Recém empossado, CNPCT sofre com ameaça de extinção e representantes da sociedade civil alinham estratégias

 

Há menos de 1 ano, em setembro de 2018, o CNPCT – Conselho Nacional de Povos e Comunidades Tradicionais tomava posse em Brasília depois de mais de 2 anos aguardando sua instalação oficial. Agora, o órgão sofre nova ameaça com a possibilidade de extinção dos Conselhos Nacionais com participação da sociedade civil, à exemplo do que aconteceu com o Consea – Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, extinto por meio da Medida Provisória 870, no dia 1º de janeiro.

“Nesse primeiro momento estamos tentando firmar o CNPCT como um espaço de fortalecer a democracia. Mas mais do que isso, esse momento de desmonte em várias áreas, em vários espaços, temos tentado fazer nosso papel de sociedade civil que é se posicionar frente às políticas públicas na criação ou implementação. Esse será sempre nosso papel, independente de governo a ou b”, destaca a presidenta do CNPCT, Claudia de Pinho.

O Conselho tem reunião prevista para os dias 10 a 12 de abril e segundo Cláudia este será o momento de fortalecer o espaço com a criação de uma agenda de trabalho para reforçar a importância de diálogo entre sociedade civil e governo na construção e monitoramento de políticas públicas.

A ameaça de extinção dos conselhos, surge como um novo enfrentamento do Povos e Comunidades Tradicionais (PCT’s), somada à violência e criminalização das lutas, aliada à falta de políticas de regularização fundiária e de territórios tradicionais. Esta síntese foi apontada durante uma atividade promovida pela FIAN Brasil, nos dias 25 a 27 de março, em Brasília, junto a um grupo de representantes da Sociedade Civil do CNPCT, que desde janeiro de 2018 se reúne para discutir e elaborar estratégias de incidência política nacional e internacional com o objetivo de fortalecer a sociedade civil do Conselho.

A atividade contou com discussões sobre conceitos e dimensões do DHANA – Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas, elaboração de um Plano de Direitos, além de uma apresentação da Declaração dos Povos Campesinos, aprovada pela ONU em dezembro de 2018, e do Tratado de Direitos Humanos e Empresas, também instrumento internacional.

Para a Presidenta do CNPCT, a atividade foi um momento importante de concentração em uma agenda internacional, como a Declaração dos Direitos Campesinos (DDC) e o Tratado de Direitos Humanos e Empresas. “Foi um momento importante para vislumbrarmos outros espaços e tentar encontrar uma saída também para articulação tanto interna, por meio do plano de direitos, quanto externa colocando nossas demandas em instrumentos como o Tratado e se somando inclusive junto a outros movimentos que também vislumbram incidência nesses espaços internacionais”.

Resistência

A elaboração conjunta do Plano de Direitos elencou algumas prioridades, como a incidência política internacional. “A palavra direito nunca se fez tão necessária como neste momento que estamos vivendo. O fato de conseguir sistematizar isso num Plano, coloca um foco estratégico nas nossas ações. Esse Plano vai mostrar que temos capacidade de articular com outros atores, com outros processos e reinventa nossa forma de resistência. Vejo o Plano como um elemento norteador pra gente seguir resistindo e, fundamental para construir estratégias, rever onde a gente realmente cometeu equívocos e quem são os parce

iros pra gente construir essa resistência ao longo dessa caminhada que vai ser com passos curtos, mas passos firmes”, afirmou o geraizeiro Samuel Caetano, representante do Centro de Agricultura Alternativa do Norte de Minas.

Análise de conjuntura

Ainda na programação, os participantes discutiram uma análise de conjuntura nacional que contou com a presença de Eloy Terena, da Apib- Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, Maurício Guetta, do ISA – Instituto Socioambiental, e Kátia Favilla, da Rede Cerrado.

O advogado ISA, Maurício Guetta, pontuou em sua apresentação os aspectos e ameaças que tramitam no Executivo, Legislativo e Judiciário. No Congresso Nacional 5 medidas ameaçam a pauta socioambiental com impacto nos povos e comunidades tradicionais, entre as quais a proposta de diminuição das Unidades de Conservação; liberação de mineração e hidrelétricas em Terras Indígenas, novo estatuto dos Povos Indígenas e, a extinção do Licenciamento Ambiental, que é o principal foco da bancada ruralista.

Para Eloy Terena, assessor jurídico da APIB, o conceito de território tradicional é o que articula e une a pauta dos povos indígenas com os PCT’s. A tese do Marco Temporal utilizada amplamente nos argumentos jurídicos para impedir a demarcação, homologação ou mesmo que permitam a suspensão da homologação é a grande preocupação dos povos indígenas, atualmente. “O movimento indígena passou a olhar para o judiciário como uma arena de conflitos, em que os juízes são atores políticos”, enfatizou. Terena ainda informou que uma das maiores mobilizações do movimento indígena, o Acampamento Terra Livre acontece em Brasília, entre os dias 24 a 26 de abril.

Tendo em vista o cenário nacional e o desmonte das políticas públicas, Kátia Favila, da Rede Cerrado, apontou a necessidade uma maior incidência no âmbito internacional e união entre os movimentos para fortalecimento das lutas e defesa de políticas públicas.

