Foto: Ubirajara Machado

Combate à fome avança, mas não se vê transição para sistemas alimentares justos e sustentáveis, aponta Informe Dhana

Na primeira metade do governo Lula o combate à fome ganha novamente centralidade, e a retirada de 20 milhões de pessoas dessa situação desumana mostra o país a caminho de sair mais uma vez do Mapa da Fome com base na retomada de políticas. Por outro lado, o orçamento para programas estruturantes é insuficiente, assim como a proteção a territórios indígenas e de povos e comunidades tradicionais (PCTs). É o que mostra o Informe Dhana 2024: Esperançar e Exigir Direitos, que abarca também o último ano do governo Bolsonaro. 

O relatório foi publicado pela FIAN Brasil com o Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (FBSSAN).

“Se é gritante o contraste com os dois governos anteriores, caracterizados por desmontes e retrocessos, não se pode dizer que caminhamos a passos firmes para sistemas alimentares justos e sustentáveis, uma transição mais do que urgente diante da sindemia global que combina desnutrição, obesidade e mudanças climáticas”, diz a secretária-geral da FIAN Brasil, Nayara Côrtes Rocha, uma das organizadoras da publicação. “O Estado brasileiro segue empreendendo esforços e orçamento público na sustentação de um modelo de produção baseado na monocultura de commodities para exportação, que aprofunda as desigualdades, viola direitos, compromete a saúde pública e nos afasta cada vez mais da soberania alimentar e do Dhana.”

Ela assinala que, da parte do governo federal, as estruturas e as políticas voltadas à realização do direito à alimentação têm sido retomadas a todo o vapor, mas os anúncios ainda superam as ações e os planos e estratégias carecem ainda de recursos e implementação. “Especialmente no que diz respeito à redução de iniquidades e à garantia de direitos humanos aos grupos racializados e historicamente violados em seus direitos, o ritmo do avanço tem sido menor do que o esperado, assim como os resultados nos territórios e na vida dessas pessoas”, diz.

O informe chama atenção para o desnível entre o volume de recursos destinado ao  auxílio-gás e o de ações estruturantes como o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), as cisternas e o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan). O auxílio foi criado durante a pandemia de Covid-19 e tem fim previsto para 2026, o que faria a previsão do programa orçamentário de Segurança Alimentar e Nutricional (5.033) cair de R$ 4,9 bilhões para R$ 1,5 bilhão.

Diretrizes voluntárias

A edição de 2024 chega no momento em que se celebram os 20 anos das Diretrizes Voluntárias para o Direito à Alimentação, uma espécie de passo a passo pactuado entre os Estados no âmbito das Nações Unidas para a realização progressiva do direito humano à alimentação e à nutrição adequadas (Dhana). “No Brasil, é um momento em que se pode novamente respirar e acreditar nessa possibilidade, ainda que em um contexto global e nacional de crises simultâneas, que se retroalimentam e ampliam os desafios para a sociedade, governos e economias”, destaca a outra organizadora do estudo, a assessora de Políticas Públicas Mariana Santarelli, que também integra a coordenação da FIAN Brasil. “Como obstáculos, temos, ainda, o avanço da extrema-direita; um Congresso Nacional conservador e muito alinhado ao agro e à indústria de ultraprocessados; e um novo arcabouço fiscal que pressiona os gastos sociais.”

Além de capítulos focados nas políticas, o relatório dedica uma de suas partes ao contexto econômico. Ela aborda a inflação dos alimentos nos últimos anos, motivada pela disrupção das cadeias produtivas globais. Uma situação exacerbada pela pandemia e pela guerra entre Rússia e Ucrânia, que impactaram a disponibilidade de insumos agrícolas, como fertilizantes, e criaram gargalos logísticos. A desvalorização do real diante do dólar também é lembrada como fator inflacionário.

Informe Dhana busca compreender as estratégias adotadas pelo atual governo para reduzir o preço de alimentos saudáveis, como a retomada de políticas de abastecimento e a reforma tributária.

O documento da FIAN Brasil traz, ainda, um texto sobre ameaças ao marco legal do direito humano à alimentação, em particular a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 17/2023, que propõe trocar o termo “alimentação” por “segurança alimentar” no artigo 6º– aquele que reúne os direitos fundamentais – da Constituição Federal.

Educação Popular e Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas – Promovendo o Dhana com a Comunidade da Cozinha Solidária do Sol Nascente

Baixe ou leia online

Este livro baseia-se no Curso de Educação Popular em Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas para a Comunidade da Cozinha Solidária do Sol Nascente (DF), realizado em setembro e outubro de 2023.

Para as atividades, a FIAN Brasil estabeleceu uma parceria com o coletivo MultiplicaSSAN – promovendo a cultura de direitos, do Observatório de Segurança Alimentar e Nutricional (OPSAN) da Universidade de Brasília (UnB).

Construímos a iniciativa como um projeto de extensão universitária. A metodologia foi alicerçada na educação popular, de referência freiriana.

FIAN Brasil anuncia vaga para assessor(a) executivo(a) e de pesquisa

A FIAN Brasil – Organização pelo Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas e o Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (FBSSAN) anunciam a abertura de processo seletivo para a contratação de profissional para atuar na Assessoria Executiva e de Pesquisa, no Observatório da Alimentação Escolar (ÓAÊ). 

Sobre a FIAN Brasil

Somos uma organização de direito privado, sem fins lucrativos, apartidária, sem vínculo religioso, com sede e foro em Brasília (DF), com atuação de abrangência nacional. Nossa missão é contribuir para um mundo livre da fome e da desnutrição, no qual cada pessoa possa desfrutar plenamente dos seus direitos humanos, em particular o direito humano à alimentação e à nutrição adequadas (Dhana), com dignidade e autodeterminação.

A FIAN Brasil, juntamente com o Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional, coordena a secretaria executiva do Observatório da Alimentação Escolar. A atuação do ÓAÊ se organiza a partir de quatro grandes eixos:

i) Ativação do debate público, a partir da sistematização e produção de conteúdo sobre o Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae); ii) Incidência política em defesa do cumprimento e aprimoramento dos marcos legais e orçamento do Pnae; iii) Monitoramento e formação para a participação social e o controle social; iv) Mobilização e comunicação, com foco na amplificação das vozes dos sujeitos de direito do programa. 

Objetivo da contratação 

A/O profissional será responsável pelo assessoramento ao Núcleo Gestor, pela articulação entre as organizações e movimentos que compõem o ÓAÊ, e pela coordenação das atividades.

Atribuições:

  • Assessorar o núcleo gestor, comitê consultivo e grupos de trabalho do ÓAÊ;
  • Atualizar, revisar e manter organizado o acervo de materiais de referência sobre o Pnae no website do ÓAÊ; 
  • Coordenar as pesquisas, estudos, publicações e campanhas do ÓAÊ, incluindo a sistematização e redação de conteúdos e supervisão de consultorias;
  • Elaborar notas e documentos técnicos sobre a alimentação escolar;
  • Coordenar a realização de eventos virtuais e presenciais;
  • Gerir o e-mail institucional e os arquivos do ÓAÊ;
  • Convocar e relatar as reuniões do ÓAÊ;
  • Participar de reuniões semanais da FIAN Brasil;
  • Apoiar a redação de notícias e materiais de comunicação do OAE;
  • Participar de GTs e reuniões promovidas por agências financiadoras;
  • Apoiar elaboração de relatórios de atividades para as agências financiadoras;
  • Participar de atividades da FIAN Brasil, para além das atividades do projeto.

Requisitos obrigatórios

  • Bacharelado em Nutrição, Políticas Públicas, Ciências Sociais, Direito, Economia, ou áreas afins;
  • Habilidades de comunicação, diálogo e trabalho em equipe;
  • Conhecimento sobre políticas de segurança alimentar e nutricional, 
  • Experiência de trabalho ou estudo com o Pnae; 
  • Compromisso com direitos humanos e valores éticos relacionados ao trabalho da FIAN Brasil;
  • Experiência profissional de no mínimo 2 anos;
  • Indicação de referências para consulta sobre experiência profissional.

Requisitos desejáveis

  • Experiência de trabalho em/com organizações da sociedade civil, movimentos sociais, espaços de participação social, redes;
  • Facilidade de escrita e conhecimento de bases de dados e indicadores sociais e de segurança alimentar e nutricional;
  • Residir em Brasília (DF).

Processo para candidatura

Envio de: I) currículo, II) carta de motivação, III) indicação de ao menos duas pessoas de referências para contato sobre experiência profissional, IV) Declaração de Conflitos de Interesse (Anexo I). Os documentos solicitados deverão ser encaminhados para [email protected] com cópia para [email protected] e [email protected] até às 18 horas do dia 15/07/2024. Entrevistas serão agendadas com as pessoas selecionadas. 

Regime de contratação: CLT

Carga horária: 7h/dia 

Início previsto dos trabalhos: agosto de 2024

Duração do contrato: 12 meses, prorrogável por igual período.

Diversidade e inclusão

A FIAN Brasil defende e apoia a ampliação da diversidade na sociedade e, por essa razão, estimula e prioriza a candidatura de mulheres, pessoas negras, indígenas, quilombolas, LGBTQIA+ e/ou com deficiência, que cumpram os requisitos estabelecidos. Se você se enquadra nesses grupos, indique em sua carta de motivação.

Foto: Pedro Biondi/Repórter Brasil (2018)

Inconstitucionalidade de isenções para agrotóxicos volta a ser julgada pelo STF

O Supremo Tribunal Federal (STF) volta a julgar nesta quarta-feira (12) a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5.553, que questiona isenção fiscal para agrotóxicos. O julgamento acontecia em modalidade virtual e, com destaque em abril pelo ministro André Mendonça, a ação passa ser julgada em plenário presencial. A FIAN Brasil é uma das entidades ouvidas no processo como amicus curiae (“amigo da corte”).

“O uso de agrotóxicos interfere diretamente no direito humano à alimentação e à nutrição adequadas do povo brasileiro”, destaca o assessor de Direitos Humanos da entidade, Adelar Cupsinski. “Esse problema vem afetando sobremaneira a vida e a saúde dos povos indígenas, dos povos e comunidades tradicionais e dos trabalhadores rurais, bem como a sua produção agrícola. A alternativa saudável consiste em incentivar a agricultura tradicional e a agricultura agroecológica.”

Ajuizada pelo Partido Socialismo e Liberdade (Psol) em 2016, a ADI 5.553 questiona as cláusulas 1ª e 3ª do Convênio 100/97 do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) e o Decreto 7.660/2011. Esses dispositivos concedem benefícios fiscais aos agrotóxicos, com redução de 60% da base de cálculo do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS), além da isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) de determinados tipos dessas substâncias. A medida ficou conhecida em vários setores como “bolsa-agrotóxicos”.  

A isenção dos agrotóxicos ocorre porque o Estado brasileiro aplicou, por meios destes dispositivos, o princípio da seletividade e essencialidade tributárias. Esse princípio determina que o Estado pode selecionar produtos e conferir benefícios fiscais em função da importância social. Isto é, se o produto é essencial para a coletividade pode ter isenções ou reduções tributárias. Desse modo, há 27 anos, o mercado de agrotóxicos é beneficiado com isenção fiscal.   

A medida tem impacto direto na arrecadação fiscal. De acordo com levantamento realizado pela Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), a estimativa é de que estados e União deixaram de arrecadar R$ 12,9 bilhões, considerando a comercialização de agrotóxicos no ano de 2021. O valor representa, por exemplo, cinco vezes o orçamento reservado pela União em 2024 para prevenção e combate a desastres naturais (R$ 2,6 bilhões).  

Posicionamento dos ministros 

Com ida para plenário, o julgamento – que estava em estágio avançado, já com manifestações de votos de nove ministros – é reiniciado. Ou seja, os ministros deverão se manifestar novamente.  

A retomada do julgamento é compreendida por organizações que incidem como amicus curiae (amigos da corte) como importante oportunidade para ampliar o diálogo com sociedade e Suprema Corte sobre impactos da concessão de benefícios ao mercado de agrotóxicos.  

Relator da ação, o ministro Edson Fachin havia reconhecido em seu voto que a isenção fiscal dos agrotóxicos é inconstitucional. O ministro conclui que as normas questionadas pela ADI 5.553 violam artigos da Constituição brasileira e sugeriu uma série de providências para a cobrança de ICMS e IPI sobre importação, produção e comercialização de agrotóxicos. Também solicitou que órgãos do governo avaliem “a oportunidade e a viabilidade econômica, social e ambiental de utilizar o nível de toxicidade à saúde humana e o potencial de periculosidade ambiental, dentre outros, como critérios na fixação das alíquotas dos tributos” sobre os agrotóxicos.   

Na manifestação do voto, o ministro evocou também o princípio da precaução para destacar as evidências de riscos de uso e consumo dos químicos ao meio ambiente e à saúde. “O uso de produtos nocivos ao meio ambiente ameaça não somente animais e plantas, mas com eles também a existência humana e, em especial, a das gerações posteriores, o que reforça a responsabilidade da coletividade e do Estado de proteger a natureza”, apontou Fachin. O posicionamento do ministro é semelhante ao das organizações sociais que atuam como amicus curiae na ação, como a Terra de Direitos, a Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e Pela Vida, a Associação Brasileira de Agroecologia (ABA) e a FIAN.  

Já o ministro Gilmar Mendes acolheu os argumentos de entidades vinculadas ao agronegócio e se manifestou pela manutenção dos benefícios fiscais aos agrotóxicos. Mendes afirmou em seu voto que os danos à saúde “não devem ser desconsiderados, mas por si próprios são insuficientes para se declarar a inconstitucionalidade dos benefícios, porquanto produtos essenciais não são isentos de causarem malefícios à saúde”. A posição diverge do relator Fachin e de um conjunto de organizações, pesquisadores e órgãos que denunciam os fortes impactos dos agrotóxicos para a saúde e meio ambiente, o que descumpre preceitos constitucionais. Os ministros Cristiano Zanin, Alexandre de Moraes e Dias Toffoli acompanharam o voto de Gilmar Mendes. Já o ministro André Mendonça reconheceu, parcialmente, a inconstitucionalidade da isenção fiscal e determinou que a União e estados façam uma avaliação do benefício. Organizações e instituições de pesquisa também reivindicam a apresentação de dados que justifique a validade das normativas. 

Com o reinício do julgamento, as organizações têm a expectativa de que os ministros revejam os votos pelo reconhecimento da inconstitucionalidade do benefício fiscal.  

“Abre-se a oportunidade dos ministros que votaram pela constitucionalidade dos benefícios fiscais reavaliarem seus votos, assim como para os ministros que ainda não julgaram avaliar a matéria com a preocupação constitucional de proteção do meio ambiente e a saúde da população brasileira. A reavaliação das políticas fiscais aos agrotóxicos pelo poder executivo da União e dos Estados relacionando desenvolvimento econômico, proteção ambiental, direito à saúde e à segurança alimentar é essencial para essa ação, para evidenciar a não aplicabilidade do princípio da seletividade tributária sobre os agrotóxicos”, destaca a assessora jurídica da Terra de Direitos, Jaqueline Andrade.   

Benefício para mercado de commodities 

Segundo as organizações, a isenção fiscal beneficia diretamente o mercado de commodities, voltadas para o mercado externo, e não incide no aumento do preço dos alimentos que compõem a cesta básica para os consumidores, como argumenta entidades representativas do agronegócio.  

De acordo com dados do Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Vegetal (Sindiveg), 89% da área total com uso de agrotóxicos em 2022 é voltada para plantio de soja, milho, algodão, cana-de-açúcar e pastagens. Com menos incentivos e pressão do agronegócio, de produção de alimentos para consumo interno sofre seguidas retrações. Enquanto a área de plantio de soja aumento em 187% de 2000 a 2021, no mesmo período o plantio de arroz diminuiu 54%, e o de feijão, 37%.  

Além da manifestação contrária à isenção pelas organizações, a Procuradoria Geral da República (PGR) declarou na mesma ação que os incentivos aos agrotóxicos  não se coadunam com os objetivos do estado democrático de Direito ambiental. Os conselhos nacionais de Saúde (CNS) e de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) recomendaram aos ministros do STF que “rejeitem quaisquer proposições que resultem ou possibilitem a redução ou a isenção fiscal e tributária a agrotóxicos uma vez que estamos diante de perigos graves de saúde pública devido à exposição a essas substâncias nocivas”.

FIAN Brasil anuncia vaga para assessor(a) de Advocacy

TERMO DE REFERÊNCIA

A FIAN Brasil – Organização pelo Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas anuncia a abertura de processo seletivo para a contratação temporária de assessor(a) de Advocacy.

O regime de contratação é como pessoa jurídica, com início dos trabalhos previsto para julho de 2024. A duração do contrato é de 12 meses, prorrogável por igual período.

Sobre a FIAN Brasil

Somos uma organização de direito privado, sem fins lucrativos, apartidária, sem vínculo religioso, com sede e foro em Brasília (DF), com atuação de abrangência nacional. 

Nossa missão é contribuir para um mundo livre da fome e da desnutrição, no qual cada pessoa possa desfrutar plenamente dos seus direitos humanos, em particular o direito humano à alimentação e à nutrição adequadas (Dhana), com dignidade e autodeterminação.

A FIAN Brasil atua para fortalecer o Dhana por meio de ações de exigibilidade, formação, informação e incidência política. As ações de incidência política e advocacy são construídas em conjunto com diferentes redes da sociedade civil, como a Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e pela Vida, o Observatório das Economias da Sociobiodiversidade (ÓSocioBio), a Aliança pela Alimentação Adequada e Saudável e a Plataforma Dhesca. Além disso, a FIAN Brasil coordena a secretaria executiva do Observatório da Alimentação Escolar (ÓAÊ) e está representada no Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), no Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH), no  Grupo Consultivo do Comitê Gestor do Pnae e na Mesa de Diálogo Permanente Catrapovos Brasil. 

Objetivo da contratação 

A/o assessor(a) de Advocacy deverá apoiar a execução de ações de incidência política da FIAN Brasil, em especial no Congresso Nacional, contribuindo em temas prioritários.

Atividades previstas

  • Monitorar pautas prioritárias para a FIAN Brasil no Congresso Nacional;
  • Sistematizar e analisar dados e informações para elaboração de pareceres, notas técnicas, planilhas e sínteses voltadas ao trabalho legislativo;
  • Estabelecer diálogo com parlamentares e assessorias parlamentares para a promoção de agendas relativas ao Dhana;
  • Apoiar a execução de ações específicas de incidência política da FIAN Brasil no Congresso Nacional;
  • Participar de reuniões periódicas com a Coordenação de Advocacy, equipes de projetos da FIAN Brasil e redes das quais a FIAN faz parte.

Requisitos obrigatórios

  • Ensino superior completo em Ciência Política, Ciências Sociais, Direito, Economia, Políticas Públicas ou áreas afins;
  • Conhecimento e experiência de atuação em processos legislativos;
  • Capacidade de redação de documentos voltados para a incidência política (planilhas, relatórios, pareceres);
  • Compromisso com direitos humanos e valores éticos relacionados ao trabalho da FIAN Brasil;
  • Compromisso em relação ao cumprimento de prazos; 
  • Habilidades de comunicação, diálogo e trabalho em equipe;
  • Residir em Brasília (DF);
  • Disponibilidade para trabalho híbrido com agendas presenciais semanais no Congresso Nacional.

Requisitos desejáveis

  • Experiência com políticas de segurança alimentar e nutricional;
  • Experiência aplicada de incidência no Congresso Nacional;
  • Experiência de trabalho em/com organizações da sociedade civil, movimentos sociais ou redes.

Processo para candidatura

Currículo, carta de motivação e declaração de conflitos de interesse (baixe aqui para preencher) deverão ser encaminhados para [email protected] com cópia para [email protected] até as 18:00 do dia 31/05/2024. Entrevistas serão agendadas com as pessoas selecionadas. 

Diversidade e inclusão

A FIAN Brasil defende e apoia a ampliação da diversidade na sociedade e, por essa razão, estimula e prioriza a candidatura de mulheres, pessoas negras, indígenas, LGBTQIA+ e/ou com deficiência, que cumpram os requisitos estabelecidos. Se você se enquadra nesses grupos, indique em sua carta de motivação.

Foto: Ubirajara Machado/Arq. FIAN Brasil

Entrevista | Levando a discussão da saúde para a economia

Por: Comunicação do Instituto Ibirapitanga

A secretária-geral da FIAN Brasil, Nayara Côrtes Rocha.
Foto: Ubirajara Machado/Arq. FIAN Brasil

Desde 2023 estamos vivenciando um novo ciclo de incidência sobre políticas públicas para acesso à alimentação adequada e saudável, aliado à demanda pela implementação de uma agenda regulatória sobre conflito entre interesses públicos e privados, que possibilite, por exemplo, restrição sobre produtos nocivos à saúde, como ultraprocessados e agrotóxicos.

Ouvimos Nayara Côrtes Rocha, secretária-geral da FIAN Brasil, para entender melhor os caminhos tomados pela sociedade civil organizada diante dos desafios e oportunidades que esse contexto apresenta, bem como para entender as lacunas que ainda precisam ser preenchidas na incidência política em torno do acesso à alimentação adequada e saudável.

Nayara Côrtes Rocha é nutricionista pela Universidade Federal de Goiás e mestre em ciências pela Faculdade de Saúde Pública da USP. Pela FIAN Brasil, compõe o núcleo gestor da Aliança pela alimentação adequada e saudável.  

Ibirapitanga: Este é um período em que a mobilização do campo voltou a se dar dentro do arcabouço institucional, a exemplo do Consea e da participação de organizações da sociedade civil em comissões que vem debatendo a atualização e elaboração de políticas públicas. Ao mesmo tempo, mantém-se a atuação em diferentes frentes de incidência. Considerando essa orquestração, como você tem observado os movimentos da sociedade civil organizada em torno da alimentação?

