACSO
Grupo Moitará de Pesquisas em Direitos Étnicos -Faculdade de Direito/UnB
Iepé – Instituto de Pesquisa e Formação Indígena
Índio É Nós
Inesc
Iniciativa das Religiões Unidas/URI/Brasília
International Rivers – Brasil
Instituto Autonomia
Instituto de Assessoria às Comunidades Remanescentes de Quilombos – IACOREQ
Instituto de Estudos Jurídicos de Direitos Humanos, Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais/Idhes
Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia – IPAM
Instituto de Pesquisa, Direitos e Movimentos Sociais
Instituto Internacional de Educação do Brasil/IEB
Instituto Madeira Vivo e a Aliança dos Rios da Panamazonia
Instituto Pólis
Instituto Políticas Alternativas para o Cone Sul/Pacs
Instituto Socioambiental – ISA
Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN)
Justiça Global
Koinonia
Laboratório de Estudos e Pesquisas em Movimentos Indígenas, Políticas Indigenistas e Indigenismo – LAEPI-CEPPAC/UnB
Laboratório de Inovações Ameríndias (lina), PPGAS, Museu Nacional
Licenciatura Indígena Políticas Educacionais e Desenvolvimento Sustentável do Instituto de Ciências Humanas e Letras/Universidade Federal do Amazonas
Licenciatura Intercultural Indígena do Sul da Mata Atlântica da UFSC
Mestrado em Meio Ambiente e Desenvolvimento Rural (MADER)/UNB
Mestrado Profissional em Desenvolvimento Sustentável, na Área de Concentração em Sustentabilidade junto a Povos e Terras Tradicionais – MESPT/UnB
Movimento Camponês Popular/ MCP
Movimento Cultural Arte Manha
Movimento Cultural de Olho na Justiça
Movimento dos Atingidos por Barragens – MAB
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra/MST
Movimento Nacional de DIreitos Humanos/ MNDH
Movimento Negro de Altamira
Movimento Nossa Belém/Movimento Cidades Sustentáveis/PA
Movimento pela soberania popular na Mineração – MAM
Movimento Xingu Vivo Para Sempre
Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade Federal do Paraná – MAE
Mutirão Pela Cidadania
Núcleo Curupiras: Colonialidades e Outras Epistemologias (Pernambuco)
Núcleo de Antropologia e Saberes Plurais da Universidade Federal de Mato Grosso
Núcleo de Cultura Indígena – NCI
Núcleo de Estudos Ameríndios/UFPR
Núcleo de Estudos sobre Etnicidade – NEPE/UFPE
Núcleo de Pesquisa e Extensão em Agroecologia da FUP/UnB
Núcleo de Pesquisa Ekoa: direito, movimentos sociais e natureza da UFPR
Operação Amazônia Nativa /OPAN
Organização dos Povos Indígenas Apurinã e Jamamadi de Boca do Acre/OPIAJBAM/AM
Organização dos Povos Indígenas Apurinã e Jamamadi de Pauini/OPIAJ
Organização dos Professores Indígenas do Acre – OPIAC
Pastoral da Juventude do Meio Popular/PJMP-Brasil
Plataforma de Direitos Humanos – Dhesca Brasil
Plataforma Interamericana de Derechos Humanos, Democracia y Desarrollo (PIDHDD Regional
Programa de Arqueologia e Antropologia (PAA) da Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA)
Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social do Museu Nacional/ UFRJ
Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social/Universidade Federal de São Carlos
Programa de Pós-Graduação em Antropologia/ Universidade Federal de Minas Gerais
Programa de Pós-Graduação em Antropologia/Universidade Federal do Paraná
Projeto ALICE – Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra
Promotoras Legais Populares
Red de Observadores de la Consulta Previa en America Latina – RED OBSERVA
Rede Brasileira de Justiça Ambiental.
Rede de Cooperação Amazônica – RCA
Rede Europeia de Ecologia Política
Rede Faor Rios Livres e sem barragens na Amazônia
Rede Feminista de Saúde, Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos/ Regional Minas
Rede Sul-Americana para as Migrações Ambientais – RESAMA
Relatoria de Direitos Humanos e Povos Indígenas
Revista Xapuri
Sociedade Maranhense de Direitos Humanos – SMDH
Terra de Direitos
Tucum Brasil
Uma Gota No Oceano
União de Mulheres de São Paulo
União dos Povos Indígenas do Vale do Javari – UNIVAJA

Fonte: Plataforma Dhesca

Mais de 250 organizações e movimentos repudiam PL que desmonta licenciamento ambiental

Mais de 250 organizações, movimentos, professores e pesquisadores divulgaram uma nota que repudia o substitutivo do deputado ruralista Mauro Pereira (PMDB-RS) ao Projeto de Lei (PL) 3.729/2004.

