Organizações denunciam violação de direitos dos povos indígenas na ONU

Durante a 36ª. Sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU, em Genebra, organizações da sociedade civil explicitam as contradições dos atos do governo de Michel Temer com os compromissos do Brasil na ONU.

No diálogo interativo com a Relatora Especial sobre Direitos dos Povos Indígenas, Victória Tauli-Corpuz, representantes de organizações da sociedade civil, entre elas Aty Guasu, Apib, Conectas, CIMI, Plataforma Dhesca e RCA, afirmaram que os compromissos assumidos pelo Brasil no plenário do Conselho de Direitos Humanos, após visita da relatora ao país, não estão sendo cumpridos. Ao contrário, o governo tem atuado no sentido de restringir direitos e fragilizar a proteção aos povos indígenas. Foram levados ao conhecimento dos membros do Conselho da ONU, o Parecer da Advocacia Geral da União que impõe a tese do marco temporal e viola o direito de consulta; a revogação da portaria declaratória da Terra Indígena Jaraguá; a drástica redução no orçamento da Funai para 2018; a criminalização e morte de lideranças; o massacre de isolados no Vale do Javari; e a situação de crise humanitária dos povos indígenas do Mato Grosso do Sul.

Voninho Benites, da Grande Assembléia Aty Guasu, denunciou que o STF anulou a demarcação da Terra Indígena Guyraroká, aplicando a tese do Marco Temporal. “ Como poderíamos estar na terra (em 1988) se o próprio Estado nos expulsou de lá?” O representante do segundo maior povo indígena do Brasil, Voninho Benites, demandou que o Conselho de Direitos Humanos da ONU tome medidas urgentes frente a grave crise humanitária que vivem. “Já são 750 suicídios e 450 assassinatos de Guarani se Kaiowás. Não aceitaremos esta realidade. Seguiremos resistindo e demarcando nossa terra com nosso próprio sangue.”

As críticas ao governo brasileiro no plenário do Conselho motivaram a presença da Embaixadora do Brasil na ONU, Maria Nazaré Azevedo, que se deslocou da sede da missão brasileira para solicitar direito de resposta. Em seu pronunciamento, a embaixadora afirmou que o governo declarou 01 terra indígena no estado do Amazonas e investe 700 milhões de dólares na saúde indígena. Repetindo a velha ladainha de comparar terras demarcadas pelos governos anteriores com a extensão de certos países europeus, a Embaixadora se esquivou de responder aos questionamentos colocados sobre o sucateamento da Funai mas afirmou “o governo brasileiro está trabalhando e continuará trabalhando como manda a Constituição com relação à demarcação (de terras indígenas)”. Com relação à situação de risco de extermínio de povos isolados no Vale do Javari, a representante do Estado disse que o Ministério Público Federal está investigando a denúncia de mortes. A Embaixadora confirmou que foram encontrados garimpeiros na terra indígena com a maior concentração de povos isolados no mundo mas não informou sobre qualquer medida que o governo esteja tomando frente ao cenário de invasão e conflito.

Acesse o pronunciamento do Secretário Executivo da RCA Luis Donisete Benzi Grupioni na ONU

Acesse o pronunciamento de Voninho Benites da Aty Guasu Guarani e Kaiowá

Acesse a réplica da Embaixadora do Brasil na ONU Maria Nazareth Farani Azevedo

Fonte: RCA

 

 

Programa 2: Como o Marco Temporal afetou os Guarani Kaiowá?

Ouça e compartilhe a segunda edição do programa “Seu Direito É Nossa Pauta”, um boletim de áudio da Articulação do Povos Indígenas do Brasil (Apib) e Fian Brasil.

Em cinco programas, vamos falar de uma ameaça que pode influenciar a vida de todos os povos indígenas no Brasil.

Neste programa, falamos como o povo Guarani Kaiowá, a segunda maior etnia do país, que foi afetada pela tese do Marco Temporal.

 

 

Saiba Mais:

 FIAN Brasil e APIB lançam campanha “Seu Direito É Nossa Pauta”

“Não há nenhum fazendeiro indiciado na CPI. Somente pessoas que lutam pela vida dos povos indígenas”, afirma dom Leonardo Steiner, da CNBB

Em coletiva de imprensa na tarde desta quinta-feira (22), a presidência da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) divulgou uma nota em defesa dos povos indígenas e do Conselho Indigenista Missionário (Cimi). O texto denuncia a “evidente tentativa de intimidar” a instituição com mais de 45 anos de existência.