Audiência Pública

 

Na tarde do dia 27, participantes da atividade estiveram na primeira audiência pública aberta de 2019 promovida pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados (CDHM). O debate reuniu representantes de movimentos sociais e grupos da população, para desenhar um plano de trabalho da Comissão. “Uma das questões que trago para este espaço é que ele seja um espaço de diálogo constante com os povos e comunidades tradicionais. Nós temos enfrentado um processo de criminalização dos movimentos sociais de um modo geral, é um número alarmante de mortes e assassinatos em nossos territórios e isso tem nos fragilizado. Esta criminalização está sendo legalizada pelo Estado brasileiro e isso é muito preocupante para nós”, apontou a presidenta do CNPCT, Claudia de Pinho.

Na audiência pública, que contou com uma diversidade de movimentos sociais, outros temas foram debatidos em torno da regularização das pistas de pouso na Amazônia, a criação de uma subcomissão de defesa dos povos tradicionais de matriz africana e a defesa da legalidade do abate doméstico de animais, a continuidade nas investigações do assassinato da vereadora Marielle Franco, reparação aos atingidos por barragens sobre a Emenda Constitucional 95 de que trata do orçamento da União, os Projetos de Lei que flexibilizam a definição de terrorismo e criminalizam movimentos sociais e o rebaixamento do Ministério do Trabalho ao status de secretaria. Os movimentos sociais solicitaram ainda que a CDHM seja facilitadora em diálogos entre o STF e a sociedade civil.

Grupo de trabalho

Participam do grupo de trabalho representantes da sociedade civil dos seguintes povos e comunidades tradicionais: Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais – CONAQ (comunidades quilombolas); Comissão Nacional de Fortalecimento das Reservas Extrativistas e dos Povos Tradicionais Extrativistas Costeiros e Marinhos (extrativistas costeiros e marinhos); Coordenação Nacional das Comunidades Tradicionais Caiçaras (caiçaras); Centro de Agricultura Alternativa do Norte de Minas (geraizeiros); Rede de Comunidades Tradicionais Pantaneiras (pantaneiros); Associação dos Retireiros do Araguaia – ARA (retireiros) e Movimento das Catadoras de Mangaba – MCM (catadoras de mangaba).

Projeto

Desde janeiro de 2018, a FIAN Brasil desenvolve um trabalho junto ao CNPCT com o objetivo de enfrentar as violações de direitos humanos relacionadas a Povos e Comunidades Tradicionais  (PCTs) do Brasil, por meio de três objetivos específicos: fortalecer a exigibilidade do DHANA; formação junto às organizações sociais que compõem o Conselho em matéria de direitos humanos e exigibilidade de tais direitos, com consequente incidência política neste sentido; viabilizar o início de monitoramento articulado da sociedade civil em torno do Direito Humano à Alimentação e Nutrição Adequadas (DHANA) na América Latina. O projeto da FIAN Brasil com o CNPCT conta com o apoio da HEKS/EPER.

Quer saber mais sobre o trabalho da FIAN Brasil junto ao CNPCT, acesse aqui

 

Contra a extinção do Consea Banquetaço dá recado: alimentação adequada e saudável e participação social são direitos

Mais do que servir alimento saudável para milhares de pessoas em 40 cidades do país, o Banquetaço, realizado de forma concomitante em 11 estados nesta quarta-feira (27 de fevereiro), foi um instrumento para sensibilizar e educar a população brasileira  sobre a importância da alimentação adequada e saudável e de que esse direito está ameaçado com a extinção do Consea – Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional.

O Banquetaço é um movimento político suprapartidário, que mobiliza a sociedade civil em defesa da boa alimentação. Em um cenário em que aumenta a fome no país, o movimento chamou a atenção da população e dos políticos para a importância da permanência do CONSEA e das demais instâncias do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional e dos programas da Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, que vêm sendo rapidamente desmontadas.

Em Brasília, o Banquetaço serviu mais de 1000 refeições, que envolveu a ação voluntária de 30 cozinheiras e cozinheiros e mais de 50 pessoas na organização geral do ato. Foram preparados cerca de 1 tonelada de alimentos, fruto de doação, e produzidos de forma agroecológica e sem o uso de agrotóxicos.

Crédito: Mídia Ninja

O ato reuniu representantes de movimentos sociais, produtores agroecológicos, parlamentares e contou com distribuição de mudas de hortaliças e sementes do Cerrado, e apresentações culturais como a cantora regional Martinha do Coco. “Todo esse movimento é uma forma de conscientizar as pessoas para que saibam que alimentação adequada e saudável é possível, é um direito e que a gente pode ter alimento saudável e barato para todo mundo. O Banquetaço também tem o objetivo de mobilizar e levar para dentro do Congresso Nacional esse clamor da sociedade brasileira para que os deputados e deputadas, no momento de analisar a Medida Provisória 870, não aprovem o artigo 85, que é o artigo que extinguiu o Conselho”, aponta a presidenta da última gestão do Consea, Elizabetta Recine.

Para Antônia Ivoneide, da Direção Nacional do MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, a segurança e soberania alimentar é o fator principal da vida do povo brasileiro. “Todo mundo precisa comer, comer bem e saber o que tá comendo. O Consea é importante do ponto de vista da discussão e da participação da sociedade em todo o processo das políticas públicas voltadas para alimentação. Nós sabemos que hoje, cada vez mais a comida está sendo controlada por poucas empresas que monopolizam a questão da agricultura e portanto controlam o processo da alimentação. Para nós do MST toda terra conquistada da reforma agrária tem que ter como função social a produção de alimento e produzir alimento saudável para as famílias assentadas e para as famílias do Brasil, por isso nós achamos fundamental as mobilizações que estão acontecendo em todo país pela manutenção do Consea”.