Nayara Côrtes Rocha: Nos últimos anos, especialmente entre 2019 e 2022, além da expansão de organizações e atores em torno do tema da alimentação, tivemos um cenário muito adverso de suspensão de diálogo com o Governo Federal, em meio a violações intensas e quase cotidianas de direitos humanos e, dentre eles, do direito à alimentação. Essa conjunção de fatores certamente impactou nos movimentos da sociedade civil em torno do tema da alimentação. Entendemos que precisamos nos organizar para além dos espaços institucionais, embora eles sejam fundamentais. Tanto porque eles têm seus limites, como porque precisamos manter certa autonomia enquanto sociedade civil. O retorno  dos espaços institucionais é super bem vindo, tem demandado bastante energia de movimentos, organizações e  coalizões, inclusive da Aliança pela alimentação adequada e saudável.

Ao mesmo tempo em que precisamos nos organizar institucionalmente para contribuir com a reconstrução de políticas públicas, a partir do que aprendemos com nossas experiências anteriores, para que elas sejam cada vez mais eficazes e consolidadas, também precisamos ocupar outros espaços porque algumas lutas partem de fora do âmbito institucional. Inclusive porque alguns temas fundamentais não estão na agenda do governo e é papel da sociedade civil pressionar para que sejam debatidas e entrem nas agendas nacionais.

Eu tenho observado que passamos por esse amadurecimento, desde o período em que o diálogo com o executivo esteve interditado. Compreendemos que precisamos estar prontas para outras formas de incidência para além das que conhecíamos e isso tem sido muito positivo, na minha opinião.

Ibirapitanga: Recentemente, com o avanço da reforma tributária e o decreto presidencial que regulamenta a nova composição da cesta básica, estamos passando por uma intensificação da incidência nesse ciclo. Numa visão geral, quais são as demandas mais prementes deste contexto? Quais são as oportunidades e desafios?

Nayara Côrtes Rocha: As demandas mais prementes neste contexto são ampliar o acesso a alimentos adequados e saudáveis, em sua acepção mais ampla, a todas as pessoas, e tentar conter o aumento no consumo de ultraprocessados que está associado à ocorrência de doenças crônicas não transmissíveis. 

A nova composição da cesta básica é uma vitória importante pela qual lutamos há muitos anos. A ampliação de itens in natura ou minimamente processados, bem como da variedade desses itens foi um primeiro passo no sentido da maior disponibilidade e acesso a alimentos saudáveis e adequados a pessoas que não podem, por si mesmas, acessar esses alimentos. Avança ainda no sentido de o Estado responsabilizar-se pela promoção da dignidade e da saúde em ações de provimento e ainda, simbolicamente, na construção de um entendimento de que alimentos in natura ou minimamente processados são “básicos” e devem compor a base da alimentação humana.

A essência das demandas em relação à reforma tributária é a mesma: ampliar ou facilitar o acesso, nesse caso acesso financeiro, a alimentos in natura ou minimamente processados e desincentivar o consumo dos ultraprocessados, via composição de preço desses itens.

A oportunidade de fazer esta discussão com o governo, parlamentares e a sociedade em geral é, por si, muito interessante porque leva a discussão da saúde para a economia, deixando evidentes algumas contradições existentes a esse respeito. Percebo como uma boa oportunidade também de divulgação da informação de que ultraprocessados fazem mal à saúde e dos privilégios injustificados que esta indústria recebe.

Os desafios estão relacionados a essas oportunidades, a meu ver, porque estamos colocando em cheque os lucros e interesses de agentes comerciais e, por consequência, de atores públicos e privados relacionados a eles, muito poderosos. Mas toda essa movimentação me parece um excelente começo. 

Ibirapitanga: Tomando como exemplo o advocacy que está sendo realizado para a taxação de ultraprocessados e agrotóxicos na reforma tributária, podemos dizer que ele bebe da fonte de processos mais antigos — como o emblemático caso da indústria do tabaco — e outros mais recentes. Quais contribuições da sociedade civil, em especial de incidência no ciclo anterior de governo federal, podemos identificar como cruciais para a atuação no ciclo atual?

Nayara Côrtes Rocha: Como mencionei no início, aprendemos muito sobre diversidades de lutas e incidências, no ciclo anterior. Aprendemos caminhos antes pouco conhecidos, como o advocacy no poder legislativo, articulação da sociedade civil em torno não só de pautas, mas de atividades, metas, ações concretas e coordenadas em momentos específicos. Sobre a atuação em rede das grandes corporações, sobre o poder dos agentes comerciais, conflitos de interesse, captura corporativa e a comunicação com a sociedade, sobre articulações regionais e internacionais, enfim… Aprendemos muito! Tudo isso tem sido crucial para esse momento em que precisamos lidar com poderes econômicos e políticos imensos e com os conflitos de interesse no interior dessas discussões.

Todo este aprendizado tem contribuído imensamente com a discussão sobre a taxação de ultraprocessados e agrotóxicos que foram colocadas na agenda nacional pela pressão da sociedade civil, porque não são consenso no governo federal. São pautas sensíveis para o governo, mas são também urgentes, precisam estar presentes na discussão sobre a reforma tributária porque têm grande impacto para toda a sociedade brasileira, e por muito tempo. 

Ibirapitanga: Diante do esforço que está sendo realizado agora, quais as lacunas que ainda precisam ser preenchidas na incidência política pelo acesso à alimentação adequada e saudável? Para que direção temos que olhar com mais cuidado?

Nayara Côrtes Rocha: Esta é uma questão interessante porque penso que poderíamos dizer que temos organizações fazendo incidência em praticamente todas as áreas relacionadas ao direito à alimentação. Precisamos olhar com mais cuidado para a questão climática, que é permeada e permeia o sistema alimentar de diversas formas. Na América Latina, parece que não estamos suficientemente dedicados a esta questão, ainda. Além disso, penso que alguns aspectos transversais a toda discussão sobre a alimentação adequada e saudável como o papel de raça, classe e gênero, da economia do cuidado, por exemplo, nos sistemas alimentares e na prática da realização desse direito, muitas vezes ocupam espaços secundários em nossas incidências ainda. Penso que esta também é  uma direção que merece mais atenção.

Publicado originalmente no site do Ibirapitanga

Mulheres, Agroecologia e Alimentação Escolar: Recomendações ao Pnae

O livro é uma parceria entre a Articulação Nacional de Agroecologia (ANA), o Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (FBSSAN), a FIAN Brasil e o Observatório da Alimentação Escolar (ÓAÊ). Foi escrito por Vanessa Schottz, com contribuições de Mariana Santarelli.

Baseia-se na pesquisa-ação “Comida de verdade nas escolas do campo e da cidade”, que teve a autora no grupo de trabalho de metodologia ao lado de Juliana Casemiro, Morgana Maselli e Flavia Londres.

A publicação integra a coleção do projeto “Equidade e saúde nos sistemas alimentares”, que a FIAN concluiu em 2023. Foi realizada com apoio de Global Health Advocacy Incubator (GHAI) e do Instituto Ibirapitanga.

Foto: Ruy Sposati/Cimi

Com pesquisa sobre insegurança alimentar, entidades pedem a Cidh urgência no caso dos Guarani e Kaiowá

Foto: Ruy Sposati/Cimi
Foto: Ruy Sposati/Cimi

A Aty Guasu, o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), a FIAN Brasil, a FIAN Internacional e a Justiça Global apresentaram novas informações à denúncia oferecida contra o Estado brasileiro no caso envolvendo violações de direitos humanos de cinco comunidades dos povos indígenas Guarani e Kaiowá do Mato Grosso do Sul: Apyka’i, Guaiviry, Kurusu Ambá, Ñande Ru Marangatu e Ypo’i.

Foram incluídos achados da pesquisa recém-lançada sobre insegurança alimentar e nutricional nesses territórios; o contexto do marco temporal, que ameaça as demarcações; e um relato sobre a morte da xamã Damiana Cavanha, liderança histórica do tekoha Apyka’i.

O memorial entregue no dia 27 de fevereiro à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (Cidh), em Washington (EUA), expõe as violações em especial quanto à soberania e segurança alimentar e nutricional (SSAN) dos dois povos. As peticionárias caracterizam a situação como um quadro de violência estrutural e sistêmica e recorrem ao artigo 29 da instância, que trata de casos de urgência ou gravidade. A Cidh é um órgão da Organização dos Estados Americanos (OEA).

“Trazemos mais uma vez para o mundo a questão do nosso povo”, diz o líder da comunidade de Kurusu Ambá, Elizeu Lopes, conselheiro da Aty Guasu, a Grande Assembleia Guarani e Kaiowá. “Estamos cercados. Expulsos dos nossos territórios, baleados à queima-roupa, envenenados por agrotóxicos, atacados com leis no Congresso Nacional. É muito triste trazer essa realidade para fora do país, mas precisamos trazer, porque é o dia a dia que vivemos com nossas crianças, com nossos avós, com nossos anciãos.”

Precariedade e vulnerabilidade

A pesquisa lançada em fevereiro pela FIAN com o Cimi atualiza a situação de três comunidades estudadas em 2013 (Guaiviry, no município de Aral Moreira; Kurusu Ambá, em Coronel Sapucaia; e Ypo’i, em Paranhos) e inclui outras duas (Apyka’i, em Dourados, e Ñande Ru Marangatu, em Antônio João). Os números mostram uma melhora em relação a dez anos atrás, mas também a persistência de um quadro de precariedade e vulnerabilidade.

Enquanto no levantamento de 2013 não houve nenhum domicílio em situação de segurança alimentar e nutricional (SAN), no de agora, naquelas três áreas, esse percentual foi de 15,0% – um dado que reforça a importância das retomadas de terras tradicionais para a alimentação e a promoção da saúde das famílias. Quase 95% dos entrevistados e entrevistadas associaram essa mudança à permanência no tekoha – “lugar onde se é”, ou em que se pode viver plenamente.

Cabe ressaltar que o índice de segurança alimentar e nutricional (SAN) é muito pior que aquele verificado no conjunto da população brasileira em 2022, sob o impacto de dois anos de pandemia.

“Além disso, como alertamos nesta nova ida à comissão, esse elemento de estabilização e melhoria – a demarcação das terras – está totalmente inviabilizado no momento, com a aprovação da lei inconstitucional do marco temporal”, ressalta o membro do Cimi Flávio Vicente Machado. O dispositivo só permite aos indígenas reivindicar áreas que estivessem ocupando quando foi promulgada a atual Constituição Federal, em 1988. Os deputados e senadores votaram a favor da tese mesmo depois de o Supremo Tribunal Federal (STF) considerá-la inconstitucional, e derrubaram o veto do presidente Lula a ela, inscrevendo-a na Lei 14.701, de 2023, já contestada na Justiça.

Como demonstração do grave cenário, as entidades destacam no memorial o caso da matriarca Damiana Cavanha, de Apyka’i. Ela passou por toda sorte de violações de direitos e violências na vida – como perder vários membros da família em atropelamentos – e morreu aos 84 anos em novembro, em condições a esclarecer, sem ver reconhecido seu tekoha, que no momento está sem moradores e em risco de desaparecer.

“Outro elemento que agregamos é o dos direitos econômicos, sociais e culturais, os Desc”, relata o assessor de Direitos Humanos da FIAN Brasil Adelar Cupsinski, citando como exemplo a total ligação do bem-viver e da espiritualidade das duas etnias com a terra e a produção de alimentos. “Como signatário do pacto internacional que protege essas dimensões da cidadania, o Pidesc, nosso país tem o dever de honrá-lo. Mais um motivo para a admissão e a priorização do caso. Sem a terra demarcada, os Desc não são viabilizados.”

Para o coordenador do programa de Justiça Internacional da Justiça Global, Eduardo Baker, o caso permite ao sistema interamericano aprofundar sua discussão sobre esses direitos no contexto específico dos indígenas no Brasil. “É algo ainda pouco explorado por seus órgãos”, observa. “Vale lembrar que a própria Cidh elegeu os direitos econômicos, sociais e culturais como um de seus três temas prioritários e os povos indígenas como uma população prioritária para os próximos anos. É uma oportunidade para conciliar a agenda do órgão com uma demanda de reversão de um quadro estrutural de violações.”

“A situação das cinco comunidades é emblemática e consegue representar as principais violências que assolam há décadas os Kaiowá e Guarani, então esperamos que a análise e as providências beneficiem as outras 55 retomadas e o povo como um todo”, acrescenta Flávio Vicente Machado, do Cimi.

A Cidh tem uma “fila” de pedidos e, quando decide pela admissibilidade de um deles, abre um processo que pode resultar em recomendações a um Estado nacional. Descumpri-las pode levar a um julgamento na Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH), como aquele em que o governo brasileiro foi condenado a demarcar o território indígena e indenizar o povo Xukuru.

Histórico

A petição inicial submetida à comissão da OEA já completou sete anos. Em dezembro de 2019 o Estado brasileiro apresentou sua resposta e em julho de 2020 as peticionárias fizeram observações a essa manifestação.

“Na prática, não mudou nada, a não ser quando retomamos nossos territórios por conta própria, conseguindo um pedaço de mato, um rio, um mínimo para sobreviver”, pontua Elizeu Lopes, lembrando das visitas de duas relatoras da ONU, comissões do Parlamento Europeu e outras missões internacionais. “Esperamos agora, pelo menos, ter um retorno sobre a denúncia e que ela pressione o governo do estado e o governo brasileiro. Que diminua a perseguição e que sejam punidos os assassinos de Xurite Lopes, Dorvalino Rocha, Nísio Gomes, Ronildo Ramires. Não queremos que esse massacre continue.”

Mulheres do Cerrado lutam por “saborania” e soberania alimentar

O Cerrado concentra, sozinho, 5% da biodiversidade do planeta, segundo a Campanha Nacional em Defesa do Cerrado. O bioma, considerado o berço das águas, é a savana mais antiga do mundo e sua preservação contribui para evitar os efeitos das mudanças climáticas, melhorar a produção de alimentos – com comida de verdade – e manter a qualidade da água e sua distribuição.

Quem mantém esse universo ecológico de pé e vivo são as mulheres e os povos e comunidades tradicionais. Somente o território do Quilombo Kalunga, noroeste do Estado de Goiás, onde existe a presença marcante dos saberes de mulheres Kalunga, preserva cerca de 83% das áreas de Cerrado nativo, de acordo com a análise do MapBiomas.

“As mulheres são responsáveis pela manutenção do Cerrado vivo, pelo manejo das sementes, pela produção de alimentos, pela reprodução dos modos de vida e das práticas culturais e agroecológicas”, conta Franciléia Paula, quilombola, mestra em Saúde Pública pela Fiocruz e organizadora do livro Racismo e sistemas agroalimentares.

São elas, dentro dos sistemas agroalimentares, as guardiãs da biodiversidade, através dos saberes das sementes crioulas – sementes passadas de geração a geração -, do tratamento das frutas e plantas para alimentação. As mulheres enfrentam as monoculturas e seus impactos para garantir a soberania alimentar, a autonomia de escolher o que comer e como plantar o alimento.

“A terra é uma figura feminina. Então, a importância desse movimento também é de acolher, o que as mulheres têm feito no sentido de proteção dessa biodiversidade como um todo. Que inclui a gente, as comunidades e os povos”, avalia Franciléia Paula.

Franciléia Paula, quilombola, mestra em Saúde Pública pela Fiocruz e organizadora do livro Racismo e sistemas agroalimentares

Insegurança alimentar x comida saudável

No Brasil, 125 milhões de brasileiras e brasileiros vivem com algum grau de insegurança alimentar: isto é, não têm nenhum acesso ou não têm acesso pleno, suficiente e permanente a alimentos, segundo a Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede PENSSAN).

A violação ao direito humano à alimentação resulta da violação de diversos outros fatores, como o direito à moradia, acesso a saneamento básico e água tratada. Isso afeta, especialmente, as mulheres negras, que são a maioria das chefes de família.

Para Veruska Prado, territorializar o debate sobre a alimentação é fundamental para superar as desigualdades, específicas em cada bioma, a partir da configuração ecológica e da necessidade nutricional de seus povos.

Coordenadora do estudo Prato do dia: desigualdades – Raça, gênero e classe social nos sistemas alimentares, da FIAN Brasil (Organização pelo Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas), ela afirma que não é possível falar do combate à fome sem tratar das questões ambientais, geográficas e de quem constrói o Cerrado.

Veruska Prado, coordenadora do estudo realizado pela FIAN Brasil – ©Arquivo pessoal

O estudo mostra que 51% dos domicílios nos quais mulheres negras são a pessoa de referência apresentam dificuldade para aquisição de alimentos, enquanto o mesmo acontece com 23% dos domicílios chefiados por homens brancos.

Segundo Veruska Prado, os dados reforçam que, quando há insuficiência de alimentos em casa, são as mulheres que comem menos para garantir a alimentação das crianças.

“A alimentação é uma janela para a gente olhar para o conjunto de iniquidades, que são as desigualdades persistentes e injustas produzidas pela sociedade, por decisões ou por negligência política”

Veruska Prado

Para Veruska, além da sobrecarga e da preocupação em sustentar a família e a comunidade, as mulheres, enquanto promotoras da saúde e do bem viver nos territórios, muitas vezes, têm maior dimensão do que acontece com a terra e dos efeitos das mudanças climáticas na vida das pessoas. Falar de insegurança alimentar e combate à fome é também falar sobre saúde física e mental dessas mulheres.

No Cerrado, comida saudável ou comer bem significa fortalecer a relação entre o consumo do alimento e o modo de vida, de acordo com Veruska. O contrário disso é a insalubridade alimentar, nociva à saúde.

A alimentação precisa ser harmoniosa do ponto de vista cultural e sustentável socialmente, com um sistema de produção que também respeite a igualdade na geração de renda para as mulheres e que elas não somente trabalhem nessa produção.

“A luta pela terra e pelo território é uma luta pelos saberes e pelos sabores”, lembra Maria Emília Pacheco, assessora da Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (FASE) e ex-presidente do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA).

Ela destaca que o papel das mulheres na alimentação é histórico: antes das plantas irem para os roçados e para as feiras, são experimentadas nos territórios.

“Se alimentar com os frutos do Cerrado é se alimentar da nossa história, pois são frutos que já estavam aqui muito antes do Brasil ser Brasil”.

Maria Emília Pacheco

A inovação das tradições é inerente às mulheres que pegam, por exemplo, o pequi e fazem uma farinha. Essa sabedoria a favor da diversidade de “saborania”, termo cunhado pela deputada Célia Xacriába sobre a pluralidade de sabores que o Cerrado oferece, expressa conhecimentos ancestrais do poder de transformação.

Cajuzinho do Cerrado, mangaba, cagaita, baru, babaçu e jatobá são alimentos que Maria Madalena trabalha com maestria. Conhecida como Madá, ela é técnica em agropecuária, extrativista de frutos do Cerrado e moradora de Brasília (DF).

Madá estuda e cria pratos com os frutos que alimentam e nutrem as pessoas. Ela tenta aproveitar tudo de um fruto ou de uma castanha, das raízes às folhas.

O processo de quebrar o coco de Baru, tirar o mesocarpo – uma massa doce que tem sobre o fruto – higienizar, torrar, descascar e levar para as padarias colocarem no pão – é familiar para a guardiã do Cerrado. Aos poucos, ela vai inovando o paladar das pessoas da cidade: também faz farinha de Jatobá e mostra como aproveitar as diversas possibilidades dos frutos.

Madá segurando a castanha do Baru e a farinha de jatobá

“Comecei a mostrar às pessoas que elas não dão valor aos frutos de nossa região. Eu me tornei uma guardiã do Cerrado não por curiosidade, mas por necessidade. Para tratar não só de mim, mas sim da comunidade”.

Madá

Enfrentar a insegurança alimentar no Brasil, em seus diferentes níveis, é movimentar os desejos para alimentos que promovam saúde ao mesmo tempo que se luta contra as mega indústrias de “alimentos”, supridas pela agropecuária e sua máquina publicitária. Voltar à construção do gosto e do acesso digno ao alimento de verdade só ocorre junto aos saberes culturais do ato de cozinhar e de poder escolher o que comer.

“É valorizar os saberes e modos de cozinhar que existem com as nossas avós, com as nossas mães, com as mais velhas e com os mais velhos”, define Veruska Prado.

Com o esvaziamento e o processo de expulsão do campo, os homens saem de suas casas e vão para longe, muitas vezes em busca de trabalho. Já as mulheres assumem o protagonismo em relação ao alimento em suas casas, conta Veruska.

Elas passam mais tempo na terra, junto à comunidade e à família, o que faz com que precisem ainda mais de um território saudável, sem violência, para viver com dignidade e gerar alimento.

Franciléia Paula considera que a comida é uma forma de materialização de afeto, história e memória.

“As mulheres estão diretamente ligadas ao sistema de produção de alimento nos seus territórios, nos quintais produtivos, na manutenção de culturas alimentares e na proteção dos bens comuns, como a água e as florestas”

Segundo o levantamento anual dos dados do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), em 2022, mulheres tiveram 69% de participação na entrega de produtos da agricultura familiar.

Agronegócio ameaça o Cerrado

O Cerrado está presente em todas as regiões do Brasil, em pelo menos 15 Estados: Goiás, Tocantins, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Bahia, Maranhão, Piauí, Rondônia, Paraná, São Paulo e Distrito Federal. Em menor medida, também é possível encontrar o bioma em Amapá, Roraima e Amazonas.

Franciléia lembra que o bioma, que acolhe 25 milhões de pessoas, ainda não aparece devidamente nos debates e leis sobre políticas de proteção ambiental, o que contribui para que seja um dos mais afetados do mundo.

“O Cerrado é colocado propositalmente como um lugar improdutivo, de pobreza, de miséria, que não tem gente, para justificar um projeto de desenvolvimento ao agronegócio”.

Franciléia Paula

Com 198,5 milhões de hectares, o Cerrado ocupa 23% do território nacional, mas sua extensão chega até 36% do país se consideradas suas áreas de transição, de acordo com dados da FASE. No entanto, o bioma representa apenas 8% das Unidades de Conservação.

Na Constituição de 1988, o parágrafo 4º do artigo 225 ignora a existência do Cerrado como patrimônio natural. Por isso, desde 2010, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 504/10, movida pelos movimentos sociais pela terra e organizações em defesa do bioma, lutam para que ele também se torne patrimônio do Brasil, assim como Amazônia, a Mata Atlântica e o Pantanal mato-grossense.