O PL desmantela o atual sistema de licenciamento ambiental e está na pauta de votação da Comissão de Finanças e Tributação da Câmara, nesta quarta (14/12). O projeto já foi apelidado nas redes sociais como “fábrica de Marianas” por seu potencial de estimular novos desastres ambientais como o que destruiu o Rio Doce (MG/ES), em novembro de 2015.

“O substitutivo apresentado pelo Deputado Federal Mauro Pereira figura, entre os textos em tramitação, como aquele que pretende impor os mais graves retrocessos à legislação atualmente em vigor, além do notável baixo nível de técnica legislativa, o que prejudica a interpretação dos dispositivos, podendo gerar insegurança jurídica e ampliação de ações judiciais”, afirma o documento.

“Eventual aprovação da referida proposta, ainda mais sem os imprescindíveis debates públicos, geraria inúmeras consequências negativas, como o significativo aumento de risco de ocorrência de desastres socioambientais, a exemplo do rompimento da barragem de rejeitos em Mariana (MG), a ausência de prevenção, mitigação e compensação de impactos decorrentes de empreendimentos, a reiterada violação de direitos das populações atingidas, a ampliação dos conflitos sociais e socioambientais e a absoluta insegurança jurídica aos empreendedores e ao Poder Público”, prossegue a nota.

Clique aqui para ler a nota na íntegra.

Nota da APIB: Governo Temer insiste em decretar o fim da demarcação das terras indígenas

Nota Pública

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), as organizações indígenas regionais que a compõem e suas distintas associações de base denunciam e repudiam veementemente para a opinião pública nacional e internacional a macabra decisão do governo ilegítimo de Michel Temer de colocar fim à demarcação das terras indígenas, portanto à existência dos povos indígenas, por meio da edição de um Decreto que estabelece novos procedimentos para o ato de demarcação, em substituição do atual Decreto 1.775/96.

Após inconsistentes, retóricas e absurdas justificativas que desvirtuam e anulam de forma escandalosa o espírito do texto constitucional (Artigos 231 e 232), das leis infraconstitucionais e tratados internacionais assinados pelo Brasil – Convenção 169 da OIT e Declaração da ONU sobre os direitos dos povos indígenas – a Minuta de Decreto, vazada por meios impressos de grande circulação, propõe-se claramente a procrastinar ad infinitum, senão enterrar de vez, o direito territorial indígena e a demarcação das terras indígenas, assegurando a prevalência de artimanhas que empurrarão os povos indígenas à remoção, reassentamento ou expulsão, disfarçadas de legalidade, de seus territórios. Tudo com o objetivo de atender vergonhosamente os interesses da bancada ruralista, do agronegócio, a implantação de empreendimentos de infraestrutura e o esbulho e usurpação dos bens naturais preservados milenarmente pelos povos indígenas, numa total negação de seu direito ao usufruto exclusivo previsto na Carta Magna.

A Minuta, reúne para isso, num só instrumento, todas as atrocidades contra o direito territorial dos povos indígenas contidas na PEC 215, nas condicionantes estabelecidas pelo STF estritamente para a Terra Indígena Raposa Serra do Sol e ressuscitadas pela Portaria 303 da AGU, bem como na equivocada tese do marco temporal adotada pela segunda turma da Suprema Corte a respeito deste direito originário fundamental.

A elaboração de um novo Decreto para a Demarcação das terras indígenas soma-se à já denunciada proposta de Decreto de reestruturação da Funai, que reduzindo orçamento e quadro de servidores, no contexto da PEC 55, e o desmonte das instituições e políticas públicas, vem de encontro com os propósitos da bancada ruralista que, por meio de uma CPI, busca desqualificar e fragilizar o papel do órgão indigenista, desmoralizar os povos indígenas e seus aliados, e impedir também a continuação das demarcações.