A Medida Provisória 870 foi umas das primeiras ações do governo de Jair Bolsonaro. Estamos lutando para derrotar a proposta do governo que acabou com o Consea e para retomarmos o caminho das políticas que combatam a fome e que garantam a soberania alimentar do nosso povo”, destacou o deputado federal Patrus Ananias (PT-MG)

Para a secretária-geral da FIAN Brasil, Valéria Burity, acabar com o Consea é uma forma de retirar direitos, especialmente dos mais pobres. “Essa é uma lógica de acabar com os direitos dos trabalhadores, uma lógica de favorecer quem tem muito privilégio e continuar matando de fome a população brasileira. É muito importante estarmos aqui hoje, fortalecendo esse movimento e exigindo dos nossos parlamentares, dos homens e mulheres que estão no Congresso, que não aprovem a Medida Provisória do Bolsonaro que extinguiu o Consea”.

Desde o anúncio da extinção do Consea, diversas mobilizações nacionais e internacionais têm sido realizadas com o objetivo de reverter essa situação.

Petição internacional

No dia 13 de fevereiro foram protocoladas cópias do abaixo-assinado contra a extinção do Consea à presidência da Câmara dos Deputados, do Senado Federal e ao Ministro de Estado da Cidadania para serem anexados ao processos de análise da Medida Provisória Nº 870/2019. Promovido pela Fian Internacional e Fian Brasil e em articulação com diversas entidades nacionais e internacionais, o abaixo-assinado reuniu até agora mais de 34 mil assinaturas. 

As organizações também enviaram petições à Relatora de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais da Organização dos Estados Americanos (OEA) e aos mecanismos de proteção de direitos humanos das Nações Unidas (ONU) informando sobre a extinção do Consea e requerendo medidas para reverter o seu fechamento.

ONU

Relatores Especiais da ONU, dentre eles a Relatora para o Direito à Alimentação, enviaram ao governo brasileiro, no dia 22 de fevereiro, uma carta em que pedem informações sobre a extinção do Consea e afirmam que esta decisão pode ter um impacto negativo severo na realização do direito à alimentação e água no país. Até o momento não se sabe se o governo respondeu a este pedido de informações.

Ascom FIAN Brasil/ Foto destaque: Acervo ISPN/Méle Dornelas

Obesidade, desnutrição e mudança climática representam desafio global

As epidemias simultâneas de obesidade e desnutrição, além das mudanças climáticas em todo o mundo, constituem a maior ameaça global à saúde humana e à do planeta e que deverão ser enfrentadas neste século.

É o que aponta um relatório publicado na conceituada revista médico-científica The Lancet, que defende que governos comecem a tratar dessa tripla pandemia como um problema único.

No periódico, os pesquisadores utilizam o termo “sindemia global” para definir as três pandemias que representam múltiplas doenças que interagem entre si, produzem sequelas complexas e compartilham atores-sociais comuns.

Outro destaque do estudo é o fato de que, historicamente, a obesidade esteve isolada dos desafios globais e agora passa a ser conectada com as questões climáticas e a desnutrição, demonstrando a urgência e a atenção necessárias para que sejam criadas soluções comuns para esses três desafios.

“Comportamentos individuais são fortemente influenciados por ambientes obesogênicos que promovem a insegurança alimentar e a emissão de gás carbônico”, diz um trecho do relatório.

Para Ana Paula Bortoletto, nutricionista e pesquisadora do Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor) que participou das discussões durante o lançamento do relatório, na Tailândia, o documento representa a determinação de um novo paradigma para a atuação e a articulação da sociedade civil a nível internacional para a discussão e o manejo da sindemia.

“Tanto no Idec quanto na Aliança, trabalhamos pela prevenção do excesso de peso e de doenças associadas com foco na melhoria dos sistemas e ambientes alimentares. O reconhecimento da associação entre as pandemias é de extrema importância para pautar o nosso trabalho, no sentido de lutar por políticas públicas mais eficazes e que abordem o problema de maneira global”, destaca.

Soluções conjuntas

De acordo com o estudo, entre as principais soluções para atuar nas três epidemias globais simultaneamente está um maior monitoramento e exposição das atividades políticas corporativas das indústrias e a elaboração de um tratado global sobre sistemas alimentares, semelhante ao que resultou no avanço das políticas públicas de redução do consumo de tabaco em todo o mundo.

“O relatório aponta de forma contundente a interferência das indústrias transnacionais de alimentos como grande responsável pela inércia política de governos que são coibidos ou pressionados a colocarem os interesses comerciais acima dos interesses da saúde pública”, destaca Bortoletto.

Fonte: Aliança pela Alimentação Saudável

Sociedade civil do Consea manifesta pesar contra decisão do novo governo de extinguir Conselho

A sociedade civil brasileira que compõe o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional recebeu, com surpresa e grande pesar, a decisão do governo federal recém-empossado em revogar, por meio de Medida Provisória nº 870, de 1º de janeiro de 2019, disposições constantes da Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional (Losan), que visa assegurar o direito humano à alimentação adequada.

A medida busca esvaziar as atribuições do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea), órgão de assessoramento direto da Presidência da República e integrante do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan).

Espaço de controle social e construção de propostas sobre o elemento primordial para a vida do ser humano ‒ a alimentação ‒, o Consea tem participação de dois terços de representantes de organizações sociais representativas dos setores mais vulneráveis da sociedade brasileira, que atuam em caráter voluntário, e um terço do governo, conforme determina o artigo 11 da Lei Orgânica nº 11.346, de 15 de setembro de 2006.

