Comentário Geral sobre terra e Direitos Humanos Econômicos, Sociais, Culturais é tema de debate na terça-feira (27), em Brasília

A elaboração de um Comentário Geral da ONU sobre terra e Direitos Humanos Econômicos, Sociais, Culturais será tema de um dia de debates com organizações da sociedade civil, movimentos sociais e instituições de pesquisa na terça-feira (27/02), na sede da ONU Brasil, em Brasília.

O objetivo do encontro é debater com a sociedade civil o conteúdo de um Comentário Geral que está sendo elaborado pelo Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (CDESC) das Nações Unidas sobre a questão da terra. Também é prevista, ao final, a sistematização de um relatório da sociedade civil sobre o tema a ser enviado ao CDESC.

A atividade inicia às 9 horas com discussões sobre o Comentário Geral e as questões centrais do direito à terra e território e as perspectivas da sociedade civil internacional. Em seguida, os participantes serão divididos em grupos de trabalho que discutirão temas como “dimensão coletiva da terra”, participação social e consentimento prévio, livre e informado e direitos humanos e empresas: impactos dos megaempreendimentos na terra e território.

A oficina é organizada pela FIAN Brasil, FIAN Internacional, Articulação para o Monitoramento dos Direitos Humanos no Brasil e pela representação nacional do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH).

Entenda

O Comitê dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (CDESC) é um órgão de 18 peritos independentes que monitora a implementação do Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC) pelos seus Estados-partes. Um Comentário Geral é um instrumento elaborado pelo CDESC com o objetivo de interpretar determinado direito humano disposto no PIDESC. O dia de debates visa receber contribuições dos diferentes movimentos, organizações e pesquisadores/as que trabalham com terra/território no Brasil – sendo, portanto, um momento de incidência sobre o CDESC e sua forma de interpretar este tema. Consultas como esta já foram realizados debates na Colômbia (maio de 2017), em Nova York (outubro de 2017), por exemplo.

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Dia de debate com organizações da sociedade civil sobre terra e DHESC (Direitos Humanos Econômicos, Sociais e Culturais)

27/02/2018

Horário: 9h às 17h

Local: ONU BRASIL, situada no Setor de Embaixadas Norte – Lote 17, SEN – Asa Norte, Brasília – DF

Nota Pública: No Cerrado piauiense, comunidades sofrem violências e perdem seus territórios

As entidades que compõem a Articulação dos Povos Impactados pelo Matopiba e a Campanha Nacional em Defesa do Cerrado, apoiadas por movimentos e organizações nacionais e internacionais, vêm novamente a público denunciar o alarmante aumento da violência e de violações de direitos às comunidades do Cerrado no Piauí, presentes na região de implementação do Plano de Desenvolvimento Agropecuário do Matopiba (PDA MATOPIBA).

Desde o ano passado, as comunidades tradicionais dos municípios de Baixa Grande do Ribeiro, Santa Filomena, Gilbués e Bom Jesus vivem sob fortes ameaças e diversos tipos de violência. Grupos armados têm ameaçado lideranças e moradores/as de comunidades em luta contra megaempreendimentos do agronegócio na região.

Em setembro de 2017, por exemplo, entidades que subscrevem esta Nota já haviam denunciado as ameaças de morte sofridas pelo senhor Adaildo Alves da Silva, que vive sob a tensão de perder sua terra, ocupada há anos, no município de Gilbués. Em dezembro, funcionários de empresas agrícolas da região visitaram as comunidades, e questionaram sobre a Caravana Internacional do Matopiba, realizada no mês de setembro na região. Já na semana passada, Adaildo e membros da Comunidade Salto foram abordados por dois homens armados que, de acordo com os próprios trabalhadores, estavam a serviço do suposto proprietário da fazenda, Bauer Souto Santos.

Pressionada pelo Ministério Público Estadual e Federal, a Polícia Civil foi até a Comunidade Salto para averiguar as ameaças, porém não efetuou nenhuma prisão e se negou a procurar pelos pistoleiros. A investigação não saiu do lugar. No próprio ato de registrar um Boletim de Ocorrência fica evidente o total descaso da polícia em relação a violência enfrentada pelas comunidades, pois os membros das comunidades muitas vezes se deparam com dificuldades para registrar as denúncias.

