Recém empossado, CNPCT sofre com ameaça de extinção e representantes da sociedade civil alinham estratégias

 

Há menos de 1 ano, em setembro de 2018, o CNPCT – Conselho Nacional de Povos e Comunidades Tradicionais tomava posse em Brasília depois de mais de 2 anos aguardando sua instalação oficial. Agora, o órgão sofre nova ameaça com a possibilidade de extinção dos Conselhos Nacionais com participação da sociedade civil, à exemplo do que aconteceu com o Consea – Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, extinto por meio da Medida Provisória 870, no dia 1º de janeiro.

“Nesse primeiro momento estamos tentando firmar o CNPCT como um espaço de fortalecer a democracia. Mas mais do que isso, esse momento de desmonte em várias áreas, em vários espaços, temos tentado fazer nosso papel de sociedade civil que é se posicionar frente às políticas públicas na criação ou implementação. Esse será sempre nosso papel, independente de governo a ou b”, destaca a presidenta do CNPCT, Claudia de Pinho.

O Conselho tem reunião prevista para os dias 10 a 12 de abril e segundo Cláudia este será o momento de fortalecer o espaço com a criação de uma agenda de trabalho para reforçar a importância de diálogo entre sociedade civil e governo na construção e monitoramento de políticas públicas.

A ameaça de extinção dos conselhos, surge como um novo enfrentamento do Povos e Comunidades Tradicionais (PCT’s), somada à violência e criminalização das lutas, aliada à falta de políticas de regularização fundiária e de territórios tradicionais. Esta síntese foi apontada durante uma atividade promovida pela FIAN Brasil, nos dias 25 a 27 de março, em Brasília, junto a um grupo de representantes da Sociedade Civil do CNPCT, que desde janeiro de 2018 se reúne para discutir e elaborar estratégias de incidência política nacional e internacional com o objetivo de fortalecer a sociedade civil do Conselho.

A atividade contou com discussões sobre conceitos e dimensões do DHANA – Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas, elaboração de um Plano de Direitos, além de uma apresentação da Declaração dos Povos Campesinos, aprovada pela ONU em dezembro de 2018, e do Tratado de Direitos Humanos e Empresas, também instrumento internacional.

Para a Presidenta do CNPCT, a atividade foi um momento importante de concentração em uma agenda internacional, como a Declaração dos Direitos Campesinos (DDC) e o Tratado de Direitos Humanos e Empresas. “Foi um momento importante para vislumbrarmos outros espaços e tentar encontrar uma saída também para articulação tanto interna, por meio do plano de direitos, quanto externa colocando nossas demandas em instrumentos como o Tratado e se somando inclusive junto a outros movimentos que também vislumbram incidência nesses espaços internacionais”.

Resistência

A elaboração conjunta do Plano de Direitos elencou algumas prioridades, como a incidência política internacional. “A palavra direito nunca se fez tão necessária como neste momento que estamos vivendo. O fato de conseguir sistematizar isso num Plano, coloca um foco estratégico nas nossas ações. Esse Plano vai mostrar que temos capacidade de articular com outros atores, com outros processos e reinventa nossa forma de resistência. Vejo o Plano como um elemento norteador pra gente seguir resistindo e, fundamental para construir estratégias, rever onde a gente realmente cometeu equívocos e quem são os parce

iros pra gente construir essa resistência ao longo dessa caminhada que vai ser com passos curtos, mas passos firmes”, afirmou o geraizeiro Samuel Caetano, representante do Centro de Agricultura Alternativa do Norte de Minas.

Análise de conjuntura

Ainda na programação, os participantes discutiram uma análise de conjuntura nacional que contou com a presença de Eloy Terena, da Apib- Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, Maurício Guetta, do ISA – Instituto Socioambiental, e Kátia Favilla, da Rede Cerrado.

O advogado ISA, Maurício Guetta, pontuou em sua apresentação os aspectos e ameaças que tramitam no Executivo, Legislativo e Judiciário. No Congresso Nacional 5 medidas ameaçam a pauta socioambiental com impacto nos povos e comunidades tradicionais, entre as quais a proposta de diminuição das Unidades de Conservação; liberação de mineração e hidrelétricas em Terras Indígenas, novo estatuto dos Povos Indígenas e, a extinção do Licenciamento Ambiental, que é o principal foco da bancada ruralista.