Nos últimos 38 anos, o Cerrado perdeu 25% de vegetação nativa, em termos proporcionais de área. Em 2022, 50% do Cerrado foi ocupado por atividades agropecuárias. Em 1985, a área de vegetação nativa tomada pela agropecuária era de 34%, segundo análise do MapBiomas.

Delimitada para fins de planejamento governamental, a região conhecida como Matopiba é o principal eixo de devastação do Cerrado. Nomeada pela Embrapa como “a grande fronteira agrícola da atualidade”, a área abrange Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia e é destinada à expansão do agronegócio, da pecuária e do hidronegócio.

Conforme veredito final do Tribunal Permanente dos Povos (TPP) em sua 49ª sessão, em defesa dos territórios do Cerrado (2019-2022), só a região do Matopiba perdeu mais vegetação nativa nos últimos 20 anos do que nos 500 anos que se passaram entre a invasão colonial e o ano 2000.

Na região, também está o chamado “arco do desmatamento da Amazônia”, zona de transição Cerrado-Amazônia, onde os conflitos no campo são mais intensos. “Ao se destruir o Cerrado, não se está apenas destruindo a savana mais biodiversa do planeta, mas se estabelecendo o principal atalho para o avanço sobre a Floresta Amazônica”, ressalta o veredito do TPP.

“Grande parte da soja que é produzida no Brasil não fica no país. Grande parte daque fica entra na cadeia de alimentos ultraprocessados ou alimentos com processamento elevado ou produtos formados a partir de um conjunto de ingredientes”, diz Veruska Prado.

“E a gente vê que o compromisso deles [agronegócio] não necessariamente está em alimentar as pessoas. Por outro lado, a gente observa que as agricultoras e os agricultores familiares, que produzem os alimentos que são cotidianamente consumidos, também visam lucro sobre a sua produção, mas têm um compromisso de manter uma variedade com relação ao que é produzido. É um compromisso para além do dinheiro”, analisa Veruska.

O “correntão”, prática usada para derrubada da vegetação no Maranhão ©Mayke Toscano/Gcom-MT – AGÊNCIA CENARIUM

Diferente de outros países, a produção de alimentos não é um problema no Brasil, que já produz quantidade suficiente para combater a fome, enfatiza a coordenadora do estudo da FIAN Brasil. “É importante, que agora, em um contexto político favorável, toda essa produção de alimento que existe no país realmente seja destinada a superar a fome e a má nutrição”, completa.

Cerca de 62% do Cerrado nativo do país está em propriedades privadas, aponta levantamento do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam). Dados de satélite analisados pelo MapBiomas mostram que, de 1985 a 2022, 85% do desmatamento do Cerrado ocorreu em terras privadas.

Mesmo assim, o próprio Código Florestal estabelece que os imóveis rurais localizados na Amazônia Legal devem ter reserva de 80% da propriedade nas áreas de florestas; já no Cerrado, somente 35% devem ser preservados.

Para Franciléia Paula, que vive no Cerrado de Mato Grosso, um dos locais mais devastados pelo agronegócio, é urgente colocar o bioma na centralidade do debate atual sobre mudanças climáticas, comida de verdade e vida digna às mulheres dessa região.

“O Cerrado, de forma geral, é um grande “observatório” de desigualdades no Brasil. O projeto político, agrícola, do agronegócio, dos grandes empreendimentos, incide muito no Cerrado”

Franciléia Paula

A forma predatória da terra e a retirada do bioma do cenário nacional e internacional como parte do debate ambientalista, afeta, sobretudo as mulheres do Cerrado e seus modos de vida. Isso inviabiliza não só a existência da biodiversidade como também a possibilidade de uma fartura de alimentos, frente a monotonia do agronegócio.

“Em contexto de omissão do Estado brasileiro, diante de tudo isso, você vai ver que quem está lá no território, permanentemente, sofrendo violações de diversas formas, cotidianamente, são as mulheres”, aponta Franciléia Paula. “Se a gente tem Cerrado ainda é porque tem gente que lutou e que permanece nesse enfrentamento direto a esse projeto capitalista, patriarcal e racista” , conclui.

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Esta reportagem é resultado do minicurso “Fome e Desigualdades no Brasil: muito além dos números” desenvolvido pelo Nós, mulheres da periferia e Gênero e Número, com o apoio e parceria da FIAN Brasil (Organização pelo Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas)

Retrospectiva 2023 e próximos passos

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Em 2023, entre muitas outras lutas, construções e vitórias,

fizemos parte da resistência ao “PL do Veneno” diante de um Congresso fortemente ruralista;

participamos centralmente, como FIAN Brasil e no Observatório da Alimentação Escolar, da pressão que garantiu o reajuste do Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae), além de documentar os avanços na execução do programa e denunciar as ameaças legislativas às suas diretrizes;

apoiamos uma oficina para jornalistas para uma cobertura mais densa sobre a fome;

participamos de diversos espaços de debate e construção coletiva, a exemplo da 6ª Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional;

estivemos em articulações com organizações de outros países para fazer frente a violações de direitos cometidas por empresas transnacionais;

vimos nosso conhecimento sistematizado resultar num guia para defensores públicos/as;

integramos a resistência ao Marco Temporal, caso em que a vitória no STF teve contribuição jurídica nossa;

lançamos um estudo sobre as desigualdades nos sistemas alimentares.

Em 2024, ao lado de muitas outras frentes,

continuaremos atuando nos espaços de participação, atentas/os às iniquidades e conflitos de interesse, promovendo a alimentação escolar adequada (inclusive em termos culturais), apoiando as lutas dos Guarani e Kaiowá e dos geraizeiros, integrando iniciativas internacionais, disseminado informação, trocando experiências, incidindo nos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário para que o Estado cumpra suas obrigações.

E queremos você ainda mais junto da gente na defesa do direito humano à alimentação e à nutrição adequadas, o Dhana.

Bora?

#FIANBrasil #2024 #Dhana

FIAN Brasil anuncia vaga para consultoria

A FIAN Brasil – Organização pelo Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas anuncia a abertura de processo seletivo para a contratação temporária de consultor/a para desempenhar atividades de pesquisa, sistematização, revisão bibliográfica e escrita do (i) Protocolo do Programa Nacional de Alimentação Escolar para o judiciário e do (ii) Guia de implementação e exigibilidade do Pnae.

A contratação será na modalidade remota, no período entre fevereiro e agosto de 2024. No entanto, é necessário ter disponibilidade para atividade(s) presencial(is) em Brasília.

As pessoas interessadas em se candidatar devem encaminhar currículo e carta de motivação até 23h59 minutos do dia 28 de dezembro de 2023, para o e-mail indicado no Termo de Referência.

As entrevistas serão realizadas em janeiro e a resposta sobre a contratação está prevista para o dia 29 de janeiro de 2024.

Estamos comprometidos em dar oportunidade igual a todas as pessoas, a partir de critérios que valorizam a diversidade, incentivando particularmente a candidatura de mulheres, negras e negros, indígenas, LGBTQIAPN+ e pessoas portadoras de deficiência.

Acesse todas as informações no Termo de Referência, disponível AQUI.

FIAN Brasil

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Estudo da FIAN Brasil examina conexões entre sistemas alimentares e iniquidades – e caminhos para enfrentá-las

A FIAN Brasil lançou nesta terça-feira (19) o livro Prato do Dia: Desigualdades. Raça, Gênero e Classe nos Sistemas Alimentares. A publicação compila os resultados de estudo conduzido em 2022 e 2023 por três pesquisadoras e dois pesquisadores, sob supervisão da entidade. Um material que investiga narrativas e dados sobre a forma como se expressam as iniquidades ao longo do processo alimentar.

Os resultados mostram como as iniquidades (as desigualdades injustas e produzidas pela sociedade) contribuem para as diversas violações do direito humano à alimentação e nutrição adequadas (Dhana) vivenciadas por brasileiros e brasileiras. E como marcam, historicamente, os sistemas alimentares e o processo alimentar, afetando de forma mais intensa a vida de pessoas negras, mulheres e crianças, e daqueles/as com mais baixa renda.

O estudo analisa dados quantitativos (numéricos) pré-pandemia (2017-2018) coletados pela Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), do IBGE. Também mergulha em textos públicos de organizações de diferentes setores da sociedade – comercial, movimentos sociais, entidades profissionais e academia, além de uma década de conferências nacionais vinculadas a políticas setoriais.

“Com a leitura integrada desse conjunto amplo de dados pudemos observar como o problema das desigualdades no acesso, no consumo, no produção e no processamentos dos alimentos é tratado de forma generalizada e, em alguns momentos, naturalizada”, comenta a coordenadora da investigação, Veruska Prado Alexandre-Weiss. “Chamou-nos atenção que, mesmo entre setores mais críticos da sociedade, é como se o que vivemos até aqui, na formação do Brasil, estivesse naturalizado a ponto de ser imutável.”

Para Veruska, a principal contribuição da pesquisa “é um alerta à necessidade de sermos mais específicos em nossas falas sobre desigualdades e iniquidades relacionadas ao acesso à alimentação, assim como a efetivação de todos os demais direitos humanos, uma atitude fundamental neste novo ciclo de gestão pública”.

A coautora Rute Costa avalia que “precisamos avançar na compreensão das interações complexas do racismo e do sexismo no contexto dos sistemas alimentares”. “Essas tecnologias de opressão social produzem profundas desigualdades e insegurança alimentar, mas também um estado de ‘proteção’, a depender do grupo social a que a pssoa pertença”, analisa.

A seu ver, “não é possível superar a insegurança alimentar sem enfrentarmos o racismo e o sexismo, produtores de barreiras à realização do direito humano à alimentação adequada”.

“A narrativa hegemônica da chamada ‘guerra contra a fome’ encobre as desigualdades que estão na base da crise alimentar, baseando-se num antigo diagnóstico de que sua origem está na escassez de alimentos diante do constante aumento populacional,”, alerta a assessora de Políticas Públicas da FIAN Brasil Mariana Santarelli. Ela acrescenta que esse discurso coloca como centro da solução soluções tecnológicas para o aumento da produtividade – na linha “o agro é tech, o agro é pop” – somadas à filantropia.

“Queremos contribuir para a superação desse cenário, na perspectiva da construção coletiva e permanente de um Brasil sem injustiças sociais. E lembrar que se trata de uma obrigação do Estado, que deve ser cumprida – e funciona muito melhor – com participação social.”

Entre as dezenas de propostas aprovadas nas conferências e encontros nacionais analisados no estudo estão:

Promover arranjos locais que facilitem o acesso à alimentação adequada e saudável, como mercados populares com alimentos subsidiados, feiras livres, hortas urbanas coletivas e hortas em ambientes institucionais.

Oportunizar espaços de governança sobre políticas e ações públicas voltadas à população negra e a outros povos e comunidades, pautados na escuta e na participação ativa e efetiva das pessoas nos processos de tomada de decisões.

Equidade e saúde em pauta

O estudo integra o projeto “Equidade e saúde nos sistemas alimentares”, que a FIAN Brasil está concluindo. A iniciativa foi pensada para contribuir com o debate sobre as desigualdades em todas as etapas do processo alimentar – como produção, comercialização, consumo –, bem como para seu enfrentamento.

A ideia é que o conhecimento produzido embase estratégias para incidir nas compras públicas, aquelas realizadas por organizações do Estado. O chamado mercado institucional pode dar lastro a uma série de políticas.

Sumário do estudo Prato do Dia: Desigualdades. Raça, Gênero e Classe Social nos Sistemas Alimentares

A publicação de 40 páginas traz os principais dados e análises do livro Prato do Dia: Desigualdades. Raça, Gênero e Classe Social nos Sistemas Alimentares, que compila os resultados de estudo conduzido em 2022 e 2023.
A investigação mostra como as iniquidades (as desigualdades injustas e produzidas pela sociedade) contribuem para as diversas violações do direito humano à alimentação e nutrição adequadas (Dhana) vivenciadas por brasileiras e brasileiros.

Acesse o livro e as notas metodológicas e saiba mais aqui.

Prato do Dia: Desigualdades. Raça, Gênero e Classe Social nos Sistemas Alimentares

A publicação compila os resultados de estudo conduzido em 2022 e 2023 por três pesquisadoras e dois pesquisadores, sob supervisão da FIAN Brasil. Um material que investiga narrativas e dados sobre a forma como as iniquidades se expressam ao longo do processo alimentar.

Acesse o sumário e as notas metodológicas e saiba mais sobre o estudo aqui.

Líderes guarani e kaiowá pedem apoio na defesa de seus territórios e do direito à alimentação

A partir desta segunda-feira (18) até 30 de setembro, dois representantes/líderes dos povos indígenas Guarani e Kaiowá do Mato Grosso do Sul (MS) estarão em viagem pela Europa para chamar a atenção para as violações estruturais de direitos humanos enfrentadas por seus povos e pedir aos formuladores de políticas europeus e aos órgãos de direitos humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) que adotem medidas de apoio à sua luta. Eles estão acompanhados pela FIAN Brasil, FIAN Internacional e pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi).

Atualmente, no Brasil, 62% das terras indígenas e reivindicações territoriais existentes estão pendentes de regularização administrativa (demarcação). A insegurança fundiária está no centro de várias violações de direitos humanos e de um conflito brutal de terras que registrou 795 assassinatos de indígenas e 535 casos de suicídio nos últimos quatro anos (consulte CIMI, 2023). Os povos Guarani e Kaiowá do MS estão entre as principais vítimas dessa dura realidade. 

As atuais violações de direitos humanos, os conflitos socioterritoriais e as inseguranças vivenciadas pelos Guarani e Kaiowá são motivados por invasões de seus territórios tradicionais por empresas agroindustriais, latifundiários, condomínios de luxo, prisões ilegais e a expansão de megaprojetos de infraestrutura para o transporte de commodities. Os conflitos se materializam em ataques de milícias armadas formadas pelos próprios fazendeiros e seus sindicatos rurais, ações paramilitares e operações militares sem autorização judicial, promovidas pelas forças de segurança pública estaduais ou pela Força Nacional.

As violações dos direitos dos Guarani e Kaiowá à alimentação e nutrição adequadas têm origem na desapropriação histórica de suas terras ancestrais, das quais foram – e continuam sendo – expulsos; na exploração predatória de seus recursos naturais, incluindo a contaminação por agrotóxicos de seus rios, terra e ar; e na negação de praticamente todos os seus direitos humanos. Desde a dificuldade de acesso à documentação e aos serviços públicos, passando pela violência psicológica e física resultante do racismo generalizado, até a dependência de cestas básicas entregues irregularmente, todas essas violações culminam em índices alarmantes de insegurança alimentar e fome. A situação já terrível piorou consideravelmente durante os anos do regime de Bolsonaro e seu desmantelamento sistemático de políticas, programas e estruturas sociais, além da promoção de políticas e princípios anti-indígenas. 

Estudo da FIAN Brasil e da Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD), a ser lançado em breve, realizado em cinco comunidades guarani e kaiowá, constatou que 77% das famílias vivem com algum nível de insegurança alimentar, enquanto 33,6% das famílias não têm alimentos suficientes para a alimentação.

Durante a missão de defesa de seus direitos, os líderes guarani e kaiowá se reunirão com membros do Parlamento Europeu, com o Serviço de Ação Externa da Comissão Europeia, bem como com representantes de órgãos de direitos humanos e missões diplomáticas em Genebra. Eles também participarão da 54ª Sessão do Conselho de Direitos Humanos e da análise do Brasil pelo Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais. A FIAN Brasil, juntamente com outras organizações da sociedade civil, apresentou um relatório sobre a situação dos direitos econômicos, sociais e culturais no país. 

Haverá também um evento público em conjunto com várias outras organizações e redes brasileiras de direitos humanos para chamar a atenção para a situação dos povos indígenas e o contexto mais amplo dos direitos econômicos, sociais e culturais pós-Bolsonaro. 

Inaye Gomes Lopes, moradora da comunidade Ñanderu Marangatu – um dos locais participante da pesquisa e da petição apresentada à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) – e vereadora no município de Antônio João, no Mato Grosso do Sul, relata que a viagem à Europa tem como objetivo “exigir a demarcação de nossas terras, o reconhecimento das terras tradicionais, a homologação das terras, para dar voz aos jovens, às mulheres, aos nossos idosos. Clamar para que o mundo saiba como vivemos, como estamos vivendo no estado do Mato Grosso do Sul, como estamos sendo assassinados, como estamos sendo violados, massacrados, pelos próprios poderes do Estado brasileiro”.

Lopes espera que os funcionários da ONU/União Europeia notifiquem e exijam das autoridades brasileiras a implementação de seus direitos territoriais segundo estabelece a Constituição Federal. E que denunciem “como nossos direitos estão sendo violados, continuam sendo violados e estão sendo massacrados”.

Entre as reivindicações centrais estão a proteção efetiva dos povos indígenas contra os ataques violentos que sofrem nas retomadas de suas terras ancestrais, a conclusão dos processos de demarcação de seus territórios, além da rejeição da tese do “marco temporal” e do Projeto de Lei 2.903/23 (para obter mais informações, consulte o comunicado de imprensa da FIAN Brasil sobre a declaração de Francisco Cali a esse respeito).

Além disso, os legisladores e os formuladores de políticas europeus serão instados a garantir que os acordos comerciais existentes e atualmente negociados, bem como os investimentos e as ações das empresas sediadas ou com vínculos com a União Europeia e seus estados-membros, não alimentem o conflito fundiário nem contribuam para violações dos direitos do povo Guarani e Kaiowá. A proibição das exportações de agrotóxicos nocivos, proibidos na UE, para o Brasil e outros países é outra demanda fundamental.  

A FIAN Brasil e a FIAN Internacional acompanham os Guarani e Kaiowá desde 2005. Juntamente com a Aty Guasu, o Cimi e a Justicia Global, eles têm uma petição pendente de admissão na Comissão Interamericana de Direitos Humanos. 

FIAN Internacional com FIAN Brasil

Fotos: Ruy Sposati/Cimi

Você sabe como a DPU atua na promoção do direito à alimentação?

A Defensoria Pública da União (DPU) atua na promoção dos direitos humanos fundamentais e isto inclui o direto humano à alimentação e à nutrição adequadas (Dhana). Significa que um dos compromissos da instituição é prestar assistência jurídica, judicial e extrajudicial, gratuita, individual ou coletiva, para garantir uma alimentação em quantidade e qualidade suficiente para todas as pessoas por meio, por exemplo, de diálogos com a administração pública e os movimentos sociais.

Para falar sobre essa atuação, o Grupo de Trabalho para a Garantia à Segurança Alimentar e Nutricional (GTSAN) da DPU lançou este ano a cartilha Segurança Alimentar e Nutricional: uma abordagem para a Defensoria Pública, em que trata dos principais conceitos relacionados ao tema; quais são os direitos da população em relação à SAN; contextualiza a situação da fome e da insegurança alimentar e nutricional; apresenta a legislação e as obrigações do Estado brasileiro em relação à temática; e fornece orientações para a garantia de direitos relacionados à SAN.

Parceira da DPU, a FIAN Brasil é uma das fontes citadas na cartilha, disponível nos sites das duas entidades.

Leia também: FIAN Brasil e DPU apresentam guia orientador ao trabalho das defensorias públicas na atuação para a exigibilidade do direito à alimentação escolar

FIAN Brasil, com informações da DPU

ONGs oferecem R$2 mil para reportagem sobre fome no Brasil

As inscrições estão disponíveis via formulário online. Começam em 31 de julho e serão encerradas no dia 7 de agosto

Estão abertas as inscrições para o minicurso “FOME E DESIGUALDADES NO BRASIL: MUITO ALÉM DOS NÚMEROS”, uma parceria entre o Nós, mulheres da periferia, a Gênero e Número e a FIAN Brasil – Organização pelo Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas.

As inscrições começam nesta segunda-feira, 31 de julho, serão encerradas no dia 7 de agosto, e podem ser realizadas neste link. A formação irá acontecer no dia 17 de agosto, com 3h de duração, das 9h às 12h, e é voltada para profissionais da comunicação de todos os segmentos e veículos, e também para estudantes de comunicação que desejam aprofundar seus conhecimentos na cobertura qualificada sobre fome e desigualdades sociais a partir de uma perspectiva de gênero, classe e raça.

O curso será completamente gratuito, online, ao vivo e oferece certificado de participação. O curso prevê vagas afirmativas para mulheres, pessoas negras, PCD, indígenas e LGBTQIAPN+. Vagas limitadas, garanta sua inscrição.

Sobre o minicurso

O curso, que irá envolver material formativo e uma aula magna com duração de 3h, será dividido em três momentos, sendo o primeiro deles composto por explanações teóricas de especialistas no assunto; e oficinas práticas a partir das experiências e coberturas realizadas pelo Nós, mulheres da periferia e Gênero e Número.

As e os participantes terão acesso ao conteúdo da Pesquisa “Prato do dia: desigualdades. Raça, gênero e classe nos sistemas alimentares brasileiros”, inédita, a ser publicada pela FIAN Brasil nos próximos dias. Aprenderão a identificar quais são os principais dados e fontes de informação sobre a temática da fome no país e como construir narrativas humanizadas levando-se em consideração as questões de classe, gênero e raça.

Sobre a microbolsa de reportagem

Após participar do curso, os participantes serão convidados a concorrer a uma microbolsa no valor de R$2.000,00 para custear a produção de uma reportagem especial sobre o tema. A pessoa selecionada receberá tutoria dos veículos de mídia e poderá publicar sua reportagem até outubro.

Cobertura qualificada

“Queremos fomentar uma cobertura qualificada sobre alimentação por meio dos dados, que contextualize as desigualdades do país, mas que também revele o protagonismo das mulheres, especialmente negras, nas soluções para o combate à fome”, destaca Vitória Régia da Silva, gerente de jornalismo e vice-presidente da Gênero e Número.