Leia a nota oficial da CNBB

Sobre o processo e os resultados da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Funai e Incra, encerrada no mês de maio, Dom Leonardo Steiner afirmou que são processos unilaterais que visam “colocar na parede” organismos, indígenas, antropólogos e procuradores que defendem os direitos indígenas. “Não existe nenhum fazendeiro indiciado. Somente pessoas que lutam pela vida dos povos indígenas. Isso prova que são iniciativas imparciais”, ressaltou o secretário geral da CNBB. “O direito dos povos originários não é refletido. A CPI não criou possibilidade de diálogo para debater a questão das terras, das culturas indígenas. Tudo o que pretende é criminalizar os movimentos”.

Ao criticar o contexto em que a CPI se insere, numa conjuntura política que negocia reformas prol do mercado, o bispo franciscano acusou o atual congresso de privilegiar o capital, colocando em detrimento os avanços sociais e os direitos dos povos. “Sentimos que há uma pressão contra os povos originários e os mais pobres. A conjuntura política do país olha para o mercado e não para as pessoas. Como resultado temos um aumento da violência no campo, inclusive no período em que acontecia o processo da CPI”.

Para o cardeal dom Sérgio da Rocha, arcebispo de Brasília e presidente instituição, os responsáveis pelo relatório que indicia mais de cem pessoas, entre elas religiosos, padres e bispo, não se dispuseram o dialogar com a Conferência.  “A falta de diálogo com a CNBB mostra que são iniciativas sem legitimidade, além de ser antidemocrática”, apontou o religioso. A nota divulgada também embasa o caráter imparcial do processo. “A CPI desconsiderou dezenas de requerimentos de alguns de seus membros, não ouviu o CIMI e outras instituições citadas no relatório”.

“Não existe nenhum fazendeiro indiciado. Somente pessoas que lutam pela vida dos povos indígenas”, reforça dom Leonardo Steiner.

A nota apresentada pela presidência contou com a aprovação da maioria dos membros do Conselho Permanente reunido no período de 20 a 22 de junho, na sede nacional da Conferência, em Brasília (DF).

Por Guilherme Cavalli, da Assessoria de Comunicação do CIMI

Guarani-Kaiowá relata violações de direitos em MS

Um grupo de jovens indígenas Guarani-Kaiowá entregou, nesta quarta-feira (21), à Comissão de Direitos Humanos da Câmara, documento em que pede apoio no combate às sistemáticas violações de direitos enfrentadas por esse povo em Mato Grosso do Sul.

A reunião com os parlamentares é resultado de um projeto realizado pela Oscip (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público) Imagem da Vida com mais de 300 jovens e lideranças indígenas da região. Pela voz de crianças e adolescentes, o grupo espera sensibilizar parlamentares e gestores públicos em Brasília para os problemas vividos cotidianamente por essas populações tradicionais.

“A esperança que a gente tem é que esses parlamentares, autoridades nos ajudem, façam nosso direito valer, porque, em Mato Grosso do Sul, nossos direitos estão sendo violados”, afirmou Jhonnar Gomes, de 16 anos.

Homicídios e suicídios
Os Guarani-Kaiowá são a segunda maior população indígena do País, com 45 mil indivíduos. Dirce Carrion, presidente da Imagem da Vida, disse que, entre os anos de 2003 e 2016, foram registrados 400 homicídios por questões de conflito de terra em Mato Grosso do Sul. No mesmo período, ocorreram 707 casos de suicídio, um dos índices mais elevados do mundo entre populações indígenas.

“Temos aqui crianças que viram seu avô, que era uma liderança, o Nizio Gomes, ser assassinado na sua frente. São crianças que estão acostumadas a viver na beira da estrada, sem alimentação, sem casa, sem nenhum tipo de direito. E como eles mesmos dizem, e dizem muito bem, eles são os legítimos donos desta terra e não têm direito a viver nela. A prioridade é para milhões de hectares para os bois, e eles estão na beira das estradas”, afirmou Carrion.

O presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara, deputado Paulão (PT-AL), destacou a importância de se dar visibilidade à luta dos povos indígenas e impedir propostas que prejudiquem o reconhecimento do direito à terra. “Não é tarefa fácil, porque a correlação de forças é desigual”, disse.

Paulão ressaltou que vários projetos em tramitação, originários do governo ou do Legislativo, prejudicam os povos indígenas. “Por exemplo, quando se diminui uma área de terras demarcadas, quando se eliminam futuras demarcações, ou se vendem terras a povos estrangeiros, ou ainda quando não há critério sobre agrotóxico ou não se estabelece um fortalecimento da Funai no Executivo”, enumerou.

Além da visita à Comissão de Direitos Humanos da Câmara, o grupo de jovens Guarani-Kaiowá também levou suas reivindicações à Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República e a representantes de organismos internacionais.

Fonte: Agência Câmara Notícias

Fotos: Marcelo Camargo/EBC/FotosPublicas

FIAN Brasil participa do Colóquio Internacional Elikadura²¹ no País Basco

“O futuro de desafios alimentares e agrícolas para o século XXI: debates sobre  quem, como e com que implicações sociais, econômica e ecológica alimentarão o mundo”, este foi o tema do Colóquio Internacional Elikadura²¹ realizado entre os dias 24 e 26 de abril, no País Basco. A FIAN Brasil participou do Colóquio com a apresentação de um artigo sobre o diagnóstico da situação alimentar e nutricional dos povos Guarani e Kaiowá. O texto foi apresentado pelo assessor de direitos humanos da organização, Lucas Prates.

O principal objetivo do Colóquio é discutir a complexidade sobre o tema da alimentação, com a intenção de unir perspectivas de diferentes setores (o campesinato, pesca, instituições públicas e pesquisa). Os debates no Colóquio partiram de seis temas que orientaram a discussão: 1. O capitalismo, classe, agricultura, pecuária e pescas; 2. Mudança climáticas e convergências; 3. Modelos de desenvolvimento no contexto dos fluxos de capital, bens e pessoas; 4. O acesso e controle sobre os meios de produção; 5.Consumo, saúde, nutrição e do direito à alimentação; 6. Movimentos Soberania Alimentar. Mais informações sobre o Colóquio.

Seminário em Bruxelas debate Violação de Direitos Humanos dos Povos Indígenas do Brasil

O “Seminário da Sociedade Civil União Europeia-Brasil em Direitos Humanos”, que acontece na cidade de Bruxelas, Bélgica, neste dia 26 de abril, reunirá representantes de organizações brasileiras e europeias para um diálogo sobre a situação vivida pelos povos indígenas, população privada de liberdade, migração e discriminação Racial e intolerância religiosa.

O evento é preparatório ao Diálogo oficial entre a União Europeia e o Brasil sobre direitos humanos, que ocorre no dia 27 de abril, também em Bruxelas. Para o secretário executivo do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Cleber Buzatto, que representa a entidade no Seminário, “trata-se de uma importante oportunidade de fortalecer o engajamento e a articulação da sociedade civil brasileira e europeia a fim de que os direitos humanos sejam melhor protegidos e promovidos em ambas realidades geográficas”.

As conclusões do Seminário da sociedade civil serão levadas e consideradas como parte do Diálogo Bilateral, que contará com a participação do corpo diplomático da União Europeia, representada pela Comissão Europeia, e do Brasil, representado pelo Ministério das Relações Exteriores.

Em sua 6ª. Rodada, pela primeira vez o tema “Povos Indígenas” entrou na pauta do Diálogo Oficial bilateral EU-Brasil sobre direitos humanos.  A visibilidade internacional relativa à situação caótica enfrentada pelos povos indígenas no Brasil certamente contribuiu para a inclusão do tema na pauta do Diálogo bilateral neste ano de 2017. “Os povos indígenas, seus direitos e aliados estão sob violento e sistemático ataque por parte de setores político-econômicos vinculados ao agronegócio no Brasil. O agronegócio produz commodities e a União Europeia importa parte dessa produção”, denuncia Buzatto.