A expansão do agronegócio no Cerrado do Piauí é caracterizada por investimentos financeiros de Fundos de Pensão estrangeiros, como o TIAA-Cref (dos Estados Unidos), o que tem propiciado grande especulação imobiliária por terras griladas por empresários e fazendeiros. Mas são nesses pedaços de chão, como na Comunidade Salto, que homens e mulheres vivem há anos, e utilizam dos “baixões” e das Chapadas para plantar e criar seus animais. Espaços de vida que foram sendo tomados à força pelos “projeteiros”, como são denominados os grileiros pelas comunidades.

Para verificar e denunciar as violações de direitos e violências sofridas pelas comunidades rurais da região sul do Piauí, em setembro de 2017 a Caravana Internacional do Matopiba (composta por membros de entidades e movimentos sociais brasileiros e internacionais, pesquisadores e jornalistas) percorreu estas áreas ao longo de onze dias. Como desdobramento dessa ação, representantes de organizações brasileiras, como Comissão Pastoral da Terra (CPT), FIAN, e Rede Social de Justiça e Direitos Humanos, visitaram países da Europa e os Estados Unidos para publicizar estas situações encontradas pela Caravana no Piauí. Denúncias foram apresentadas, por exemplo, a representantes de governos europeus e ao Parlamento Europeu. Nos EUA, ocorreu um seminário sobre a problemática na Universidade de Nova York. E o Relatório sobre a Caravana Internacional do Matopiba será lançado ainda neste semestre.

Além da investida estrangeira no Piauí, a Regularização Fundiária Estadual, proposta na Lei 6709/2017, agrava mais essa situação conflituosa, pois desconsidera o território onde as comunidades vivem, e privilegia o título individual e a regularização em primeiro momento das terras invadias pelos fazendeiros e empresas. Lembramos que esse processo de regularização é financiado pelo Banco Mundial.

Os povos e comunidades piauienses, bem como as organizações e movimentos sociais que os acompanham, têm realizado inúmeras denúncias nacionais e internacionais, todavia, percebe-se que a ausência do Estado brasileiro na prevenção e resolução dos conflitos agrários contribui para o aumento da violência e para a legitimação das ações criminosas de fazendeiros e empresas.

Diante deste cenário, manifestamos nossa solidariedade e apoio às comunidades ameaçadas e em luta na defesa de seus territórios. Exigimos ações imediatas das autoridades públicas para impedir mais mortes anunciadas de camponeses e camponesas. Exigimos ainda que a Vara Agrária do Piauí, o Instituto de Terras do Piauí (Interpi) e o Núcleo de Regularização Fundiária da Corregedoria Geral da Justiça do Piauí revisem a Lei 6.709/2017 e que esse processo revisional conte com ampla participação das comunidades impactadas, como está garantido na Convenção 169 da OIT, e a garantia primeira da destinação das terras às comunidades, que há anos vivem e convivem com estes territórios.

Brasília, 22 de fevereiro de 2018.

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Public Note: In the Cerrado of Piaui, Brazil, communities suffer violations and lose their land

The entities that make up the Articulation of the Populations Impacted by Matopiba and the National Campaign in Defense of the Cerrado, supported by national and international movements and organizations, are once again publicly denouncing the alarming increase in violence and violations of rights of the communities in the Cerrado in Piauí, part of the region where the federal government is implementing its Matopiba Agricultural Development Plan (MATOPIBA PDA).

Since last year, traditional communities in the municipalities of Baixa Grande do Ribeiro, Santa Filomena, Gilbués and Bom Jesus have been living under strong threats and various types of violence. Armed groups have threatened leadership and community dwellers struggling against large agribusiness ventures in the region.

In September 2017, for example, entities that subscribe to this note had already denounced the death threats suffered by Mr. Adaildo Alves da Silva, who is being pressured to leave the land he has occupied for years, in the municipality of Gilbués. In December, officials from the region’s agricultural companies visited the communities and questioned them about the Matopiba International Caravan held in September in the region. Last week, Adaildo and members of the Morro D’água community were approached by two armed men who, according to the workers themselves, were in the service of the alleged owner of the farm, Bauer Souto Santos.