“É extremamente importante qualificar a cobertura da fome em nosso país entendendo que as desigualdades estruturais passam também pelo racismo e pelo machismo. Com o curso, queremos mostrar nosso jeito de ver o mundo e cobrir o tema, sempre pensando as histórias das mulheres negras e periféricas com o cuidado e profundidade que merecem”, aponta Lívia Lima, cofundadora e diretora de comunidades do Nós.

“Para olhar para a fome e para os sistemas alimentares de uma perspectiva de direitos é preciso retratar os seus fatores estruturais e reconhecer as desigualdades por trás da insegurança alimentar. E também reconhecer que a garantia deste direito é uma obrigação do Estado brasileiro, o que nem sempre é feito na cobertura deste tema, que tende mais a vulnerabilizar os sujeitos e valorizar a filantropia empresarial”, é o que aponta Mariana Santarelli, assessora de políticas públicas da FIAN Brasil.

Sobre as organizações

Sobre o Nós, mulheres da periferia
Somos mulheres que criaram um site para escrever textos e registrar histórias que não encontravam em lugar nenhum. Em um país em que as mulheres estão à margem da liderança dos meios de comunicação, o Nós mulheres da periferia é uma empresa jornalística fundada e autogestionada por mulheres negras e periféricas.

Sobre a Gênero e Número
A Gênero e Número é uma associação que produz e distribui jornalismo e informação orientados por dados e análises sobre questões urgentes de gênero e raça, visando qualificar debates rumo à equidade. A partir de linguagem gráfica, conteúdo audiovisual, pesquisas, relatórios e reportagens multimídia alcançamos e informamos uma audiência interessada no assunto.

Sobre a FIAN Brasil
Fundada em 2020, a FIAN Brasil – Organização pelo Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas tem como missão contribuir para um mundo livre da fome e da má nutrição, no qual cada pessoa possa desfrutar plenamente dos seus direitos humanos, em particular o direito humano à alimentação e à nutrição adequadas (Dhana), com dignidade e autodeterminação. Com sede em Brasília, é uma seção da FIAN Internacional, atuante em mais de 50 países.

SERVIÇO

Formação Fome e Desigualdades no Brasil: muito além dos números
Data das inscrições: de 31/7 a 07/08
Formulário para inscrição: Clique aqui
Data da formação: 17/8
Horário da formação: das 9h às 12h (Horário de Brasília)
Curso online e gratuito

Fonte: Nós, mulheres da periferia, com Gênero e Número e FIAN Brasil

Em manifesto, associações médicas e organizações da sociedade civil pedem por reforma tributária que previna doenças promovendo a alimentação adequada e saudável

Uma reforma tributária que contribua com a prevenção de doenças, promovendo a alimentação adequada e saudável com base nas orientações do Guia Alimentar para População Brasileira, ou seja, incentivando o consumo de alimentos saudáveis e sem incentivos para produtos ultraprocessados. Essa é a bandeira de um grupo de organizações da sociedade civil, associações médicas, grupos de pesquisa e profissionais da saúde e alimentação saudável – como a chef e apresentadora Bela Gil, o pesquisador e médico Carlos Monteiro e o pediatra Daniel Becker. E você também pode contribuir. O manifesto está aberto para receber assinaturas de organizações e pessoas físicas em https://bit.ly/manifesto-alimentacao-saudavel-na-reforma-tributaria.

A publicação do manifesto é uma reação diante do risco de que o texto da reforma tributária conceda o mesmo tratamento fiscal para alimentos saudáveis e produtos ultraprocessados, nocivos à saúde e que devem ser evitados de acordo com o Ministério da Saúde. “A concessão de benefícios fiscais ou tratamento favorecido para ultraprocessados levaria ao aumento do consumo desses produtos, com a consequente queda no consumo de alimentos saudáveis, e o avanço dos índices de doenças crônicas não transmissíveis, com os respectivos custos humanos, sociais e econômicos para o Brasil”, alerta o documento. 

A iniciativa conta com o apoio da ACT Promoção da Saúde, Aliança pela Alimentação Adequada e Saudável, Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM), Abeso, Conselho Federal de Nutricionistas (CFN), Idec, FIAN Brasil, Instituto Desiderata, Instituto Ibirapitanga, Slow Food e Cátedra Josué de Castro de Sistemas Alimentares Saudáveis e Sustentáveis da USP – e já está com mais de 832 assinaturas de pessoas físicas e outras organizações e grupos de pesquisa.

“Na reforma tributária ou na adoção de outras políticas públicas de alimentação e nutrição é imprescindível que o Estado faça a distinção entre comida de verdade e produtos alimentícios que adoecem, como os ultraprocessados, com base nas definições do Guia Alimentar para a População Brasileira, do Ministério da Saúde. Precisamos de incentivos para alimentos saudáveis, in natura ou minimamente processados, que saciam a fome e protegem contra doenças, e desincentivos para os ultraprocessados, que causam impactos negativos à saúde, ao meio ambiente e à economia”, afirma o texto.

“A reforma tributária vai impactar a saúde desta e das próximas gerações. Conclamamos o governo e congressistas para que deixem um legado de justiça social, combate à fome e promoção da saúde, através da garantia do acesso à alimentação adequada e saudável”, conclui o manifesto. 

ACT Promoção da Saúde

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Marco Temporal: Especialista da ONU recomenda ao STF e Senado a rejeição da tese que ameaça direitos dos povos indígenas no Brasil

Na terça-feira (13), em declaração oficial publicada na página do Alto Comissariado para os Direitos Humanos, principal entidade vinculada à Organização das Nações Unidas (ONU) no campo dos direitos humanos, o relator especial sobre os Direitos dos Povos Indígenas, José Francisco Calí Tzay, expressou preocupação com a aplicação da tese do Marco Temporal pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no caso que envolve a disputa possessória de terras entre os indígenas Xokleng, Kaingang e Guarani e o estado de Santa Catarina, em análise pela Suprema Corte desde 2021, após a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) interpor o Recurso Extraordinário 1017365.

O recurso discute se o 5 de outubro de 1988 – data em que foi promulgada a Constituição brasileira – deve ser adotado como parâmetro para definição da ocupação tradicional da terra por povos indígenas. O julgamento, que estava suspenso, foi retomado na última quarta-feira (7) e voltou a ser adiado após pedido de vista do ministro André Mendonça. Até o momento, são dois votos a favor (ministros Alexandre de Moraes e Nunes Marques) e um voto contra (do relator e ministro Edson Fachin).

Na declaração, Calí Tzay destaca que o julgamento do Marco Temporal “pode determinar o curso de mais de 300 processos pendentes de demarcação de terras indígenas no país”, por isto solicita ao STF que não aplique a tese mencionada no caso e decida “de acordo com as normas internacionais existentes sobre os Direitos dos Povos Indígenas”. A adoção do Marco Temporal é contrária aos padrões internacionais, lembra o relator.

O relator especial também disse estar preocupado com a aprovação do Projeto de Lei 490/07 no dia 30 de maio pela Câmara dos Deputados. Também enfatizou que, se a tese do Marco Temporal for aprovada pelo Senado, “todas as terras indígenas, independentemente de seu status e região, serão avaliadas de acordo com a tese, colocando todas as 1393 Terras Indígenas sob ameaça direta” o que segundo Calí Tzay agrava a situação ao “prolongar ou potencialmente obstruir o processo de demarcação, expondo os povos indígenas a conflitos, contaminação relacionada à mineração, escalada da violência e ameaças de seus direitos sociais e culturais”.

FIAN Brasil

Leia íntegra da declaração (tradução livre)

“O Marco Temporal limita o reconhecimento das terras ancestrais dos povos indígenas apenas às terras que ocupavam no dia da promulgação da Constituição, em 5 de outubro de 1988. A tese do Marco Temporal teria sido usada para anular processos administrativos de demarcação de terras indígenas, como no caso da comunidade Guayaroka do povo indígena Guarani Kaiowá. Ela foi questionada em inúmeras ocasiões por organismos internacionais, povos indígenas e defensores dos direitos humanos por desrespeitar o direito dos povos indígenas às terras das quais foram violentamente expulsos, particularmente entre 1945 e 1988 – um período de grande turbulência política e violações generalizadas de direitos humanos no Brasil, incluindo a ditadura.

O julgamento pode determinar o curso de mais de 300 processos pendentes de demarcação de terras indígenas no país. Peço ao Supremo Tribunal Federal que não aplique a tese mencionada no caso e decida de acordo com as normas internacionais existentes sobre os Direitos dos Povos Indígenas.

Estou muito preocupado com a aprovação, no dia 30 de maio, pela Câmara dos Deputados, do Projeto de Lei 490/07 que, se aprovado pelo Senado, aplicaria legalmente a tese do Marco Temporal.

Se a tese do Marco Temporal for aprovada, todas as terras indígenas, independentemente de seu status e região, serão avaliadas de acordo com a tese, colocando todas as 1393 terras indígenas sob ameaça direta. É particularmente preocupante que o Projeto de Lei 490/07 indique explicitamente que sua regulamentação seria aplicável a todos esses casos pendentes, agravando a situação ao prolongar ou potencialmente obstruir o processo de demarcação e expondo os povos indígenas a conflitos, contaminação relacionada à mineração, escalada da violência e ameaças de seus direitos sociais e culturais.

A adoção do Marco Temporal é contrária aos padrões internacionais. Espero que a decisão do Supremo Tribunal Federal esteja alinhada com as normas internacionais de direitos humanos aplicáveis e que proporcione a maior proteção possível aos povos indígenas do Brasil.

A decisão precisa garantir reparações históricas para os povos indígenas e evitar a perpetuação de mais injustiças. Peço ao Senado Federal que rejeite o projeto pendente.

Exorto o governo do Brasil a tomar todas as medidas para proteger os povos indígenas, suas culturas e tradições, de acordo com a Constituição Federal brasileira e as obrigações internacionais de direitos humanos.”

Confira aqui a declaração original.

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Tese político-jurídica é inconstitucional e ameaça os direitos dos povos indígenas no Brasil

Nesta quarta-feira, 7 de junho, o Supremo Tribunal Federal (STF) retoma o julgamento sobre a legalidade do Marco Temporal, uma tese político-jurídica inconstitucional segundo a qual os povos indígenas no Brasil só teriam direito às terras sob sua posse em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal. Porém, é sempre importante lembrar: a história dos povos indígenas não começou em 1988.

Sobre o assunto, no final de maio a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (Cidh) reiterou a preocupação com o possível reconhecimento jurídico do Marco Temporal pelo STF. Em comunicado à imprensa, a Cidh reafirma que a aplicação dessa tese contraria os padrões universais e interamericanos de direitos humanos, colocando em risco a própria existência dos povos originários no país.

“No contexto da possível apreciação dessa tese pelo STF, agendada para o dia 7 de junho, e seu nocivo efeito sobre todos os casos de demarcação de terras ancestrais já concluídos e futuros, a CIDH reafirma que sua aplicação contraria disposições da Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH) e da Declaração Americana sobre os Direitos dos Povos Indígenas”, destaca o comunicado.

Em paralelo, a Câmara dos Deputados tenta acelerar o plano de tornar a aplicação do Marco Temporal um mecanismo legal. Para se ter uma ideia, no último dia 30 e em regime de urgência, deputadas e deputados aprovaram o Projeto de Lei (PL) 490/2007, que dentre outros assuntos transfere do Poder Executivo para o Poder Legislativo a competência para realizar demarcações de terras indígenas. Foram 283 votos a favor e 155 votos contra.

Dentre os parlamentares que votaram a favor estão os membros da bancada ruralista e do agronegócio, que querem a utilização da tese como critério para todos os trâmites que envolvem terras indígenas e, desta forma, inviabilizar a demarcação dos territórios originários que ainda não tiveram seus processos finalizados.

No dia da votação, o Ministério dos Povos Indígenas (MPI) divulgou nota em que classificou a aprovação do Marco Temporal pelos parlamentares federais como um “genocídio legislado”. “O PL 490 representa um genocídio legislado porque afeta diretamente povos indígenas isolados, autorizando o acesso deliberado em territórios onde vivem povos que ainda não tiveram nenhum contato com a sociedade, nem mesmo com outros povos indígenas, cabendo ao Estado brasileiro atuar também pela proteção dos territórios onde vivem estes povos”, diz o documento.

Também em nota, o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) destacou que ao determinar a aplicação “da nociva e inconstitucional tese do Marco Temporal, o PL inviabiliza as demarcações dos territórios indígenas, legaliza o genocídio contra os povos em isolamento voluntário ao permitir o contato com esses povos, flexibiliza o usufruto exclusivo dos territórios para a exploração de terceiros e extingue o direito de consulta aos povos segundo a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT)”.

Para se tornar lei o texto precisa ser analisado e votado pelo Senado Federal, ainda sem data definida.

Aporte jurídico

Ao manifestar preocupação com a aprovação do PL 490/2007, a FIAN Brasil relata que a justificativa das deputadas e deputados para a aprovação da normativa foi fundamentada na aplicação da tese do Marco Temporal, em 2009, durante julgamento do caso Raposa Serra do Sol. “Embora os direitos territoriais das comunidades indígenas daquela localidade tenham sido resguardados, a decisão dos ministros do STF gerou muitos conflitos”, explica o assessor de direitos humanos da FIAN Brasil, Adelar Cupsinski.

A tese político-jurídica foi utilizada para anular processos administrativos de demarcação, a exemplo de áreas pertencentes aos Guarani e Kaiowá, e vem sendo questionada pelos povos indígenas em muitas ocasiões.

Cupsinski explica que as organizações indígenas, apoiadas por indigenistas, defensores de direitos humanos e ambientalistas, argumentam que o Marco Temporal “desconsidera os direitos dos povos originários sobre aquelas áreas de onde foram violentamente retirados, especialmente durante os anos da ditadura militar, momento em que os direitos humanos foram violados”. O assessor de direitos humanos esclarece que a Constituição brasileira seguiu a tese jurídica do “indigenato”, que consiste no direito inato e congênito dos povos indígenas sobre as terras tradicionalmente ocupadas.

Por estas razões e com o intuito de pacificar as disputas sobre os direitos indígenas, a Suprema Corte brasileira reconheceu a repercussão geral da matéria, no Recurso Extraordinário 1017365 SC, pautado para julgamento nesta quarta-feira, 7 de junho. O caso envolve a disputa possessória entre os indígenas Xokleng, Kaingang e Guarani e o estado de Santa Catarina e chegou até o Supremo Tribunal Federal através de um recurso manejado pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai).

A FIAN Brasil, apoiada pela FIAN Internacional, participa do processo judicial na qualidade de amicus curiae (amigo da Corte) e apresentou um memorial aos ministros do STF defendendo os direitos dos povos indígenas.

Um dos pontos do documento afirma que o direito humano à alimentação foi incorporado ao artigo 6º da Constituição Federal de 1988 como direito fundamental social, por meio da Emenda Constitucional 64/2010. Para Adelar Cupsinski, a decisão do Estado brasileiro “rompeu com o paradigma assistencialista destinado à alimentação, ao reconhecê-la enquanto direito fundamental, assumindo a responsabilidade em adotar estratégias para efetivar a segurança alimentar e nutricional”.

O direito fundamental à alimentação também está implícito no artigo 194, o qual determina ações públicas para a garantia dos direitos relativos à saúde, previdência social e assistência social, assim como no artigo 196, que eleva a saúde à condição de “direito de todos e dever do Estado”.

Sobre o assunto, o assessor de direitos humanos destaca que “este direito ainda precisa ser lido em consonância com o multiculturalismo reconhecido pela Constituição Federal de 1988. O multiculturalismo se expressa pelo dever que o texto constitucional incumbiu ao Estado de proteger o patrimônio histórico e cultural dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira. Por estas razões, o Estado brasileiro precisa assegurar os direitos territoriais dos povos indígenas, nos termos da Constituição Federal de 1988 e dos tratados internacionais de que participa”, conclui Cupsinski.

Quer saber mais sobre o Marco Temporal?

No livro O Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas: Enunciados Jurídicos, vários textos abordam o Dhana do ponto de vista dos povos indígenas. Especialmente dois enunciados trazem elementos para o debate atual: “Terra e território como elementos centrais para a garantia do direito humano à alimentação e à nutrição adequadas de povos indígenas e povos e comunidades tradicionais”, de Olivier De Schutter, Valéria Burity e Felipe Bley Folly (p. 87); e “O direito constitucional à retomada de terras indígenas originárias” (p. 99), de Eloy Terena e Roberta Amanajás.

A questão também é tratada no episódio 4 do podcast baseado no livro.

Em 2017, a FIAN Brasil e a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) lançaram a campanha “Seu Direito É Nossa Pauta”, na qual indígenas e organizações parceiras explicam o Marco Temporal, falam de sua inconstitucionalidade e comentam as ameaças da tese às garantias constitucionais dos povos indígenas. São cinco episódios curtinhos que você pode escutar aqui.

FIAN Brasil

Confira as participações especiais no evento Desafios da Alimentação Escolar para os Povos Indígenas

Estudos de caso realizados pela FIAN Brasil em Caarapó (MS), com o povo Guarani e Kaiowá, e em Tabatinga (AM), com mulheres do povo Tikuna, tiveram como ponto norteador a busca de oportunidades e desafios para adequar as refeições escolares em terras e escolas indígenas à luz do Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) e, desta forma, identificar como se dá o respeito à cultura, aos hábitos alimentares tradicionais e à oferta de alimentos da agricultura indígena.

Os resultados dos estudos estão registrados nas seis primeiras publicações da coleção “Equidade e saúde nos sistemas alimentares”, com lançamento marcado para às 11h desta terça-feira, 30 de maio, pela plataforma Zoom, no evento “Desafios da alimentação escolar para os povos indígenas”.

Em uma roda de conversa aberta ao público (mediante inscrição), Mariana Santarelli (FIAN Brasil) apresenta os estudos de caso e recebe:

📌 Adelina Fidelis Ramos (Associação de Mulheres Indígenas – Mapana)
📌 Rosileide Barbosa de Carvalho (EMI Ñandejara)
📌 Marco Antonio Delfino (MPF/MS e Catrapovos)
📌 Regismeire Viana Lima (CECANE – UFAM)
📌 Renata Mainenti Gomes (FNDE)
📌CECANE – MS (a confirmar)

A mediação será de Pedro Vasconcelos (FIAN Brasil).

Participe também!

Serviço
Desafios da alimentação escolar para os povos indígenas

Data: 30 de maio, terça-feira
Horário: 11h (horário de Brasília)
Local: Evento virtual pela plataforma Zoom
Inscrições gratuitas: bit.ly/EventoPnaePovosIndigenas

Haverá transmissão simultânea no canal youtube.com/@FIANBrasil

As publicações dos estudos de caso, além de um minidocumentário e uma reportagem sobre a realidade de cada local, já estão disponíveis aqui mesmo no site:

www.fianbrasil.org.br/pnaegk

www.fianbrasil.org.br/pnaetkn

O projeto “Equidade e saúde nos sistemas alimentares” tem apoio da Global Health Advocacy Incubator (GHAI).

FIAN Brasil

Representante da ONU visita o Brasil para apurar violência contra povos indígenas

FIAN Brasil participa de duas atividades relacionadas à missão oficial de Alice Wairimu Nderitu

Entre 1º e 12 de maio, a subsecretária-geral da Organização das Nações Unidas e assessora especial para Prevenção do Genocídio, Alice Wairimu Nderitu, esteve pela primeira vez em missão oficial no Brasil para apurar casos de violência cometidos contra povos indígenas, quilombolas e outras populações em situação de risco no país.

No dia 4 de maio, em Brasília, Nderitu conversou com representantes do poder público, da sociedade civil, de comunidades indígenas e da comunidade internacional em uma mesa de diálogos organizada pelo Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH). Na ocasião, o assessor de direitos humanos da FIAN Brasil, Adelar Cupsinski, entregou à subsecretária-geral documento acerca do trabalho da FIAN Brasil com os indígenas Guarani e Kaiowá.

Fruto de parceria com o Conselho Indigenista Missionário no Mato Grosso do Sul e pesquisadoras/es de referência, a publicação apresenta, entre outros temas, uma pesquisa* socioeconômica e de análise da situação de (in)segurança alimentar e nutricional, realizada em 2013, nas comunidades Guaiviry, Ypo’i e Kurusu Ambá.

Nas visitas de campo, sempre recebida por lideranças indígenas, Nderitu conheceu, entre outros, o povo Yanomami (RR) e os Guarani e Kaiowá que vivem na retomada do Tekoha Guapo’y, município de Amambai (MS).

Em relato preliminar, a sub subsecretária-geral declarou ter se sentido chocada com a extrema pobreza dos Guarani e Kaiowá. Destacou que as terras indígenas na região ainda não foram demarcadas e têm sido alvo de disputas, principalmente com grandes agricultores, em todo o MS. “A maioria dos indígenas foi expulsa de suas terras tradicionais, na maior parte dos casos de forma violenta. Alguns vivem às margens das rodovias em condições degradantes e desumanas, sem bens e serviços básicos, como água potável, alimentação, saúde e educação para os filhos. Eles são discriminados no acesso a serviços básicos”.

Desde 2005, após denúncia da morte de crianças indígenas por desnutrição, a FIAN Brasil acompanha sistematicamente as comunidades Guarani e Kaiowá. Para a secretária geral da FIAN Brasil, Nayara Côrtes, a triste situação ainda ocorre. “Em pleno 2023, voltam a circular fotos de crianças Guarani e Kaiowá desnutridas, que noticiam a morte de ao menos uma criança em razão da violação de um dos direitos mais básicos, do qual a vida depende: o direito humano à alimentação e à nutrição adequadas”. A declaração foi feita durante encontro com Nderitu no MS, a convite do Conselho Indigenista Missionário (Cimi).

Para saber mais sobre a missão, sugerimos a leitura das matérias produzidas pela Agência Brasil e pelo Cimi. Veja também as primeiras considerações de Alice Wairimu Nderitu sobre a visita de campo.

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* Pesquisa socioeconômica

A pesquisa O Direito Humano à Alimentação Adequada e à Nutrição do povo Guarani e Kaiowá foi realizada nas comunidades Guaiviry, Ypo’i e Kurusu Ambá e encontrou algum grau de insegurança alimentar e nutricional em todas as famílias investigadas.