Para o missionário indigenista, “é importante que a sociedade civil e a Comissão Europeia estejam cientes das violações de direitos humanos dos povos indígenas, quilombolas, populações tradicionais e camponeses decorrentes da produção dessas commodities no Brasil e como sua importação e consumo, pelos Europeus, pode estar contribuindo nesse processo”.

Na ocasião, serão apresentados casos concretos de violações de direitos humanos de povos indígenas no Brasil, a exemplo do que ocorre com os Guarani Kaiowá, no Mato Grosso do Sul. O massacre de camponeses em Colniza, no Mato Grosso, ocorrido no último 19 de abril, também será retratado no Seminário. Por fim, serão aportadas recomendações a serem adotadas pela União Europeia e seus Estados Membro e pelo Estado brasileiro.

Do Brasil, além do Cimi, participam, dentre outros, representantes da Associação Nacional de Organizações Não Governamentais (Abong), Conselho Nacional de Igrejas Cristãs (Conic), Coordenadoria Ecumênica de Serviço (CESE), Movimento Nacional de População de Rua e FASE. Da Europa, dentre outros, participam representantes da Anistia Internacional, FIAN Internacional, AVSI Fundation e Povo Saami.

Fonte: CIMI

Filme Martírio, de Vincent Carelli, está em cartaz em 19 capitais

O filme Martírio, ganhador do Júri Popular no 49º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, aborda o tema da batalha dos indígenas em busca do respeito às suas terras. Com direção de Vincent Carelli, Ernesto de Carvalho e Tatiana Almeida, o longa analisa a violência sofrida pelos Guarani Kaiowá diante ao genocídio do seu povo. Segundo filme da trilogia que começou com Corumbiara, o povo indígena retratado é uma das maiores populações indígenas brasileiras, que entram em constantes conflitos com latifundiários, pecuaristas e fazendeiros locais pela luta de terras.

O documentário que estreou no dia 13 de abril em 19 capitais do país denuncia os sucessivos massacres e violências contra os povos indígenas. Em Brasília, o filme estreia no dia 19 de abril, com sessão às 21h, no Cine Brasília. Após a exibição, haverá debate com dois dos seus diretores e a professora doutora Dácia Ibiapina (UnB), com mediação do crítico e pesquisador de cinema Guilherme Lobão (Abraccine). Entrada franca.

Com informações do Cine Brasília

Consea relaciona ‘tragédia humana’ dos Guarani Kaiowá ao agronegócio

Relatório feito após visita ao MS critica juízes federais, governos e desmonta argumentos dos fazendeiros; confira trechos mais importantes

Ligado diretamente à Presidência da República, o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) pode representar mais um peso na balança de poder que envolve a situação dos índios Guarani Kaiowá no Mato Grosso do Sul. A entidade esteve em comitiva no Estado entre agosto e setembro de 2016, onde visitou diversas comunidades – reservas, terras ocupadas e acampamentos em beira de estrada. O resultado é um relatório alarmante sobre a realidade dos indígenas no Estado.

(Reprodução: Consea)

Intitulado ‘Tekoha: Direitos dos Povos Guarani e Kaiowá“, o relatório critica o poder público de forma abrangente. Após constatar a fome, a saúde precária e demais violências sofridas pelas comunidades, o Consea afirma que os Guarani Kaiowá vivem uma tragédia humana no Mato Grosso do Sul. O teor de denúncia do relatório não economizou nos detalhes: de juiz ruralista à omissão do governo estadual, passando pela perseguição de pistoleiros aos agentes de saúde da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai).

O PAPEL DO AGRONEGÓCIO

A presidente do Consea, Maria Emília Lisboa Pacheco, destacou a tradicionalidade da terra para os Guarani Kaiowá. A necessidade que eles têm de matas, com frutos para coleta, plantas medicinais, áreas para plantio da roça familiar ou coletiva. Cultura que eles estão sendo impedidos de viver. “A comitiva constatou um quadro de violência com mortes por assassinato, manifestações de preconceitos e violação de direitos humanos, em especial o Direito Humano à Alimentação Adequada”, diz o relatório. “Uma verdadeira tragédia humana!”