Pressed by the State and Federal Public Prosecutor’s Office, the Civil Police went to the Salto Community to investigate the threats, but did not make any arrests and refused to look for the gunmen. The investigation did not advance in any way. In the very act of recording an Occurrence Bulletin, the police’s total lack of awareness of the violence faced by the communities was evident, making it difficult for community members to record their complaints.

The expansion of agribusiness in the Cerrado do Piauí is funded by financial investments of foreign pension funds, such as TIAA, from the United States, which has speculated in real estate acquired illegally by entrepreneurs and farmers. But it is on these pieces of ground, like the Salto Community, that men and women have lived for years, and they use the lowlands and the bluffs to plant and raise their animals – spaces of life that have been taken by force by the “projectors”, as the land grabbers are called by the communities.

In order to verify and denounce violations of human rights and violence suffered by rural communities in the southern region of Piauí, the Matopiba International Caravan (composed of members of Brazilian and international organizations and movements, researchers and journalists) visited affected communities over eleven days in September 2017. After the caravan representatives of Brazilian organizations, such as the Pastoral Land Commission (CPT), FIAN, and the Social Network of Justice and Human Rights, visited countries in Europe and the United States to publicize the situations encountered by the Caravan in Piauí. Complaints have been made, for example, to representatives of European governments and the European Parliament. In the USA, a seminar on the problem at New York University took place. And the Matopiba International Caravan Report will be released later this semester.

In addition to increasing foreign investment in Piauí, the Land State Regularization, proposed in Law 6709/2017, further aggravates this conflictive situation, since it disregards the territory where the communities live, and privileges individual titles and the regularization of land soon after being invaded by farmers and companies. We remind you that this regularization process is financed by the World Bank.

The peoples and communities of Piaui, as well as the organizations and social movements that accompany them, have made innumerable national and international denunciations, however, it is noticed that the absence of the Brazilian State in the prevention and resolution of agrarian conflicts contributes to the increase of violence and to legitimize the criminal actions of farmers and companies.

Given this scenario, we express our solidarity and support to threatened communities struggling to defend their territories. We demand immediate actions by public authorities to prevent further announced deaths of peasants. We also demand that the Agrarian Branch of Piauí, the Institute of Land of Piauí (Interpi) and the Nucleus of Land Regularization of the General Corregedoria of Justice of Piauí review Law 6,709 / 2017. This review process should have wide participation of impacted communities, as guaranteed by the ILO Convention 169, as well as guarantee that land be allocated to the communities that have lived in these territories for many years.

Brasília, February 22, 2018.

Associação de Advogados de Trabalhadores Rurais no Estado da Bahia (AATR/BA)

ActionAid Brasil

Associação Agroecológica Tijupá

Alternativa para a Pequena Agricultura no Tocantins (APA/TO)

Cáritas Brasileira

Cáritas Regional Piauí

Comissão Pastoral da Terra (CPT)

Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag)

Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ)

Conselho Indigenista Missionário (Cimi)

Conselho Pastoral dos Pescadores (CPP)

Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (CONIC)

Coletivo Acadêmico de Educação do Campo/PI

Escola de Formação Paulo de Tarso

Federação da Agricultura Familiar do Piauí (FAF-PI)

Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado do Piauí (FETAG-PI)

Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (FASE)

FIAN Internacional

FIAN Brasil

Grassroots International

Grupo de Estudos sobre Geografia, Território e Sociedades, do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia (IFMA)

Grupo de Estudos sobre Mudanças Sociais, Agronegócio e Políticas Públicas (GEMAP) do Programa de Pós-Graduação de Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade (CPDA/UFRRJ)

Grupo de Pesquisa ReExisTerra – Resistências e Reexistencias na Terra (NAEA/UFPA)

Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN)

Instituto Políticas Alternativas para o Cone Sul (PACS)

Maryknoll Office for Global Concerns

Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA)

Movimento dos Pescadores e Pescadoras Artesanais (MPP)

Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Campo (MTC)

Núcleo de Agroecologia e Educação do Campo (GWATÁ/UEG)