Em 2021, a FIAN Brasil produziu uma nota técnica, com apoio de profissionais com ampla experiência de trabalho junto aos Guarani e Kaiowá, onde o diagnóstico apontou muitos problemas nos programas de assistência emergencial à alimentação e entraves relacionados a programas de transferência de renda que impactam na segurança alimentar nas aldeias, bem como problemas com a documentação civil.

Atualmente, a FIAN Brasil e a FIAN Internacional, em parceria com o Conselho Indigenista Missionário (Cimi) no Mato Grosso do Sul, e com um grupo de pesquisadores/as de referência no tema, vem realizando uma nova pesquisa, visando traçar os primeiros pontos para a atualização da pesquisa realizada em 2013 sobre as condições socioeconômica nutricional e de segurança alimentar e nutricional das três comunidades pesquisadas, acrescentando ao estudo duas comunidades – Apyka’i e Nhanderu Marangatu.

A análise das informações deve ser feita sob a perspectiva dos Direitos Humanos, em especial sob a ótica do direito humano à alimentação e à nutrição adequadas (Dhana). Porém, os estudos já realizados apontam para a falta de terra como um ponto central a ser resolvido pelo Estado brasileiro.

FIAN Brasil

Lançamento da coleção “Equidade e saúde nos sistemas alimentares”

A adequação das refeições escolares em terras e escolas indígenas é um dos desafios do Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae), que tem entre suas diretrizes o respeito à cultura, às tradições e aos hábitos alimentares saudáveis e deve priorizar a oferta de alimentos da agricultura indígena.

Para contribuir com essa pauta, a FIAN Brasil esteve em Caarapó (MS), em visita ao povo Guarani e Kaiowá, e em Tabatinga (AM), em diálogo com mulheres do povo Tikuna, para realizar estudos de caso capazes de identificar as oportunidades e os desafios encontrados pelas comunidades indígenas locais no acesso ao Pnae.

Os resultados serão apresentados às 11h da próxima terça-feira, 30 de maio, no evento sobre os “Desafios da alimentação escolar para os povos indígenas” e você pode participar. A programação prevê uma roda de conversa aberta às pessoas inscritas no formulário disponível neste link.

Também haverá o lançamento das seis primeiras publicações da coleção “Equidade e saúde nos sistemas alimentares”:

. Diagnóstico e recomendações sobre a alimentação escolar tikuna;
. Documento-síntese do material;
. Diagnóstico e recomendações sobre a alimentação escolar guarani e kaiowá;
. Documento-síntese do material;
. Registro de experiências da Aldeia Te’yikue com o projeto Sabor da Terra e a Unidade Experimental Poty Reñoi;
. Registro de experiências desenvolvidas pela Associação de Mulheres Indígenas – Mapana.

As publicações dos estudos de caso, além de um minidocumentário e uma reportagem sobre a realidade de cada local, já estão no nosso site, nas páginas:

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Salve a data, acesse as publicações e participe conosco.

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Serviço

Desafios da alimentação escolar para os povos indígenas

Data: 30 de maio, terça-feira

Horário: 11h (horário de Brasília)

Local: Evento virtual pela plataforma Zoom

Inscrições: bit.ly/EventoPnaePovosIndigenas

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O projeto “Equidade e saúde nos sistemas alimentares” tem apoio da Global Health Advocacy Incubator (GHAI).

FIAN Brasil

FIAN Brasil e DPU apresentam guia orientador ao trabalho das defensorias públicas na atuação para a exigibilidade do direito à alimentação escolar

Parceria entre a FIAN Brasil e a Defensoria Pública da União (DPU) resultou na produção do Guia de Atuação para Exigibilidade do Direito à Alimentação Escolar. A publicação é voltada ao trabalho das defensorias públicas de todo o país e foi formulada a partir do curso de capacitação para defensoras e defensores públicos federais ofertado pela FIAN Brasil em outubro de 2022, em Brasília (DF).

Com detalhes sobre as diretrizes e a gestão do Programa Nacional da Alimentação Escolar (Pnae), o guia trata das violações possíveis desse direito e reúne exemplos de boas práticas e sugestões para a atuação de defensoras e defensores públicos federais.

Por fim, apresenta propostas de perguntas que podem ser usadas pela DPU na fiscalização em relação à alimentação fornecida nas escolas durante inspeções ou no envio de ofícios aos órgãos competentes, por exemplo.

Para a coordenadora colegiada da FIAN Brasil e coordenadora do Observatório da Alimentação Escolar, Mariana Santarelli, a proposta é que a publicação possa orientar o trabalho não apenas de defensoras e defensores públicos, mas também de advogadas e advogados, procuradoras e procuradores, cidadãos e cidadãs comprometidos com o direito humano à alimentação. “Esperamos com a cartilha estimular uma onda de parcerias entre conselhos, movimentos sociais e o judiciário, para que o direito à alimentação escolar possa ser exigido em todos os estados do país”.

Em agosto, a FIAN Brasil vai realizar uma nova rodada de formação sobre o tema, como parte de acordo de cooperação com o Núcleo de Direito Humano à Alimentação e Nutrição Adequadas Josué de Castro (Núcleo Dhana) do Ministério Público de Pernambuco (MPPE).

FIAN Brasil, com informações da DPU

FIAN Brasil abre processos de seleção

A FIAN Brasil – Organização pelo Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas – contrata três profissionais: Secretária/o, Assessor/a de Sistemas Alimentares e Coordenador/a de Projeto.

As candidatas e candidatos interessados nas vagas para Assessor/a e Coordenador/a deverão enviar seu currículo e carta de apresentação (não mais que uma página) até 21 de maio de 2023, para o e-mail [email protected], indicando no título do e-mail para qual das duas vagas está aplicando.

As candidatas e candidatos interessados na vaga para Secretária/o deverão enviar seu currículo até 21 de maio de 2023, para o e-mail [email protected], indicando no título do e-mail a vaga ao qual pretende concorrer.

Estamos comprometidos em dar oportunidade igual a todas as candidatas e candidatos, a partir de critérios que valorizam a diversidade, incentivando particularmente mulheres, negras e negros, indígenas, LGBTQIAP+ e pessoas com deficiência a se candidatarem aos processos seletivos da entidade.

Para mais informações, clique nas vagas e confira os Termos de Referência:

FIAN Internacional destaca desafio de reconstruir o combate à fome

A FIAN Internacional publicou matéria sobre o desafio do governo Lula de tirar novamente o país do Mapa da Fome, restaurando o sistema de segurança alimentar que o ex-presidente Jair Bolsonaro desmantelou.

O texto ressalta o papel da ex-secretária-geral da FIAN Brasil, Valéria Burity, nessa missão. Ela assumiu a Secretaria Extraordinária de Combate à Pobreza e à Fome, do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS). Leia abaixo.

Ex-secretária-geral da FIAN Brasil lidera os programas de combate à fome do presidente Lula

Clara Roig

Valéria Burity defendeu o direito à alimentação por quase oito anos como secretária-geral da FIAN Brasil. Agora, com uma posição-chave dentro do novo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ela tem o desafio de restaurar os programas de segurança alimentar desmantelados pelo ex-presidente Jair Bolsonaro e promover a soberania alimentar em um país onde 50% da população enfrenta algum grau de insegurança alimentar.

Em 2022, o Brasil retornou ao Mapa da Fome da Organização da Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) após oito anos de ausência. A ex-secretária-geral da FIAN Brasil Valéria Burity enfrenta agora o desafio de restaurar o sistema de segurança alimentar que o ex-presidente Jair Bolsonaro desmantelou. Este sistema é composto pelo Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), um órgão-chave de consulta que reúne a sociedade civil e o governo, a Câmara Interministerial de Segurança Alimentar e Nutricional (Caisan) e a Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional. Esta estrutura institucional existe tanto em nível estadual quanto municipal. O Consea, por exemplo, foi restabelecido em 28 de fevereiro de 2023 pelo presidente Lula num esforço para incluir uma diversidade de vozes na luta contra a fome.

Durante a presidência de Bolsonaro, os níveis de fome dispararam, embora o Brasil seja um dos quatro maiores produtores de alimentos do mundo. A FAO colocou o país novamente no Mapa da Fome quando o número de pessoas que sofrem de fome crônica subiu de 2,5% para 4,1%. Quase um terço da população (30%) tem dificuldades para obter alimentos e 15% (33,1 milhões de pessoas) passam fome todas as noites, de acordo com um relatório da Rede Penssan.

O número de pessoas que passam fome quase dobrou entre 2019 e 2021, após 24 anos consecutivos de queda na insegurança alimentar. Algumas das causas incluem o desmantelamento dos programas alimentares por Bolsonaro, as políticas neoliberais do presidente Michel Temer de 2016 a 2018 que encorajaram a captura corporativa de terras e recursos naturais, uma forte redução dos gastos do governo com o bem-estar social, a crise da Covid-19 e o aumento global dos preços dos alimentos.

Agora, o governo de Lula pretende corrigir o agravamento da situação da fome. O presidente declarou que esta é uma das principais prioridades do novo governo, criando uma câmara para coordenar as ações de 24 ministérios que trabalham para acabar com a fome. Valéria Burity coordenará esta tarefa como secretária extraordinária de Combate à Fome no Ministério do Desenvolvimento Social.

Seu primeiro objetivo é reconstruir as estruturas e instituições federais desmanteladas por Bolsonaro que se dedicaram a garantir o direito à alimentação e à nutrição. Ao lado do Consea e da Caisan, existe o Plano Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Plansan), que incluirá medidas emergenciais e estruturais.

Todas estas instituições trabalharão em conjunto para formar um plano de emergência para reduzir a fome através de uma série de ações. Estas incluem um aumento no orçamento do programa de combate à pobreza Bolsa Família e no salário mínimo, mais fundos para tornar as refeições escolares mais saudáveis e programas para de compras estatais da produção dos pequenos agricultores.

No entanto, os vetores estruturais da insegurança alimentar, tais como desigualdades acentuadas e racismo, e a concentração da terra também precisam ser abordados para garantir uma alimentação adequada e nutritiva. Há também planos de reforma agrária redistributiva para garantir o direito à terra das comunidades rurais mais afetadas pela fome, reformas tributárias para combater as desigualdades e o estabelecimento de reservas alimentares para combater a volatilidade dos preços dos alimentos. Todas estas ações serão direcionadas para a reestruturação dos sistemas alimentares. Em nível pessoal, Valéria Burity avalia que os pesticidas passaram por uma grande liberalização nas últimas décadas e que este “é um dos desafios para garantir uma alimentação adequada”.

Burity entende que esta será uma tarefa desafiadora, especialmente em um governo de coalizão sem uma visão comum sobre a importância da soberania alimentar e outras questões subjacentes relacionadas ao direito à alimentação. “Esta não é uma tarefa fácil”, explica ela, “mas Lula está muito empenhado em acabar com a fome, e nós temos o apoio de uma sociedade civil forte”.

Acesse o texto original e conteúdos complementares em inglês.

FIAN Brasil no Twitter

Estamos felizes em anunciar a abertura da nossa conta no Twitter (@FIANBrasil) como mais um canal de comunicação com a sociedade.

Vamos utilizar essa rede social para divulgar nossas atualizações, noticiário, ações de advocacy, campanhas, análises e documentos técnicos, sempre buscando fortalecer o debate e a conscientização em torno dos direitos humanos, em especial, do direito humano à alimentação e à nutrição adequadas (Dhana).

Além do nosso site e da nova conta no Twitter, também estamos presentes no Instagram (@FIANBrasil) e no Facebook (@FIANnoBrasil). Por isso, convidamos a todas, todes e todos os interessados em discutir e contribuir para garantir a exigibilidade do direito à alimentação a nos seguirem em nossas redes sociais e a participarem das discussões, atividades e campanhas noticiadas.

FIAN Brasil

Participe do Banquetaço 2023: o Consea voltou!

O Coletivo Banquetaço está convocando ativistas e defensores do direito humano à alimentação adequada e saudável para participar da próxima edição nacional, no dia 27 de fevereiro, que celebra a volta do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea). Conselheiros e conselheiras dos Conseas locais, nutricionistas, cozinheiros e cozinheiras, pesquisadoras e pesquisadores, agricultores, artistas, representantes de organizações não-governamentais e demais ativistas podem organizar ações em suas cidades ou se integrar aos grupos que já estão planejando ações – como eventos de distribuição de alimentos, rodas de debate, atividades artísticas e culturais e atos públicos.

O Banquetaço 2023, que tem clima de comemoração, acontece na semana da posse dos conselheiros e conselheiras do Consea Nacional, que será transmitida ao vivo no dia 28 de fevereiro. E exatamente quatro anos depois da primeira edição nacional, realizada em 2019, em que ações e eventos em mais de 40 cidades se mobilizaram contra a extinção do conselho. Para se voluntariar e ser integrado aos grupos locais que estão realizando ações, ou para mais informações sobre o Banquetaço 2023, acesse a página do coletivo nacional no Instagram ou busque pelo perfil do Banquetaço no seu estado. Outra forma de contato é pelo e-mail  [email protected] , ou por mensagem de Whatsapp para Clau Gavioli (11 99161 2835) ou Simone (11 95655 9694).

Metodologia e história do Banquetaço

Banquetaço é um coletivo de ação direta, formado pela sociedade civil organizada, para fortalecer a defesa do direito humano à alimentação adequada e saudável. Por meio de banquetes públicos e intervenções, visa sensibilizar a sociedade sobre a importância da comida – no campo, na cidade, nas florestas e nas águas – promovendo debates e agendas que envolvem os diversos atores dessa ampla cadeia: quem planta e colhe cuidando do meio ambiente e produzindo comida, quem cozinha, quem pesquisa e todos os que agem social, econômica e politicamente nessa relação com os alimentos. Banquetaço é uma ferramenta de ação e mobilização política em prol da Soberania e Segurança Alimentar Nutricional (SSAN) para toda a população (Clique aqui para acessar e conhecer um caderno de metodologias de ação do Banquetaço).

“O coletivo Banquetaço entende que este é um tempo oportuno para ativar o diálogo com a sociedade civil, bem como aproveitar para compartilhar informações sobre a importância desses conselhos e da participação cidadã para todo o povo brasileiro. Nos últimos anos, vimos o Brasil retroceder ao mapa da fome e serem desmontados projetos em diversas fases de execução, alguns embrionários, outros em implantação e também aqueles já maduros e com resultados favoráveis à população, devido a decisões políticas que impactaram diretamente no fomento e na articulação de suas atividades”, afirma o coletivo, em texto de divulgação. 

Observando as ações do Banquetaço numa linha do tempo, desde 2017, quando se posicionou contra a política da farinata, a discussão sobre a comida, a fome e a necessidade de políticas públicas voltadas ao tema nunca deixaram de fazer parte das atividades em diversas frentes. Veja a seguir: 

Seguimos na mesma estrada, Valéria

Valéria Burity encerra o ciclo de quase oito anos como secretária-geral da FIAN Brasil e assume a Secretaria Extraordinária de Combate à Fome do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS).

Neste momento, em que o número de pessoas sem ter o que comer no nosso país é desolador, Valéria irá conduzir uma agenda urgente e necessária para a garantia do direito humano à alimentação: gerir o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan) e facilitar as articulações necessárias para a integração da Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional.

É comum a todas, todes e todos reconhecer que Valéria contribuiu para que a FIAN desse um extraordinário salto qualitativo, constituindo-se hoje como organização de referência no campo do direito humano à alimentação e à nutrição adequadas (Dhana), nos âmbitos nacional e internacional. Sempre assumiu grandes desafios e os transformou em ações norteadoras, bem ancoradas, agregadoras e resolutivas. São marcos de sua história a seriedade, a competência e imensa sensibilidade.

Como legado, Valéria deixa na FIAN Brasil uma equipe profissionalizada, ampliada, confiante e que segue serena, repleta de orgulho e alegria por tudo o que certamente virá neste novo tempo.

Valéria leva consigo nosso amor, traduzido em apoio, admiração, esperança e sincera gratidão. Seguimos na mesma estrada.


Foto: Arquivo pessoal

Mensagem de fim de ano da FIAN Brasil

O ano de 2023 abre novas perspectivas para a realização do direito humano à alimentação e à nutrição adequadas (#Dhana) no nosso país. Nós, que integramos a FIAN Brasil, esperamos que o quadro de desigualdades de classe, raça e gênero nos sistemas alimentares e de crise ambiental no país volte a ser combatido.

Não vamos nos esquecer dos 33 milhões de brasileiros e brasileiras que passam fome, ou dos 125 milhões de pessoas vivendo sob insegurança alimentar – mais da metade da população. E que é urgente olhar para os grupos como mulheres negras e povos indígenas, que são os mais afetados. Chamam atenção a violência contra os Guarani e Kaiowá e a fome extrema que afeta o povo Yanomami.

Mas também não nos esqueceremos de seguir a nossa luta ancorados nos diálogos ampliados, na retomada da democracia, impulsionados pela potência do nosso povo e pela força da nossa participação e mobilização social. Não nos esqueceremos, especialmente, de trabalhar por um Brasil sem fome.

Agradecemos, celebramos as conquistas democráticas e desejamos um 2023 leve e especial para cada uma e cada um de vocês. A máxima da vida é a renovação.

Ida à Alemanha intensifica articulações internacionais contra os agrotóxicos

Pedro Vasconcelos (2o à esq.) no Parlamento alemão com Almudena Abascal (FIAN Alemanha), Silke Bollmohr (PAN Alemanha) e Marian Henn (FIAN Alemanha)

O assessor de Advocacy da FIAN Brasil, Pedro Vasconcelos, esteve na Alemanha em outubro para atividades de incidência internacional no tema dos agrotóxicos. Participou de articulações e expôs a situação brasileira, com ênfase nas contradições entre a postura dos fabricantes europeus em seus países e em outros mercados – o chamado “duplo padrão” (double standards).

Ao lado da seção Ásia e Pacífico da Pesticides Action Network (PAN) – principal rede mundial da área –, a FIAN Brasil liderou a elaboração de carta de 274 entidades do Sul global em apoio à proposta alemã de proibir a exportação de “agrotóxicos altamente perigosos” (hazardous pesticides).

Chama-se de incidência o conjunto de ações dirigidas pela sociedade civil ao Estado para que cumpra suas obrigações em relação a direitos. A viagem foi apoiada pela FIAN Alemanha.

“Além de apoiar a proposição legislativa, as atividades em Berlim tiveram como principais objetivos apresentar o estado do direito humano à alimentação e à nutrição adequadas [Dhana] no Brasil, com ênfase nessa questão, para parlamentares, membros do governo federal e organizações parceiras; e estreitar as relações com essas entidades”, explica Vasconcelos. Leia entrevista à Fundação Heinrich Böll.

Com membros da FIAN Alemanha, da PAN Alemanha e da Inkotta Netzwerk, o assessor participou de reunião no Parlamento alemão com parlamentares e assessorias dos Partido Socila-Democrata (SPD) e dos Verdes, que compõem a atual coalizão governamental.

“Apresentei preocupações relatadas no Brasil com as violações de direitos humanos associadas ao uso indiscriminado de agrotóxicos”, conta Vasconcelos. “Ressaltei o peso político ruralista e os efeitos disso para leis e políticas públicas, incluindo o lobby que exercem, com o apoio de empresas alemãs, por meio de institutos e confederações.” Os interlocutores e interlocutoras comprometeram-se a pressionar por uma maior transparência da atuação de suas transacionais no Brasil, bem como uma contestação pública do projeto de lei conhecido como “Pacote do Veneno” (PL 1.459/2022).

A resistência à proposição, encabeçada pela Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e pela Vida, conseguiu evitar a votação no plenário do Senado este ano. O PL foi aprovado na Câmara dos Deputados e pelos senadores/as da Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA).

Agenda com ministérios

Pedro Vasconcelos também se reuniu com representantes de três ministérios alemães: Agricultura (BMEL), Relações Exteriores (AA) e Cooperação e Desenvolvimento (BMZ).

Aproveitando a presença de responsável pelo Brasil na pasta alemã de Relações Exteriores, o representante abordou o estado do direito à alimentação e à nutrição adequadas e os impactos dos agrotóxicos altamente perigosos no país.

“Fomos questionados sobre eventuais aplicações errôneas das substâncias tóxicas e sobre a necessidade de regular isso. Argumentamos que estamos em processo de regular práticas como a pulverização aérea, mas que a responsabilidade também é de quem exporta substâncias perigosas sabendo como elas são utilizadas”, relata o assessor.

“Ressaltamos que o problema geral está relacionado ao modelo agroexportador, exigente em insumos e com impactos severos no meio ambiente e na saúde. Este modelo gera benefícios e prejuízos desiguais entre Norte e Sul global, levantando questões fundamentais de justiça e responsabilidade. Desta constatação reafirmamos a importância de levar adiante e incentivar transições justas nos sistemas alimentares.”

Regulação das transnacionais

O assessor de Advocacy também participou, na Suíca, de discussões voltadas à criação de um instrumento legalmente vinculante (LBI) que regule internacionalmente as relações entre empresas, principalmente transnacionais, e os direitos humanos. Leia mais.

FIAN contribui em discussão de tratado sobre empresas e direitos humanos

De 22 a 29 de outubro, a FIAN Internacional, a FIAN Brasil e outras seções nacionais participaram de discussões voltadas à criação de um instrumento legalmente vinculante (LBI) que regule internacionalmente as relações entre empresas, principalmente transnacionais, e os direitos humanos. As atividades foram realizadas em Genebra, Suíça.

A proposta é discutida desde 2014 no Grupo de Trabalho (GT) para um Tratado Internacional Vinculante para Empresas e Direitos Humanos, instância intergovernamental atualmente presidida por uma delegação do Equador, em que a FIAN Internacional tem status consultivo. 

Dezenas de organizações da sociedade civil estiveram presentes e ativas na 8ª sessão de negociação do GT. Debates e acordos de definição da incidência das diferentes coalizões ocorreram previamente, com encontros presenciais nos dias 22 e 23. 