(Reprodução/ Consea)

A presidente do Consea critica o que chamou de “expansão do agronegócio, com um alto nível de degradação ambiental e contaminação por agrotóxicos do solo e dos mananciais”, além do “confinamento a que estão submetidos esses povos”. Para a entidade, a questão só tem uma resposta: demarcação e titulação de terra, a garantia do Direito Humano à Alimentação e o acesso a políticas públicas, “em conformidade com as cláusulas de nossa Constituição cidadã”.

O documento também destaca a história da colonização do Estado, e critica a marginalização dos índios durante o processo. Desde 1920, época da criação dos “aldeamentos” pelo Estado, as diminutas áreas reservadas para a população Guarani:

– Entre os anos 50 e 70, a expansão do agronegócio no Centro-Oeste brasileiro deu-se por meio da expulsão dos povos indígenas Guarani e Kaiowá de suas terras tradicionais, que contou com o apoio e o incentivo governamental das três esferas (União, estado e município) e dos três Poderes (Executivo, Judiciário e Legislativo), demonstrados objetivamente por meio da autorização da emissão de títulos de propriedade para terceiros, pela impunidade dos crimes cometidos contra os povos indígenas do estado e pela ausência de políticas públicas adequadas de saúde, educação e alimentação.

Para a presidente, a violação aos direitos territoriais dos índios continua até hoje, e pode ser ilustrada pela “consumação de interpretações jurídicas preconceituosas e parciais em prol dos interesses econômicos locais”.

Leia matéria completa AQUI.

Fonte: De Olho nos Ruralistas

Governo brasileiro não vê suicídios dos Guarani-Kaiowá como crise, diz jornal canadense

O jornal canadense The Globe and Mail divulgou a versão em português de reportagem sobre os suicídios entre os Guarani Kaiowá, 22 vezes maiores que no conjunto da população brasileira: “Os esquecidos: por dentro da crise de suicídios indígenas no Brasil“. A reportagem de Stephanie Nolen, publicada em inglês no dia 17, constatou que o governo brasileiro não vê nisso uma crise – como ocorre no caso canadense.

Apesar da epidemia, dos enforcamentos seguidos, “os policiais nunca atendem a um chamado da aldeia rapidamente”, diz a reportagem. Com isso as crianças acabam vendo os corpos dos parentes pendurados. A maior parte dos casos ocorre entre adolescentes.

Segundo a publicação, a situação no Brasil tem muitos paralelos com o fenômeno no Canadá. Mas lá os suicídios indígenas são definidos como “crise”. “O primeiro-ministro, Justin Trudeau, afirmou que adotará medidas urgentes contra o suicídio indígena”, escreve a repórter.  “Seus ministros prometeram uma intervenção em âmbito federal”.

No Brasil, silêncio. A reportagem informa que, em 2015, o governo federal prometeu reduzir em 10% a taxa de suicídio na região, e anunciou um plano de prevenção para as aldeias mais afetadas. Mas sem informar o orçamento ou mesmo os locais específicos da ação. “A resposta tardia e imprecisa reflete, em parte, o fato de que o país, já atolado em uma turbulência econômica e política, tem cortado recursos e desviado o foco da maioria dos problemas sociais”, diz o The Globe and Mail.

Segundo a reportagem, menos que uma dúzia de pesquisadores no Brasil estudam as taxas “astronômicas” de suicídio indígenas. Apenas 13 psicólogos atendem os 70 mil indígenas do Mato Grosso do Sul. E o país nem sabe quando o problema começou, porque o governo só coleta dados desde os anos 90. Pior: os números podem ser maiores, pois as mortes de indígenas “quase nunca são submetidas à análise de um legista, ou muitas vezes, simplesmente, não são registradas”.

“Mais terra para as vacas”

Este trecho da reportagem descreve a visão que a repórter canadense teve do agronegócio, em contraste com o confinamento dos povos indígenas:

– No lado brasileiro da fronteira, os Guarani-Kaiowa contam com nove aldeias no sul do Mato Grosso do Sul, estado no coração do lucrativo agronegócio brasileiro. O território, cuja principal vocação é a produção de grãos, é um vasto mar de campos verdes de soja, cana de açúcar e milho que pertencem a algumas poucas empresas gigantes, muitas delas multinacionais. Enquanto o resto do Brasil cambaleia sob o peso de uma economia estagnada, ainda se faz muito dinheiro aqui: a fome do mercado asiático pela soja brasileira e pela carne bovina alimentada com soja não diminuiu. (…) Você pode dirigir durante 15, 20 minutos em linha reta e passar apenas por pastagens de gado Bhraman. Depois de um tempo, você percebe que muito mais terra aqui foi dada às vacas do que aos humanos indígenas.