A institucionalização da participação de representantes de diferentes setores da sociedade civil em um órgão de assessoramento direto da Presidência da República, como o Consea, tem sido importante instrumento de escuta da sociedade civil para o aprimoramento de políticas públicas e fortalecimento do Estado brasileiro.

A inclusão do direito à alimentação na Constituição, a aprovação da Lei Orgânica, da Política e do Plano Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, o Plano Safra da Agricultura Familiar, a Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica e o Programa de Aquisição de Alimentos e as compras institucionais de alimentos da agricultura familiar para escolas e outros órgãos públicos são algumas das propostas que surgiram em debates no Consea e se tornaram políticas públicas para a garantia de uma alimentação saudável para toda a população.

O formato de participação social adotado pelo Brasil na área de segurança alimentar e nutricional tem sido exemplo para inúmeros países. Nos últimos anos, o Consea recebeu visitas de delegações nacionais e organismos internacionais para conhecer sua organização e atuação.

Assim, é preciso reforçar e consolidar o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional como um espaço democrático do Estado brasileiro ‒ e não de governos ‒ dando voz às organizações sociais representativas para que as políticas públicas consigam dar resposta aos problemas dos setores mais vulneráveis da sociedade brasileira.

CONSELHEIRAS(OS) REPRESENTANTES DA SOCIEDADE CIVIL NO CONSEA

Brasília (DF), 2 de janeiro de 2019.

 

“Pela Democracia e contra a fome”: em manifesto organizações denunciam graves violações de direitos

Em razão ao Dia Mundial da Alimentação, celebrado em 16 de outubro, mais de 30 organizações, movimentos populares e sociais, assinam o Manifesto Pela Democracia e Contra a Fome que denuncia as graves violações de direitos que afetam duas dimensões do Direito Humano à Alimentação Adequada (DHAA) no Brasil: o direito de não sofrer fome e o direito de nos alimentarmos com base em processos e sistemas alimentares adequados, sustentáveis e saudáveis.

Em relação à primeira dimensão, o direito de não sofrer fome, o Manifesto destaca que nas últimas décadas, “dezenas de milhões de pessoas saíram da pobreza, em razão, dentre outros fatores, da adoção de programas de proteção social e da valorização do salário mínimo, que de um lado garantiram direitos e de outro aqueceram a economia do país”, destaca um dos trechos do documento.

No Manifesto as organizações destacam que o governo de Michel Temer adotou medidas que intensificam a violação de direitos sociais e, consequentemente, a realização do DHAA, como o aumento do desemprego, desvalorização do salário mínimo, desmonte de órgãos como Incra e Funai, cortes orçamentários em programas sociais como Água para Todos e o PAA – Programa de Aquisição de Alimentos. “Houve ainda retrocessos na concepção de como se garantir o direito à alimentação, com o aumento da influência política das indústrias que produzem que apresentam alimentos ultraprocessados e adotam práticas e políticas contrárias à realização desse direito. Não engolimos essa!”.

Muitos desses retrocessos são atribuídos à política de austeridade econômica, que agravou a crise do país e cuja maior expressão é a Emenda Constitucional (EC) 95, chamada de Novo Regime Fiscal, que congela, durante 20 anos, as despesas primárias do orçamento público, em um momento de crescimento da população.

O Manifesto também reforça a importância da democracia para a realização do Direito Humano à Alimentação Adequadas. “Reforçamos que a democracia é pressuposto para a garantia do direito humano à alimentação adequada, por isso exigimos o compromisso dos/as agentes políticos de hoje e os e as que serão futuramente eleitos/as com o Estado Democrático de Direito, com nossos direitos fundamentais e com o apoio a sistemas alimentares sustentáveis que sejam ferramentas para alcançarmos mais igualdade social, de gênero e justiça ambiental, que garantam a produção e o consumo de comida de verdade, comida que sabemos de onde vem, comida que nutre, comida com sabor, tradição e cultura, comida que traz saúde e vida, para o nosso corpo, para nosso planeta”.

Entre as organizações que assinam o Manifesto estão Aliança pela Alimentação Adequada e Saudável, Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional, Via Campesina, Fian Brasil, Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e pela Vida, Rede de Mulheres Negras para Segurança Alimentar e Nutricional.

Leia o Manifesto na íntegra abaixo:

 

Pela Democracia e contra a fome
16 de outubro – Dia Mundial da Alimentação

O lema do Dia Mundial da Alimentação 2018 anunciado pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) é “Nossas ações são nosso futuro. Um mundo #fomezero para 2030 é possível”. A proposta é convocar a sociedade mundial para realizar ações que possam combater a fome e desenvolver modelos agrícolas mais saudáveis e sustentáveis.

As entidades que assinam esse manifesto respondem a esse chamado para denunciar as graves violações de direitos que, na atual conjuntura política, afetam as duas dimensões do Direito Humano à Alimentação Adequada (DHAA) no Brasil: o direito de não sofrer fome e o direito de se alimentar com alimentos produzidos com justiça ambiental e social, que gerem saúde, com respeito à cultura e às especificidades de cada indivíduo e grupo, de forma emancipada, informada e permanente.