Sucessivos abusos e violações de direitos humanos ocorrem em todo o mundo pela ação de empresas transnacionais. Abarcando diversas atividades em extensas cadeias de valor, a responsabilização dessas corporações e a resposta às demandas de comunidades afetadas representam desafios de regulação nos planos nacional e internacional.

“O principal instrumento internacional vigente para prevenir e reparar este tipo de violação são os Princípios Orientadores da ONU para Empresas e Direitos Humanos [UNGPs], balizados pelo mote de ’proteger, respeitar e reparar’”, explica o assessor de Advocacy Pedro Vasconcelos, que representou a FIAN Brasil. “Em sentido semelhante, alguns Estados têm implementado medidas orientadoras no âmbito da responsabilidade corporativa, como exemplificam o surgimento de cada vez mais leis nacionais de devida diligência – due diligence. Entretanto, entende-se em diferentes contextos que o fato de muitas destas regulações serem apenas orientadoras e não vinculantes dificulta sua efetiva implementação.”

Durante a 8ª sessão, ao lado de representantes de outras seções da FIAN, Vasconcelos trabalhou na elaboração de pareceres para declarações em cada discussão de acordo com decisões internas e deliberações das três redes de que a entidade participa: Global Campaign, Treaty Alliance e Escr-Net. Participou também de eventos paralelos temáticos (side events) e de reuniões com cada rede.

O assessor também leu uma declaração de contribuição para o preâmbulo do instrumento vinculante, ressaltando a primazia dos direitos humanos sobre outros acordos internacionais. A manifestação também defendeu a inclusão da Declaração da ONU sobre os Direitos dos Camponeses (Undrop, na sigla em inglês) como exemplo de parâmetro de legislação internacional democraticamente adotada. Enfatizou, ainda, a importância da cooperação internacional no tema, citando como exemplo a atuação de empresas produtoras de agrotóxicos que afetam comunidades em outros países. 

“Articulei, pela FIAN Brasil, uma declaração conjunta com Cimi [Conselho Indigenista Missionário], FIAN Internacional, Apib [Articulação dos Povos Indígenas do Brasil], Red Iglesias y Mineria e Campanha Global para o Artigo 6º”, acrescenta Vasconcelos. “A declaração afirma a importância de incorporar a aplicação do princípio da precaução como chave na relação entre Estados, empresas e direitos humanos, atentando principalmente para povos indígenas, povos e comunidades tradicionais [PCTs], camponeses e riscos de degradação ambiental.”

Agrotóxicos

O assessor de Advocacy também esteve na Alemanha para atividades de incidência internacional no tema dos agrotóxicos. Participou de articulações e expôs a situação brasileira, com ênfase nas contradições entre a postura dos fabricantes europeus em seus países e em outros mercados. Leia mais.

Congresso derruba veto e abre caminho para reajustar alimentação escolar

Parlamentares derrubaram canetada do presidente Jair Bolsonaro contra o reajuste do Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) na LDO. Decisão deve garantir R$ 1,5 bilhão a mais em 2023

Em votação nesta quinta-feira (15), o Congresso Nacional derrubou o veto do presidente Jair Bolsonaro à emenda que tinha incorporado o reajuste do Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). A decisão abre caminho para que o programa receba, em 2023, ao menos R$ 1,5 bilhão a mais, totalizando R$ 5,5 bilhões.

“É uma vitória coletiva, resultado da mobilização de dezenas de organizações ligadas ao Observatório da Alimentação Escolar [ÓAÊ]”, comenta o assessor de Advocacy da FIAN Brasil, Pedro Vasconcelos. “Também confirma a sensibilidade da maioria dos e das parlamentares à prioridade absoluta para as crianças e adolescentes expressa na nossa Constituição. Comida de verdade na escola é indispensável para a saúde e o pleno desenvolvimento dos indivíduos.”

O ÓAÊ conduziu, ao longo do ano, a campanha “Derruba Veto, Reajusta Pnae” para confirmar a reposição dos 34% de perda inflacionária desde 2017 que o projeto aprovado pela LDO contemplava. Agora, como a possibilidade foi acenada pelos parlamentares e pela equipe de transição, a ideia é buscar a ampliação da verba.

“Importante celebrar esta conquista, sem esquecer que o valor ainda não é suficiente para recompor o poder de compra que o Pnae tinha em 2010, quando viveu seu melhor momento”, pontua a coordenadora do observatório, Mariana Santarelli. “Só para acompanhar a inflação dos alimentos precisaríamos de um total de R$ 7,9 bilhões. Está em tempo de o novo governo e o Congresso Nacional darem ao enfrentamento da fome seu devido lugar com mais recursos para a alimentação escolar.”

Nota técnica do ÓAÊ e da FIAN mostra que, sem o reajuste, cada estado perderia de R$ 2 milhões a 247 milhões, e a agricultura familiar deixaria de receber R$ 398 milhões, por ano.

Ato, petição e reforço no Orçamento 2023

O relator-geral do Orçamento 2023, senador Marcelo Castro (MDB-PI), divulgou na terça relatório que registra acréscimo de R$ 1,5 bilhão à verba do Pnae para o ano que vem.

Castro recebeu ontem as 7.390 assinaturas registradas em petição pública pela derrubada do veto de Bolsonaro e pelo aumento na verba da alimentação escolar. O senador ouviu representantes da FIAN Brasil, da Ação da Cidadania, da Aliança pela Alimentação Adequada e Saudável, do Conselho Federal de Nutricionistas (CFN), da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag) e do Instituto Alana. Ele entregou o documento da sociedade civil ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).

Há a expectativa de que a Proposta de Emenda Constitucional da Transição (PEC 32/2022) traga novo reforço para essa política. A PEC garante recursos para áreas sensíveis que estavam a descoberto no Orçamento 2023.

Sobre o observatório

Lançado oficialmente em fevereiro de 2021, o Observatório da Alimentação Escolar (ÓAÊ) é resultado da ação coletiva de organizações da sociedade civil e movimentos sociais engajados na defesa do direito à alimentação escolar.

O ÓAÊ visa ampliar a visibilidade e mobilização e promover o monitoramento do Pnae a partir da formação de uma ampla rede de ação compartilhada que atualmente conta com 18 organizações da sociedade civil, movimentos sociais e redes de pesquisa. Tem hoje, em sua secretaria executiva, a FIAN Brasil e o Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (FBSSAN).

FIAN Brasil

CNDH realiza Ato pelo Dia Internacional dos Direitos Humanos e dá posse à nova composição

Na última quarta-feira (7), o Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH) realizou o Ato pelo Dia Internacional dos Direitos Humanos (10 de dezembro), com o tema “Justiça e paz para fortalecer a democracia, respeitar a diversidade e promover os direitos humanos”. O encontro reuniu conselheiras e conselheiros de dois mandatos do colegiado – o que atuou no Biênio 2020-2022 e o que tomou posse para atuar nos próximos dois anos.

A servidora e assessora da Secretaria-Executiva do CNDH, Ana Claudia Macedo, apresentou em sua fala um agradecimento público pela atuação da FIAN Brasil, que integra duas comissões do Conselho: a Comissão de Direito à Alimentação Adequada do Conselho, representada pela assessora de direitos humanos Nayara Côrtes; e a Comissão Permanente de Monitoramento e Ações na Implementação das Obrigações Internacionais em Matéria de Direitos Humanos (Comissão Internacional), por meio do assessor de direitos humanos Adelar Cupsinski.  

Para Côrtes, o CNDH sempre desenvolveu importante papel na construção de uma cultura de direitos no Brasil. Ela explica que “nos últimos anos – em que o ataque e a violação aos direitos humanos foi uma tônica e os espaços de participação social quase totalmente extintos no governo atual – o Conselho se tornou um espaço de resistência elementar no país”.

A assessora reforça o quanto “é fundamental fortalecer e estruturar o CNDH para que o país, de fato, avance no entendimento e na promoção de uma cultura de direitos e não volte a viver esse terror que é a criminalização de direitos humanos”.

O Ato pelo Dia Internacional dos Direitos Humanos está disponível no canal do CNDH  no YouTube.

FIAN Brasil

Ato no Congresso pressiona por reajuste para alimentação escolar

Mobilização desta quarta (14) em Brasília reúne entidades ligadas ao Observatório da Alimentação Escolar (ÓAÊ) para sensibilizar os/as parlamentares

As entidades que compõem o Observatório da Alimentação Escolar (ÓAÊ) marcaram para a manhã desta quarta-feira (14) um ato em Brasília pelo reajuste do Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae).

A manifestação no Congresso Nacional reafirma a importância de que as refeições escolares, com valor congelado há cinco anos, tenham reforço no orçamento para 2023. Embora o presidente eleito Lula e a equipe de transição tenham defendido enfaticamente a necessidade de mais recursos para o programa, nenhuma proposta foi formalizada até agora em relatórios setoriais ou gerais do Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA).

O relatório divulgado hoje pelo relator-geral do Orçamento, o senador Marcelo Castro (MDB-PI), incorporou um acréscimo de R$ 1,5 bilhão à verba do Pnae para o ano que vem, totalizando R$ 5,4 bilhões. As entidades mantêm a manifestação desta quarta para buscar garantir que o montante permaneça ao longo da tramitação do projeto de lei.

Embora seja uma conquista, para recompor o poder de compra o orçamento deveria ser na casa dos R$ 7,9 bilhões, tendo em vista que o último reajuste nos valores do programa que acompanhou a inflação ocorreu em 2010.  

Desde 2017, o governo federal repassa aos estados e municípios R$ 0,36 por aluna/o por dia, no ensino fundamental e médio.

Aprovação e veto

Como resultado de forte pressão da sociedade civil, e do compromisso de parlamentares de diferentes partidos, a Câmara dos Deputados aprovou a reposição dessas perdas inflacionárias no fim do primeiro semestre, mas o presidente Jair Bolsonaro vetou o trecho ao sancionar o projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) em agosto. Assim, a rubrica orçamentária voltou ao montante do ano anterior, R$ 4 bilhões, para atender mais de 40 milhões de alunos em todo o ano letivo.

As organizações integrantes e parceiras do ÓAÊ lançaram, então, a campanha “Derruba Veto, Reajusta Pnae”, que incluiu uma petição pública pela derrubada da canetada presidencial. “A apreciação do veto acabou não entrando na agenda do Congresso, e com isso a disputa ficou para o próprio PLOA”, explica o assessor de Advocacy da FIAN Brasil, Pedro Vasconcelos. “A Proposta de Emenda Constitucional da Transição [PEC 32/2022] garante recursos para áreas sensíveis que estavam a descoberto no Orçamento 2023, e a segurança alimentar e nutricional de crianças e adolescentes certamente está entre as de caráter fundamental e emergencial.”

Perdas

Nota técnica do observatório e da entidade mostra que, sem o reajuste, cada estado perderia de R$ 2 milhões a 247 milhões, e a agricultura familiar deixaria de receber R$ 398 milhões, por ano.

“Isso é ainda mais absurdo num cenário em que 33 milhões de brasileiras e brasileiros passam fome, e em que a insegurança alimentar grave subiu de 9,4% em 2020 para 18,1% nos lares com crianças menores de 10 anos”, denuncia o assessor de Política Agrícola da Confederação Nacional dos Trabalhadores da Agricultura (CONTAG), Décio Sieb. “Está sendo negada uma das mais importantes refeições do dia – e com isso o direito humano à alimentação e à nutrição adequadas [Dhana] – na etapa crucial do desenvolvimento físico e intelectual.”

O Pnae responde pelas refeições servidas nas quase 150 mil escolas da rede pública do ensino básico no país.

FIAN Brasil

Participação em GT de transição combina propostas emergenciais e estruturantes

A secretária-geral da FIAN Brasil, Valéria Burity, e a assessora de Políticas Públicas, Mariana Santarelli, participaram da plenária do Grupo de Técnico (GT) de Desenvolvimento Social e Combate à Fome do governo de transição. Em suas falas, destacaram propostas emergenciais e estruturantes.

Burity trouxe elementos do contexto, como a escalada da fome, o aumento do consumo de produtos ultraprocessados – associado ao crescimento de doenças não transmissíveis –, a inflação dos alimentos e o colapso ambiental. “O caráter intersetorial da política de SAN [segurança alimentar e nutricional] deve nortear as estrutura de governança de modo que busque dar conta de todas as pontas dos sistemas alimentares, com todos os seus sujeitos”, comenta. “Destaquei ainda a importância de a Caisan [Câmara Interministerial de Segurança Alimentar e Nutricional] ter uma efetiva capacidade de convocação dos diversos ministérios e  dialogar com o Legislativo e o Judiciário.”

Outro assunto abordado pela secretária-geral são as proposições legislativas no Congresso Nacional que representam esperança ou ameaça para o direito humano à alimentação e à nutrição adequadas (Dhana). “É  importante que os órgãos de controle não criminalizem os programas de agricultura familiar e segurança hídrica, como o das cisternas.”

Santarelli, por sua vez, defendeu a reativação do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) no primeiro dia de governo, com a composição de quando teve seu funcionamento interrompido pelo presidente Jair Bolsonaro. “A ideia seria atualizar essa representação adiante, de forma a garantir uma abordagem enfaticamente antirracista e incorporar atores do campo que surgiram nos últimos anos”, explica a assessora, que participou como integrante do Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (FBSSAN).

A FIAN apoia a proposta de criação da Secretaria Especial de Segurança Alimentar e Nutricional e Enfrentamento da Fome, ligada à Presidência da República e abrigando a Caisan e o Consea. “Também seria interessante, na recomposição do que será o futuro Ministério do Desenvolvimento, Assistência Social e Combate à Fome, criar uma secretaria voltada ao acesso à alimentação, com foco em programas como os de cisternas e equipamentos de alimentação e nutrição”, pontua Santarelli. Ela propôs o fortalecimento de uma rede de cozinhas solidárias, que criam os caminhos entre o que é produzido pela agricultura familiar e as pessoas que passam fome na cidade, e lembrou a proposta que vem sendo defendida pelo Observatório da Alimentação Escolar (ÓAÊ) de reajuste do Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae).

Entre os e as integrantes do GT estão o ex-presidente do Consea Renato Maluf, a culinarista Bela Gil, a senadora Simone Tebet e as ex-ministras Tereza Campello e Márcia Lopes. O grupo tem nova plenária marcada para quinta-feira (15).

Em entrevista na Alemanha, assessor da FIAN Brasil comenta lobby e contradições das transnacionais dos agrotóxicos

Entrevista realizada em Berlim, em 20 de outubro, e publicada originalmente em alemão no site da Fundação Heinrich Böll

Brasil: Por que o agro não é pop

Milhões de brasileiros são afetados pela insegurança alimentar. Conversamos com Pedro Vasconcelos Rocha, da FIAN Brasil, sobre a agricultura no Brasil e o lobby brasileiro e alemão dos agrotóxicos.

Por Mareike Bödefeld e Almudena Abascal

O que você espera de uma proibição de exportação de agrotóxicos da Alemanha ou da Europa? Que efeitos positivos tal proibição teria sobre o povo do Brasil, especialmente os trabalhadores rurais e as comunidades indígenas ou quilombolas?

Em primeiro lugar, para nós é um sinal positivo de igualdade de tratamento, porque nós, brasileiros, pegamos doenças dos agrotóxicos assim como os europeus. A afirmação das empresas de que são necessários mais agrotóxicos para uma agricultura bem-sucedida nos países tropicais do que nos países europeus não é eficaz. O solo contaminado acaba por contaminar também os europeus, pois os produtos produzidos no solo são exportados para a Europa. Não é fácil para os europeus determinar quais ingredientes invisíveis acabam em seus pratos. No entanto, foi comprovado que o [queijo] grana padano italiano, por exemplo, contém vestígios de agrotóxicos do Brasil. Os animais de onde vem o presunto espanhol foram alimentados com soja brasileira, para a qual provavelmente foram usados ​​agrotóxicos além da engenharia genética. A decisão de interromper em breve a exportação de agrotóxicos proibidos para outros países, anunciada pelo governo alemão, é, portanto, crucial. Porque as empresas alemãs Bayer e Basf estão na vanguarda do comércio de agrotóxicos. No Brasil, eles simbolizam um comércio eticamente questionável. Um comércio que só funciona com violência e pulverização de agrotóxicos do ar. As pessoas nas proximidades dos campos cultivados com produtos da Bayer ou da Basf sofrem consequências para a saúde, como deformidades genéticas ou câncer. E não são as únicas empresas atuantes no Brasil.

Lobby alemão no Brasil?

No Brasil, o instituto Pensar Agro – com o apoio financeiro de empresas alemãs – promoveu mudanças na legislação ambiental brasileira. A meu ver, os lobistas alemães estão tentando influenciar o pacote de legislação brasileira sobre venenos (PL 6.299). Eu queria obter mais informações sobre isso na Alemanha, mas infelizmente não deu certo.

A FIAN Brasil espera que a Alemanha apresente uma proposta mais ambiciosa para a proibição de exportação de agrotóxicos, uma proposta que sinaliza compromisso e responsabilidade ética. Em geral, pedimos mais transparência em relação às vendas e exportações desses produtos. Alguns produtos não são regulamentados na Alemanha. Precisamos saber quais substâncias não são regulamentadas na Alemanha para poder regulá-las no Brasil, se necessário. Porque não sabemos o que os produtos podem fazer aqui ou como serão usados ​​posteriormente. Gostaríamos de saber dos parlamentares alemães como eles conseguiram regulamentar certos agrotóxicos na Alemanha para aprender com eles para nosso trabalho de lobby no Brasil. O uso de agrotóxicos, a legislação ambiental e a mineração em territórios indígenas estão sendo flexibilizados aqui.

Também é importante para nós se as proibições se aplicam apenas a produtos agrotóxicos acabados ou também a ingredientes ativos individuais. O Brasil tem capacidade de produção própria: ou seja, se apenas os produtos acabados forem proibidos e os ingredientes ativos continuarem sendo exportados, isso não nos ajuda muito. Os problemas ambientais causados ​​pelos produtos também devem receber maior reconhecimento.

Quando há problemas ou danos, as empresas alemãs dizem que os agricultores brasileiros não estão usando seus produtos adequadamente. Mas na realidade eles vendem produtos que são pulverizados do ar como armas químicas em indígenas, por exemplo. Esses ingredientes ativos agora podem ser encontrados em nossos rios e em nossa água potável. Também aqui na Alemanha existem responsáveis ​​que realmente sabem que as substâncias são prejudiciais à saúde e, portanto, foram proibidas aqui.

Também trabalhamos a questão da responsabilidade corporativa, especialmente das empresas transnacionais que atuam no Brasil e no mundo. Junto com a sociedade civil brasileira, estamos trabalhando no Projeto de Lei 572/22, lei da cadeia produtiva brasileira que propõe um acordo entre direitos humanos e negócios, com foco em empresas transnacionais. O lobby empresarial no Brasil é muito poderoso e está tentando barrar o projeto. Fazemos networking com outros latino-americanos e internacionais, por exemplo, atores asiáticos. A União Europeia sinalizou que adotará uma postura de apoio. Uma proposta sobre cadeias de abastecimento livres de desmatamento também está sendo discutida. É importante que as questões de indenização e reparação sejam claramente definidas, não como no caso do Rio Doce, por exemplo, em que os responsáveis ​​ainda são procurados até hoje. Os princípios fundamentais são: prevenção, transparência, reparação e não reincidência. A consulta aos povos indígenas deve ser uma diretriz. Assim, com toda a pressão, o debate sobre a responsabilidade pode ter algum sucesso afinal. As preocupações com a prestação de contas não devem ser apenas uma questão do Sul Global.

Qual é o estágio da implementação de uma política nacional de redução de agrotóxicos no Brasil?

Fizemos uma luta e uma grande coalizão contra a iniciativa legislativa 1.459/22 (o “Pacote do Veneno”, como chamamos) e pedimos apoio internacional. Os relatores especiais da ONU sobre o impacto de substâncias tóxicas e resíduos nos direitos humanos, Marcos Orellana, e sobre o direito à alimentação, Michael Fakhri, viam o projeto com grande preocupação em um comunicado. A lei flexibilizaria a legislação brasileira – ainda que o Brasil já tenha aprovado um número recorde de agrotóxicos nos últimos anos. A informação sobre substâncias cancerígenas e desreguladoras do sistema endócrino deve ser removida do registro e apenas uma categoria de risco deve ser utilizada. O nome “agrotóxico” também deve ser alterado para “produto fitossanitário”. Não há revisão regular dos registros, então existe o risco de que os agrotóxicos sejam liberados indefinidamente. Expressamos repetidamente a nossa preocupação com esse pacote legislativo e, mais recentemente, nós o submetemos à Comissão da Agricultura. Ao mesmo tempo, vemos na Câmara dos Deputados uma redução gradativa do financiamento da agroecologia.

Por que a agroecologia é uma alternativa e como ela pode ser fortalecida?

Com o slogan “O agro é pop”, uma certa visão de como a agricultura deve ser feita é popularizada. Esse modelo agrícola gera renda para poucos no Brasil e certamente não alimenta a população brasileira. Atualmente, 33 milhões de brasileiros vivem em grave situação de insegurança alimentar. Cento e vinte e cinco milhões de brasileiros são afetados por algum tipo de insegurança alimentar. Famílias com filhos são particularmente dependentes do programa de merenda escolar já mencionado. Para muitas crianças brasileiras, a alimentação escolar é a única refeição do dia. Como na escola tem o que comer, conseguimos manter alto o nível de alfabetização e frequência escolar. É claro que é um problema sério quando uma criança vai para a escola só porque está com fome. Agro não é pop. Não alimenta a população brasileira. O agronegócio ganha dinheiro nas costas da população.