A APIB entende que contrariamente aos propósitos alegados de que com este Decreto de novos procedimentos para a demarcação estarão sendo superados os conflitos que envolvem povos indígenas e invasores de seus territórios, o  governo Temer está nada mais do que decretando o agravamento dos conflitos, da violência, da discriminação, do racismo e da criminalização contra os povos indígenas, secularmente  privados de seus direitos mais sagrados à vida, à dignidade, a uma identidade cultural e ao espaço físico e imaterial onde, mesmo com as adversidades, têm resistido secularmente enquanto povos diferenciados.

Pelo visto, em nada adiantam para esse governo as instâncias e mecanismos internacionais de observação e verificação dos direitos humanos, em especial dos direitos dos povos indígenas: a relatoria especial para povos indígenas e o Conselho de Direitos Humanos da ONU, entre outros, que tem alertado para a grave tendência em curso de etnocídio dos povos originários do Brasil.

A APIB e todos os povos e comunidades, organizações e associações que a compõem reafirmam que continuam em pé de luta, e resistirão, até as últimas consequências, contra quaisquer retrocessos em seus direitos que venham a ser propostos ou adotados pelos distintos poderes do Estado Brasileiro.

Pelo direito de viver!

Brasília – DF, 13 de dezembro de 2016.

Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB

 Mobilização Nacional Indígena

Fonte: APIB

Por falta de demarcação de terras e violações de direitos humanos, povo Guarani e Kaiowá protocola petição contra Estado brasileiro na OEA

“Tudo que quero são os ossos e a cabeça do meu filho para poder enterrar ele”.

whatsapp-image-2016-12-09-at-15-15-17
Mãe do cacique Nízio Gomes, assassinado em 2011

O pedido emocionado é da mãe do cacique Nízio Gomes, liderança Guarani e Kaiowá, assassinado no dia 18 de novembro de 2011, no acampamento da retomada do Tekoha Guaiviry. Após cinco anos, o corpo de Nízio ainda não foi localizado.

A fala da mãe do Cacique desaparecido aconteceu durante a visita de uma comissão de deputados do Parlamento Europeu e do Parlamento Brasileiro a comunidades indígenas da região, realizada no dia 6 de dezembro. Além de ouvir as denúncias das graves violências sofridas pelos Guarani e Kaiowá, também puderam acompanhar a Assembleia Aty Guasu – Grande Assembleia Guarani e Kaiowá, que protocolou online na mesma tarde uma petição à CIDH – Comissão Interamericana de Direitos Humanos, da Organização dos Estados Americanos (OEA).

A denúncia contra o Estado brasileiro protocolada na CIDH é apresentada pelo Conselho da Aty Guasu Guarani e Kaiowá, Conselho Indigenista Missionário (CIMI), Fian Internacional, Fian Brasil e Justiça Global ,em representação das comunidades indígenas Guarani e Kaiowá de Apyka’i, Guaiviry, Ypo’i, Ñhanderu Marangatu e Kurusu Ambá, por violações aos direitos previstos na Convenção Americana de Direitos Humanos, no Protocolo de San Salvador e na Convenção de Belém do Pará.

“Além das mortes, denunciamos a falta completa de demarcação das nossas terras tradicionais. Isso motiva toda uma série de graves violações que geram o genocídio do nosso povo”, explica Eliseu Guarani e Kaiowá.

No Mato Grosso do Sul está a segunda maior população indígena do país e um dos piores índices de terras indígenas demarcadas pelo Estado brasileiro. A população indígena da região enfrenta dois problemas centrais: a morosidade nas demarcações de seus territórios e os violentos ataques de milícias contratadas por fazendeiros da região.

whatsapp-image-2016-12-09-at-15-17-05Na petição, as organizações reforçam que sem o acesso ao território e com os ataques os Guarani e Kaiowá encontram-se em situação de extrema vulnerabilidade para suprir as suas necessidades culturais e socioeconômicas. Nesse sentido, os casos emblemáticos escolhidos confirmam que, uma vez que o direito à vida e ao território são violados, todos os direitos humanos que dependem de tais fatores são também desrespeitados, como o direito humano à alimentação e à nutrição adequadas, saúde, educação, entre outros.

“O fato dos Guarani e Kaiowá não terem acesso a suas terras tradicionais os levam a viverem em condições miseráveis e nós esperamos que o governo brasileiro preste conta junto à OEA de sua omissão e, portanto, sejam obrigados a tomar medidas enérgicas no sentido de demarcar essas terras. Caso a petição seja aceita poderá ser um marco importante na luta de todos os povos indígenas brasileiros”, destaca o assessor sênior da FIAN Internacional, Flávio Valente.

