Campanha mostra alternativas dos territórios para a crise alimentar mundial

Em resposta ao cenário de violações ao direito à alimentação, à crise climática e ao desmantelamento do sistema de direitos humanos como um todo, cada seção nacional da FIAN compartilhará nesta semana experiências de enfrentamento à crise alimentar que geram alternativas de soberania e autonomia alimentar. Esse é o tema da edição atual do Observatório do Direito à Alimentação e à Nutrição, que confronta verdadeiras e falsas soluções diante de crises globais.

“Soluções verdadeiras: alternativas dos territórios para a crise alimentar mundial” traz saídas alicerçadas em experiências de diferentes partes do mundo. Dentre elas estão a transformação agroecológica urgente, a pesca sustentável e as mobilizações para proteger os sistemas alimentares com base nos direitos humanos.

Comunidades estão assumindo a liderança para enfrentar o aumento da fome e da desnutrição, servindo de exemplo para as instituições internacionais que continuam a não tratar das causas estruturais da fome. Elas estão encontrando alternativas ao sistema alimentar industrial, apesar de serem diretamente afetadas pela crescente desigualdade, pela desapropriação, pela mercantilização da natureza, pela apropriação de terras e de recursos naturais.

Os territórios buscam romper as assimetrias entre centro-periferia e Norte-Sul, além das relações neocoloniais que são perpetuadas nas políticas de transição climática, o colonialismo verde. As comunidades estão deixando claro que o Sul Global não quer continuar sendo um espaço subalterno a ser explorado, destruído e reconfigurado de acordo com as necessidades de acumulação de capital. Além disso, estão adotando uma abordagem transformadora, alcançando a soberania alimentar em harmonia ecossocial para salvaguardar o direito à alimentação a todos.

Um outro mundo não só é possível, como já o estamos construindo de baixo para cima, com organização e mobilização a partir das bases, das ruas, bairros, vilarejos e comunidades. As comunidades estão indo à raiz dos problemas, confrontando a captura corporativa, o greenwashing (‘maquiagem verde”) e as práticas neocoloniais embutidas em falsas soluções para as crises climática, ecológica e alimentar.

FIAN Brasil participa de conferência de políticas contra a fome na Alemanha

A FIAN Brasil participou, neste mês, de uma conferência de políticas contra a fome organizada pelo Ministério da Agricultura e da Alimentação da Alemanha. Com o título de “Vinte anos de ação: avançando o direito humano à alimentação”, o encontro em Berlim celebrou as duas décadas das diretrizes voluntárias das Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) para a realização desse direito, fazendo um balanço dos usos e desdobramentos da publicação. A FIAN está entre as signatárias de declaração pela implementação integral do instrumento.

A secretária-geral da FIAN Brasil, Nayara Côrtes Rocha, ressaltou a importância das diretrizes. “Elas funcionaram como uma ferramenta para que os Estados criassem políticas concretas para realizar gradualmente o direito humano à alimentação e à nutrição adequadas, o Dhana”, disse. “No Brasil, a sociedade civil se apropriou dessas diretrizes, no sentido de divulgá-las, o que foi muito importante na construção do nosso arcabouço legal de políticas públicas de segurança alimentar e nutricional.” Ela representou a entidade no evento, realizado nos dias 4 e 5, a convite da Pão para o Mundo (PPM)  

Na conferência, cerca de 200 participantes de 38 países discutiram os sucessos e desafios na concretização do Dhana. Além da FIAN, do Brasil foram convidadas a organização de Agricultura Familiar e Agroecologia, AS-PTA, o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) e a Secretaria Extraordinária de Combate à Fome (SECF) do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS). Representantes do Consea e da SECF compartilharam nas mesas experiências brasileiras vivenciadas na construção e na reconstrução dessas políticas.

O Brasil teve destaque no evento em razão de sua histórica participação social na construção das políticas públicas do campo. O Consea, que é parte do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan), é formado por pessoas e organizações distribuídas em todo o território nacional, representando uma grande diversidade de grupos, desde aqueles que enfrentam violações de direitos, passando por promotores do Dhana, organizações dedicadas ao estudo e realização dessas questões, dentre várias outras.  

“A participação desses diversos segmentos enriquece nossa política, que, apesar de suas imperfeições e contradições, é referência internacional no campo”, afirmou Nayara Côrtes. Ela disse que essa posição foi consolidada através de práticas inovadoras que inspiram outras nações a adotar abordagens mais inclusivas e participativas na formulação de políticas públicas.

Durante a conferência, especialistas e representantes de diversos setores debateram a construção de uma agenda para garantir o direito à alimentação até o ano de 2034. “Nós refletimos profundamente sobre o que ainda está faltando, os novos desafios que surgem no caminho para garantir esse direito de forma abrangente”, relata Nayara Côrtes. Ela ressalta que, embora tenha havido avanços significativos, há ainda muito trabalho a ser feito. “A luta pelo direito humano à alimentação e à nutrição adequadas só terminará quando todas as pessoas tiverem seus direitos plenamente garantidos”, pontua.

Côrtes apontou a necessidade do diálogo contínuo entre governos e sociedade civil ao redor do mundo. Essa colaboração, segundo ela, é essencial para aprendizados mútuos e para fortalecer estratégias que possam acelerar o progresso na área da segurança alimentar globalmente.

A conferência reforçou o compromisso de diversas nações e organizações em trabalhar de forma colaborativa e intensificada para enfrentar os desafios persistentes e alcançar um futuro em que o direito à alimentação seja uma realidade universal.

Conferência “Políticas contra a Fome”. Foto: Ministério Federal da Alimentação e da Agricultura da Alemanha (BMEL).