Em relação à primeira dimensão, o direito de não sofrer fome, destacamos que nas últimas décadas, no Brasil, dezenas de milhões de pessoas saíram da pobreza, em razão, dentre outros fatores, da adoção de programas de proteção social e da valorização do salário mínimo, que de um lado garantiram direitos e de outro aqueceram a economia do país. Entre 2001 e 2012, a renda dos 20% mais pobres cresceu três vezes mais do que a renda dos 20% mais ricos. Apesar das causas estruturantes da desigualdade persistirem nesse período, especialmente em razão do modelo de desenvolvimento e do modelo de produção e consumo de alimentos adotado no país, os fatores anteriormente citados, acesso à renda e políticas públicas, foram determinantes para diminuir a pobreza e para que o país reduzisse significativamente o número de pessoas sofrendo de fome. Por registrar, em 2014, um número menor do que 5% da população afetada pela insegurança alimentar e nutricional grave, o Brasil saiu do Mapa da Fome e foi mundialmente reconhecido como referência por esta e outras conquistas, como a redução da mortalidade infantil. Apesar disso, ressaltamos que alguns grupos como povos indígenas, povos e comunidades tradicionais, mulheres negras, entre outros, continuavam apresentando os indicadores mais altos de insegurança alimentar e nutricional.

Desde que o governo Michel Temer assumiu o poder vêm sendo adotadas diversas medidas que intensificam a violação de direitos sociais e, consequentemente, a realização do DHAA. As ações afetam justamente os pilares que garantiram o combate à fome e à pobreza: houve aumento do desemprego – há 13,2 milhões de desempregados no Brasil, além de 4,8 milhões de desalentados – pessoas que desistiram de procurar trabalho, os resultados preliminares do novo Censo Agropecuário revelam que foram eliminados, desde 2006, cerca 1,5 milhão de empregos nos estabelecimentos agropecuários; o salário mínimo foi desvalorizado e reduzido seu poder de compra; Houve o desmonte de órgãos públicos como FUNAI e INCRA; os programas sociais que foram implementados no Brasil vêm sofrendo graves cortes orçamentários, a exemplo do Programa de Aquisição de Alimentos (67%) e do Programa Água para Todos (94%) . |Houve ainda retrocessos na concepção de como se garantir o direito à alimentação, com o aumento da influência política das indústrias que produzem que apresentam alimentos ultraprocessados e adotam práticas e políticas contrárias à realização desse direito. Não engolimos essa!

Muitos desses retrocessos são atribuídos à política de austeridade econômica, que agravou a crise do país e cuja maior expressão é a Emenda Constitucional (EC) 95, chamada de Novo
Regime Fiscal, que congela, durante 20 anos, as despesas primárias do orçamento público, em um momento de crescimento da população. Análises da Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílio (PNAD) Contínua 2017 revelam que retrocedemos, em 02, mais de 10 anos em indicadores sociais de extrema pobreza, alcançando 11,8 milhões de brasileiros. Como o fenômeno da fome, como já denunciava Josué de Castro, mantém estreita relação com pobreza e extrema pobreza, alertamos, com grande angústia e preocupação, para a volta do Brasil ao Mapa da Fome. Para além da fome,
há outros impactos que estão sendo associados aos retrocessos que estamos vivendo. A mortalidade infantil, em 2016, depois de décadas de queda, apresentou um aumento de 4,8% em relação a 2015.

Quanto à segunda dimensão do direito à alimentação, se intensifica um modelo de desenvolvimento, e de produção e de consumo de alimentos, que levam à precificação, à financeirização e à concentração de terra e a um maior uso de agrotóxicos – de acordo com o novo Censo Agropecuário do total de 5.072.152 propriedades rurais metade delas têm 10 hectares ou menos, representando 2,28% da área total destinada a estabelecimentos agropecuários, de outro lado, cerca de 1% abrangem 47,52% de todas as terras utilizadas para a agropecuária e aumentou em 20,4%, entre 2006 e 2017, o número de propriedades rurais que usam agrotóxicos. Estes modelos também negam o direito às sementes crioulas, geram disputas e conflitos por água e por terra, nos concedendo o triste título de campeões em assassinatos de defensores e defensoras de territórios tradicionais. Este processo também resulta em desmatamento descontrolado, e deixa evidente a incapacidade do Estado de regular grandes (e poucas) empresas que atuam e dominam as diferentes esferas do sistema alimentar, que expõem as pessoas a produtos ultraprocessados, nos conduzindo à má nutrição, à obesidade e às doenças crônicas não transmissíveis, que tem levado à morte milhões de pessoas.

Quando se nega o acesso a sementes crioulas, ou quando se deixar circular livremente produtos ultraprocessados, são os corpos das pessoas que vão exibir, as diversas violações de direitos que enfrentamos no Brasil e no mundo. Nossos corpos, assim como nosso planeta, já dão mostras que não podemos seguir assim e um grande números de pesquisas evidenciam isso. No contexto de graves violações de direitos, o aumento do uso da violência e da criminalização é o instrumento para conter lutar por direitos.

A população brasileira vem reagindo e denunciado essas violações de direitos: recentemente 07 representantes de movimentos populares fizeram 26 dias de greve de fome com o propósito de denunciar o quadro grave de violações de direitos que está afetando a vida de milhões de pessoas e a própria democracia brasileira. A Caravana do Semiárido, uma iniciativa da Articulação Semiárido (ASA), juntamente com a Frente Brasil Popular e Via Campesina, também denunciaram o aumento da pobreza e da fome, chamando a atenção da sociedade brasileira e das autoridades sobre este fenômeno que viola direitos garantidos na Constituição Federal. A Coalizão Anti-austeridade tem denunciado todos os retrocessos causados pela política de austeridade e muitos conselhos, a exemplo do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, também vêm denunciando os retrocessos que, dentre outros efeitos, condenam pessoas empobrecidas à fome.