Demarcação de terras

A morosidade na demarcação de terras indígenas no país também foi apontada recentemente pela relatora especial da ONU sobre os direitos dos povos indígenas, Victoria Tauli-Corpuz. “Um refrão recorrente entre os povos indígenas por todo o país era a urgente necessidade de concluir os processos de demarcação de terras, fundamental para todos os seus outros direitos. Povos indígenas do país inteiro repetidamente enfatizaram que, devido à ausência prolongada de uma proteção eficaz do Estado, eles se veem forçados a retomar suas terras para garantir sua sobrevivência. Muitos até declararam que, caso recebam ordens de despejo ou reintegração de posse, não deixarão suas terras e, se necessário, morrerão por isso”, aponta um dos trechos do relatório apresentado em setembro no Conselho de Direitos Humanos da ONU.

Desnutrição

A insegurança alimentar e nutricional do povo Guarani e Kaiowá é outra grave violação de direitos apresentada na petição. Se em todo o país o índice de insegurança alimentar e nutricional em qualquer grau, que mede a dificuldade de acesso a alimentos em quantidade e qualidade adequadas, é de 22,6%, em três comunidades Guarani e Kaiowá pesquisadas pela FIAN Brasil tal índice é de 100%. A informação consta no documento “O Direito Humano à Alimentação Adequada e à Nutrição do povo Guarani e Kaiowá – um enfoque holístico”.

Violências

O assassinato de Nízio Gomes integra os números alarmantes de violências sofridas pelo povo Guarani e Kaiowá no estado do Mato Grosso do Sul. Esta situação destaca-se hoje como uma das mais flagrantes violações de direitos humanos, que em síntese são protegidos por normas nacionais e internacionais. 

Nos últimos 12 anos foram registrados mais de 400 homicídios de indígenas no estado do Mato Grosso do Sul; o estado concentra, dessa forma, mais de 60% dos casos de assassinatos de indígenas do país.

Panamá

Ainda no início do mês, antes do protocolo da petição, a FIAN Brasil, CIMI e representantes da Aty Guasu estiveram no Panamá para participar do 159º Período de Sessões da Comissão Interamericana de Direitos Humanos e sensibilizar a própria Comissão da situação de violações de direitos contra os povos Guarani e Kaiowá.

“A petição é mais um instrumento que reforça a luta direta dos povos Guarani e Kaiowá, essa luta que é a grande responsável pela resistência histórica que eles apresentam às grandes sistêmicas violações contra seus direitos e contra suas vidas. Esperamos que esse instrumento comprove também que os Guarani e Kaiowá só partem para uma exigibilidade direta de seus direitos, quando a omissão do Estado brasileiro leva os indígenas brasileiros a lutarem por suas terras e por causa dessa luta são perseguidos, criminalizados, torturados e assassinados. Nós esperamos que a petição pressione o governo brasileiro a pagar sua dívida histórica com os povos indígenas e com os povos Guarani e Kaiowá”, ressalta a Secretária-Geral da FIAN Brasil, Valéria Burity.

CIDH

Mediante a apresentação de uma petição perante a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), as pessoas que sofreram violações a seus direitos humanos podem obter ajuda. A Comissão investiga a situação e pode formular recomendações ao Estado responsável para que se restabeleça o gozo dos direitos, para que situações similares não ocorram novamente no futuro e para que os fatos ocorridos sejam investigados e reparados.

Ascom FIAN Brasil (com informações do CIMI)

Estado Brasileiro vai ao Panamá responder por grave situação no Sistema Socioeducativo cearense

As graves violações de direitos humanos no Sistema Socioeducativo cearense serão debatidas pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), durante seu 159º Período Ordinário de Sessões, que ocorre de 29 de novembro a 7 de dezembro de 2016, no Panamá. Os peticionários[1] CEDECA Ceará, Fórum DCA Ceará e ANCED/Seção DCI Brasil, e representantes do governo brasileiro, participarão de reunião de trabalho na segunda (05), quando deverão apresentar o atual contexto do Socioeducativo no Ceará para a Comissão.