A sociedade civil brasileira insiste, portanto, num modelo agrícola diferente: a agroecologia. A agroecologia trata bem a agricultura e o solo e atua de forma ambientalmente responsável. Nas mais diversas regiões do país, as pessoas estão lidando com novos modelos agrícolas e estabelecendo redes. Os povos indígenas estão lutando com a questão da agrofloresta. Vale destacar o movimento Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra [MSTR], que são os maiores produtores de arroz orgânico da América Latina. Seria ótimo se tivéssemos ainda mais apoio nacional e internacional para esse projeto. Porque o Brasil não tem uma política agroecológica forte há muito tempo. Durante os governos do PT houve iniciativas de planos nacionais – mas acabaram falhando na implementação. Em princípio, preferia-se um modelo agrícola diferente, mas algumas medidas a favor dos pequenos produtores poderiam ser implementadas.

Deve haver mais foco no meio ambiente e no envolvimento de quem cuida dele.

Conte-nos um pouco mais sobre a merenda escolar brasileira.

Temos feito muito lobby no Congresso Brasileiro para o programa estadual de alimentação escolar, o Programa Nacional de Alimentação Escolar [Pnae], e como resultado temos conseguido muita atenção da mídia.

O programa existe desde a década de 1960 e é um modelo para muitos outros países. Porque: 40 milhões de crianças e jovens são alimentados em instituições de ensino estaduais com refeições gratuitas que fortalecem seu desenvolvimento biopsicossocial. O programa foi regulamentado pela sociedade civil no passado e tivemos acesso ao Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea).

O resultado da nossa luta foi, entre outras coisas, que desde 2009 o estado se comprometeu a comprar pelo menos 30% dos alimentos para a merenda escolar dos pequenos produtores. A alimentação entregue nas escolas também deve ter uma ligação cultural com a região, de acordo com a legislação do programa. Os especialistas decidem o que as crianças e os jovens vão comer. Por exemplo, o lobby do leite gostaria de se envolver – isso faz sentido para regiões com muito gado leiteiro, mas não para a região amazônica, porque como o leite deveria ser entregue em grandes quantidades aqui? Não dá para levar comida do sul do Brasil que não tem ligação com uma comunidade indígena da Amazônia.

Os tempos mudaram nos últimos anos, especialmente sob o governo Bolsonaro: o Brasil sofre atualmente com uma inflação alta. A insegurança alimentar é um grande problema. Mesmo antes da guerra na Ucrânia e antes da pandemia, alimentos agroecológicos bons, orgânicos, de alta qualidade e de produção familiar eram caros. Recentemente, faltou dinheiro e vontade política para implementar esse gigantesco programa de merenda escolar. Os alimentos regionais e saudáveis ​​foram então trocados, de modo que hoje nossas crianças e jovens às vezes comem alimentos ultraprocessados ​​ou apenas biscoitos, que podem causar doenças crônicas, entre outras coisas.

Como o senhor vê o acordo UE-Mercosul?

Para nós, é uma prioridade abordar o acordo UE-Mercosul a partir de uma perspectiva de direitos humanos. Tanto quanto sabemos, existe um princípio no direito internacional que diz que os direitos humanos têm precedência sobre outros tipos de tratados. Quando se propõem esses tipos de tratados bilaterais e multilaterais, corre-se o risco de que a ambição envolvida leve ao esquecimento deste princípio. Portanto, no UE-Mercosul, estamos lidando com direitos humanos e padrões ambientais muito baixos. Por exemplo, identificamos a questão da proibição da exportação de agrotóxicos proibidos na União Europeia como uma condição importante para o andamento desse tratado. A tendência do acordo até agora é aumentar ainda mais as exportações de agrotóxicos da Europa para a América Latina, inclusive os proibidos aqui. Este contrato foi feito dentro do atual modelo dominante de agricultura industrial e produção de commodities. O contrato reduz os requisitos ao mínimo. Há uma boa chance de que esse tratado seja ratificado pelo novo governo do Brasil – um governo que tem maior interesse em uma posição internacional privilegiada.

Novo governo Lula da Silva

Nos governos anteriores de Lula [2003-2011] houve um pacote de medidas com propostas econômicas e fiscais, que incluíam também a segurança alimentar e o salário mínimo. Sob Bolsonaro, o único pacote era o subsídio ao gás, que vence no final do ano.

Sob Lula havia um ministério da agricultura de exportação [Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – Mapa] e um do Desenvolvimento Agrário [MDA], no qual a agroecologia também era promovida. Esse ministério já foi dissolvido no governo Temer. No processo de transição, Lula criou três grupos de trabalho: um sobre povos indígenas e tradicionais; um sobre agricultura, do qual participam representantes do agronegócio, e o terceiro sobre desenvolvimento agrícola, tendo como participantes sindicalistas e movimento sem-terra.

Foto: Pedro Biondi/Repórter Brasil (2018)

FIAN Brasil e PAN lideram apoio de 274 entidades a proibição de exportação de agrotóxicos proibidos pela UE

Comunicado de imprensa publicado originalmente em inglês por Panap

274 grupos da sociedade civil do Sul Global: sim à proibição alemã de exportação de agrotóxicos proibidos pela UE

Em nome de 274 grupos da sociedade civil de 54 países do Sul Global, a PAN Ásia-Pacífico (Panap) e a FIAN Brasil apresentaram uma carta ao ministro da Agricultura alemão, Cem Oezdemir, em apoio à nova legislação planejada pela Alemanha para proibir a exportação de agrotóxicos proibidos pela União Europeia (UE).

As OSCs agradeceram a declaração de Oezdemir “reconhecendo que não é aceitável que a Alemanha continue a produzir e exportar agrotóxicos que foram corretamente proibidos em seu próprio território para proteger a saúde das pessoas e que as pessoas em todo o mundo, incluindo os agricultores, tenham o mesmo direito à saúde”. A elaboração do documento foi resultado das atividades do assessor de Advocacy da FIAN Brasil, Pedro Vasconcelos, na Alemanha.

Os agrotóxicos altamente perigosos (HHPs) que são proibidos na União Europeia podem, no entanto, ser exportados para países fora da UE, ameaçando a saúde e os meios de subsistência das pessoas. Nessas exportações, a Alemanha desempenha um papel relevante, com 8.525 toneladas de substâncias agrotóxicas ativas não autorizadas exportadas apenas em 2021.

“Temos esperado ansiosamente por ações ousadas e decisivas, como esta proposta de proibição de exportação alemã de agrotóxicos proibidos pela UE. Todos os dias, milhões de agricultores estão sendo envenenados desnecessariamente por padrões duplos injustos no comércio de agrotóxicos. Esperamos que os ministros alemães possam atender ao nosso apelo e resistir à pressão da indústria agroquímica”, disse Sarojeni Rengam, diretor executivo da Panap, que enviou a carta em nome dos signatários em 24 de novembro passado.

Um estudo global de intoxicações agudas não intencionais por agrotóxicos mostra que agricultores e trabalhadores rurais no Sul Global estão sofrendo mais com os impactos dos HHPs, com cerca de 180 milhões de agricultores sofrendo de envenenamento por agrotóxicos não fatais no sul da Ásia, seguidos por 55 milhões no Sudeste Asiático e 51 milhões na África Oriental.

Além das intoxicações agudas, os agrotóxicos proibidos pela UE estão ligados a doenças crônicas como o câncer, têm o potencial de perturbar os sistemas endócrinos das pessoas e colocam especialmente em risco os nascituros, as crianças e as mulheres. Alguns desses agrotóxicos também são conhecidos por prejudicar e até eliminar populações de insetos benéficos, o que coloca em risco a biodiversidade, a polinização, o controle natural de pragas e, consequentemente, a segurança alimentar e a saúde das pessoas. Assim, as OSCs instaram a Alemanha a proibir as exportações de agrotóxicos considerados demasiado perigosos não só para a saúde das pessoas, mas também para o ambiente e a biodiversidade.

“Pedimos que proíbam a exportação de todos os agrotóxicos que não são aprovados na União Europeia – não importa se eles são exportados como produtos ou ingredientes ativos. A mera proibição de exportação de produtos agrotóxicos formulados não será suficiente para evitar danos, já que os exportadores poderiam simplesmente mudar para a exportação de ingredientes ativos, que seriam então formulados e usados no país importador”, disse a carta.

“Expressamos nosso apoio e estamos convencidos de que, se a Alemanha mantiver seu compromisso de reduzir os padrões duplos insustentáveis no comércio de agrotóxicos com a nova legislação planejada, estabelecerá um modelo para outros países e regiões seguirem e será um passo importante para reduzir os danos dos agrotóxicos altamente perigosos sofridos por todas as pessoas e pelo planeta, “, concluiu a carta.

Os signatários da carta incluíram parceiros da Panap da Índia, Bangladesh, Vietnã, Filipinas, Camboja, Indonésia, Paquistão, Nepal e Sri Lanka.

Direito à alimentação: qual o papel do Poder Judiciário?

Duas ações que tratam da fome ainda não foram analisadas pelo STF

O papel do Poder Judiciário na garantia do direito humano à alimentação e à nutrição adequadas (Dhana) será debatido em um evento online que a Conferência Popular por Direitos, Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional promoverá nesta quarta, 19 de outubro. O encontro “Fome de Direitos e Sede de Justiça: o papel do Judiciário na garantia do direito humano à alimentação” reunirá especialistas que vão apresentar casos sobre a atuação do sistema judiciário e debater os marcos conceituais.

“O papel do Judiciário é ser o guardião da Constituição. Ele é provocado a atuar quando há omissão do Poder Executivo, quando o Executivo não implementa o que está previsto como direito na Constituição, quando não implementa uma política de segurança alimentar”, explica Leonardo Ribas, da Conferência Popular.

Leonardo, que será um dos palestrantes do evento, acrescenta que cabe também ao Judiciário garantir aos cidadãos o exercício da soberania alimentar. “A soberania alimentar é o cidadão ter poder de participar do processo que determina como se produz os alimentos, como se distribui, como se consome e como se acessa porque hoje esse processo é totalmente controlado pelo sistema alimentar agroindustrial brasileiro”.

Duas Arguições de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) – a 831, protocolada pelo PT, e a 885, protocolada pela OAB – estão no Supremo Tribunal Federal (STF) e aguardam análise.  Essas ADPF tratam da questão da fome no Brasil e estão sob as relatorias dos ministros Luiz Fux e Dias Toffoli. A expectativa das entidades que compõem a Conferência Popular é que sejam analisadas após as eleições.

A defensora pública do Estado do Rio de Janeiro, Andrea Sepúlveda, explica que o evento vai procurar encontrar formas de sensibilizar e mobilizar não somente o Supremo, mas todo o sistema de Justiça no Brasil para a questão da fome. “Nós entendemos que o Judiciário pode e deve interferir nas políticas públicas que são baseadas em direitos constitucionais”, diz. “O grande debate é pensarmos como a gente vai avançar para que de fato o Judiciário passe a ser um pouco mais atuante. O nós demandamos é que simplesmente cumpra o seu papel de monitorar as políticas públicas e de declarar violações coletivas de direitos quando as políticas públicas não são cumpridas, como no caso da fome”, acrescenta.

Trinta e três milhões de pessoas passam fome no Brasil. O aumento da fome se deu num cenário de desmonte de políticas públicas que garantiam a segurança alimentar. A extinção do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), em 2019, endossa o cenário.  “Quando você extingue o Consea, você tira a sociedade civil desse debate. E eu acredito que a partir da extinção do Consea todas as outras estruturas foram fragilizadas”, ressalta Andrea.

O encontro “Fome de Direitos e Sede de Justiça: o papel do Judiciário na garantia do direito humano à alimentação” poderá ser acompanhado pelo canal da Conferência Popular no Youtube: https://www.youtube.com/c/conferenciapopularssan. Um documento sobre a atuação do Judiciário será produzido a partir do encontro.

DHANA

Sobre a Conferência Popular 

A Conferência Popular por Direitos, Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional é um movimento permanente de resistência à fome e à extinção do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea). Contesta as violações de direitos, racismo estrutural e ameaças à vida. Criada em 2019, é formada por um conjunto de movimentos sociais, organizações da sociedade civil e coletivos.

Para mais informações, acesse o site conferenciassan.org.br.

DHANA

Serviço:

Evento: “Fome de Direitos e Sede de Justiça: o papel do Judiciário na garantia do direito humano à alimentação”

Data: 19/10, das 17h às 19h

Transmissão online: https://www.youtube.com/c/conferenciapopularssan

DHANA

Programação:

Parte 1 – Casos

17h – Abertura – Andrea Sepúlveda, Defensora Pública do Estado do Rio de Janeiro

17h05 – Marcos Legais/Dhana – Flávio Valente, pesquisador associado do Departamento de Nutrição da Universidade Federal de Pernambuco

17h15 – ADPFs no STF e ações no Rio de Janeiro – Rodrigo Azambuja, Defensor Público do Rio de Janeiro

17h25 – “Caso da luta por direitos da Comunidade Sururu do Capote” – Alexandra Beurlen, promotora de Justiça de Alagoas

17h35 – Jurisprudências internacionais e controle da convencionalidade – Miriam Balestro, doutora em Sociologia Jurídica e Instituições Políticas, Promotora de Justiça Aposentada do MPRS e diretora de articulação da FIAN Brasil

17h45 – Roda de Debate – Andrea Sepúlveda (mediação)

Parte 2 – Marcos Conceituais

18h15 – Economia fiscal e direitos humanos – Livi Gerbase, assessora política do INESC

18h25 – Dhana em regime de recuperação fiscal – Leonardo Ribas, doutor em Teoria do Estado e Direito Constitucional

18h35 – Roda de Debate e encerramento – mediação: André Luzzi, Conferência Popular por Direitos, Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional

DHANA

Informações para imprensa

Fabiana Novello – [email protected] – (11) 97149-2324

Marcela Coimbra – [email protected] – (11) 99812-5545

Conferência SSAN

Países latino-americanos discutem estratégias legais em alimentação e saúde à luz do controle do tabaco

Entre 28 de setembro e 1º de outubro, a Cidade do México reuniu advogadas, advogados e ativistas de entidades da América Latina, que atuam nos campos do direito à alimentação e do controle do tabaco, para discutir estratégias legais para a prevenção de doenças crônicas não transmissíveis. O evento teve em sua composição os encontros: “V Encuentro Latinoamericano: Estrategias Legales en Alimentación y Salud” e o “XII Taller Legal: Control de Tabaco en América Latina”.

A partir de afinidades temáticas, vivências e enfrentamentos jurídicos comuns ao coletivo, a troca de conhecimento e articulação teve como fio condutor um quadro de análises sobre a realização progressiva de direitos econômicos, sociais e culturais, nos campos do direito humano à alimentação e à nutrição adequadas (Dhana) e do controle do tabaco.

“Esse quadro tem um olhar para a política econômica, para a política fiscal, para o orçamento, para identificar quais atores enfrentam uma carga tributária maior, ou quais são os grupos beneficiados pelas políticas econômicas e fiscais”, explica a secretária-geral da FIAN Brasil, Valéria Burity.

Valéria e o assessor de direitos humanos da FIAN Brasil, Adelar Cupsinski, contribuíram com as atividades do evento a partir de um chamamento ao debate de propostas que possam potencializar a relação entre a econômica, os aspectos jurídicos e o direito à alimentação. 

Para a secretária-geral, “essa relação é muito importante porque, no Brasil, as políticas econômicas têm um impacto muito severo na garantia do direito à alimentação, seja aumentando a fome e facilitando o aumento da obesidade, seja apresentando aspectos racistas, ou acentuando desigualdades”.

A iniciativa é do Centro de Estudios de Derecho, Justicia y Sociedad (Dejusticia), Campaign for Tobacco Free Kids (TFK), Global Health Advocacy Incubator (GHAI), Global Center for Legal Innovation on Food Environments (por meio do O’Neill Institute for National and Global Health Law) e Unión Internacional Contra la Tuberculosis y Enfermedades Respiratorias (THE UNION).

Leia a publicação: O Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas: Enunciados Jurídicos

Tabaco e alimentação – Antes, nos dias 26 e 27 de setembro, também na Cidade do México, o encontro “Fortalecimiento de Habilidades Estratégicas para el Trabajo Legal”, buscou fortalecer as habilidades de pensamento estratégico, destacando sua centralidade ao trabalho jurídico; construir conhecimento além das áreas do direito que geralmente são exploradas em profundidade em contextos específicos; e gerar um espaço seguro para a inovação, permitindo explorar ideias desafiadoras do ponto de vista jurídico.

Iniciativa do Global Center for Legal Innovation on Food Environments por meio do O’Neill Institute, o workshop se dedicou ao tema de evidências e observou estudos de casos de países da América Latina, como o Brasil. “Foi importante ouvir e conhecer a experiência dos vários países. A partir do compartilhamento das estratégias locais, o grupo pôde fazer comparativos e pensar sobre quais tipos de ações judiciais, estratégias de litigância e de incidência, no campo do tabaco, podem ser adotadas no campo da alimentação”, finalizou Valéria.

FIAN Brasil

Foto: Adelar Cupsinski

Artigo | A fome e a dor dos outros

Nayara Côrtes Rocha

Publicado originalmente no acervo online do Le Monde Diplomatic Brasil, em 19 de setembro

“As violações ao direito humano à alimentação e à nutrição adequadas nunca deixaram de existir no Brasil. A pobreza, a miséria e a concentração de renda, causas da fome, assim como o poder desproporcional e desregulamentado do agronegócio e da indústria de alimentos, sempre se fizeram presentes no complexo cenário brasileiro relacionado à soberania e segurança alimentar e nutricional”.

A reflexão abre o artigo “A fome e a dor dos outros” de Nayara Côrtes Rocha, assessora de direitos humanos da FIAN Brasil ao Le Monde Diplomatique Brasil, veiculado no acervo online do último dia 19.

A partir de um viés científico, político e histórico, Nayara traz em destaque a defesa à dignidade humana e aos direitos fundamentais por meio do acesso ao alimento adequado, saudável e sustentável; e rechaça a omissão e o posicionamento negacionista do governo Bolsonaro diante do aumento da fome e da insegurança alimentar e nutricional em todos os níveis.

Leia o artigo.

Insegurança alimentar é o tema do VII Concurso de Redação da DPU

Com o tema “Prato feito: alimentação de qualidade é sinal de dignidade”, a Defensoria Pública da União (DPU) lançou nesta quinta-feira (18), a 7ª edição do concurso de redação. O torneio é promovido pela DPU em parceria com a FIAN Brasil, a Fundação Pitágoras e o Departamento Penitenciário Nacional, entre outras instituições.

Podem participar do concurso alunos do ensino fundamental e médio, incluindo estudantes da Educação de Jovens e Adultos (EJA). Além dos adolescentes que cumprem medida socioeducativa de internação e os adultos privados de liberdade em instituições estaduais, desde que estejam devidamente matriculados em escola da rede pública ou de ensino técnico. Os internos das penitenciárias federais também podem participar.

As inscrições para participar da iniciativa vão de 19 de setembro a 28 de outubro. Todos os trabalhos devem ser inéditos, feitos individualmente e enviados no formulário de redação que será disponibilizado no site do VII Concurso da DPU. Também precisam estar identificados e não fugirem do tema proposto. Entre as premiações estão videogames, smartphones e tablets.

A alimentação adequada é um direito humano fundamental para que a população viva com saúde e dignidade. O defensor público-geral federal, Daniel Macedo, pontua que a educação é emancipatória. “A gente já fica imaginando uma criança, adolescente ou adulto redigindo uma redação sobre esse tema atual e importante na vida das pessoas. Nós abraçamos esse projeto e a educação é um trabalho de conscientização cidadã”, ressaltou.

A presidente da Fundação Pitágoras, Helena Neiva, reforçou em seu discurso a importância de somar formas com instituições de diferentes áreas. “É importante caminharmos na mesma direção para incluirmos pessoas e promovermos a esperança. Especialmente a área prisional é um lugar de profundo sofrimento e exclusão. Fazer isso por meio da redação é uma oportunidade incrível”, pontua.

O defensor público federal e secretário-geral de articulação institucional da DPU, Gabriel Travassos, reforça que o concurso de redação é uma forma de exercitar a criatividade e falar sobre direitos humanos. “Vamos receber redações de todos os estados do Brasil. Acreditamos na importância de discutir política pública de maneira efetiva e usamos a educação como estratégia”, afirmou.

Acordo

No lançamento do projeto, a DPU assinou um acordo de cooperação técnica com a Fundação Pitágoras, responsável por indicar parte da banca examinadora do concurso. Ao todo, cerca de 200 estudantes de Direito irão ler os textos dos participantes e selecionar os vencedores. Os critérios utilizados serão a criatividade, o conteúdo, a originalidade, a pertinência temática, a clareza no desenvolvimento das ideias, e a correção ortográfica e gramatical do texto.

Cronograma completo do concurso

• Início das inscrições do concurso de redações: 19/9/2022
• Fim das inscrições e do prazo de envio das redações: 28/10/2022
• Início das correções: 31/10/2022
• Fim das correções: 02/12/2022
• Publicação e divulgação do resultado: 24/01/2023

Defensoria Pública da União

Foto: Pedro Vasconcelos/FIAN Brasil

Carta exige apuração imediata e responsabilização civil e penal sobre ação violenta de policiais dirigida a povos indígenas do tekoha Guapo’y

Nesta quarta-feira (29) a FIAN Internacional e a FIAN Brasil, com apoio de entidades de diversas regiões do mundo, integrantes da Rede Global pelo Direito à Alimentação e Nutrição, formalizam denúncia ao Estado brasileiro e ao governo de Mato Grosso do Sul sobre operação de despejo ilegal e violenta, realizada na última sexta-feira (24) pela polícia militar do Mato Grosso do Sul (MS) contra os povos Guarani e Kaiowá, do tekoha Guapo’y, localizado no município de Amambai.

Importante lembrar que com a promulgação da Constituição Federal em 1988, compete à União proteger as populações indígenas, assim como garantir a demarcação de seus territórios tradicionais. No entanto, segundo relato de indígenas e entidades indigenistas, após a retomada de parte do território Guapo’y pelos povos originários ante a omissão do Estado em demarcar as terras indígenas, forças policiais atuaram na expulsão dos Guarani e Kaiowá, acampados no local, sem que houvesse autorização judicial e à revelia do ordenamento jurídico brasileiro.