Obras Kolping/PI

Rede Social de Justiça e Direitos Humanos

Rede de Mulheres Negras para Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Redessan)

Serviço Pastoral do Migrante (SPM)

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* Crédito imagem: Caravana Internacional do Matopiba – Piauí Set.2017

Declaração Internacional dos Direitos Campesinos é tema de oficina que acontece nesta segunda (26) em Brasília

FIAN Brasil, FIAN Internacional e a Articulação para o Monitoramento dos Direitos Humanos no Brasil realizam, nesta segunda-feira (26/02), uma Oficina sobre a Declaração dos Direitos dos Campesinos, em Brasília. A atividade, direcionada para organizações da sociedade civil e movimentos sociais, tem como objetivo discutir pautas internacionais importantes para as lutas sociais relacionadas à terra, território e outros direitos humanos.

O cerne dos debates estará direcionado para a Declaração Internacional dos Direitos dos Campesinos (DDC), importante processo político-jurídico que vem ocorrendo nos últimos anos no Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas (ONU), em Genebra (Suíça). A Declaração é uma ferramenta que pretende consolidar, proteger e também inovar no que se refere aos direitos dos camponeses e de outras pessoas que trabalham na zona rural. Neste sentido, destaca-se a importância nas discussões de temas relacionados, por exemplo, a Povos e Comunidades Tradicionais, soberania alimentar, direito às sementes, bem como outras pautas relacionadas.

Na programação da Oficina, as organizações e movimentos participam de discussões sobre o processo político de construção na ONU da Declaração dos Direitos dos Campesinos, a importância da DDC para reforçar as lutas sociais no Brasil e as estratégias para o fortalecimento da incidência internacional no tema.

“A iniciativa é essencial pelo papel chave que os camponeses desempenham na produção de alimentos e os desafios em torno da questão agrária, bem como o crescente número de conflitos em torno da terra e da água, assim como as crises dos preços alimentares e climáticos”, destaca trecho de um documento da Via Campesina Internacional, em 2012, na ocasião da aprovação da Resolução sobre a necessidade de se criar uma nova ferramenta para os direitos dos mais de um milhão de camponeses e de trabalhadores rurais do mundo inteiro.

A previsão é de que a negociação da Declaração seja concluída em abril, em Genebra, na próxima sessão do Grupo Aberto de Trabalho responsável pela minuta final.

Serviço

Oficina com sociedade civil sobre a Declaração dos Direitos dos Campesinos

26 de fevereiro

Horário: 9h às 18h

Local: Instituto São Boaventura (SGAN 915, Módulos ABC, Anexo ao Santuário São Francisco), Brasília – DF.

Conselho Nacional dos Direitos Humanos manifesta repúdio à intervenção militar no Rio de Janeiro e qualifica decisão como “completamente inadequada e ineficaz”

Nesta segunda-feira (19), o Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH) divulgou nota manifestando extrema preocupação e repúdio à intervenção militar no Rio de Janeiro, decretada pelo Presidente da República, Michel Temer, na sexta (16). A medida está sendo utilizada pela primeira vez no país, desde a promulgação da Constituição Federal de 1988.

Para o CNDH, o decreto, que precisa ser aprovado pelo Congresso e deve ser votado ainda nesta segunda em regime de urgência, aprofunda a ruptura com a institucionalidade democrática do país, o estado de exceção, e traz graves ameaças à estabilidade democrática e aos direitos humanos.

“A atuação das Forças Armadas é historicamente marcada pelo aumento do número de violações de direitos, operando na lógica do ‘combate ao inimigo’ e, segundo essa lógica, a população negra, pobre e moradora de favelas e periferias é quem tem sido ‘combatida’ pelas tropas do Exército, da Marinha e da Aeronáutica”, ressalta o CNDH na nota, qualificando a decisão como completamente inadequada e ineficaz.

“A falsa solução de emprego das Forças Armadas como uma pretensa justificativa para o enfrentamento ao tráfico de entorpecentes sob o enfoque de ‘guerra às drogas’, agora está sendo utilizada de forma autoritária e ostensiva para o combate à violência e insegurança no Estado, sem a busca por uma estratégia de combate ao crime organizado, sem a adequada promoção de políticas de segurança pública e de temas sociais e sem o debate prioritário sobre a dignidade humana”, reforça o colegiado.