Reforçamos o grito contra a exclusão, a fome e a morte. Não vamos aceitar qualquer ação ou omissão que nos leve ao sofrimento e à negação da vida. Reforçamos que a democracia é pressuposto para a garantia do direito humano à alimentação adequada, por isso exigimos o compromisso dos/as agentes políticos de hoje e os e as que serão futuramente eleitos/as com o Estado Democrático de Direito, com nossos direitos fundamentais e com o apoio a sistemas alimentares sustentáveis que sejam ferramentas para alcançarmos mais igualdade social, de gênero e justiça ambiental, que garantam a produção e o consumo de comida de verdade, comida que sabemos de onde vem, comida que nutre, comida com sabor, tradição e cultura, comida que traz saúde e vida, para o nosso corpo, para nosso planeta. Comida é direito, é patrimônio e é cultura e a nossa fome é também por justiça, democracia e direitos.

Aliança pela Alimentação Adequada e Saudável
Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional
Via Campesina
Fian Brasil
Pesacre
Movimento Camponês Popular
Núcleo Interdisciplinar de Prevenção de Doenças Crônicas na Infância – Pró- Reitoria
Extensão UFRGS
Banquetaço
Observatório da Alimentação Saudável e Sustentável – ObASS
Terra de Direitos – Organização de Direitos Humanos
Núcleo de Pesquisa de Nutrição em Produção de Refeições-UFSC
Naturinga Orgânicos
Movimento agora Brasil
Slow Food Brasil
Ação Da Cidadania SP
Rede Paulista de Controle Social da Tuberculose
PET – Nutrição UFSC
ABRA-Associação Brasileira de Reforma Agrária
MUDA – Movimento Urbano de Agroecologia
APAER – Associação Paulista de Extensão Rural
Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e pela Vida
Rede de Mulheres Negras para Segurança Alimentar e Nutricional
Centro de Referência em Segurança Alimentar e Nutricional
FASE- Solidariedade e Educação
Grupo de Estudos em Segurança Alimentar e Nutricional- GESAN
Abrasco
O Joio e o Trigo
CEDAC – Centro de Ação Comunitária
MPS – Mov. Pró-Saneamento e Meio Ambiente – São João de Meriti / RJ
Coletivo SAN-RJ
Centro Ecológico
Instituto de Estudos Socioeconômicos – INESC
Grupo de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional
Rede Brota Cerrado de Cultura e Agroecologia

Baixe o Manifesto Aqui!

 

(Crédito foto destaque: Marcia Foletto / Agencia O Globo)

Sociedade civil do Consea analisa programas de governo dos presidenciáveis

Organizações da sociedade civil do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) apresentaram uma análise dos planos de governo propostos pelos presidenciáveis  sobre a Segurança Alimentar da população para as eleições 2018. A análise A Segurança Alimentar e Nutricional nos programas de candidatas e candidatos à Presidência da República foi divulgada durante a 9ª Plenária do Conselho, que teve como tema “Prioridades para a Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (PNSAN)” e realizada no final de setembro, em Brasília.

O objetivo da pesquisa foi identificar propostas e citações relacionadas à agenda de Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) presentes nos programas de governos dos 13 candidatos e candidata à Presidência. O documento  analisa os programas sob a ótica do marco conceitual da SAN e das diretrizes que compõem a sua agenda, previstas na Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional para tanto, foram definidas 20 palavras-chave: Abastecimento alimentar; Agricultura familiar; Agroecologia; Agronegócio; Agrotóxicos; Alimentação; Água/Cisterna; Bolsa Família; Fome; Mudança Climática;  Mulheres/Gênero; Nutrição; Obesidade; Pobreza; População negra; Povos e comunidades tradicionais; Povos indígenas; Segurança alimentar e nutricional; Terra e território/Reforma agrária e Transgênicos.

“Todos os programas foram lidos na íntegra. As palavras-chave foram localizadas, contabilizadas, analisadas, interpretadas de acordo com o contexto em que foram mencionadas. A análise de cada palavra-chave foi feita a partir do contexto em que ela foi mencionada, tendo como parâmetro os princípios dispostos da Lei nº 11.346/2006 (que cria o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional – SISAN)”, destaca o documento.

De acordo com o documento, nenhum candidato ou candidata mencionou todas as palavras-chave pesquisadas. Os programas de Fernando Haddad (PT) e de Guilherme Boulos (PSOL) são os que mais mencionam as palavras-chave relacionadas à agenda de SAN: “Haddad (PT) citou 18 (90%) dentre as 20 palavras pesquisadas e Boulos (PSOL) 17 (85%). O programa de Marina Silva (REDE) menciona 16 (80%) das 20 palavras e no de Ciro Gomes (PDT) foram identificadas 14 (70%) das palavras pesquisadas. Os demais candidatos citaram menos de 10 (50%) palavras do total das 20 pesquisadas. O candidato Álvaro Dias (PODE) não mencionou nenhum dos termos”.

Na imagem abaixo é possível observar a presença ou não das palavras-chave nos programas dos presidenciáveis.

Reprodução documento

Para as organizações que assinam o documento, a implementação intersetorial do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan) “desafia a gestão pública a estabelecer um círculo virtuoso de articulação, qualificação de processos e ampliação de resultados para a realização do Direito Humano à Alimentação Adequada. A adoção da Segurança Alimentar e Nutricional como um eixo de desenvolvimento do nosso país terá um impacto na redução da pobreza, no desenvolvimento, na promoção da sustentabilidade ambiental, social e econômica, na justiça social e na saúde das populações do campo, das cidades, das florestas e das águas”, consideram.

