Ao descobrir as terríveis condições de vida das comunidades afetadas, a delegação aponta para o envolvimento do capital internacional da Europa, do Canadá e dos EUA em grande escala de aquisição de terras na região do Matopiba.
A Caravana Matopiba concluiu sua missão com uma série de audiências públicas e reuniões em Bom Jesus (PI), Teresina (PI) e Brasília (DF). Apresentando algumas recomendações preliminares, a delegação solicitou às autoridades brasileiras a tomarem medidas imediatas para melhorar as condições de vida das comunidades afetadas e tomar medidas para combater as irregularidades com a titulação da terra na região.
Durante a Caravana, realizada entre os dias 4 a 15 de setembro, a delegação testemunhou a gravidade da violência estrutural contra as comunidades, cujas terras são ocupadas por “grileiros”. Como resultado, os moradores enfrentam ameaças, destruição de lares, perda de meios de subsistência, contaminação por agrotóxicos, problemas de saúde e diminuição de abastecimento de água, bem como a perspectiva de ação legal.
Em todas as comunidades visitadas, a delegação informou uma ausência terrível do Estado. A população, geralmente, carece de serviços públicos, como escolas, eletricidade, infraestrutura e instalações de saúde e são discriminados pela polícia, que não os protege. Conforme salientado pelo membro da delegação Altamiran Ribeiro (CPT-Piauí), a ação do Estado é fundamental para a sobrevivência dessas comunidades: “Apoiamos essas comunidades ou são condenadas à morte”.
Fundos de pensão
A Caravana Matopiba também abordou o papel contestado do capital internacional na aquisição de terras em larga escala. Desde a crise financeira em 2008, a terra e o agronegócio são cada vez mais vistos como setores comparativamente seguros para investir. Atores importantes neste campo são fundos de pensão, que são obrigados pela legislação nacional a aumentar seu capital para garantir pagamentos de aposentadoria futuros. Atualmente, os fundos de pensão estão investindo mais de 32 trilhões de dólares em todo o mundo, incluindo a região visitada pela missão de pesquisa, o sul do Piauí.
Pesquisas anteriores mostram que o TIAA-CREF, um fundo de pensão dos EUA com capital de aproximadamente 1 trilhão de USD, está operando na região de Matopiba através de uma empresa chamada Radar. Sob a aparência de uma estrutura complexa, a empresa contorna a lei brasileira que proíbe investimentos estrangeiros acima de uma certa escala.
A TIAA-CREF recebe investimentos de fundos de pensão no Canadá, Alemanha, Holanda e Suécia, entre outros países. Os governos nacionais estão apenas monitorando os riscos financeiros desses investimentos, mas estão desconsiderando os custos humanos em potencial, embora tenham a responsabilidade de proteger os direitos humanos dentro e além de suas fronteiras.
Próximos passos
A delegação continuará a investigar e expor a problemática desses investimentos nos próximos meses. Para o efeito, uma missão de pesquisa de acompanhamento será realizada no início do próximo ano na Europa. O objetivo é esclarecer o envolvimento do investimento europeu em aquisições em larga escala na região de Matopiba, bem como a inação de Estados europeus sobre o mesmo. Contudo, já é bastante claro que os fundos de pensões devem deixar de investir na região e que os Estados precisam regulamentar os fundos de pensões com base nas suas fronteiras nacionais.
É o Estado brasileiro que, em última instância, é responsável por pôr fim a essa prática, que não é apenas característica desta região, mas do país como um todo. Nesta nota, a delegação está considerando a possibilidade de solicitar uma medida cautelar pela Corte Interamericana de Direitos Humanos.
O relatório final da missão de pesquisa será publicado até o final de 2017.
Caravana
A Caravana foi coordenada pela FIAN Internacional e organizada pela FIAN Internacional, Rede Social de Justiça e Direitos Humanos, FIAN Brasil e CPT Piauí, e conta com o apoio de diversas organizações nacionais e internacionais, entre estas: Comissão Pastoral da Terra (CPT), CLOC – La Via Campesina, Via Campesina Brasil, GRAIN, ActionAid USA, Friends of the Earth International, WhyHunger, InterPares, Development and Peace, FIAN Suécia, FIAN Alemanha, FIAN Holanda, Solidaridad Suecia – América Latina, Grassroots International, National Family Farm Coalition, Family Farm Defenders, Student/Farmworker Alliance, Maryknoll Office for Global Concerns, Presbyterian Hunger Program, SumOfUs, Campanha Nacional em Defesa do Cerrado, FASE, FIOCRUZ, HEKS/EPER, ActionAid Brasil, Cáritas Regional do Piauí, Federação dos Agricultores Familiares (FAF), Federação dos Trabalhadores Rurais na Agricultura (FETAG-PI), Escola de Formação Paulo de Tarso (EFPT – PI), Vara e Procuradoria Agrária – PI, PROGEIA (Santa Filomena), Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Santa Filomena, Paróquia de Santa Filomena, Instituto Comradio do Brasil e Obra Kolping do Piauí.