Para Eloy Terena, assessor jurídico da APIB, o conceito de território tradicional é o que articula e une a pauta dos povos indígenas com os PCT’s. A tese do Marco Temporal utilizada amplamente nos argumentos jurídicos para impedir a demarcação, homologação ou mesmo que permitam a suspensão da homologação é a grande preocupação dos povos indígenas, atualmente. “O movimento indígena passou a olhar para o judiciário como uma arena de conflitos, em que os juízes são atores políticos”, enfatizou. Terena ainda informou que uma das maiores mobilizações do movimento indígena, o Acampamento Terra Livre acontece em Brasília, entre os dias 24 a 26 de abril.

Tendo em vista o cenário nacional e o desmonte das políticas públicas, Kátia Favila, da Rede Cerrado, apontou a necessidade uma maior incidência no âmbito internacional e união entre os movimentos para fortalecimento das lutas e defesa de políticas públicas.

Audiência Pública

 

Na tarde do dia 27, participantes da atividade estiveram na primeira audiência pública aberta de 2019 promovida pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados (CDHM). O debate reuniu representantes de movimentos sociais e grupos da população, para desenhar um plano de trabalho da Comissão. “Uma das questões que trago para este espaço é que ele seja um espaço de diálogo constante com os povos e comunidades tradicionais. Nós temos enfrentado um processo de criminalização dos movimentos sociais de um modo geral, é um número alarmante de mortes e assassinatos em nossos territórios e isso tem nos fragilizado. Esta criminalização está sendo legalizada pelo Estado brasileiro e isso é muito preocupante para nós”, apontou a presidenta do CNPCT, Claudia de Pinho.

Na audiência pública, que contou com uma diversidade de movimentos sociais, outros temas foram debatidos em torno da regularização das pistas de pouso na Amazônia, a criação de uma subcomissão de defesa dos povos tradicionais de matriz africana e a defesa da legalidade do abate doméstico de animais, a continuidade nas investigações do assassinato da vereadora Marielle Franco, reparação aos atingidos por barragens sobre a Emenda Constitucional 95 de que trata do orçamento da União, os Projetos de Lei que flexibilizam a definição de terrorismo e criminalizam movimentos sociais e o rebaixamento do Ministério do Trabalho ao status de secretaria. Os movimentos sociais solicitaram ainda que a CDHM seja facilitadora em diálogos entre o STF e a sociedade civil.

Grupo de trabalho

Participam do grupo de trabalho representantes da sociedade civil dos seguintes povos e comunidades tradicionais: Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais – CONAQ (comunidades quilombolas); Comissão Nacional de Fortalecimento das Reservas Extrativistas e dos Povos Tradicionais Extrativistas Costeiros e Marinhos (extrativistas costeiros e marinhos); Coordenação Nacional das Comunidades Tradicionais Caiçaras (caiçaras); Centro de Agricultura Alternativa do Norte de Minas (geraizeiros); Rede de Comunidades Tradicionais Pantaneiras (pantaneiros); Associação dos Retireiros do Araguaia – ARA (retireiros) e Movimento das Catadoras de Mangaba – MCM (catadoras de mangaba).

Projeto

Desde janeiro de 2018, a FIAN Brasil desenvolve um trabalho junto ao CNPCT com o objetivo de enfrentar as violações de direitos humanos relacionadas a Povos e Comunidades Tradicionais  (PCTs) do Brasil, por meio de três objetivos específicos: fortalecer a exigibilidade do DHANA; formação junto às organizações sociais que compõem o Conselho em matéria de direitos humanos e exigibilidade de tais direitos, com consequente incidência política neste sentido; viabilizar o início de monitoramento articulado da sociedade civil em torno do Direito Humano à Alimentação e Nutrição Adequadas (DHANA) na América Latina. O projeto da FIAN Brasil com o CNPCT conta com o apoio da HEKS/EPER.