“Os programas que estão previstos no Plano Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional podem, de um lado, fortalecer processos alimentares sustentáveis e saudáveis, garantindo o direito humano à alimentação e à nutrição da população brasileira e, de outro, ser um motor que aquece a economia interna e reduz desigualdades, por isso é fundamental conhecer o que cada candidata/o apresenta como programa”, destaca a secretária geral da FIAN Brasil, Valéria Burity.

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CNDH divulga relatório de missão sobre direito à alimentação em penitenciária feminina do DF

O Conselho Nacional dos Direitos Humanos realizou em março de 2018 uma missão à Penitenciária Feminina do Distrito Federal, a Colmeia. A partir de denúncias feitas pelo Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT), a missão teve como foco o direito à alimentação de detentas gestantes, lactantes e com filhos e filhas. Na incursão, o Conselho identificou uma série de violações, que resultaram em um relatório, aprovado na última reunião do pleno do colegiado, realizada no dia oito de agosto.

Foram verificadas as condições gerais de distribuição e consumo da alimentação e da água potável; as condições de gestação, parto e pós-parto (direitos sexuais e reprodutivos); a permanência ou não das crianças na unidade, dentre outros procedimentos.

Entre as conclusões, o grupo observou que a decisão do STF, que determinou a substituição da prisão preventiva pela domiciliar para mulheres grávidas e mães de crianças com até 12 anos, não vinha sendo cumprida. Além disso, as detentas não têm acesso adequado à água potável, são oferecidos alimentos em condições de higiene duvidosas, as refeições são monótonas e incompletas em termos de uma alimentação adequada e saudável, principalmente para gestantes e lactantes. Também foi identificada a inexistência de local apropriado para a realização das refeições, sendo as custodiadas submetidas a situações degradantes para se alimentar.

Quanto à alimentação dos bebês residentes na unidade prisional, foi identificado atraso na entrega da comida, além disso, a alimentação complementar não é feita de forma correta. Os bebês recebem sopa (oferecida pela empresa terceirizada prestadora de serviços de alimentação) ou alimentos trazidos pela família. Ao contrário do que é indicado pelo Ministério da Saúde, as mães são orientadas a iniciar a introdução alimentar antes dos seis meses de idade, pois com essa idade eles são retirados das mães.

A missão, que foi composta apenas por mulheres, contou ainda com a participação de representantes do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT), Ministério da Saúde, Ministério dos Direitos Humanos e Fian Brasil, que integram a Comissão Permanente sobre Direito Humano à Alimentação Adequada do colegiado.

Para Fabiana Severo, Presidenta do Conselho Nacional dos Direitos Humanos e Defensora Pública da União, as violações não estão apenas no cárcere. “Elas começam na decisão do encarceramento, na forma como o sistema de justiça reforça um ciclo de exclusão que atinge não só essas mulheres, mas também seus filhos e filhas. As penas são absolutamente desproporcionais aos delitos”.  Fabiana observou ainda que das mulheres entrevistadas, quase todas eram negras, que, grávidas ou com filhos, viviam num contexto de vulnerabilidade social. “O encarceramento faz parte de um ciclo de violações estruturais na vida dessas mulheres, já que a maioria delas não teve acesso a políticas públicas primárias, como moradia digna, educação, saúde e justiça”.

A presidenta do CNDH avalia ainda como dramática a separação das mães lactantes dos seus bebês aos seis meses. “Aos cinco meses já se retira a amamentação exclusiva e se introduz alimentos, para acelerar a separação. Algumas, que não têm apoio familiar, nem sabem para onde vão os bebês, que são entregues a abrigos ou destinados para adoção. E perdem esse vínculo definitivamente”, relata.

O Conselho decidiu, portanto, encaminhar recomendações a diferentes órgãos públicos responsáveis por garantir o direito à alimentação adequada, bem como os demais direitos humanos dessas mulheres e seus filhos e filhas.

Dentre as recomendações, está a de encaminhamento aos órgãos competentes dos casos em que for adequada a substituição de prisões preventivas por prisões domiciliares, conforme decisão do Supremo Tribunal Federal no Habeas Corpus (HC 143641). Deve-se também ser garantida, nas hipóteses de separação entre e mães e filhos/as, nos casos em que não caiba a prisão domiciliar, que o procedimento seja acompanhado pelos órgãos de proteção de direitos humanos e de assistência social e psicológica, sendo devidamente respeitados os direitos humanos das custodiadas, bem como o princípio do melhor interesse da criança.

Histórico da missão

O caso foi apresentado à Comissão Permanente Direito Humano à Alimentação Adequada do CNDH em 2017, pelo Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura (MNPCT). Na denúncia, o Mecanismo identificava a alimentação como um provável vetor de tortura na Penitenciária.

“Percebemos que a alimentação das mulheres lactantes era severamente reduzida. Isso, na opinião das próprias mulheres, tinha o propósito de reduzir a produção do leite para que as crianças fossem afastadas de suas mães”, relata Luz Arinda, então perita do Mecanismo, que relatou também diversas outras violações ao direito à alimentação adequada, como falta de acesso à água potável e à alimentação de qualidade em várias porções ao dia.

Também foram identificadas, à época, violações aos direitos sexuais e reprodutivos que impactam no direito à amamentação, como partos desassistidos, partos de mulheres algemadas, e condições violadoras no pós-parto. “Se uma mulher pare em condições de violência, é pouco provável que ela consiga amamentar essa criança”, frisa Luz Arinda, que também participou da missão.