Fonte: CIMI

Secretária-geral da Fian fala sobre situação dos Guarani e Kaiowá

“O desafio para garantir alimentação e nutrição dos Guarani e Kaiwoá é respeitar o modo de ser desses povos e o seu território”. A afirmação é de Valéria Burtiy, secretária-geral da Rede de Informação e Ação pelo Direito a se Alimentar (Fian Brasil) e ex-secretária executiva do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea). Na entrevista abaixo, Valéria, mestre em Direito Humano à Alimentação Adequada, Direitos Humanos e Direito Constitucional, faz um alerta sobre o contexto social vivido pelos povos Guarani e Kaiowá no Mato Grosso do Sul e destaca. “O que levou fome ao Povo Guarani Kaiowá foi a exploração econômica no Mato Grosso do Sul, a expulsão de suas terras e a discriminação e violência a que foram submetidos”.

O documento “O Direito Humano à Alimentação Adequada e à Nutrição do Povo Guarani e Kaiowá”, lançado em 2016 pela Fian Brasil, relata o índice de insegurança alimentar grave entres os povos Guarani e Kaiwoá. Qual o motivo dessa situação e como contorná-la?

Valéria Burity: Falta espaço aos Guarani e Kaiowá. No Mato Grosso do Sul são muitos os conflitos entre não indígenas e indígenas. No campo dos direitos territoriais, atualmente é acirrada a disputa entre o modo de produção que se expressa através dos latifúndios e monoculturas e o uso do território de acordo com a cultura indígena. O uso da área indígena pelos nativos não obedece aos parâmetros de produção de “riqueza” ou acumulação de bens, aos quais estão submetidas as propriedades e os latifúndios do estado, atualmente destinados, em sua maioria, à produção de soja e de gado de corte. Então falta terra e falta respeito à identidade cultural daquele povo.

Qual a relação entre a ausência da demarcação de territórios com a segurança alimentar e nutricional dos povos Guarani e Kaiwoá?

Valéria Burity: A situação dos Guarani e Kaiowá, em relação a direitos como saúde, alimentação e nutrição, acesso à água, educação, segurança, igualdade, seguridade social, entre outros, é gravíssima e está associada à não garantia de seus direitos territoriais. A violência e discriminação que esses povos sofrem e a ineficácia dos órgãos que deveriam proteger seus direitos quando lesados ou ameaçados também prejudicam a segurança alimentar nesse sentido. A violação à identidade cultural e ao uso do território de acordo com essa característica gera uma série de outras violações. Eles não podem cultivar plantas, animais e alimentos para autoconsumo, para produção de seus remédios naturais, tampouco podem ter mobilidade em sua área tradicional. Os povos Guarani e Kaiwoá vivem em um ambiente hostil de discriminação, violência e preconceito, cercados por monoculturas que demandam uso intensivo de agrotóxicos e maquinário, o que empobrece o seu solo tradicional, afeta sua saúde física e mental e, consequentemente, afeta todos os seus direitos e suas vidas.

Como é o seu trabalho com os Guarani e Kaiowá? Quais os principais desafios que você identifica na segurança alimentar desses povos?

Valéria Burity: Nosso trabalho é, em articulação com movimentos sociais, documentar as violações e dar visibilidade a estas transgressões, exigindo sua reparação dentro e fora do Brasil. O principal desafio é garantir o território e o respeito à identidade cultural dos povos indígenas. O que levou fome ao Povo Guarani Kaiowá foi a exploração econômica no Mato Grosso do Sul, a expulsão de suas terras e a discriminação e violência a que foram submetidos. O desafio para garantir alimentação e nutrição é respeitar o modo de ser desse povo (teko) e respeitar o seu território (ha). É a garantia dos tekohas o primeiro passo para firmar a dignidade destes povos.

Fonte: Consea