No documento, o CNDH exige dos órgãos do Governo Federal e do Estado do Rio de Janeiro, Defensoria Pública e Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, que apresentem relatório e prestem contas sobre a atuação das Forças Armadas já realizada no Estado. Também destaca que a solução para a crise na segurança pública dos estados deve ser discutida amplamente com a sociedade, e afirma que irá aprofundar o debate e deliberar por ações, em âmbito nacional e internacional, que busquem o fortalecimento da democracia.

Leia a nota na íntegra AQUI

 

Fonte: CNDH

Quilombolas comemoram vitória histórica em julgamento de ADI

O resultado final do julgamento da Ação Direita de Inconstitucionalidade (ADI) n° 3239 no Supremo Tribunal Federal (STF), que trata do direito à terra e território das comunidades quilombolas, teve desfecho favorável às e aos quilombolas brasileiros nesta quinta-feira (8).

Durante a sessão, que durou toda a tarde, os ministros Edson Fachin, Ricardo Lewandoswki, Luiz Fux, Marco Aurélio Mello, Celso de Mello e Cármen Lúcia votaram pela integral improcedência da ação, incluindo a aplicação da tese do “marco temporal”, que prevê que o direito constitucional quilombola à terra se resumiria apenas às áreas que estivessem efetivamente ocupadas em 5 de outubro de 1988 – o que dificultaria o acesso efetivo das comunidades a seus territórios. Em seu voto, Lewandoswki chegou a classificar o marco temporal como “prova diabólica”, por ser difícil ou impossível de ser produzida.

Segundo ministro a votar no julgamento da ADI 3239, Luís Roberto Barroso também julgou pela improcedência da ação. No que se refere à tese de marco temporal, contudo, ele propõe que sejam consideradas as comunidades ocupadas quando a Constituição Federal foi promulgada, em outubro de 1988, somadas às que foram desapossadas à força (desde que sua vinculação cultural tenha sido preservada) e caso haja pretensão da comunidade em retomar a terra. Estas duas condicionantes são analisadas a partir de laudos antropológicos produzidos pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).

Já o ministro Gilmar Mendes acompanhou o voto de Dias Toffoli, que em sessão anterior havia se posicionado pela constitucionalidade parcial (que leva em consideração a tese do marco temporal) da matéria.

Para os representantes das comunidades quilombolas de todo o país presentes ao julgamento, o resultado é uma vitória contundente, advinda de um processo intenso de luta e mobilização. “Hoje o Estado brasileiro deu um passo importantíssimo para resolver o problema de uma nação. É um dia de luta e de comemoração, mas que sirva de exemplo para que a gente possa galgar novos caminhos. Que essa decisão faça com que o Executivo devolva aquilo que é direito nosso”, afirma Denildo Moraes, integrante da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq).

Segundo Layza Queiroz, advogada popular da Terra de Direitos, o julgamento é um marco na história dos direitos quilombolas. “A confirmação da constitucionalidade do decreto e o rechaço da tese do marco temporal é uma vitória imensa das comunidades quilombolas, principalmente diante de um contexto de ofensiva conservadora e retirada de direitos. Ao Estado brasileiro compete agora mais do que nunca o integral cumprimento da Constituição e do decreto, garantindo recursos necessários para a titulação dos territórios quilombolas”.

Por Maria Mello

Fonte: Terra de Direitos

Feira da barganha: ano começa tóxico no Congresso

Frente Parlamentar da Agropecuária volta a pressionar com força pelo Pacote do Veneno, desta vez em troca de apoio ao governo para aprovar Reforma da Previdência

O ano de 2018 mal começou no Congresso e a parceria entre governo e ruralistas já está pegando fogo. Isso porque um governo desesperado por apoio para aprovar suas reformas voltou a costurar nos bastidores com a maior bancada do Congresso a flexibilização das regras de agrotóxicos. A oferta de troca agora são votos a favor da polêmica Reforma da Previdência.