Em 31 de dezembro de 2015, a CIDH solicitou, por meio da Resolução 71/15, a adoção de Medidas Cautelares pelo Estado Brasileiro a favor da vida e da integridade física dos adolescentes internos no Centro Educacional São Miguel, Centro Educacional Dom Bosco, Centro Educacional Patativa do Assaré e aqueles transferidos provisoriamente ao Presídio Militar de Aquiraz. Entre as medidas solicitadas pela Comissão destacam-se a garantia de infraestrutura, pessoal suficiente e idôneo, adequação das condições de higiene, alimentação, educação e tratamento médico, redução do número de detidos e que as medidas adotadas pelo Estado Brasileiro sejam coordenadas com os beneficiários (adolescentes) e seus representantes (organizações da sociedade civil).

As organizações peticionarias, no entanto, constatam a permanência da situação de gravidade, urgência e risco irreparável à integridade física e aos direitos dos adolescentes, bem como um agravamento das violações ocorridas no que tange à ocorrência de tortura, maus tratos, tratamento cruel, desumano e degradante, ausência de atividades educativas, confinamento permanente, utilização do isolamento compulsório como sanção disciplinar, bem como restrição ao acesso à água, à alimentação e a condições de salubridade. Na ocasião da reunião, os peticionários apresentarão uma série de ações e propostas para o Estado necessárias para fazer cumprir a Medida Cautelar, além de solicitar a manutenção e ampliação da mesma para os adolescentes internos nas demais[2] Unidades cearenses, por também expressarem situação de gravidade, urgência e risco de danos irreparáveis para os adolescentes.

Além das organizações peticionarias, a delegação contará com a presença da mãe de um dos adolescentes beneficiários quando da outorga das Medidas Cautelares. O adolescente (nome preservado), foi vítima de tortura em várias Unidades do Sistema por onde passou e, em fevereiro de 2016, depois de seguidos maus tratos e permanência de condições insalubres, fugiu do Centro Educacional Patativa do Assaré. Cerca de uma semana depois, no dia 25/02/2016, foi assassinado aos 17 anos, no bairro onde morava sua família, restando ainda desconhecidas as circunstâncias e autoria do homicídio.

Comissão Interamericana de Direitos Humanos

A CIDH, criada em 1959, é o órgão principal e autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA) que, juntamente com a Corte Interamericana de Direitos Humanos, compõe o Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos (SIDH). Com atribuições sancionatórias, o Sistema Interamericano tem atribuições de promoção e proteção dos direitos humanos no continente americano.

MAIS INFORMAÇÕES

Comunicado da e Resolução 71/2015 da CIDH resumo da decisão.

Comissão Interamericana de Direitos Humanos manifesta preocupação com atos de violência no Sistema Socioeducativo cearense em comunicado:http://goo.gl/xYT5w3

Comissão Interamericana de Direitos Humanos aprova decisão cautelar contra o Brasil por violações no Socioeducativo cearense:http://goo.gl/g5aSfW

________________________________

[1] Em março de 2015, o Centro de Defesa da Criança e do Adolescente (CEDECA Ceará), o Fórum Permanente das ONGs de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente (Fórum DCA Ceará) e a Associação Nacional dos Centros de Defesa da Criança e do Adolescente (ANCED/Seção DCI Brasil), apresentaram Petição à Comissão Interamericana de Direitos Humanos denunciando gravíssimas violações de direitos humanos nas Unidades cearenses.

[2] Ampliação das Medidas Cautelares para contemplar o Centro Educacional São Francisco e Centro Educacional do Passaré, ambos provisoriamente desativados à época da outorga da Medida em 31 de dezembro de 2015, e para o Centro Educacional Canindezinho e Centro Educacional Cardeal Aloísio Lorcshaider.

Carta pela formação de frentes parlamentares de segurança alimentar e nutricional

image-1As entidades presentes no Seminário Nacional sobre o Direito Humano à Alimentação, promovido pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias e pela Frente Parlamentar de Segurança Alimentar e Nutricional da Câmara dos Deputados em 30 de novembro e 1° de dezembro de 2016, estimulam a criação de frentes parlamentares estaduais e municipais com foco na segurança alimentar e nutricional. Leia.

O direito humano à alimentação adequada está previsto na Declaração Universal dos Direitos Humanos, no Pacto de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais e, desde 2010, está expresso como direito fundamental no artigo 6° da Constituição da República.

De acordo com a ONU, o direito à alimentação adequada realiza-se quando a pessoa tem acesso físico e econômico, ininterruptamente, à alimentação adequada ou aos meios para sua obtenção. Esse direito é ligado à dignidade inerente à pessoa humana e é indispensável para a realização de outros direitos humanos. Ele é também inseparável da justiça social, requerendo a adoção de políticas socioeconômicas e ambientais, orientadas para a erradicação da fome, da pobreza e para a realização dos direitos humanos para todos.