Deise Benedito, uma das peritas do MNPCT que participou da missão, ressalta que a ausência de políticas públicas é determinante para o quadro de violações a que essas mulheres são submetidas, e aponta o racismo como componente que acentua a vulnerabilidade de mulheres negras a práticas de tortura e maus tratos. “A cor da pele define o grau de sofrimento que será imposto a essas mulheres na prisão”, declara.

No início deste ano, o Supremo Tribunal Federal (STF) concedeu habeas corpus coletivo que determinou a substituição da prisão preventiva pela domiciliar para mulheres grávidas e mães de crianças com até 12 anos. A medida vale para mulheres que não tenham cometido crimes violentos contra os próprios filhos ou que sejam responsáveis por pessoas com deficiência. À época foram dados 60 dias para os tribunais cumprirem integralmente a decisão.

 

Acesse na íntegra o Relatório sobre Direito Humano à Alimentação Adequada na penitenciária feminina do Distrito Federal

 

Fonte: Assessoria de Comunicação do CNDH

Declaração Internacional dos Direitos Campesinos é tema de oficina que acontece nesta segunda (26) em Brasília

FIAN Brasil, FIAN Internacional e a Articulação para o Monitoramento dos Direitos Humanos no Brasil realizam, nesta segunda-feira (26/02), uma Oficina sobre a Declaração dos Direitos dos Campesinos, em Brasília. A atividade, direcionada para organizações da sociedade civil e movimentos sociais, tem como objetivo discutir pautas internacionais importantes para as lutas sociais relacionadas à terra, território e outros direitos humanos.

O cerne dos debates estará direcionado para a Declaração Internacional dos Direitos dos Campesinos (DDC), importante processo político-jurídico que vem ocorrendo nos últimos anos no Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas (ONU), em Genebra (Suíça). A Declaração é uma ferramenta que pretende consolidar, proteger e também inovar no que se refere aos direitos dos camponeses e de outras pessoas que trabalham na zona rural. Neste sentido, destaca-se a importância nas discussões de temas relacionados, por exemplo, a Povos e Comunidades Tradicionais, soberania alimentar, direito às sementes, bem como outras pautas relacionadas.

Na programação da Oficina, as organizações e movimentos participam de discussões sobre o processo político de construção na ONU da Declaração dos Direitos dos Campesinos, a importância da DDC para reforçar as lutas sociais no Brasil e as estratégias para o fortalecimento da incidência internacional no tema.

“A iniciativa é essencial pelo papel chave que os camponeses desempenham na produção de alimentos e os desafios em torno da questão agrária, bem como o crescente número de conflitos em torno da terra e da água, assim como as crises dos preços alimentares e climáticos”, destaca trecho de um documento da Via Campesina Internacional, em 2012, na ocasião da aprovação da Resolução sobre a necessidade de se criar uma nova ferramenta para os direitos dos mais de um milhão de camponeses e de trabalhadores rurais do mundo inteiro.

A previsão é de que a negociação da Declaração seja concluída em abril, em Genebra, na próxima sessão do Grupo Aberto de Trabalho responsável pela minuta final.

Serviço

Oficina com sociedade civil sobre a Declaração dos Direitos dos Campesinos

26 de fevereiro

Horário: 9h às 18h

Local: Instituto São Boaventura (SGAN 915, Módulos ABC, Anexo ao Santuário São Francisco), Brasília – DF.

CDNH aprova Resolução sobre DHANA para mulheres e adolescentes em privação de liberdade

O CNDH aprovou, em sua 33ª Reunião Ordinária, realizada no dia 6 de dezembro, a Resolução n° 9/2017, que trata do Direito Humano à Alimentação Adequada de mulheres e adolescentes em privação de liberdade, em especial gestantes, lactantes e com filhos e filhas. A Resolução é um dos encaminhamentos da Comissão Permanente de Direito Humano à Alimentação e Nutrição Adequadas do CNDH, da qual a FIAN Brasil faz parte.

Para o colegiado, qualquer imposição de fome e sede às mulheres e adolescentes em Privação de Liberdade, sobretudo a título de punição ou como forma de condicionar comportamentos, é considerada tortura, por isso, o colegiado defende a aplicação de medidas alternativas à privação de liberdade como medida de prevenção à tortura.

Na impossibilidade de aplicação de medidas alternativas, o documento do colegiado recomenda que o Estado garanta, dentre outros itens, o direito à amamentação de livre demanda, sem restrição de tempo e em local apropriado; a criação de condições e ambientes que permitam às mulheres e adolescentes alimentar e/ou amamentar seus filhos e filhas; a oferta de alimentos adequados e saudáveis para as crianças menores de 2 anos, respeitando as quantidades, a qualidade e a consistência conforme diretrizes e princípios estabelecidos no Guia Alimentar para Crianças Menores de 2 anos, do Ministério da Saúde; e atenção especial ao direito das mulheres e adolescentes vivendo com HIV ou AIDS de alimentar seus filhos e filhas, garantindo o vínculo e respeito à alimentação adequada.

CNDH também recomenda que mulheres e adolescentes em privação de liberdade sejam consultadas sobre o interesse em amamentar e/ou alimentar seu filho e filha, respeitando a opção da mãe e, havendo o seu interesse, garantir orientação e apoio para o Aleitamento Materno e alimentação adequada. Também é reforçada a recomendação de não utilização de algema durante os atos médico-hospitalares preparatórios para a realização do parto, durante o trabalho de parto e pós-parto; além de tratamento médico e psicológico em caso de abortos, espontâneos ou não.

Confira aqui a Resolução na íntegra.

Fonte: CNDH