Sem o apoio ruralista, o governo fica de mãos atadas para aprovar as matérias de seu interesse. Por isto, ceder aos interesses do agronegócio configura como moeda de troca valiosa para o Planalto garantir as reformas desejadas pelo presidente Temer. Na prática, isso significa que governo e Congresso barganham nossa saúde e a proteção do meio ambiente por apoio parlamentar em Brasília.

Estamos falando de trocas extremamente perigosas, especialmente pelo fato de serem primordiais para os respectivos interessados. Se por um lado o presidente insiste para ver aprovada sua tão desejada reforma na tentativa de colocar um propósito em sua gestão, por outro os ruralistas anseiam pelo encaminhamento de sua própria e querida proposta, apresentada em 2002 e hoje transformada em um verdadeiro Frankstein de anexos sob um único Projeto de Lei, o (PL) 6299/02.

Trata-se do Pacote do Veneno, um conjunto de medidas a favor dos pesticidas e que atende a desejos da indústria e interesses de boa parte dessa bancada. Seria um marco histórico para os ruralistas aprovar essa medida e segundo o site JOTA, o deputado ruralista Luiz Nishimori (PP/PR), relator da proposta, prometeu apresentar o texto da lei até março para votação.

De acordo com Marina Lacôrte, da campanha de Agricultura e Alimentação do Greenpeace Brasil, se o Pacote do Veneno for aprovado, o Brasil, que já é um dos campeões mundiais em uso de agrotóxicos, abrirá ainda mais suas portas para essas substâncias. “Os agrotóxicos são os principais responsáveis pela perpetuação desse modelo de produção agrícola que é altamente impactante e que coloca em risco o futuro da nossa produção e de nossas condições de vida. Ao contrário do que o agronegócio costuma dizer, essa não é a única forma de se produzir e existe sim um novo caminho capaz de fornecer alimentos para todos”, explica ela.

Para se ter uma ideia, um dos objetivos dos ruralistas é mudar o termo “agrotóxico”, que passaria a chamar “defensivo fitossanitário” – uma clara tentativa de mascarar sua nocividade – e desconsiderar os impactos à saúde e ao meio ambiente no processo de aprovação de novas substâncias. Além disto, a proposta é tão escancarada que será admitida a possibilidade de registro de substâncias comprovadamente cancerígenas.

“Este pacote vai totalmente na contramão do que a sociedade quer. O que precisamos urgentemente é aprovar medidas e políticas para diminuir a quantidade de veneno no campo, e não aumentar. Como o Greenpeace e a agência de monitoramento vêm mostrando, os agrotóxicos têm ido parar no nosso prato e colocam em risco a nossa saúde e a de nossas crianças”, defende Lacôrte.

Este é justamente o objetivo da PNARA, a Política Nacional de Redução de AgrotóxicosAcolhida no início de 2017 pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia, a PNARA aguarda há mais de um ano a instalação de uma Comissão Especial para começar a tramitar. Por isso é muito importante que continuemos a fazer pressão pela sua aprovação. Lançada no ano passado, uma petição para apoiar a PNARA e dizer não ao Pacote do Veneno já conta com cerca de 80 mil assinaturas.

Se você ainda não assinou a petição, aproveite agora. Se já assinou, compartilhe em suas redes, com amigos e familiares. Não podemos mais engolir tanto veneno!

Fonte: Greenpeace / Crédito foto: Antonio Cruz/Agência Brasil

Há um ano conselheiras e conselheiros aguardam a posse no CNPCT

Sem a instalação do Conselho Nacional, Povos e Comunidades Tradicionais  perdem ainda mais direitos

Se no último ano os retrocessos e as perdas de direitos têm acentuado desigualdades no país, os impactos destas medidas para povos e comunidades tradicionais têm sido ainda mais danosos. A violência e criminalização das lutas, aliada à falta de políticas de regularização fundiária e de territórios tradicionais têm fragilizado estes povos que precisam ter garantido o direito à terra e território, como condição necessária para sua sobrevivência, assim como a manutenção da sua identidade e valores culturais.