Quer saber mais sobre o trabalho da FIAN Brasil junto ao CNPCT, acesse aqui

 

‘CDHM deve garantir o direito constitucional da livre manifestação de organizações e movimentos sociais’ aponta Plataforma Dhesca em audiência pública

A Plataforma Dhesca Brasil participou da primeira audiência pública da Comissão de Direitos Humanos e Minorias – CDHM da Câmara dos Deputados, que reuniu movimentos e organizações sociais a fim de pensar caminhos de atuação da Comissão.

 

No dia 27 de março, aconteceu a primeira audiência pública aberta da CDHM – Comissão de Direitos Humanos e Minorias. O debate que reuniu diversos grupos, movimentos e organizações sociais, servirá de base para a elaboração do plano de trabalho da comissão.

O presidente da CDHM, o deputado Helder Salomão, destacou a importância de se estabelecer uma agenda comum e de se aproximar das instituições comprometidas com os direitos humanos a fim de definir os compromissos e os caminhos da Comissão.  Diante de um plenário cheio, a Procuradora Federal dos Direitos do Cidadão, Deborah Duprat, trouxe um alerta sobre o atual cenário político do país.

“O que o governo federal traz é o que chamamos de necropolítica, que é a gestão da vida a partir da morte. Temos um decreto que autoriza a posse de amas e que vai aumentar o feminicídio e, no campo, assassinatos de quilombolas, indígenas e povos tradicionais. Além disso, estimula a violência contra as populações pobres e negros. É a licença para matar”, apontou a procuradora.

A conjuntura de cerceamento e desmonte das estruturas de participação e controle social é uma preocupação. Neste sentido, Darci Frigo, integrante da coordenação da Plataforma de Direitos Humanos, reforçou a importância e a urgência de a Comissão incidir pelo direito constitucional à livre manifestação dos movimentos e organizações da sociedade civil, além de alertar sobre os impactos da Emenda Constitucional 95 nos direitos sociais da população, bem como os prejuízos da reforma trabalhista e da reforma da Previdência e, por fim, sobre a proposta de desvinculação total do orçamento da União.

De encaminhamentos foram sugeridos debates acerca de diversos temas do campo dos direitos humanos, tais como a regularização das pistas de pouso na Amazônia, a criação de uma subcomissão de defesa dos povos tradicionais de matriz africana, a continuidade nas investigações do assassinato da vereadora Marielle Franco, a reparação aos atingidos por barragens, a desvinculação do orçamento da União, os Projetos de Lei que flexibilizam a definição de terrorismo e criminalizam movimentos sociais e o rebaixamento do Ministério do Trabalho ao status de secretaria. Os movimentos ressaltaram ainda que a cabe à CDHM o papel de facilitar diálogos entre o STF e a sociedade civil.

Além da Plataforma de Direitos Humanos, estiveram presentes  Educafro, Movimento dos Trabalhadores 13 de Outubro, Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), Movimento Social de Luta, Fesabra Sindical, Intervozes, Justiça Global, Conselho dos Povos e Comunidades Tradicionais, Associação das Etnias Ciganas, Sociedade Maranhense de Direitos Humanos, Instituto Americano das Cultura Índias do Brasil, Associação Nacional dos Anistiados Políticos, Conselho Federal de Psicologia, Associação dos Perseguidos Políticos Militares, Comunidade Baha’I, Funai, Fórum Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional dos Povos Tradicionais de Matriz Africana, Conselho Indigenista Missionário, Aldeia Taquari, Anamatra, Instituto Comtemplo, Tupinambás do Sul da Bahia, Advocacy da Conectas Direitos Humanos, Sindicato dos Servidores Públicos da União e Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul. Os deputados Helder Salomão (PT/ES), Paulo Teixeira (PT/SP), Elvino Bonh Gass (PT/RS0, Padre João (PT/MG), Patrus Ananias (PT/MG), Erika Kokay (PT/DF), Talíria Petrone (PSOL/RJ) e Bira do Bindaré (PSB-MA) também compuseram a audiência pública.

Fonte: Plataforma Dhesca