“O número de pessoas mortas e feridas ainda está sendo apurado, porém, de acordo com as últimas informações obtidas, há registro da morte de uma pessoa e de outras 10 pessoas feridas como resultado dessa ação”, registra o documento, que reúne subsídios da Grande Assembleia da Aty Guasu Guarani e Kaiowá, do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), do Ministério Público Federal de Ponta Porã e de veículo de comunicação.

A carta aponta outros pontos de atenção, como declaração do secretário estadual de justiça e segurança pública do MS, em que culpabiliza e incrimina com argumentos insustentáveis os indígenas atacados pelas forças de segurança pública; e a tentativa das autoridades policiais de dificultar o atendimento prestado pelo serviço público de saúde local a indígenas feridos.

Na carta – encaminhada em cópia para entidades relevantes dos sistemas de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas, Interamericano de Direitos Humanos e da União Europeia – a FIAN Internacional e a FIAN Brasil reivindicam investigação e providências imediatas por parte das autoridades públicas brasileiras. “Exigimos ao Estado Brasileiro que sejam imediatamente cessadas e apuradas as violentas ações dirigidas a tekoha Guapo’y e ao povo indígena Guarani e Kaiowá (…). Exigimos que sejam responsabilizadas civil e penalmente as pessoas que comandaram e/ou realizaram essas ações, com a maior brevidade possível”.

Por fim, o documento exige “o avanço na demarcação dos territórios indígenas e na adoção de outras ações de enfrentamento à violência e à discriminação que afetam, há décadas, o povo Guarani e Kaiowá”.

Leia a íntegra da Carta.

A FIAN Internacional atua há 35 anos pela realização do direito à alimentação e nutrição. Juntamente com a FIAN Brasil, acompanha a luta dos povos Guarani e Kaiowá há mais de uma década. Para saber mais, acesse a publicação “O Direito Humano à Alimentação Adequada e à Nutrição do povo Guarani e Kaiowá”.

FIAN Brasil

Foto: Povos Guarani e Kaiowá, gentilmente cedida ao Cimi

Fortalecimento da participação social na construção de políticas para a alimentação é tema de seminário internacional

Compartilhar vivências, saberes e gerar reflexões coletivas que indiquem respostas à crise alimentar para avançar nos caminhos que conduzem a garantia do direito à alimentação e à soberania alimentar.

Este foi o eixo temático do “Seminario Internacional: La Soberanía Alimentaria y el Derecho a la Alimentación, alternativas a la crisis alimentaria”, realizado em Bogotá, nos dias 7 e 8 de junho, por iniciativa da FIAN Colômbia, FIAN Internacional e Faculdade de Ciências Agrárias da Universidade Nacional da Colômbia.

A experiência da sociedade civil brasileira na promoção do direito humano à alimentação e à nutrição adequadas (Dhana), por meio da formulação e consolidação do sistema, da política e do plano de segurança alimentar e nutricional, foi apresentada pela secretária geral da FIAN Brasil, Valéria Burity, ao falar sobre participação social na construção de políticas públicas com enfoque na alimentação, fio condutor do último painel do seminário internacional.

Burity explicou que as pautas sobre segurança alimentar e combate à fome ganharam centralidade política entre 2003 e 2018, e o protagonismo da sociedade civil foi essencial para as conquistas alcançadas. “A trajetória muito antiga da sociedade civil passou a ser um fundamento importante e decisivo dessa construção, uma energia social muito forte se conectou com este momento”.

A secretária geral destacou o processo de formulação e implementação do sistema nacional de segurança alimentar e nutricional (Sisan). Falou sobre os marcos legais, instrumentos e mecanismos de participação social, como os conselhos e as conferências populares que pautaram a agenda do Sisan junto ao Estado brasileiro.

Burity mencionou os limites e desafios vivenciados pela sociedade civil na conjuntura política da época; e apresentou resultados alcançados ao longo de 10 anos de concertação social, como diminuição das desigualdades sociais e da pobreza extrema e aumento do poder de compra da população. “Em 2014 o Brasil saiu do Mapa da Fome e ficou conhecido mundialmente como referência por vários de seus programas e por resultados muito concretos, como por exemplo, a redução muito significativa da mortalidade infantil”.

No entanto, a secretaria geral alertou que a realidade do Brasil atual é muito diferente. “O país está diante de um governo autoritário e austero, que promove restrições à atuação da sociedade civil desde 2016, quando houve o golpe, seguido do desmonte das instâncias de participação social e do evidente enfraquecimento de políticas públicas essenciais para garantir a alimentação e outros direitos fundamentais”, esclareceu.

Enquanto o seminário internacional acontecia, o 2º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil (II VIGISAN) revelava que 33,1 milhões de pessoas convivem com a fome no Brasil, situação que só se agrava, já que no fim de 2020 o número alarmante de 19,1 milhões de brasileiras e brasileiros já não tinham o que comer.

Para saber mais, a FIAN Colômbia disponibilizou a íntegra do seminário internacional. Assista em:

Dia 1, veiculado em 07/06: https://youtu.be/jBwNuM_W46k

Dia 2, veiculado em 08/06: https://youtu.be/XAFzzmACFdk

Fian Brasil

Alimentação escolar: 22 entidades assinam carta contendo propostas às candidatas e candidatos

Mais de 40 milhões de alunas e alunos da educação básica pública, em todos os municípios do país, têm acesso a pelo menos um prato de refeição por dia, que deve seguir as diretrizes de uma alimentação adequada e saudável. Para muitos desses estudantes a refeição feita na escola é a única ou a mais importante do dia.

O Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae) é a principal política pública para a garantia dessas refeições, especialmente para crianças e adolescentes. Porém, além do expressivo aumento da fome no Brasil e da gravidade da situação alimentar das famílias, o valor do repasse de recursos para a alimentação escolar é insuficiente e não garante a proteção do direito humano à alimentação e à nutrição adequadas (Dhana).

Atualmente, 33 milhões de pessoas passam fome no país, de acordo com o 2º Inquérito Nacional sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil, divulgado nesta quarta-feira (8) pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede Penssan). Os dados mostram que a insegurança alimentar grave em domicílios com crianças menores de 10 anos subiu de 9,4% em 2020 para 18,1% em 2022; e a fome está presente em 22,3% dos domicílios que tiveram acesso ao Pnae.

Diante desse contexto, o Observatório da Alimentação Escolar (ÓAÊ) apresenta nesta quinta-feira (9) carta destinada a eleitoras/es e candidatas/os nos âmbitos federal e estadual, contendo propostas que podem ser implantadas para garantir o direito de toda e todo estudante a se alimentar adequadamente.

A assessora de políticas públicas da FIAN Brasil e coordenadora do ÓAÊ, Mariana Santarelli, explica que a carta foi elaborada com a participação de representantes das organizações e movimentos que compõem o comitê consultivo do observatório. Tem como base “posições que vem sendo amadurecidas a partir do acompanhamento e monitoramento da implementação do Pnae, de estudos realizados pelo ÓAÊ em 2021 que buscaram escutar a opinião de estudantes e agricultores que fornecem alimentos ao Pnae e de estudos técnicos”.

Santarelli comenta parceria com a Associação Nacional de Pesquisa em Financiamento da Educação (Fineduca), a partir da qual foi desenvolvida a proposta de ampliar o valor per capita destinado ao Pnae para recompor as expressivas perdas inflacionárias acumuladas entre 2010 e 2021, ajustando-o às necessidades das/dos estudantes para a oferta universal de alimentação de qualidade, em que reivindica reajuste de R$ 3,9 bi para R$ 7,8 bi.

A carta também traz como propostas: a compra de mais alimentos provenientes da agricultura familiar, priorizando a produção dos assentados da reforma agrária, povos indígenas, quilombolas, povos e comunidades tradicionais, buscando, por exemplo, superar o mínimo de 30% estabelecido em lei das metas estaduais de aquisição de produtos da agricultura familiar, além de assegurar a inclusão de grupos informais e pequenas associações nos processos de compra;

A restrição da oferta de produtos alimentícios ultraprocessados e a ampliação da oferta de alimentos saudáveis, pautados na cultura alimentar do território, na sazonalidade e diversificação, preferencialmente adquiridos da agricultura familiar local e produzidos de forma agroecológica;

E o fortalecimento da gestão pública e da participação social, fundamentais para o cumprimento das diretrizes do Pnae, em detrimento à terceirização de serviços fundamentais como a compra e o preparo dos alimentos, além da importância de reconhecer a participação popular na formulação e controle social desta política.

“Esperamos que nossos futuros governantes, presidente, governadores e legisladores, se sensibilizem com o aumento da fome, e percebam que a melhor estratégia que podem adotar para enfrentá-la é investir recursos e esforços pela melhoria da alimentação escolar, que chega a boa parte das crianças e adolescentes do país por meio das escolas públicas”, finaliza Santarelli.

Jornal Folha de S.Paulo repercute a Carta do ÓAÊ. Leia a matéria: Governo federal ignora inflação e repassa menos de R$ 1 para alimentação de aluno

Mobilização

A secretaria executiva do Observatório da Alimentação Escolar (ÓAÊ) é coordenada pela FIAN Brasil junto com o Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (FBSSAN). Conta com um comitê consultivo, formado pela ActionAid, Aliança por uma Alimentação Adequada e Saudável, Articulação Nacional de Agroecologia (ANA), Articulação Semiárido Brasileiro (ASA), Associação Nacional de Pesquisa em Financiamento da Educação (Fineduca), Comissão de Presidentes de Conseas Estaduais (CPCE), Federação Nacional dos Estudantes do Ensino Técnico (Fenet), Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede PENSSAN), Rede de Mulheres Negras para a Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional e União Nacional dos Conselhos Municipais de Educação (UNCME).

Além dessas 14 organizações, a carta é assinada pela ACT Promoção da Saúde, Associação Brasileira de Nutrição (Asbran), Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares (Contag), Conselho Federal de Nutricionistas (CFN), Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (Fase), Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) e União Nacional das Cooperativas de Agricultura Familiar e Economia Solidária (Unicafes).

Leia a carta na íntegra aqui.

FIAN Brasil, com o Observatório da Alimentação Escolar (ÓAÊ)

ÓSocioBio intensifica incidência política no Congresso em projetos sobre sociobiodiversidade

Devido à urgência em pensar a conservação ambiental conectada ao desenvolvimento da bioeconomia, a FIAN Brasil e um grupo de parceiros que reúne organizações ambientalistas, movimentos sociais do campo e populações indígenas e tradicionais no Brasil, formalizaram nesta quarta-feira (1º), na Câmara dos Deputados, em Brasília, a criação do Observatório da Economia da Sociobiodiversidade (ÓSocioBio).

Tendo na condução o Instituto Socioambiental (ISA); o Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN); e o WWF-Brasil, o lançamento aconteceu em parceria com a Frente Parlamentar Ambientalista, com participação de parlamentares, gestores públicos, organizações da sociedade civil, pesquisadores e jornalistas especializados.

O desenho da iniciativa teve início há cerca de seis meses, quando organizações que atuam diretamente na incidência política no Congresso Nacional, em defesa dos direitos de agricultoras/es familiares, de povos indígenas e de povos e comunidades tradicionais, identificaram a necessidade de intensificação da incidência, diante do desvirtuamento da temática em muitas matérias legislativas relacionadas à economia da sociobiodiversidade, gerando confusão sobre o tema no Parlamento e na sociedade.

O Observatório coloca-se neste contexto como um conjunto de atores relevantes e qualificados para enriquecer a discussão sobre desenvolvimento econômico com igualdade social e equilíbrio ambiental ancorado no respeito aos direitos territoriais dos povos. As questões relacionadas à garantia de direitos territoriais e de acesso a conhecimentos tradicionais, possuem uma transversalidade bastante relevante na abordagem do Observatório. Em ano eleitoral, o coletivo busca ser referência no tema às candidaturas presidenciais e regionais, além de fonte às legislaturas e executivos estaduais eleitos.

Assista cerimônia de lançamento.

Leia carta sobre a criação do Observatório.

Com informações do ISA, ISPN e WWF-Brasil

FIAN internacional repercute documento sobre o uso de agrotóxicos na América Latina

O Relatório anual internacional da FIAN 2021, lançado no último dia 12, dedica seção à defesa dos sistemas alimentares sem o uso de agrotóxicos, em que destaca o informe regional Agrotóxicos na América Latina: violações contra o direito à alimentação e à nutrição adequadas, publicado em 2021 pelo Brasil e mais sete países (Colômbia, Equador, Guatemala, Haiti, Honduras, México e Paraguai), além da FIAN Internacional.

O informe regional aponta como os agrotóxicos impactam a saúde humana e o meio ambiente, e com isso impedem a realização plena do direito humano à alimentação e à nutrição adequadas (Dhana) nesses países latino-americanos e caribenhos onde estão presentes coordenações e grupos da FIAN. 

A secretária-geral da FIAN Brasil, Valéria Burity, explica que o trabalho é fruto do esforço coletivo desses países e se tornou um importante instrumento de advocacy e denúncia. “Considerando a dificuldade de acesso às informações nas plataformas oficiais e coleta de dados dos diversos países, a atuação das coordenações da FIAN na América Latina foi fundamental. Elas disponibilizaram as informações tanto por meio de seus próprios bancos de dados quanto pela literatura especializada”, diz.

Além de enfatizar as causas e consequências das violações de direitos humanos que resultam do uso indiscriminado de agrotóxicos na região, o documento fornece recomendações sobre o que ainda precisa ser feito, como as ações de resistência aos agrotóxicos e ao modelo que os sustenta, ou a necessidade de que os países latino-americanos deixem de fornecer condições econômicas ou regulatórias favoráveis às empresas multinacionais de pesticidas.

O Relatório anual internacional registra que além de fornecer apoio técnico e coordenar a elaboração do informe regional, o Brasil subsidiou denúncia formal ao relator especial das Nações Unidas para substâncias tóxicas e direitos humanos sobre os efeitos nocivos dos agrotóxicos na América Latina, como o caso brasileiro em que a pulverização aérea foi usada como arma contra comunidades camponesas da Zona da Mata Sul de Pernambuco.

O Relatório anual internacional da FIAN 2021 está disponível neste link:

https://www.fian.org/files/annual-report-final-2021-finalpdf.pdf

O informe regional Agrotóxicos na América Latina: violações contra o direito à alimentação e à nutrição adequadas pode ser acessado neste endereço eletrônico:

https://fianbrasil.org.br/wp-content/uploads/2021/04/Agrotoxicos-na-America-Latina-Portugues.pdf

FIAN Brasil, com informações da FIAN Internacional

Coleção reúne cinco publicações sobre o Pnae pela perspectiva da comida de verdade

Um livro, dois livretos e duas cartilhas compõem a coleção de publicações do projeto Crescer e Aprender com Comida de Verdade – pelo Direito à Alimentação e à Nutrição Adequadas na Escola.

A iniciativa, executada pela FIAN Brasil ao longo de 2021, teve como objetivo contribuir para a promoção desse direito humano, conhecido pela sigla Dhana, no âmbito do Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae).

O livro Crescer e Aprender com Comida de Verdade: um ano em defesa do direito à alimentação adequada no Pnae reúne as atividades realizadas – de produção de conhecimento, formação, articulação, sensibilização e incidência, num contexto fortemente impactado pela pandemia de Covid-19 e pelo desmonte das políticas sociais, marcado ainda por tentativas de captura do cardápio escolar

Também compila materiais produzidos pela equipe da FIAN e pelo portal jornalístico O Joio e o Trigo, parceiro na iniciativa. Entre eles, a linha do tempo “Da política ao prato”, que abrange de 1945 a 2001; o artigo “O primeiro direito e a alimentação escolar”; e cinco entrevistas inéditas com Deborah Duprat, José Graziano, Maria Emília Pacheco, Sofía Monsalve e Tereza Campello.

O livreto O Pnae em fatos e números: a importância do Programa Nacional de Alimentação Escolar foi elaborado no intuito de propiciar um primeiro contato com essa política pública, apresentar fundamentos e particularidades de sua execução e oferecer informação para consulta constante. Outro objetivo era contribuir para uma cultura de direitos no país.

A publicação traz histórico e legislação, objetivos e diretrizes e a dimensão do programa. Também apresenta os avanços e desafios, passando por fatos relevantes como a nova realidade imposta pela pandemia.

Orientações para pôr as diretrizes em prática

Na perspectiva formativa, a FIAN produziu as cartilhas Como exigir o direito à alimentação e à nutrição adequadas no Pnae? e Alimentação e nutrição adequadas no Pnae: mais alimentos frescos, menos ultraprocessados. Ambas receberam contribuições de organizações parceiras e foram usadas nas oficinas do projeto.

A primeira trata do direito de toda e todo estudante da educação básica da rede pública a receber, durante o período letivo, uma alimentação adequada. Nesse sentido, explica as diretrizes do Pnae e os princípios e dimensões do Dhana.

O conteúdo apresenta o conceito de exigibilidade – de forma bem simplificada, o exercício do direito de exigir a garantia de direitos –, detalhando as obrigações e responsabilidades das partes envolvidas com o Pnae. Um passo a passo mostra um dos caminhos possíveis para uma reclamação ou denúncia de violação do Dhana no contexto das escolas.

Na segunda cartilha são abordados, entre outros pontos, os motivos de veto ou limitação dos produtos alimentícios ultraprocessados no cardápio; a importância de comprar mais alimentos frescos, da agricultura familiar local; e os impactos dessas medidas para a saúde dos estudantes, para os pequenos agricultores e agricultoras, para a sociedade e para o meio ambiente.

Mergulho na exigibilidade

Programa Nacional de Alimentação Escolar: diretrizes e exigibilidade em tempos de pandemia, como o título indica, aprofunda-se nos pilares da política pública e nos impactos da Covid-19 em sua execução.

A ideia é contribuir para que os sujeitos de direito possam exigir aquilo que a legislação consagra, e que os/as agentes públicos se engajem com propriedade nessa causa ou, no mínimo, façam sua parte.

Sob a ótica do Dhana, o material traz os marcos legais do Pnae e sua implementação no cenário atual, examinando as modalidades de gestão e a situação das compras púbicas. São apresentadas as principais violações desse direito fundamental no período, argumentos para exigir sua garantia e experiências de exigibilidade em seus diferentes níveis (administrativo, político, quas judicial e judicial). O texto explica, ainda, quem e como pode recorrer a cada caminho desses.

Mais uma parceria com o FBSSAN, o livreto foi elaborado por Mariana Santarelli e Vanessa Schottz, pelo fórum nacional, e Nayara Côrtes e Valéria Burity, pela FIAN, com contribuição de Vanessa Manfre. O texto foi originalmente escrito como material de apoio a módulo de curso de extensão sobre o tema.

Restrição aos ultraprocessados e apoio à agricultura familiar

O Crescer e Aprender, desenvolvido ao longo de 2021 com apoio da Global Health Advocacy Incubator (Ghai), teve como foco a restrição aos produtos alimentícios ultraprocessados e o incentivo a uma maior participação da agricultura familiar no fornecimento de alimentos para as escolas públicas. Foram ações de produção de conhecimento, formação, articulação, sensibilização e incidência, num contexto fortemente impactado pela pandemia de Covid-19 e pelo desmonte das políticas sociais, marcado ainda por tentativas de captura do cardápio escolar.  

As atividades envolveram estreita colaboração com a ACT Promoção da Saúde, o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) e o Núcleo de Pesquisas Epidemiológicas em Nutrição e Saúde (Nupens) da Universidade de São Paulo (USP), além do portal jornalístico O Joio e o Trigo, na produção de conteúdo. Um novo parceiro foi o Instituto Desiderata, que no período desenvolveu projeto focado na saúde de crianças e adolescentes, em âmbito municipal, no Rio de Janeiro.

Na iniciativa, a FIAN Brasil também contou com a parceria da Aliança pela Alimentação Adequada e Saudável, do Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (FBSSAN), do Observatório da Alimentação Escolar (ÓAÊ) e do Observatório de Políticas de Segurança Alimentar e Nutrição (Opsan) da Universidade de Brasília (UnB), entre outras organizações. As conversas com a FIAN Colômbia trouxeram conceitos e uma forma de olhar para programas de alimentação escolar alinhada ao Dhana e à soberania alimentar.

Todas as escutas, diagnósticos e interações reafirmaram a importância do Pnae, uma das maiores políticas de alimentação escolar do mundo, que faz bem para a cidade e o campo – e a necessidade de defender esse programa que é referência para vários países.

Também trouxeram novos elementos para nossa atuação em 2022 e 2023, num projeto que buscará contribuir para o enfrentamento das desigualdades no Brasil a partir dos sistemas alimentares.

Livreto apresenta dimensão, histórico e diretrizes do Pnae

O livreto O Pnae em fatos e números: a importância do Programa Nacional de Alimentação Escolar foi produzido no intuito de propiciar um primeiro contato com essa política pública, apresentar fundamentos e particularidades da execução e oferecer informação confiável, em linguagem simples, para consulta constante.

Nossa avaliação era que o “espírito” do programa, e mesmo sua existência, passam despercebidos por boa parte da população, até mesmo entre seus beneficiários/as – talvez pela longevidade e pelo caráter próximo ao de uma política “de Estado” (não associada a uma gestão). Sem falar na ausência de uma cultura de direitos no país, que dificulta o entendimento de que as crianças e os adolescentes são prioridade absoluta e que cabe ao Estado lhes garantir saúde, um ambiente equilibrado e condições de aproveitar ao máximo a escola – e que a comida de verdade tem a ver com tudo isso.

A publicação traz histórico e legislação, objetivos e diretrizes e a dimensão do programa. Também apresenta os avanços e desafios, passando por fatos relevantes como a nova realidade imposta pela pandemia. Foi elaborada pela nutricionista Daniela Bicalho Alvarez, doutoranda em Ciências pela Faculdade de Saúde Pública da USP, em diálogo com a equipe da FIAN Brasil. Para o material, a FIAN elaborou cadernos ilustrados com a designer Patrícia Nardini.

O Pnae em fatos e números faz parte da coleção de publicações do projeto Crescer e Aprender com Comida de Verdade, que inclui um livro, duas cartilhas e mais um livreto. Saiba mais sobre a iniciativa.