O direito humano à alimentação adequada está relacionado a um modelo de desenvolvimento inclusivo, socialmente justo, ambientalmente responsável e sustentável e que respeite as culturas locais, a pluralidade de modos de vida e a biodiversidade.

O Brasil conquistou nos últimos anos diversos avanços em indicadores de segurança alimentar e nutricional, com o ápice na saída do mapa da fome. Isso foi resultado da criação do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e de políticas públicas de reforma agrária, acesso à terra, à saúde, à educação e ao alimento; políticas que incentivaram a agricultura familiar e camponesa, a agroecologia, a garantia territorial dos povos e comunidades tradicionais e o fortalecimento da participação social dos territórios rurais e dos diferentes segmentos sociais.

Hoje esses avanços, que ainda são insuficientes, estão ameaçados pelo desmonte do Estado brasileiro promovido pelo grupo que se apoderou do governo. Além dos retrocessos em curso, há problemas persistentes: a concentração fundiária, o modelo de desenvolvimento centrado na monocultura e no interesse de corporações transnacionais, o uso de agrotóxicos, a crescente liberação dos transgênicos, a irresponsabilidade ambiental, a desvalorização de alimentos tradicionais e regionais, a ausência de regulação de produtos ultraprocessados não saudáveis e suas agressivas estratégias de marketing, bem como a presença de “desertos alimentares” – regiões que não possuem oferta acessível de alimentos variados, frescos e livres de veneno.

A atuação organizada de parlamentares engajados na efetividade do direito humano à alimentação é importantíssima, seja pela necessidade de produção normativa, seja pelo papel de fiscalização que o poder legislativo exerce. A formação de frentes parlamentares é um importante mecanismo de catalisação desses esforços em torno da proteção e da promoção de direitos.

A grande maioria das assembleias legislativas e câmaras de vereadores, porém, ainda não conta com frentes parlamentares de segurança alimentar e nutricional. Frentes parlamentares nos estados e municípios são espaços de diálogo com a sociedade e de organizar temáticas e demandas que devem ser regulamentadas localmente. Além disso, têm o papel de monitorar a implantação do Plano Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional e de contribuir na elaboração e efetivação dos respectivos planos estaduais e municipais.

Nesse sentido, as entidades presentes no Seminário Nacional sobre o Direito Humano à Alimentação, promovido pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias e pela Frente Parlamentar de Segurança Alimentar e Nutricional da Câmara dos Deputados em 30 de novembro e 1° de dezembro de 2016, estimulam a criação de frentes parlamentares estaduais e municipais com foco na segurança alimentar e nutricional, criando uma rede de resistência para evitar retrocessos e para lutar por avanços no campo dos direitos humanos econômicos, sociais, ambientais e culturais.

 

Brasília, 1° de dezembro de 2016.

 

Agentes de Pastoral Negros do Brasil

Articulação dos Povos Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo

Associação Brasileira de Agroecologia

Associação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas do Maranhão

Associação Rede de Pesquisadores e Extensionistas em Segurança Alimentar e Nutricional

Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida

Centro Nordestino de Medicina Popular

Comissão Permanente de Presidentes Estaduais de CONSEAS

Confederação Coordenação Nacional das Comunidades Negras Rurais Quilombolas – CONAQ

Confederação Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar do Brasil

Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura

Conselho Federal de Nutricionistas

Conselho Indigenista Missionário

Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional

Federação Nacional das Associações de Celíacos do Brasil

FIAN – Rede de Informação e Ação pelo Direito a se Alimentar

Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional

Fórum de Segurança Alimentar e Nutricional do Espírito Santo

Fórum Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional dos Povos Tradicionais de Matriz Africana – FONSANPOTMA

Greenpeace

Grupo de Estudos em Segurança Alimentar e Nutricional Professor Kitoko

Grupo de Trabalho Educação do Movimento Slow Food Brasil

Movimento Camponês Popular

Movimento dos Pequenos Agricultores

Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra

Rede de Mulheres Negras para Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional

Rede Nacional de Colegiados Territoriais

Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Fundação Oswaldo Cruz

Via Campesina

Relatório internacional aponta preocupação com povo Guarani-Kaiowá

Um estudo feito pela Foodfirst Information and Action Network (FIAN) em parceria com o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) constatou que o grau de insegurança alimentar de três comunidades da etnia Guarani-Kaiowá que habitam o Mato Grosso do Sul está em 100%. Para se ter uma ideia, no estado, por exemplo, esse índice é de 18,2% e, no caso da população brasileira em geral, a insegurança é de 22,6%.