Em relação a estes povos, no que diz respeito à participação, um dos principais problemas enfrentados é a não efetivação do  Conselho Nacional de Povos e Comunidades Tradicionais (CNPCT). Instituído pelo Decreto 8.750 de maio de 2016 – uma das últimas ações do governo da Presidenta Dilma Rousseff – o Conselho é um órgão de caráter consultivo e seus conselheiros e conselheiras são eleitos por meio de edital público. O processo eleitoral aconteceu ainda no ano de 2016, porém o resultado deste só foi divulgado em fevereiro de 2017. Apesar da nomeação em 14 julho de 2017, conselheiras e conselheiros eleitos aguardam há quase um ano a instalação para que possam dar continuidade aos trabalhos inicialmente realizados pela Comissão Nacional de Povos e Comunidades Tradicionais (transformada, posteriormente em Conselho).

Entre as principais atribuições do CNPCT estão coordenar e acompanhar a implementação da Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais, instituída pelo Decreto nº 6.040/07.  A Política foi elaborada tendo como principal objetivo a promoção do desenvolvimento sustentável desses grupos com ênfase no reconhecimento, no fortalecimento e na garantia dos seus direitos territoriais, sociais, ambientais, econômicos e culturais, respeitando e valorizando suas identidades, formas de organização e instituições.

“O CNPCT é uma conquista dos povos e comunidades tradicionais, uma luta de muitos anos, é um espaço de Estado e não um espaço de governo, mas que precisa muito de vontade política para que ele de fato se efetive e continuamos nessa luta pela sua efetivação. Temos atuado, mas sem reuniões ordinárias para deliberar algumas coisas no coletivo e isso é muito ruim politicamente, porque resulta em muitas perdas coletivas”, ressalta a conselheira Cláudia de Pinho, da Rede de Comunidades Tradicionais Pantaneiras.

Sem posse

A relação com as organizações da sociedade civil eleitas para compor o Conselho foi divulgada pelo Ministério de Desenvolvimento Social em fevereiro de 2017. O resultado da eleição foi divulgado no Diário Oficial da União no dia 3 de fevereiro de 2017.

São 33 organizações e movimentos sociais que aguardam a posse no CNPCT, além de 15 membros do Governo Federal. Importante instrumento para promover o desenvolvimento sustentável, reconhecer e garantir direitos de povos e comunidades tradicionais, em maio de 2017, o governo federal, por meio do Decreto 782 transferiu a estrutura do CNPCT, que até então integrava o Ministério de Desenvolvimento Social, para o Ministério dos Direitos Humanos.

“Passamos por todo o processo de composição do CNPCT, mas não saiu a posse e no meio do processo a Secretaria Executiva que estava conduzindo esse processo no MDS passa para o Ministério de Direitos Humanos, mas até agora nada de previsão, inclusive fizemos uma carta para a Ministra solicitando a posse dos Conselheiros, o funcionamento da Secretaria Executiva, entre outras. Apesar da SDH ter nos recebido, até agora não temos nada de efetivação. Precisamos dar continuidade às atividades e obrigações do Conselho”, conta Claudia de Pinho.

Na carta, enviada à ministra Luislinda Dias de Valois em outubro de 2017, além de explicitar o processo de mobilização e articulação construído para a instituição do Conselho, as organizações e movimentos sociais de povos e comunidades tradicionais pedem agilidade na efetivação do órgão como: posse dos Conselheiros; transferência do orçamento referente ao Conselho que se encontra disponível no MDS para o MDH; transferência da estrutura da Secretaria do CNPCT que se encontra no MDS para o MDH; criação de uma coordenação para a Política dos Povos e Comunidades Tradicionais na estrutura da Secretaria Nacional de Promoção da Igualdade Racial.

“Diante do exposto manifestamos que não aceitamos a desculpa da crise política que o país atravessa para se fazerem acordos e que a toque de caixa retirem nossos direitos e nossas conquistas nas lutas históricas em busca da visibilidade política e efetivação de políticas públicas que refletem o nosso modo de ser e existir neste país. Repudiamos qualquer retrocesso que viole os direitos de Povos e Comunidades Tradicionais e contamos com a vosso apoio”, destaca trecho da carta.

Direito ao território e à alimentação

Em atividade de formação sobre a Declaração dos Direitos Campesinos, realizada com a FIAN Brasil, nos dias 15 e 16 de janeiro, representantes do Grupo de Trabalho sobre Direitos Campesinos do CNPCT, apontaram a ausênica de posse de conselheiras e conselheiros como um dos principais problemas de povos e comunidades tradicionais do país.