A pesquisa é a versão em português da 8ª edição do “Observatório do Direito à Alimentação e à Nutrição”, e foi lançada nesta quarta (16) pela FIAN, organização que reúne internacionalmente diversos movimentos sociais e entidades, em Brasília (DF). Com periodicidade anual, a publicação monitora o cenário da segurança alimentar em diversas partes do mundo.

Os pesquisadores apontam que a falta de proteção e promoção da identidade cultural indígena é um fator preponderante no processo de ameaça a outros direitos, o que impacta no acesso à alimentação e à nutrição adequadas.

“O dado mais grave que identificamos é a desnutrição crônica, que afeta crianças menores de 5 anos. A média das comunidades avaliadas foi de 42%, o que significa que as crianças não estão crescendo como deveriam. Esse mesmo índice é de 26% para crianças indígenas no país, de modo geral, e de 6% para crianças não indígenas”, acrescenta a secretária-geral da FIAN Brasil, Valéria Burity.

O estudo teve início em 2013 e verificou a situação de cerca de 400 pessoas (96 domicílios) nas três comunidades analisadas.

Demarcações

O monitoramento feito pela FIAN assinala ainda a questão territorial como um ponto central do aspecto alimentar e nutricional das comunidades. A ocupação geopolítica dos espaços, em especial com o fenômeno da colonização agropecuária, resultou, historicamente, em um processo acentuado de violação de direitos.

O Mato Grosso do Sul, por exemplo, tem a segunda maior população indígena do país e amarga um dos piores índices de reconhecimento territorial, com apenas 1,8% de áreas indígenas demarcadas.

“No processo de exploração econômica, os Guarani-Kaiowá foram tirados de suas terras e confinados em reservas. Um relatório feito pela Comissão Nacional da Verdade [CNV] identificou que isso resultou de um processo de liberação das áreas para o poder econômico do estado. Essas reservas foram feitas sem qualquer respeito à identidade cultural deles. Há, nesse processo, todo um contexto de conflito de terras, violência e discriminação que dificulta o acesso à alimentação adequada”, analisa Burity.

Ela acrescenta ainda que o cenário de violações é diretamente responsável pelo índice de suicídios, que chega a um caso por semana entre as comunidades da etnia, segundo dados do Cimi. “Esse é mais um indicador da grave situação que afeta os Guarani-Kaiowá”, afirmou a secretária-geral.

As três comunidades contempladas no estudo têm casos de lideranças que foram assassinadas no processo de luta pela terra.

“Elas vivem cercadas pela monocultura e pelo agronegócio, num ambiente de muita hostilidade. (…) Sofrem ações judiciais de despejo, ataques militares ilegais e outras violências, num verdadeiro processo de massacre”, destacou Burity.

Sociologia e meio ambiente

Para os movimentos da causa agrária, a situação da etnia Guarani-Kaiowá e dos povos do campo em geral está diretamente associada ao caráter social da terra.

“Trata-se de uma questão de olhar para o território além dos seus aspectos produtivos ou além do espaço da terra em si, porque é algo maior do que a visão da terra como espaço de produção de comida. Os povos sentem uma necessidade de recuperar o processo histórico de enraizamento das comunidades no seu território tradicional, de acordo com sua cultura. O debate em relação aos Guarani-Kaiowá passa diretamente por isso. É a reivindicação do papel sociológico da terra”, analisa Cléber Folgado, membro do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) e da Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e pela Vida.

Ao retratar as questões políticas atuais e o relatório deste ano, o representante da FIAN Internacional que esteve no lançamento, Flávio Valente, inseriu o contexto da luta pela terra no processo global de avanço conservador.

“O Brasil está passando por uma crise terrível. A magnitude do que está ocorrendo é do nível de um genocídio, uma agressão bárbara. Mas é preciso assinalar que não é só aqui. Há uma ofensiva global, com desdobramentos na Europa, nos Estados Unidos, na Ásia, na África e aqui. Precisamos trabalhar muito e unificar as agendas pra superar este momento difícil”, afirmou Valente.

por Cristiane Sampaio/ Brasil de Fato