Além da falta de efetivação do CNPCT, o grupo apontou ainda como problemas enfrentados pelos povos e comunidades tradicionais o fim do PAA e PNAE; a sobreposição dos territórios tradicionais com Unidades de Conservação; o não reconhecimento dos territórios tradicionais; a privatização dos recursos naturais; o desrespeito aos marcos legais e tratados nacionais e internacionais; a perda de políticas públicas e desmonte do Estado; o aumento da violência contra as mulheres e jovens PCT; o uso de agrotóxicos; os impactos causados por grandes empreendimentos, entre outros.

“Todas as políticas que vêm das perdas de direitos tem um impacto muito grande porque nossos territórios não estão regularizados. A maioria das demandas está relacionada à questão da regularização fundiária dos territórios tradicionais e isso impacta diretamente na segurança alimentar, porque para muitos povos além da auto afirmação da sua identidade e território, existe uma auto afirmação ligada à sua alimentação e muitas vezes essa alimentação está disponível na sua forma de estar no território e, sem o território, isso fica fragilizado, vulnerável”, aponta Claudia de Pinho.

De acordo com dados do último IBGE é possível perceber que a insegurança alimentar é mais presente em comunidades rurais, onde predominantemente se encontram os PCT’s. Enquanto na cidade o grau de segurança alimentar é de 79,5%, em comunidades rurais o dado cai para 64,5% (IBGE/2013). “Acrescentando a estes dados o quesito racial, em comunidades negras rurais (quilombolas, por exemplo) o grau de segurança alimentar cai para 58%. Essas informações indicam a necessidade urgente de políticas públicas que reconheçam a especial vulnerabilidade dos PCT’s no Brasil. A instalação imediata do CNPCT não é apenas uma obrigação legal do Estado brasileiro, mas uma medida que visa garantir os direitos humanos”, destaca a assessora de Direitos Humanos da FIAN Brasil, Luana Natielle Basílio.

 

(Foto destaque: Leo Lima)

CNDH manifesta preocupação quanto a aumento da violência em conflitos no campo

O crescimento da violência que vitima povos, comunidades e trabalhadores e trabalhadoras do campo também foi visto com preocupação pelo Plenário do Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH), reunido em Brasília nos dias 31 de janeiro e 1° de fevereiro em Brasília,  em sua 34ª Reunião Ordinária.

Em nota aprovada pelo Plenário nesta quarta-feira (31 de janeiro), o colegiado alerta sobre o crescimento da violência contra defensores e defensoras de direitos humanos, especialmente vinculada a conflitos fundiários; contra povos indígenas, e para a quantidade de chacinas ocorridas em 2017. “As execuções em Colniza/MT (nove trabalhadores), Pau D’arco/PA (nove trabalhadores e uma trabalhadora) e Vilhena/RO (três trabalhadores), demonstram um ataque indiscriminado à luta pelos direitos humanos, especialmente vinculados às questões agrárias no Brasil”, diz a nota.

“O ano de 2018 começa com o assassinato de dois defensores de direitos humanos (execuções ocorridas em Anapu/PA e Iramaia/BA), o assassinato de dois professores indígenas (mortos a pauladas, em Penha/SC, e por apedrejamento, em Confresa/MT) além de um atentado por arma de fogo contra um indígena Munduruku em Itaituba/PA. São casos que apontam para um quadro gravíssimo de violência que requer urgente e necessária proteção e garantia dos direitos humanos”, destaca o documento do CNDH.

O colegiado também destaca que, “paralelo a este crescimento nos dados sobre a violência no campo, o Estado brasileiro tem tomado medidas que, na contramão dos direitos humanos, podem agravar um quadro que já é extremamente grave”, citando a Medida Provisória 759/2016 (altera a política de reforma agrária), a redução orçamentária para políticas públicas voltadas para a agricultura familiar, a paralisação das demarcações dos territórios indígenas e quilombolas, dentre outras questões.

Acesse a Nota Pública AQUI

 

Fonte: Ascom/CNDH